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Academic year: 2021

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V OL UME I | NÚMERO 1 | J AN-JUN / 2 0 19 RECEBIDO EM: 26/06/2019 ACEITO EM: 26/06/2019

Culturalismo e subjetividade das

relações de trabalho: uma análise

de sua precarização na produção

têxtil do agreste pernambucano

Oton de Albuquerque Vasconcelos Filho1

Moacir Barbosa Morais2

Maria Catarina Barreto de Almeida Vasconcelos3 Resumo

O presente artigo, que versa sobre a temática da exploração do trabalho humano, analisa, no ambiente de produção e confecção têxtil, que movimenta boa parte da economia do Estado de Pernambuco, a existência de condições precarizadas de trabalho devidas à ausência de efetivos mecanismos de tutela para as pessoas que laboram nessa área. Este trabalho almeja discutir a problemática do novo contexto das relações de trabalho, que tem proporcionado novas formas de exploração do labor através da imposição de condições precárias ao trabalhador destacando em tal análise o cenário de superexploração no setor de produção têxtil do agreste de Pernambuco. O estudo se desenvolveu pela via da revisão de literatura, a partir de títulos contidos nas bases de dados SciELO, Capes, Bibliotecas Virtuais. Através do método dedutivo foi considerada realidade de exploração do labor como um fator de influência na possibilidade de geração de

1 Doutor em Teoria Dogmática do Direito pela UFPE (Recife, PE, Brasil). Mestrado em Direito pela UFPE. Professor Adjunto de Direito do Trabalho dos Cursos de Graduação em Direito da Universidade de Pernambuco – UPE e do Centro Universitário Tabosa de Almeida – ASCES-UNITA. Presidente da Academia Luso-Brasileira de Ciências Jurídicas – ALBCJ e Membro da Academia Pernambucana de Direito do Trabalho – APDT. Líder do Grupo de Pesquisa Direito e os Conflitos Oriundos da Pós-Modernidade registrado no CNPq. E-mail: otonvasconcelosfilho@gmail.com. Recife, Pernambuco, Brasil.

2 Pós-graduando em Direito do Trabalho e Previdenciário pela Universidade Norte do Paraná – UNOPAR. Bacharel em Direito pelo Centro Universitário Tabosa de Almeida – ASCES- UNITA. Participante do Grupo de Pesquisa Direito e os Conflitos Oriundos da Pós-Modernidade registrado no CNPq. Advogado. E-mail: moacirmorais2009@hotmail.com. Caruaru, Pernambuco, Brasil.

3 Pós-graduanda em Direito Público pela Faculdade LEGALE- São Paulo. Bacharela em Direito pela Faculdade de Direito de Olinda – AESO. Membro da Comissão da Mulher Advogada da OAB Seccional Pernambuco. Ouvidora Geral da OAB Seccional Pernambuco. Advogada. E-mail: catarinavasconcelos.legis@gmail.com. Recife, Pernambuco, Brasil.

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crises na sociedade e foi possível identificar uma nova cultura do trabalho dotada de subjetivismo e particularidades no Brasil sendo o setor de produção têxtil do agreste do Estado de Pernambuco vítima de novos meios de aproveitamento abusivo da força de trabalho. Diante desse contexto, resta evidente a necessidade de encontrar novos horizontes protetivos nas relações de trabalho em adaptação ao sistema de produção capitalista que tem como marca a flexibilização das relações de trabalho.

Palavras-chave: Estado de Pernambuco. Precarização. Relações de Trabalho. Setor

de Produção Têxtil. Superexploração do Trabalho.

Culturalism and subjectivity of work relations: an analysis of its

precarisation in the textile production of agreste pernambucano

Abstract

This article, which deals with the thematic of the exploitation of human labor, analyzes, in the environment of production and preparation of textiles, that makes the good part of the economy of the State of Pernambuco an existence of precarious conditions of work dismembered guardianship for the people who work in this area. This work is related to the problematic of the new context of work tasks, which provided the new forms of labor exploitation through the production of methods prior to work in analysis of the scenario of superexploration in the textile production sector agreste of the Pernambuco. The study was developed through literature review, based on titles contained in the SciELO, Capes, and Virtual Libraries databases. Through the deductive method was considered a reality of exploitation of labor as a factor of influence in the possibility of crisis generation in society and it was possible to identify a new culture of labor endowed with subjectivism and particularities in Brazil being the textile sector of the agreste of the State of Pernambuco victim of new means of abuse of the labor force. In view of this context, the need to find new protective horizons in labor relations in adaptation to the capitalist production system that has as a mark the flexibilization of labor relations remains evident.

Keywords: State of Pernambuco. Work relationships. Superexploration of Work.

Textile Production Sector.

Culturalismo y subjetividad de las relaciones de trabajo: un

análisis de su precarización en la producción téxica del agreste

pernambucano

Resumen

El presente artículo, que versa sobre la temática de la explotación del trabajo humano, analiza, en el ambiente de producción y confección textil, que mueve buena parte de la economía del Estado de Pernambuco, la existencia de condiciones precarizadas de trabajo debidas a la ausencia de efectivos mecanismos de tutela para las personas que laboran en esa área. Este trabajo anhela discutir la problemática del nuevo contexto

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de las relaciones de trabajo, que ha proporcionado nuevas formas de explotación de la labor a través de la imposición de condiciones precarias al trabajador destacando en tal análisis el escenario de superexplotación en el sector de producción textil del agreste de Pernambuco. El estudio se desarrolló por la vía de la revisión de literatura, a partir de títulos contenidos en las bases de datos SciELO, Capes, Bibliotecas Virtuales. A través del método deductivo fue considerada realidad de explotación de la labor como un factor de influencia en la posibilidad de generación de crisis en la sociedad y fue posible identificar una nueva cultura del trabajo dotada de subjetivismo y particularidades en Brasil siendo el sector de producción textil del agreste del Estado de Pernambuco víctima de nuevos medios de aprovechamiento abusivo de la fuerza de trabajo. Ante este contexto, queda evidente la necesidad de encontrar nuevos horizontes protectores en las relaciones de trabajo en adaptación al sistema de producción capitalista que tiene como marca la flexibilización de las relaciones de trabajo.

Palabras clave: Estado de Pernambuco. La precariedad. Relaciones de trabajo. Sector

de Producción Textil. Superexplotación del trabajo.

SUMÁRIO: 1 INTRODUÇÃO; 2 CULTURALISMO E SUBJETIVIDADE NAS RELAÇÕES DE TRABALHO NO SÉCULO XXI; 3 AS METAMORFOSES NO MUNDO DO TRABALHO FRENTE AO SISTEMA DE EXPLORAÇÃO CAPITALISTA; 4 A PRECARIZAÇÃO DAS CONDIÇÕES DE TRABALHO E SUA OBSERVÂNCIA NO CENÁRIO BRASILEIRO; 5 OS DESAFIOS DO COMBATE À SUPEREXPLORAÇÃO DO TRABALHO FRENTE À RELEVÂNCIA E PECULIARIDADES DO SETOR DE PRODUÇÃO TÊXTIL DO AGRESTE PERNAMBUCANO; 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS; REFERÊNCIAS.

1 INTRODUÇÃO

A mutabilidade das relações de trabalho na atualidade tem acentuado um novo cenário regulatório das normas trabalhistas, que vem dando ensejo a uma realidade dotada de expansões de categorias de trabalhadores com ou sem vínculo de subordinação. As formas de lidar e sujeitar o trabalhador às novas condições de labor são derivadas da flexibilização das relações de trabalho como tentativa do empresariado em aferir novos ganhos por lucratividade e produtividade.

Diante das influências de um sistema econômico baseado na exploração humana, as novas demandas do mercado exigem daqueles que buscam ou tentam manter vínculos formais de emprego, além da mera experiência profissional e da diplomação na sua área, a capacidade emocional e propensão a se adaptar ao novo contexto de relações de trabalho já que, no mundo do trabalho, salvo exceções, não é a vontade, mas sim a necessidade que faz com que surja relação laboral, restando clara uma tendência de submissão do trabalhador àquele que está lhe remunerando e consequentemente aceitando possíveis imposições ilícitas.

Na área de produção têxtil do agreste de Pernambuco, as relações de trabalho têm enfrentado mutações ao logo dos anos e diante da relevância de tal produção para a população, o contexto de tal realidade vem a ser um fator decisivo na economia e cultura da região. Tal relevância é comprovada por um estudo realizado pelo Serviço

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Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE, 2012), no qual verificou-se nos dez municípios onde verificou-se concentra a atividade confeccionista no agreste pernambucano, que há mais de cem mil pessoas ocupadas em produzir peças de vestuário. A pesquisa estimou que existiam cerca de 4.530 (quatro mil quinhentos e trinta) unidades de produção de confecção, sejam em instalações formais ou informais. É válido notar que a utilização deste estudo feito no ano de 2012 se deveu ao fato de ser o último de grande magnitude realizado pela referida entidade passível de se enquadrar ao contexto de abordagem do presente trabalho.

Ocorre que, com a modernização da produção e as novas modalidades de trabalho, a ausência de novas diretrizes normativas específicas tem sido um problema enfrentado pelas pessoas que laboram no já referido setor. No agreste pernambucano, com a falta de proteção estatal na esfera fiscalizatória e normativa, é possível notar o grande número de pessoas em condições precárias de trabalho nos pequenos e grandes fabricos da região. Questões como jornadas de trabalho excessivas, ambientes de trabalho insalubres, supressão de intervalos intrajornada, ausência de férias ou mesmo de repouso semanal remunerado, dão às pessoas que trabalham em muitos pequenos fabricos de roupas, condições por vezes sub-humanas de trabalho.

Considerando o fato de que o trabalho informal tem sido uma fuga do empresariado brasileiro, que se queixa constantemente da alta carga tributária que demanda um alto dispêndio financeiro para contratar um empregado dentro dos ditames legais da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), é notável o fato de que muitas dessas pessoas que laboram nessa área de produção têxtil estão na clandestinidade, sem nenhuma proteção legal, de modo a ilustrar a realidade do setor de produção têxtil do agreste pernambucano que precisa de tutela estatal no âmbito fiscalizatório e normativo adaptável ao contexto mercadológico.

Contextualizando a mencionada realidade social de inovações nas relações de trabalho com as disposições convencionadas através de novos enunciados normativos trabalhistas, como a lei 13.467/17, que modificou, acrescentou e revogou diversos enunciados da CLT, é possível entender que as relações de trabalho podem mudar tanto para o âmbito dos trabalhadores que estão devidamente registrados, quanto para os clandestinos, já que o Estado brasileiro cada vez mais atende às pressões do empresariado que preza pela livre estipulação e flexibilização dos termos dos contratos de trabalho.

Levando em consideração essa nova realidade das relações de trabalho e a importância da produção têxtil na economia do agreste pernambucano, faz-se necessária uma nova avaliação do que mudou e do que deve mudar nos ambientes de trabalho na referida região. Para uma compreensão do tema e de sua repercussão na sociedade, será necessária a análise de dados específicos sobre a produção têxtil em Caruaru-PE, informações sobre a apuração de situações irregulares por parte do Ministério do Trabalho e de informações sobre demandas processuais trabalhistas ocorridas no Brasil. Em relação à matéria de Direito do Trabalho em sua aplicabilidade, a análise normativa e doutrinária em comparação a dados estatísticos é fundamental,

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tendo em vista que o tema em questão gira em torno do desrespeito e da adequação de normas trabalhistas.

O presente trabalho tem como objetivo realizar uma abordagem sociológica e jurídica específica ao observar o caráter subjetivo das relações de trabalho do setor de produção têxtil no agreste de Pernambuco. Também são objetivos deste artigo a realização de uma de crítica do contexto das relações de trabalho na contemporaneidade e a proposição de mudanças no paradigma observacional desta questão no referido setor de produção.

2 CULTURALISMO E SUBJETIVIDADE NAS RELAÇÕES DE TRABALHO NO SÉCULO XXI

O mundo no século XXI encontra-se em constante mutação e essa tendência não é diferente nas relações de trabalho, principalmente no que concerne ao caráter regulatório destas. Everaldo Gaspar Lopes de Andrade e Isabele Bandeira de Moraes D’Angelo evidenciam tal questão e demonstram que as relações de emprego são de fato, as mais afetadas já que é real a tendência de criação de novos universos no mundo do labor:

Se o Direito do Trabalho veio para proteger a maioria da população economicamente ativa, o que havia ocorrido no auge do Estado do Bem-Estar e do Pleno Emprego, agora não consegue proteger sequer a metade daquele universo. Os demais se encontram no trabalho clandestino ou alcançado pelo desemprego estrutural (ANDRADE, D’ANGELO, 2016, p. 92).

A influência de um sistema econômico baseado na exploração humana, o capitalismo, no ambiente de análise das relações de trabalho é um dos fatores que mais afetam tal realidade como enfatiza Fábio Konder Comparato:

O capitalismo não é mero sistema econômico, mas uma forma global de vida em sociedade; ou, se se quiser, dando ao termo um sentido neutro, uma civilização. Como tal, define-se ele por um espírito (no sentido em que Montesquieu empregou o termo), um conjunto de instituições sociopolíticas e uma prática. O espírito do capitalismo é o egoísmo competitivo, excludente e dominador. Daí por que toda espécie de colaboração entre empresários é naturalmente tida por suspeita; assim como suspeita e nociva à boa economia sempre pareceu, desde as origens, aos olhos dos empresários, a sindicalização dos trabalhadores e a organização reivindicativa dos despossuídos. Nesse tipo de civilização, toda a vida social, e não apenas as relações econômicas, fundam-se na supremacia absoluta da razão de mercado (COMPARATO, 2008, p. 536-537).

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A socióloga do trabalho francesa Danièle Linhart, entende que nessa nova realidade, o desprestígio à experiência profissional de cada trabalhador é acentuado pela flexibilização da produção e pela permanente atualização do maquinário. Em boa parte das vezes os aspectos mais importantes para os empregadores não são os diplomas, as especializações e as qualificações, mas a personalidade, as capacidades cognitivas e emocionais dos trabalhadores. Nas palavras da referida autora:

[...] la déprofessionnalisation viserait à mobiliser les aspects humains qui seraient plus faciles à contrôler, à coloniser. L’important, du point de vue managérial, n’est pas de dépendre des employés, qui doivent être contrôlés; ils parient sur le fait qu’ils sont plus faciles à subriver en les gérant plus en tant qu’êtres humains que professionnels. L’objectif est donc de réduire la capacité de protestation et d’opposition, mais aussi l’incertitude et l’imprévisibilité de chaque individu.4 (LINHART, 2015 p. 143).

Pela interpretação da obra “Os sentidos do trabalho”, do professor Ricardo Antunes é plenamente possível entender que a racionalização do processo produtivo, o forte disciplinamento da força de trabalho, a implantação de novos mecanismos de capital e de trabalho intensivos somados ao envolvimento mais ativo do intelecto no trabalho, tornaram-se práticas recorrentes nas relações de trabalho. Um processo no qual as substâncias vivas são eliminadas, onde o trabalho vivo é substituído pelo trabalho morto, pelo maquinário tecno-informacional-digital que hoje tipifica o processo de “enxugamento” das empresas e favorece a subjetividade das relações de trabalho com a participação cada vez mais frequente do empregado no aspecto intelectual. Conclui o referido autor que:

Ainda que fenomenicamente minimizado pela redução da separação entre a elaboração e a execução, pela redução dos níveis hierárquicos no interior das empresas, a subjetividade que emerge na fábrica ou nas esferas produtivas contemporâneas é expressão de uma existência inautêntica e estranhada. Contando com maior “participação” nos projetos que nascem das discussões dos círculos de controle de qualidade, com maior “envolvimento” dos trabalhadores, a subjetividade que então se manifesta encontra-se estranhada em relação ao que encontra-se produz e para quem encontra-se produz (ANTUNES, 2009, p. 130).

4 [...] a desprofissionalização visaria a mobilizar os aspectos humanos que seriam mais fáceis de controlar, de colonizar. O importante seria, do ponto de vista gerencial, de não depender dos assalariados, que devem ser controlados; aposta-se no fato de que eles são mais fáceis de se sujeitarem, ao geri-los mais como humanos que profissionais. O objetivo é, portanto, reduzir a capacidade de protesto e de oposição, mas também a incerteza e a imprevisibilidade que carrega cada indivíduo.(Tradução livre dos autores)

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Outro ponto destacado por Antunes é a mudança das relações de trabalho no ambiente interno das grandes empresas, com funcionários portadores de características peculiares. Segundo o referido autor, na realidade contemporânea:

Preserva-se um número mais reduzido de trabalhadores dentro das empresas matrizes, mais qualificados, multifuncionais e envolvidos com o seu ideário dos “colaboradores”, amplia-se o universo dos terceirizados e temporários no interior (e fora) das empresas, ampliando-se o fosso entre a classe trabalhadora. De um lado, em escala minoritária, o trabalhador “polivalente e multifuncional” da era informacional-digital, capaz de exercitar com mais intensidade sua dimensão mais intelectual. De outro lado, uma massa de trabalhadores precarizados, terceirizados, flexibilizados, informalizados, cada vez mais próximos do desemprego estrutural (ANTUNES, 2011, p. 127).

De fato, a partir de tal reflexão é possível visualizar que essas novas formas de lidar e de sujeitar o trabalhador a novas condições, são derivadas da flexibilização das relações de trabalho, que advém da tentativa de aferir novos ganhos por lucratividade e produtividade em que o envolvimento intelectual do trabalhador é cada vez mais presente, haja vista que este tem maior consciência de que sua produtividade intelectual e que o seu futuro financeiro estão diretamente atrelados ao destino da empresa.

O contrato de trabalho, ao ser regulamentado por leis, limita a liberdade das partes e demanda a necessidade da utilização de leis protecionistas para garantir uma igualdade jurídica, tendo em vista que uma das partes no contrato de trabalho – o empregado – é hipossuficiente em relação ao outro – o empregador. Ocorre que no mundo, salvo exceções, não é a vontade mas sim a necessidade que dá ensejo a essa relação laboral. Boaventura de Sousa Santos trata a referida questão dando ênfase à tendência do trabalho deixar de servir de suporte à cidadania com a precariedade de suas relações:

[...]o trabalho fica reduzido a dor da existência, quer quando o há – sob a forma de trabalho desgastante – quer quando o não há – sob a forma de desemprego, e não menos desgastante. É por isso que o trabalho, apesar de dominar cada vez mais a vida das pessoas, está a desaparecer das referências éticas que dão suporte à autonomia e a auto-estima dos sujeitos (SANTOS, 2017, p. 41).

É diante de todo esse contexto jurídico, que se faz uma nova forma de ver quanto ao objeto do próprio subsistema trabalhista. É o que confirma Amanda Madeira Reis:

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Na atual sociedade dinâmica do século XXI, em devotada evolução, anverso às novas tecnologias e convergências do mundo contemporâneo, faz-se cogente uma reavaliação sobre a forma de pensar a relação trabalhista e o desenvolvimento socioeconômico e político da sociedade, de jeito a manter e estimular o apropriado desempenho da ordem econômica, ajustado ao Bem-Estar social e à compleição da dignidade da pessoa humana (REIS, 2016, p. 78).

Considerando a primazia pela necessidade de manutenção de um vínculo de trabalho, surge a importância de se evidenciar que a precarização de tais condições é uma variante que não pode ser descartada A partir dessa linha de argumentação se faz necessária uma nova forma de pensar o mundo das relações de trabalho tendo em vista a importância da preservação de preceitos basilares de proteção à classe trabalhadora como o respeito aos valores sociais do trabalho e à preservação da dignidade da pessoa humana assegurados pela Constituição Federal do Brasil de 1998.

3 AS METAMORFOSES NO MUNDO DO TRABALHO FRENTE AO SISTEMA DE EXPLORAÇÃO CAPITALISTA

Em uma sociedade baseada no sistema de produção capitalista e marcada pelo desenvolvimento tecnológico, o caráter de mutabilidade das relações de trabalho tem ganhado cada vez mais destaque, tendo em vista que, tal sistema que tem como premissas a propriedade privada com fins lucrativos dos meios de produção

e distribuição vem sofrendo uma grande quantidade de mudanças de adaptação derivados da evolução dos meios de produção. Essa mudança é explicada por José Dari Krein que, ao analisar tal sistema de produção enfatiza suas dimensões esclarecendo que:

[...] há um processo de reestruturação produtiva, que é ao mesmo tempo sustentáculo e consequência das mudanças mais gerais que estão ocorrendo na forma de acumulação do capitalismo. A reestruturação produtiva envolve 5 dimensões: a) as inovações nos equipamentos e materiais; b) a mudança na relação entre empresas (por um lado, fusões, joint venture, compartilhamento de projetos etc. e, por outro, internalização e horizontalização da empresa); c) novos métodos de organização da produção (just in

time, kanban, qualidade total, manutenção preventiva etc.); d)

novos métodos de organização do trabalho (trabalho em grupo, polivalência etc.); e) inovações na gestão do trabalho (adoção de métodos “participativos” e de envolvimento do trabalhador com a empresa). (KREIN, 2013, p. 16).

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Diante desse contexto, se faz necessária uma reflexão para se entender que de certa maneira o mundo do trabalho hoje é composto como pensava Karl Marx (MARX, 1984), pelo trabalho produtivo e também pelo improdutivo. Em uma visão exemplificativa, Wolek foca no sistema capitalista contemporâneo como um facilitador de mudanças no mercado de trabalho, junto a uma série de fatores enfatizando que:

O capitalismo contemporâneo vem, nas últimas décadas, engendrando profundas mudanças no mercado de trabalho. Essas mudanças se expressam, principalmente, pela globalização das finanças, pela crescente precarização das relações de trabalho, pelas taxas elevadas de desemprego, pelo deslocamento geográfico de organismos produtivos e absorvedores de mão-de-obra e pela eliminação de postos de trabalho na indústria e nos serviços (WOLECK, 2002, p.10).

Nessa linha de pensamento sobre um mundo repleto de mudanças, Ricardo Antunes analisa a questão do trabalho sob um prisma geral de evolução de setores de produção e operariado diferenciados, contextualizando um novo plano de possibilidade de exploração da força de trabalho enfatizando que:

[...] no universo do mundo do trabalho no capitalismo contemporâneo, uma múltipla processualidade: de um lado verificou-se uma desproletarização do trabalho industrial, fabril, nos países de capitalismo avançado, com maior ou menor repercussão em áreas industrializadas do Terceiro Mundo. Em outras palavras, houve uma diminuição da classe operária industrial tradicional. Mas, paralelamente, efetivou-se uma expressiva expansão do trabalho assalariado, a partir da enorme ampliação do assalariamento no setor de serviços; verificou-se uma significativa heterogeneização do trabalho, expressa também através da crescente incorporação do contingente feminino no mundo operário; vivencia-se também uma subproletarização intensificada, presente na expansão do trabalho parcial, temporário, precário, subcontratado, “ terceirizado” , que marca a sociedade dual no capitalismo avançado [...]. (ANTUNES, 2006, p. 49).

Esse panorama de mudanças no sistema econômico e no mercado de trabalho como um todo é percebida por Manuel Castells como fator imprescindível de análise, a evolução tecnológica, a mudança de uma sociedade na qual:

[...] a comunicação em ampla escala tem passado por profunda transformação tecnológica e organizacional [...] baseada em redes horizontais de comunicação multidirecional, interativa,

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na internet; e, mais ainda, nas redes de comunicação sem fio, atualmente a principal plataforma de comunicação em toda parte (CASTELLS, 2013, p.128).

É nesse sentido que, Marina Patrício de Arruda e Lilia Aparecida Kanan reconhecem que o trabalho na nova era digital agrega a compreensão global de um conjunto de tarefas além de exigir a abertura para novas aprendizagens já que as novas tecnologias que são fruto da criação humana não são apenas ferramentas auxiliares para as atividades tradicionais. Para as referidas autoras já está em andamento o que foi denominado de “estilo de vida digital”, pois o computador, a internet e as redes são tecnologias da inteligência que passam a ampliar a base educacional da sociedade que, por sua vez, também influenciará os processos de trabalho. (ARRUDA; KANAN, 2013, p. 590).

A propositura de novos moldes na tratativa da qualificação do trabalhador, apesar de não existir um movimento generalizado de desqualificação ou um movimento de aumento geral de qualificação, é possível nesse novo contexto de desenvolvimento tecnológico observar um movimento contraditório de desqualificação do trabalho de alguns pela “superqualificação” do trabalho de outros, isto é, uma polarização das qualificações requeridas que resulta de uma forma particular de divisão do trabalho derivada cada vez mais na “inteligência” da produção.

Diante dessa problemática e do contexto histórico e atual destacado, levando em conta o caráter de mutabilidade das relações de trabalho Ricardo Antunes conclui que:

[...] pode-se constatar de um lado um efetivo processo de intelectualização do trabalho manual; de outro, e em sentido inverso, uma desqualificação e mesmo subproletarização, expressa no trabalho precário, informal, temporário etc. Se é possível dizer que a primeira tendência seria mais coerente e compatível com o avanço tecnológico, a segunda tem sido uma constante no capitalismo dos nossos dias, dada a sua lógica destrutiva (ANTUNES, 2009, p. 210).

Com a observância desse contexto de desenvolvimento tecnológico em consonância com a evolução do sistema de produção capitalista é possível entender um novo contexto de relações de trabalho que cada vez mais tem se difundido no mundo. Sendo assim, é evidente o surgimento de um novo modelo de exploração da força de trabalho, não somente voltado para as relações de emprego, mas para toda uma complexidade de modalidades de trabalho surge no século XXI.

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4 A PRECARIZAÇÃO DAS CONDIÇÕES DE TRABALHO E SUA OBSERVÂNCIA NO CENÁRIO BRASILEIRO

A dinâmica de exploração do labor em um contexto de multiplicidade de relações de trabalho tem se dado a um ponto além dos limites prefixados como razoáveis de respeito aos direitos humanos, de modo a ser possível observar que a continuidade do contexto de superexploração da força de trabalho é algo presente em uma sociedade que tenta a todo custo fugir da crise econômica e do desemprego. Nesse sentido Adrian Sotelo Valência conclui que:

[...] a superexploração, entendida como um regime de exploração do capital nas sociedades dependentes e subdesenvolvidas está se convertendo num regime de exploração da força de trabalho nos países capitalistas desenvolvidos, com a finalidade de contrapor-se aos efeitos perniciosos da longa depressão da economia mundial em suas declinantes taxas de crescimento, de rentabilidade e de produção de valor e mais-valia. (VALÊNCIA, 2009, p. 17).

Novas modalidades de superexploração do trabalho surgem com as adaptações do mercado de trabalho a cada dia. Ricardo Antunes e Luci Praun, sobre essa questão analisam que:

[...] por um lado, os trabalhadores pertencentes ao núcleo que atua com maquinário mais avançado, dotado de maior tecnologia, encontram-se cada vez mais expostos à flexibilização e à intensificação do ritmo de suas atividades, expressas não somente pela cadência imposta pela robotização do processo produtivo, mas, sobretudo, pela instituição de práticas pautadas pela multifuncionalidade, polivalência, times de trabalho interdependentes, além da submissão a uma série de mecanismos de gestão pautados na pressão psicológica voltada para o aumento da produtividade. Por outro, outra parcela da classe trabalhadora, numericamente superior, passa a experienciar, cada vez mais, diferentes modalidades de vínculos e condições de trabalho que se viabilizam a partir de ambientes de trabalho que articulam menor desenvolvimento tecnológico a jornadas mais extensas, maior insegurança e vulnerabilidade (ANTUNES; PRAUN, 2015, p. 411).

Tal enredo não se volta apenas para o âmbito do trabalho subordinado assalariado, pois as outras modalidades de trabalho possuem características peculiares que demonstram de forma disfarçada um contexto de exploração. Luciano Vasapollo seguindo esse raciocínio critica o caráter expansionista do empreendedorismo como um disfarce para exploração:

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As novas figuras do mercado de trabalho, os novos fenômenos do empreendedorismo, cada vez mais se configuram em formas ocultas de trabalho assalariado, subordinado, precarizado, instável, trabalho “autônomo” de última geração, que mascara a dura realidade da redução do ciclo produtivo. Na verdade, trata-se de uma nova marginalização social e não de um novo empresariado (VASAPOLLO, 2005, p. 10).

Nesse contexto, as pessoas excluídas do mercado de trabalho formal migram para o empreendedorismo, para o trabalho intermitente, informal e tantas outras categorias que surgem a cada dia. Contudo, a insegurança e a alta concorrência tornam muito mais complicadas as situações daqueles que se viam resguardados por seus vínculos de emprego. Para aferir uma renda regular, o esforço despendido no trabalho em boa parte das vezes vem a ser maior do que quando possuíam um vínculo empregatício de trabalho assalariado regular. Concordando com esse novo cenário de exploração, Maria Augusta Tavares conclui que:

[...] o que se nos é apresentado como liberdade do trabalho e respeito à individualidade do trabalhador é tão somente uma forma adequada ao modo de produção capitalista, sobretudo quando a acumulação está a depender de relações flexíveis. Revela-se, aqui e agora, o caráter provisório das formulações capitalistas, expresso na metamorfose do atrasado em moderno (TAVARES, 2015, p. 51).

O século XXI vivencia um quadro de precarização por meio da análise das diversas modalidades de trabalho, que sempre acabam trazendo de modo disfarçado, diferentes formas de precarização. De fato, as novas condições de trabalho estão sempre predispostas a promover a perda de direitos e garantias sociais, já que muitas dessas relações, seja o trabalho livre, o informal, o domiciliar ou mesmo o subordinado, não tem qualquer garantia de continuidade. Nesse cenário o trabalhador encontra-se em uma fronteira incerta entre ocupação e não ocupação e também na incerteza de reconhecimento jurídico de garantias sociais básicas.

É notável também o fato de que uma nova divisão internacional de exploração do trabalho se estabeleceu no âmbito do trabalho subordinado e, concomitantemente, um novo contexto de acidentes e doenças profissionais. No interior de corporações de grande porte essas mudanças são evidentes já que suas gestões dos processos de trabalho são potencializadas pela presença de tecnologia avançada. É nesse sentido que Ricardo Antunes conclui que a nova classe trabalhadora atualmente constitui:

[...] o conjunto heterogêneo e complexificado do trabalho social hoje, tanto incorporando aqueles segmentos, minoritários e mais qualificados, que existem na grande indústria informatizada, nas esferas produtivas e nas atividades de serviços, bem como se

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incorporarmos também os segmentos assalariados majoritários, que presenciam formas intensificadas de exploração do trabalho dadas pelo trabalho part time, temporário, terceirizado, subcontratado etc., que também participam do complexo compósito e heterogêneo, dado pelo trabalho coletivo, pela totalidade do trabalho social (ANTUNES, 2009, p. 181).

A dinâmica histórica posta pelo novo metabolismo social do trabalho com a nova precariedade salarial instaura o que podemos denominar de “crise do trabalho vivo”. Ela se compõe do seguinte complexo de crises que decorrem do processo de precarização do homem-que-trabalha como a crise da vida pessoal, a de sociabilidade e a crise de autorreferência humano-pessoal.

No caso do Brasil, que parte de uma história de quatro séculos de escravidão, a precarização do trabalho é uma característica constitutiva de sua formação social. Como nos países em desenvolvimento de maneira geral, uma boa parte da população está inserida no trabalho do tipo tradicional e no trabalho informal não-regulamentado. Nessa situação, encontram-se relações autoritárias prevalecendo a precarização do trabalho, a falta de segurança, a assistência médica de péssima qualidade, a pobreza, a fome e a exploração como um todo. Tanto o trabalho do tipo tradicional, quanto os trabalhos informais e não-regulamentados podem ser considerados como parte de uma zona de exclusão à área de saúde e segurança do trabalho.

Nesse sentido é possível entender que a passagem da produção de montagem em esteira para o trabalho por células, do trabalho por produção contabilizado por indivíduo para a responsabilização da produtividade da equipe ou célula, e da correlativa diminuição dos empregos fabris, acabou sendo paralela à demissão e liberação de operárias mais antigas e à formação de empreendimentos a domicílio por parte destas operárias para a produção por conta própria para as antigas fábricas ou para pequenas novas empresas e para agentes intermediários. Aqui a intensificação do trabalho a domicílio e suas longas jornadas de trabalho se atenuam pelo controle do seu ritmo no domicílio e na vida familiar e de vizinhança.

Em alguns lugares que se faz uso da confecção têxtil como meio propulsor da economia, como é o caso do município de Caruaru e algumas cidades do agreste do estado de Pernambuco, a velocidade com que pequenas produtoras de confecções clandestinas acabaram crescendo com a utilização de uma força de trabalho informal, sem carteira assinada, parece propiciar uma legitimidade local, pelo menos temporária, a este pleno emprego fruto do desenvolvimento desta atividade. Tal fato se comprova pelas tentativas estatais recentes de atrair os pequenos produtores a um mínimo de formalidade, contribuindo para sua aposentadoria e assistência de saúde, parecem reconhecer a legitimidade de tais atividades, por sua própria inevitabilidade.

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5 OS DESAFIOS DO COMBATE À SUPEREXPLORAÇÃO DO TRABALHO FRENTE À RELEVÂNCIA DO SETOR DE PRODUÇÃO TÊXTIL DO AGRESTE PERNAMBUCANO

O agreste pernambucano, importante centro econômico e cultural do Estado, tem como uma de suas bases o comércio na zona urbana, mas, além do comércio, a indústria também tem notória relevância com destaque para as confecções têxteis, setor de produção que deslanchou na década de 1990 e que, segundo estudo realizado pelo SEBRAE (2012), verificou-se que nos dez municípios onde se concentra a atividade confeccionista no Agreste pernambucano, há mais de 100 mil pessoas ocupadas em produzir peças de vestuário. Estimou a pesquisa que existiam cerca de 4.530 (quatro mil quinhentos e trinta) unidades de produção de confecção, sejam em instalações formais ou informais. Somente em Caruaru neste período, tal quantidade representava 24,1% da produção em todo polo de confecções do agreste pernambucano, haja vista que cidades polo como Toritama e Santa Cruz do Capibaribe também tinham notória relevância e formavam, junto com Caruaru, os grandes polos de produção na indústria Têxtil no Agreste de Pernambuco (SEBRAE/PE, 2013).

O Polo de Confecções Agreste de Pernambuco reúne seis macroestruturas de negócios confeccionistas: O Moda Center, o Polo Comercial em Caruaru, o Parque das Feiras em Toritama e três Feiras nas cidades-destaque deste Polo, a saber, Santa Cruz do Capibaribe, Caruaru e Toritama, sendo estas detentoras da maior produção de confecções. Essas seis estruturas estão consolidadas no cenário de mutação em que se processam os negócios e que tornam o Polo de Confecções como um cenário de negócios dinâmico, imprevisível e competitivo, mas favorável a ações estratégicas de ação profissional nas etapas do processo produtivo confeccionista.

O referido setor de confecção têxtil vem demonstrando um grande número de casos de desrespeito às normas de proteção ao trabalhador que tem sido combatido por entidades de proteção ao trabalhador em Caruaru e região, seja na própria atuação sindical, com a intermediação e realização de convenções e acordos coletivos de trabalho e também com a apuração de denúncias. Está última tarefa também é do Ministério Público do Trabalho, atuante na defesa dos direitos coletivos/ indisponíveis dos trabalhadores e também da própria advocacia particular, que vem se destacando perante a Justiça do Trabalho, na defesa de direitos de trabalhadores na área de produção têxtil.

Como exemplo de comprovação da problemática acima exposta, são cada vez mais constantes as inspeções de estabelecimentos que são autuados e assinam Termos de Ajuste de Conduta junto ao Ministério Público do Trabalho sendo obrigados a efetuar a rescisão indireta de todos os trabalhadores, como é o caso da inspeção noticiada pelo Sindicato dos Auditores Fiscais do Trabalho (2013) realizada nas cidades de Caruaru, Toritama, Vertentes, Surubim e Santa Maria do Cambucá, que são polos de relevante produção de confecções na região do agreste

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pernambucano, onde foram resgatados 7 (sete) trabalhadores, em condições amplamente degradantes de trabalho.

Levando em consideração esse contexto de fiscalização no mundo de alta concorrência empresarial, a latente necessidade de produção em tempo mais rápido possível com qualidade, o fato de não haver, em muitos casos, as devidas tutelas protetivas, é latente a necessidade de união da classe operária na busca por seus direitos. Nesse sentido Aline Carneiro Magalhães e Iúlian Miranda enfatizam que:

As empresas hoje precisam produzir intensamente para acompanhar o ritmo acelerado de suas concorrentes. Elas, ainda, buscam diminuir os custos de sua produção para vencer essa corrida. Entretanto, o seu sucesso não pode ocorrer às custas da superexploração do trabalhador, de baixos salários, de jornadas extenuantes, da não observância de normas de saúde e segurança sob pena de reação da classe obreira, que reivindica condições de trabalho dignas e a efetividade de seus direitos fundamentais, insculpidos no art. 7º da CR/88 (MAGALHÃES; MIRANDA, 2012, p. 66).

O contexto de superexploração e de multiplicidades de relações de trabalho apresentado vem proporcionando um conjunto de agravantes para o trabalhador, que ultimamente tem tido dificuldades em se comunicar e harmonizar os interesses comuns dos demais de sua categoria a fim de encontrar novos meios de defender suas conquistas e postular novos direitos.

A utilização do acesso à internet e seus desdobramentos derivados das redes sociais como meio facilitador das lutas coletivas e da união das classes trabalhadoras tem sido uma realidade no século XXI. Essa importância do acesso à internet para as lutas coletivas é destacada de forma veemente por Maria da Glória Gohn:

Na ação concreta, essas formas adotam diferentes estratégias que variam da simples denúncia, passando pela pressão direta (mobilizações, marchas, concentrações, passeatas, distúrbios à ordem constituída, atos de desobediência civil, negociações etc.) até as pressões indiretas. Na atualidade, os principais movimentos sociais atuam por meio de redes sociais, locais, regionais, nacionais e internacionais ou transnacionais, e utilizam-se muito dos novos meios de comunicação e informação, como a Internet. Por isso, exercitam o que Habermas denominou de o agir comunicativo (GOHN, 2011, p. 335-336).

Outra barreira a ser quebrada será a do reconhecimento, por parte das entidades governamentais, da necessidade de instrução à população através da utilização dos demais meios de comunicação, de seus direitos e dos meios de busca e efetivação destes, já que boa parte desta ainda desconhece como se dá a atuação

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dos organismos governamentais de combate ao trabalho em condições precárias, somando isso ao fato de ainda existir o receio por boa parte dos trabalhadores em se agregar ou mesmo de denunciar aos entes governamentais, a ocorrência de ilícitos.

Ainda sobre as problemáticas referentes a desafios de adaptação, é válido enfatizar a dificuldade dos profissionais que laboram no mundo do Direito em se adaptar aos ditames da lei 13.467/17, gerou um certo receio na comunidade de advogados atuantes na ceara trabalhista em ingressar no judiciário na busca dos interesses de seus clientes. Tal situação foi comprovada e noticiada pela Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho – ANAMATRA (2017), que relatou a queda em 56% do número de novas ações trabalhistas após a primeira semana de vigência da reforma trabalhista. Tal realidade de insegurança é comprovada pelo fato de que até o dia 18 de fevereiro de 2018 já haviam sido protocoladas dezoito Ações Diretas de Inconstitucionalidade tratando sobre partes específicas da referida lei conforme registro do periódico O Tempo (2018).

Tal receio de ingresso no poder judiciário tem sido devido ao grande número de reformas trazidas pelo diploma legislativo já que esta insegurança por parte da comunidade jurídica acerca da constitucionalidade e da real tutela de direitos inerentes ao trabalhador trazidos pelas reformas legislativas. Carlos Henrique Bezerra Leite conclui que tal mudança vem “sem se preocupar com a efetividade do direito fundamental de acesso à Justiça do Trabalho e os princípios fundamentais da cidadania, da dignidade da pessoa humana, do valor social do trabalho e do valor social da livre iniciativa.” (BEZERRA LEITE, 2017, p. 17).

Sendo assim, é possível verificar que, diante das novas peculiaridades das relações de trabalho e da importância do setor de produção e confecção têxtil no agreste pernambucano, um novo olhar de observância à sua fiscalização e ao auxílio aos trabalhadores desse setor deve ser dado como prioridade aos governantes e a população local já que comprovadamente tal setor de produção é demasiadamente relevante para a economia e cultura local.

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

As relações de trabalho sofreram uma gama de mutações durante os séculos em contextos diferentes de exploração da força de trabalho. Na sociedade brasileira tal fenômeno não foi diferente, o subjetivismo inerente a cada ambiente de labor tem ficado cada vez mais complexo e passível de inovações. Nessa realidade, é notório o surgimento de diversas modalidades de superexploração do trabalho que se expandem em um contexto mais amplo que o do vínculo formal de emprego e tendem a ser fatores de análise básicos para entender tal contexto de mudança imposto pelo sistema de produção capitalista.

A precarização do trabalho derivada da necessidade de manutenção de um vínculo de labor em prol da subsistência foi observada, sendo dada ênfase no setor

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de produção têxtil, especificamente na região do agreste de Pernambuco. Dada a relevância de tal setor de trabalho para a economia do Estado, a partir de uma análise de dados do SEBRAE, foi possível observar que um grande percentual de pessoas sobrevive de tal produção e que frequentemente convivem com o desrespeito a diversos direitos básicos inerentes à relação de trabalho, seja a partir da manutenção de vínculos formais e informais, de jornadas exaustivas, de ambientes insalubres ou mesmo de salários abaixo do mínimo permitido legalmente.

Como resultado desse contexto de superexploração do trabalho derivada de um sistema mercadológico de produção que incentiva a concorrência e a busca por novas flexibilizações de relações de trabalho, se tornaram evidentes os novos desafios a serem buscados pelas entidades de tutela aos trabalhadores. Questões como a adaptação da sociedade na busca de novos meios de reivindicar seus direitos, políticas de incentivo à busca por direitos básicos e adequação dos institutos normativos regulatórios do Direito do Trabalho à realidade social vigente, são novas metas a serem buscadas dada a importância do labor para a sociedade.

Diante do exposto, foi possível realizar uma reflexão crítica acerca do novo contexto das relações de trabalho, assim como, enfatizar a relevância do setor de produção e confecção têxtil no agreste pernambucano para o Estado e suas implicações para a sociedade no que tange aos novos institutos sociais e jurídicos que tomam forma em uma sociedade contemporânea que tem como marca a flexibilização das relações de trabalho objetivando aconstante necessidade de adaptação ao sistema de produção capitalista.

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