VINTE ANOS DE ARQUEOLOGlA
NA
ALCÁÇOVA DE SANTARÉM: BALANÇO DE
RESULTADOS E PERSPECTIVAS DE FUTURO
1. Introdução
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habitantes da Alcáçova ao longo dos séculos da sua ocupação.
As
espécies vegetais cultivadas puderam ser conhecidas através das anál ises dassementes recolhidas nos diversos níveis arqueológicos escavados, de cronologia variada.
O
desenvolvimento e a concretização do projecto tornou possível, ponamo, traçar um perfil relativamente coerente e lógico do quadro dodesenvolvimento do sitio ao longo da diacronia da sua ocupação numa
multiplicidade de aspectos.
Como
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á
atrás se mencionou, (Odo este trabalho tcm vindo a serdivulgado à comunidade cientifica nacional e internacional, tendo parecido
importante que o püblico não especializado, nacional e escalabitano, fosse
também informado do trabalho desenvolvido no mltico lugar «Jardim das
Portas do Sok Assim, os contactos que a Câmara Municipal iniciou com o
Museu Nacional de Arqueologia, no selHido de realizar uma exposição onde os materiais recolhidos ao longo dos vinte anos de trabalhos de campo
fossem expostos. foram acolhidos com agrado pclas responsáveis cientificas
do projecto, que imediatamente se disponibili7..aram para prestar toda a colaboração a esta iniciativa.
Deste modo, e juntamente com a dra. Maria José de Almeida, então arqueóloga da Câmara Municipal, comissariaram a referida exposição, tendo
sido também responsáveis pela organização do carálogo, no qual colaboraram com diversos textos e numerosas fichas descritivas dos materiais.
As
dificuldades inerentes a qualquer escavação em área urbanaco
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também, naturalmente, na Alcáçova de Santarém. As limitações do meio urbano, e ai nda as circunstâncias em que decorreramgrande parte das escavações da década de 90 (sondagens, cujas áreas foram
determinadas pela própria natureza preventiva dos trabalhos), nem sempre facilitaram as análises espaciais e as leituras horizontais.
Por outro lado, a longa diacronia do sitio
é
em gmndc parte responsável pelas limitações com que nos confrontamos no mamemo deanalisar o modo como se processou a ocupação do espaço ao longo dos
séculos. De facto, a ocupação islâmica da AJcáçova de Santarém interferiu, por vezes drasticamente, com os testemunhos anteriores.
Os
silos subterrâneos, datáveis do perfodo islâmico. foram abertos no calcário de base, o que obrigou os seus construtores a perfurar, e por vezes mesmo a)
n
ANOS I)F. ARQUfOl.OGIA NA AI.CÁçoVA OE SAN"li\Rf.M, 1 ... 1 19 1remover, a totalidade dos nfveis arqueológicos anteriores. Tal situação
implicou a destruição de pane apreciável de muros pertencentes a parede.~ de ediffcios, o que justifica o desaparecimemo de uma parte considerável
da malha urbana sidérica e romana, que, em certos casos, só
é
recons(Ítuívd a partir do que foi poupado pelas ~~dcsttuições») islli.micas. Também as construções de época modernac
contemporânea provocaramrortes danos nas construções antigas, para além de limitarem as áreas
passiveis de serem intervencionadas.
No entanto, os trabalhos arqueológicos permitiram a identificação e caracterização da ocupação humana da Alcáçova ao longo da diacronia,
estando hoje relativamenre bem definidas as sequências oCllpacionais,
e
aevolução das técnicas construtivas e do urbanismo sidérico e romano. .AfJnal, e apesar de todas as limitações, a intervenção humana
n
o
localpode ser analisada e as distintas abordagens daquele espaço pelos diversos agentes que nele interferiram puderam ser equacionadas e caracterizadas,
mesmo tendo consciência que muitos aspectos dos rnodelos de ocupação
do espaço permanecem ainda obscuros.
3. A Idade do Ferro
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na área meridional da Penín
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arqucomctria tem proporcionado fornecem COf1{ornos, cada vez mais nflidos, às informações dos textOs clássicos sobre a colonização fenfeia do Extremo Ocidente. Se a cronologia que podemos inferi r da leitura dos autores clássicos para a fundação de Gadir (século
XlI
a.c.)é
ainda demasiado recuada frelHe aos dados arqueológicos, o factoé
que no território da actual cidade de Cádiz e ainda na orla mediterrânea aocideme do Estreito de Gibraltar são múltiplos os testemunhos de uma
colonização fenícia cm larga escala, cujo inicio pôde ser datado, pelo carbono
1
4,
elltTe O final do século X e o início do século IX a.C.O s dados que as escavações arqueológicas no território actualmente
português forneceram permitiram verificar que, pelo menos a panir dos
finais do século IX a.C, os fenícios instalados na região de Cádiz iniciam
COlltaclOS sistem,hicos com outros territórios e alcançam a fachada
ocidental portuguesa. Tudo indica que o estuário do Tejo terá sido o local
pioneiro desses COlHactos. D e facto, é de Santarém e do C laustro da Sé de Lisboa que são provenientes os mais antigos materiais que podem
relacionar-se com as viagens que os fenfeios ocidentais efectuaram ao ocidente da Penfnsula Ibérica, a partir do final do século IX a.C
Na Ncáçova de Santarém, muitos são os elementos que confirmam esta
situação, não havendo dúvidas sobre a precocidade e a intensidade das relações estabelecidas entre o baixo vale do
Tejo
e os imigrantes levantinos.A Idade do Ferro da Alcáçova de Santarém está, reaJmeme, imbufda
de um profundo orientalismo, orientalismo esse consubstanciado num
conjunto anefacrual muito caracterfstico e
em
técnicas de construçãoespecíficas do mundo oriental.
Nos trabalhos de campo. recolheram-se milhares de fragmelltos cerâmicos cuja tecnologia, morfologia e decoração evidcnciam
°
seu carácter exógeno (Arruda,t
993;
1999
-2
000).
A cerâmica de engobe vermelho, a cerâmica pintada, a cerâmica cinzenta e as ânforas Ilão podemser lidas no COlllexto de uma qualquer evolução local. Encontradas em
grandes quantidades nos níveis inferiores da Alcáçova, ~evela.m ev~d~ntes
afinidades com os espólios das colónias fenfeias do lItoral mendlonal
espanhol, onde têm os scus melhores paralelos. .
É
importante destacar quc a w talidade destes produtos era fabricada a torno, parecendo claro que, pelo menos na região, a introdução da rodade oleiro pode ser atribuída aos fenfcios. A cobcrtura de alguns vasos cerâmicos por um cngobe espesso, de cor vermelha e que adquire, por
polimento ao torno, um aspecto accl'inado é também lima inovação a. ler
em
conta nesta discussão, bcm como aliás as Illorfologias dos vasos que receberam esse mesmo engobe. Trata-se, maioritariamente, de pratos de bordo muiw largo e ainda taças carenadas, cuja presença deve tradu'Úr novos hábitos alimenlares. Os chamadospilhoi
(vaso.~ de grandesdimensões, fechados, com duas ali quatro asas, muilo possivelmente destinados ao armazenamento) são outra das formas cerâmicas que ajudam a desenhar o quadro das relações da Alcáçova de Santarém com os colonos fenfeios peninsulares. Trata-se de vasos cujo modelo se deve
procurar no Mediterrâneo O riem"l, e que ocorrem, exclusivamente. CIO
áreas em que a coloni7.ação está atestada, nomeadamente em Cartago,
Ibiza, Sicília Ocidemal, Sardenha e, na região de Cádiz. No caso dos
pilhoi
de Santarém, a sua decoração, pintada ~m bandas vermel.h"s enegras, associada
à
morfologia e 11 tecnologia lIuli1.acla no seu falmco (o torno), facilita o seu enquadramento no universo mediterrâ.neo.A.5
ânforas dos níveis sidéricosscn//ah
itanos
mostram que os produtos alimentares foram importados das colónias fcn/cifls da região de Cádi7., oque evidencia o nfvel de relaçõcs entre as duas áreas.
A Alcáçova de Santarém ofereceu ainda artefactos cerâm icos directamente relacionados com a prática da actividade metalürgica. 'l'rat;l
-se de recipientes destinados
à
preparação de capelas que indiáull que a metalurgia da prata foi praticada no local.k dificuldades a que Fizemos alusão no pOllto anterior, Il~O facilitflllJ a análise das primeiras ocupações humanas. tendo, corno
é
óhvio, sido194 IINII MIIRC,ARlOIIAIIRUI)A , CATARINA VIEGAS
essas as mais atingidas pelas construções posteriores. No entanto, o que sobreviveu aos ediflcios romanos
e
aos silos medievais permite algumasintérpretações.
Ficou claro que nos edifícios sidéricos, de planta rectangular, se recorreu, preferencialmente,
à
terra corno material construtivo.Os
dados recolhidos mostram que as paredes das estruturas habitacionais eram de tijolos de adobe, tendo, também, ficado evidenciado queess
as
paredesse alçaram
sobrealicerces construidos com pedras ligadas por argila. Foi também a argila que
se usou para impermeabilizar a cobertura vegetal dessas estruturas
habitacionais e ainda a ela recorreram os habitantes da Aldçova
pré
~
romana
para construir muitos dos pisos que as pavimentavam.Ainda quanto a técnicas de construção, pudemos constal'ar que, nos
mamemos mais tardios da Idade
do
Ferro, a taipa {ai também uti lizada,e
que o calcário moído se usou igualmente na feitura de pavimentos.Pode ainda
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que a extensa área ocupada e os numerososmateriais recolhidos deixam antever uma população numerosa, que foi
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estimada em cerca de1000
habitantes (Arruda,1999
~
2000),
o que certamenre implicava um amplo território de exploração de recursosalimentares.
4.
A
época romanaDatam do século
Il
a.e.
os primeiros materiais que podemosrelacionar com a presença romana na região. Algumas ânforas e cerâmicas de mesa (Arruda e Almeida,
1
998;
no prelo) permitem pensar que as tropas de Décimo Junio Bruto, estabelecidas cm138
ae.
emMoron
,
possibilitaram a aquisição de alguns bens de consumo.
Mas é já no decorrer do século I a.c. que a Alcáçova
é
palco de profundas alterações estruturais decorrentes do estabelecimento, no local, de romanos.Em primeiro lugar,
é
nfrida uma clara alteração no traçado urbano,alceração essa evidenciada pela nova orientação que as estruturas
adquirem. Por OUtro lado, o corte radical com a vivência anterior ficou demonstrada pela reconstrução total, tendo as habitações anteriores sido abandonadas.
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uma nova cidade que é enrão construfda, havendo dados,
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Assim, a escavação em área aberta reallz.1{!a permitIUobservar uma sequência de ocupação e edifkação sucessiv:lInellle remodelada e reconstruída desde O final da Idade do Ferro, até
à
épocaislâmica.
Parece imponante começar por lembrar que, nesta área. verificámos
que se regista uma ruptura e reorielllação do Inçado das habitações do Final da Idade do Ferro relativamente ao início
da
ocupação romana.Pelo
contrário, desde o período tardo republicano até meados do séc.
I
V/V,
asalterações que se verificam não prodU7.iram qualquer alteração na orientação das habitaçóes, mas demonstram uma sllce.~são de COIlSITUçÕes e remodelações bastante significativa. As diferentes fases construtivas
identificadas sao marcadas, naa só por alterações no interior dos espaços domésticos, mas também na relação destes com os possíveis arruamentos ou áreas exteriores. A iIHerpretação e datação proposta para as diferentes fases de construção e remodelação, ainda que preliminar, baseia~se 11:1
leitura da estf<l.tignfia e nos dados fornecidos pelas cerâmicas flna.ç, nomeadamente pela terra
Jigiltalll
.
Assim, ao período tardo~repllblicano pertencem edifícios definidos
por um conjulHo de compartimentos de planta rectangular, de função ainda difícil de determinar, mas que, no ent'aIllO, podem corresponder habitações. A Sul, identificou~se o que se julga ser um arruamento 0 11 lima
área exterior.
Em torno aos finais do último quartel do séc. I a.c., e até meados da centúria seguinte, toda a área construída sofreu um proce.~.~o continuo de remodelações. Algumas paredes deixaram de eStar em utilização. sendo
outras alteadas, defin indo-se mesmo novos compartimentos c espaços. No fin al de um longo processo de sucessivas remodelações. assistiu-se à
construção de uma Fachada ponicada com a im plantação de um conjulllo
de 4 colunas junto
à
fachada Sul dos edifícios, sobre a possível rua.Em fi nais do séc. I ou inícios do séc. II d.e. e até meados desse século, procedeu-se ao re-arranjo de pan e dos edifícios anteriores, verifICando-se,
o abandono de muitos dos compartimentos. A nova organi7.ação do
espaço habitacional passou ainda pela construção de novas divisões.
Q uanto às técni cas construtivas, e na ed ificação das pa redes tarclo republicanas e início do império verificou-se a construção de alicerces de
pedras. ligadas por terra argilosa.
As
habitações seriam construídas com tijolos de adobe que se colocavam sobre estes alicerces, de que se recolheram alguns exemplares.J
á
em época alto imperial, mas num momentO que não é possível precisar com exactidão, um reboco de argamassa de cal e areia, por vezes mesmo de estuque, passou a revestir as paredes que eram,j
á
então, totalmente constru ídas em alvenaria.
Ao nlvel dos pavimentos, a solução mais comum parece ler sido a dos pisos de terra batida. com finas camadas de argila compactada. apesar de o calcário moído ter permanecido como solução adoptada. De meados ou
finais do séc. I d.
c.,
conservou-se pane de um pavimcllco deo
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construção de muros e paredes são abundantes. De assinalar a presença de
diversos tijolos de quadram c, de diferentes dimensões, alguns deles encontrados /11
s
itu
,
relacionados com construções que julgamos poder datar do séc. II. Tijolos de quadrante de grande diâmetro. encontradosfora do seu contexto original, poderão, eventualmente, ter pertencido a colunas de um ediffcio püblico, localizado em área próxima.
Nos níveis superiores escavados na área dos Viveiros dos Jardins, existiam
mmbém paredes que correspondem ao período tardo-romano (finais do séc.
IV- séc. V). Não permirem qualquer Icinlr.l ao nível da sua planimetria e
caracterizavam-se por terem sido co nstruídos, essencialmeme, com cerâmica de construção reaproveitada.
No utras áreas da Alcáçova, muitas outras construções de época
ao Lago do Jardim das Panas do Sol que apresentava lima construção de
silhares bem aparelhados e revestimento por estude pintado; do conjunto
de cisternas existente
junt
O
à
vertente da Ald çova virada a Alrange; de uma construção romana de um posslvel edifício públicn; e, finallllelllc, dotemplo romano.
O muro detectado n uma sondagem jUllto ao Lago do Jardim
apresentava como característica dissonante rela!ivamellle ;1S eSlrtltllras
descritas ;mreriormente, o facto de ter sido construido com blocos de pedra aparelhados ligados por forte argamassa, e a presença de estuque pintado.
Os rrabalhos arqueológicos que incidi ram sobre a cisterna permitiram verificar que se traIa {Ie um conjunto de pelo menos quatro depósitos
inter-comunicanres, conservando-se ainda dois.
U
m
destes está hojevisível e corre perigo de derrocada a qualfjuer momento, não tcndo sido
passivei, até ao momento, e apesar dos esrorços da C MS, q ue as diferentes instituições que gerem o património nacional se coloa ssem de acordo quanto
à
sua conservação e restauro. O segundo depósito não !(li escavadopois encontra-se parcialmente sob a muralha medicval.
Toda esta construção, foi escavada na rocha de
h
a
.~c
calcária, encontrando-se hoje num local de grande instabilidade devido aosconstantes desabamentos de terras das vertentes da Alcáçova. O depósito visível apresema planta rectangubr, com paredes que conservam cerca de
4 m de altura. É ainda vislvcl o arranq ue do tecto que seria CI11 abóhoda de berço. A parede Sul detém
tr
ês
aberturas que permitiam que a águacirculasse para o depósito adjacente. rindo o imcrinr foi revestido a OpU5
signinu
nI
e regista meia cana no ângulos das paredes e na ligação destas aopavimento. Sensivelmellte ao centro deste depósito existe uma pequena depressão circular que constitui o tanque de lim pez.a. Julgamos poder
associar a esta cisterna, um peq ueno tanque. situado cerca de 30 III para norte, igualmenre escavado na rocha e revestido por
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pus
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;
"
"illtl1n.
Esta construção integra-se no tipo de cisternas com cumpartimentos paralelos ilHer-comunicantes, presente em alguns locais do Império Romano, nãosendo possível, no entanto, saber-se, para o caso de Santarém, se a origem
da água seria pluvial, de nascente cxistent:e no local ou condll7.ida de outra zona da Alcáçova. A determinação da cronologia dest:l e.~t nu Ufa é
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As
importaçõe
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muito
numerosas, c os centros exportadores e os produtos são múltiplos.
Também a numismática contribui para acentuar a relevância de Scallabis
durante os últimos anos do I milénio a.c., parecendo importante referir aqui que as cunhagens da ceca itinerame do legado de AuguSlO
P.
Carisiusdominam no conteúdo do inventário das moedas romanas recolhidas na
Alcáçova, o que aliás contribui também para acentuar o carácter militar
do inicio da ocupação romana de
Scallahis.
A aha cronologia que 3tribufmos
à
construção do templo deSCllllahis
impede.nos de considerar que ele se destinava ao culto imperial, apesar da sua
localização e impla.mação, num lugar alto e sobre um rio, frequememenre alvo de cheias imensas, o sugerir.
Não
é
impossfvel pensar que,à
semelhança de muitos outros templosquandrangulares. o templo de
Sca
llahis
fosse um capitólio, atribuição quesomos obrigados a deixar em aberto. dada a absoluta falta de dados,
epigráficos ou iconográficos, que elucidem o assunto.
A intervenção arqueológica prevemiva efectuada na Igreja de Sama Maria de Alcáçova em 1992, na sequência de obras programadas pela D.G.E.M.N., permitiu a identificação, na sua capela·mor, de uma
construção romana de alvenaria de pedra e argamassa de boa qualidade. Apesar da área escavada ser muito reduzida, esta estrutura, que se pode datar de época romana alto imperial, apresenta contrafortagern no seu
imerior e poderá ter pertencido a um edifício público de função ainda desconhecida. Apenas se encontrou o topo deste edifício desconhecendo·
se a sua verdadeira dimensão.
Da cidade romana tardia, paleocrisrã ou visigórica, pouco ou nada se
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,
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VI no local, estes náo se encontram associados a qualquer estrutura.
São dezenas de milhar os materiais arqueológicos de época romana que pudemos recolher durante os nabalhos de campo. Nesta breve
apresentação tOrna·se impossfvel descrever ou falar com o necessário
detalhe a seu propósitO. Mas parece indispensável deixar registado que.
para além do bom estado de conservação da grande maioria. este espólio
,
Integra:
I. ceràmicas de vários tipos e cronologias e funcionalidades
2. objectos de adorno, concretamente nbulas, contas de colar de vidro. alfinetes de cabelo anéis e ainda um strigillo, artefacto Ulilizado nos
banhos.
3.
bronzes e ferros vários entre os quais destacamos duas aenelas desftula, um sfmpul o em bronze e lima enxada.
A instalação de militares no planalto da alcáçova está bem documentada através de uma quantidade apreciável de objectos que podem rclacionar.se com a actividade bélica, nomeadamente: lanças, projécteis em pedra, glandes
de chumbo e alguns numismas que sabemos foram cunhados com o
propósitO explicito de os pagamemos
às
tropas.Documentando a fiação e a tecelagem foram recolhidos vários artefaclOs:
separadores de tear,
pesos
de tear, agulhas e fusaiolas5. Medieval/islâmico
Voltamos a possuir alguns dados sobre a ocupaçáo da Alcáçova, a
partir da ocupação islâmica, conhecendo·se, nomeadamente através de registo escrito, a importância que o local adquire, no quadro da expansãc
islâmica no Vale do Tejo. Não obstante, os dados arqlleológico~ relacionáveis com o urbanismo da Alcáçova muçulmana são praticamentl
inexistentes. De factO, e como já foi mencionado, as estruturas m:li:
significativas deste pedodo são o conjunto de fossas ou silos islâmicos qUI
se encontram, com maior ou menor intensidade, um pouco por roda, área da Alcáçova. Trata-se de estruturas de abenura quase sempre circular
podendo apresentar perfis com alguma variedade. Estando a sua funçã(
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y I~"'I\;Isilos encomrar-se-iam associados
às
habitações muçulmanas, das quais, noentanto, nada resta. Aliás, a escavação destes silos ou fossas permitiu verificar que estas estruturas foram, a panir dos momentos finais da ocupação islâmica, utilizados como lixeiras, estando o seu interior preenchido com
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a função originaJ foi
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Não podemos deixar de estranhar a ausência de qualquer registo sobre o
urbanismo islâmico da Alcáçova e, sobretudo dos edifrcios que caracterizam
a~ Alcáçovas islâmicas, nomeadamente as instalações militares e a área
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atina. No
entalHO,a
pere
c
ibilidade dos materiais utilizados
na
s
consuuçóes das primeira, e a possibilidade de a área palatina poder ter sido, pelo menos parcialmenre, utilizada pelos ocupantes cristãos poderá justificar esta ausência.
As
sucessivas remodelações desses edifícios poderá terconduzido
à
ocultação das caractctfsdcas iniciais dos mesmos, desfocando aleitura sobre a Alcáçova islâmica. Neste contexto, não podemos concluir sem
rererir que as casas locali7.adas no Largo da Alcáçova n. o I e 2 são, habitualmente, e com base na documentação escrita, idemificadas com os
palácios de D. Afonso Henriques.
São também muito numerosos os restos anefacruais encontrados
durante as escavações, alguns dos quais pela sua raridade devem desde já
ser mencionados. O candelabro arquitectónico datado do século X é uma
peça de excepcional qualidade e a sua presença cm Santarém contribuiu
para aumentar o escasso conjunto conhecido mundialmenre.
As
cerâmicas são o material mais abundantemente recolhido, sejamvidradas, decoradas a corda seca e verde e manganês ou comuns. Destinarn
--se ao serviço de mesa, a utilização na cozinha e Outras actividades domésticas.
6.
Perspectivas de futuro
o
conhecimento que está hoje dispon!vel sobre a ocupação humanaantiga de Santarém
é,
como se vê, de dimensão considerável. Deve ainda chamar-se a atenção para o numeros!ssimo espólio que pode ser recolhido.Este, para além de, maioritariamente, se encontrar em excelente estado de
conservação
é
também bastante diversificado, tanto do pomo de vista...
•-arqueológicas postas a descoberto, em 1999 e 2000 na área dos viveiros
do Jardim, fornecem importantes informações sobre o urbanismo de
época romana, apresentando uma leitura horizonral bastante nitida do
ponto de vista arquitectural.
Deste modo, e independemememe da publicação final dos resultados
que temos neste momento em preparação na forma de um livro monográfico, pensamos que se torna indispensável que os escaJabiranos e quem visita a cidade tenham o direito de fruir de um importante pedaço
da história da cidade, que além do mais resultou de esrorço pessoal de
uma larga equipa e de investimentos financeiros, apesar de tudo, consideráveis, quer da administração central como aud rquica. Parece-nos
pois indispensável que as peças arqueológicas retiradas do sub-solo sejam expostas a titulo definitivo numa estrutura museológica que as enquadre, proteja e divulgue junto do püblico cm geral e também dos especialistas. A sua permanência na reserva municipal não deved, na nossa perspectiva,
perpetuar-se, parecendo-nos que a mostra exibida no Museu Nacional de
Arqueologia e a que se prepara para a Igreja da Graça, sendo importantes,
não esgotam o problema.
É
necessário afirmar, com frontalidade, que Santarém, capital de Distrito não dispõe de uma qualquer estrutura museológica. Não parece pois disparatado propor que, atendendo aodesenvolvimento dos trabalhos arqueológicos c do esforço que se reali7.Du na conservação e restauro de muitas peças destinadas
à
expo."ição temporária,que o projecto de um verdadeiro Museu arqueológico em Santarém faça
parte das prioridades dos poderes públicos, locais e ccntrais.
No ~mbito do Plano de Salvaguarda para a reabilitação e valorização
da Alcáçova e do Alporão, faria todo o sentido a conservação c valorizaçâo
das minas postas a descoberto na área dos viveiro, no interior da Igreja de
Santa Maria da AJcáçova e das fossas de época islâmic"l jUlHo
à
barreiravirada a Alfange.
Outras medidas deveriam ser ainda implementadas tais como:
I. criação de percursos que inc\u!ssem o templo romano e as clsrCrl1:tS;
2. pequena sala de exposição junto ao restaurante das Portas do Sol;
3. valorização de troços das muralhas e respectivas portas tal como a