• Nenhum resultado encontrado

ENSINO RELIGIOSO LAICO: UM OLHAR COMPLEXO E TRANSDISCIPLINAR

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "ENSINO RELIGIOSO LAICO: UM OLHAR COMPLEXO E TRANSDISCIPLINAR"

Copied!
17
0
0

Texto

(1)

Cícero Lopes Silva**, Gilbraz de Souza Aragão***, Luiz Alencar Libório****

Resumo: o presente ensaio aborda questões epistemológicas do Ensino Religioso no Brasil

tendo como aporte teórico o paradigma da complexidade de Edgar Morin e a abordagem transdisciplinar. Até o presente o Ensino Religioso público é tratado de modo ambíguo pelos sistemas de ensino do país, atuando tanto para a formação geral do cidadão quanto para a filiação religiosa de Igrejas. Tal situação torna a disciplina frágil e vulnerável à crítica por parte daqueles que defendem o estatuto do Estado laico e o ensino positivista. Entretanto, parece-nos que não se trata de excluir o ensino sobre a religião de dentro da escola, mas de contornar os seus limites através de novos paradigmas. Desta forma, acreditamos que a emergência do paradigma de complexidade e a abordagem transdisciplinar na educação podem ajudar o Ensino Religioso a redimensionar os seus limites e a sua prática em vista do ensino laico e o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil.

Palavras-chave: Ensino Religioso. Complexidade. Transdisciplinaridade. Secularismo.

Terceiro incluído. –––––––––––––––––

* Recebido em: 26.11.2018. Aprovado em: 31.01.2019.

** Doutorando e Mestre em Ciências da Religião (UNICAP). Especialista em História Geral (FAFOPST). Licenciado em História (Faculdade de Formação de Professores de Serra Talhada) e bacharel em Teologia (Instituto de Ciências Religiosas de Fortaleza). Bolsista CAPES. E-mail: cicero.cls@hotmail.com

*** Doutor em Teologia (PUC Rio). Mestre em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teo-logia de São Paulo. Graduado em Filosofia e TeoTeo-logia. Professor de Estudos de Religião (UNICAP). Coordenador do Observatório Transdisciplinar das Religiões no Recife. E-mail: gil_braz@uol.com.br

**** Doutor e Mestre em Psicologia e especialista em Psicologia da Religião (Pontifícia Univer-sidade Salesiana de Roma/UPS). Especialista em Psicologia Cognitiva (UFPE). Graduado em Psicologia (Faculdade Frassinetti do Recife), em Filosofia e Teologia (Universidade Católica do Salvador). Docente na UNICAP. E-mail: laliborio@terra.com.br

ENSINO RELIGIOSO LAICO: UM

OLHAR COMPLEXO

(2)

O

mundo hoje se apresenta caracterizado pelas transformações científicas e pela crescente complexificação da realidade. E neste novo contexto parece difícil para qualquer ser humano compreender a incerteza, o indeterminismo, o caos, a ambiguidade etc., fazendo parte da realidade e da dinâmica da vida (MORAES, 2016).

Da mesma forma, o cenário do campo religioso brasileiro se mostra cada vez mais cria-tivo e incerto, como bem retratou o último Censo/2010 da Religião no Brasil que deixou os especialistas intrigados1. Por certo, o próprio fato religioso tem se mostrado ao longo de sua história um fenômeno altamente complexo e plu-ral, o que impacta nas pesquisas e sugere abordagens mais abertas, quem sabe, interdisciplinares e transdisciplinares.

Não obstante, nos encontramos na atual sociedade brasileira com o grande desafio de promover a convivência republicana e respeito às diferentes visões de mundo, com o qual, certamente, a educação tem muito a contribuir. Nesse sentido, as Ciências da Religião2 e o Ensino Religioso emergem como campos privilegia-dos de estudo e aprofundamento do fenômeno religioso sem viés confessional ou proselitista, possibilitando uma cultura de paz e diálogo entre as religiões e com todos.

As Ciências da Religião hoje são reconhecidamente a melhor opção para fundamentar teórica e metodologicamente o Ensino Religioso nas escolas públicas do país (SOARES, 2010). Trata-se de uma área acadêmica com enorme riqueza do saber religioso até agora acumulado e disponível à comunidade científico-escolar. A abordagem interna das Ciências da Religião é sempre interdisciplinar ou transdisciplinar (PASSOS; USARSKI, 2013), o que permite aprofundar ângulos e camadas de um objeto maior.

Isto significa dizer que o domínio de estudo da religião sugere um campo epistemológi-co mais amplo e métodos que transcendam a fragmentação e a atomização do conhecimento, uma vez que estamos lidando com fatos e eventos complexos e plurifacetados. Por isto, Ciências da Religião e Ensino Religioso podem ga-nhar com o enfoque complexo e transdisciplinar de conhecimento que busca superar a disciplinarização e promover uma visão globalizadora da realidade. Desta forma, acredita-se que as possíveis contribuições do método da complexidade

e da abordagem transdisciplinar na educação podem ajudar a redimensionar os limites e a metodologia do Ensino Religioso para que se torne uma dis-ciplina científica e laica como qualquer outra disdis-ciplina da escola. A nova epistemologia complexa surge como possibilidade de reorganizar a própria estrutura do saber e resgatar conceitos, princípios e métodos mais abertos de conhecimento, favorecendo a formação integral da pessoa humana e seu pre-paro para o exercício da cidadania numa sociedade cada vez mais pluralista e planetária.

(3)

EDUCAR EM TEMPOS INCERTOS

A Modernidade nos deixou diante da ideia de universo ordenado e estável. Era como se a desordem estivesse “excluída para todo o sempre” (MORIN, 2016, p. 52). Para filósofos como René Descartes (1596-1650) e Issac Newton (1643-1727), o universo funcionava como um relógio, uma estrutura material fragmentária e regida por leis matemáticas eternas.

Conforme André Botelho (2007, p. 71),

O mundo da ciência, mecanicista e experimental, reduzirá o universo a um vasto conjunto de pequenos corpos materiais controlados pela ciência. O mistério do mundo e seu sentido são reduzidos, a partir de então, a leis precisas que podem ser decifradas pela lógica matemática.

E a partir desta percepção mecânica do universo se estabeleceu um método como um programa, como se a natureza funcionasse feito um relógio. De acordo com o modelo proposto por Descartes (1999), para chegarmos ao conhecimento de um todo bastava supostamente dividir o objeto a ser conhecido em quantas partes fossem possíveis, seguido por sua ordenação posterior. Assim, deste ponto da história humana o método cartesiano se tornaria o fundamento de toda ciência, fragmentando o conhecimento e separando sujeito e objeto. Por outro lado, não resta dúvida de que o método cartesiano possibilitou o

desenvol-vimento tecnológico e científico que superaram toda a história e favorece-ram grandes conquistas da humanidade, porém, produziu um progresso cego e incontrolado que levou a humanidade ao risco de aniquilar a si mesma com “armas termonucleares, manipulações de todo tipo, desregramento ecológico etc.” (MORIN, 2007, p. 9).

A velha ótica patriarcal, cartesiana e newtoniana, só viria a ser contestada pelas des-cobertas das Ciências da natureza no século XX, que levaram à necessidade de um novo paradigma capaz de lidar com a desordem e a incerteza. A nova percepção de um universo como sistema aberto, incerto, “evolutivo” (Lamarck) e criador foi confirmada a partir de novas estruturas da ciência contemporânea, como as Teorias da Relatividade (Einstein), Quântica (Max Plank e Bohn), das Estruturas Dissipativas (Prigogine), dos Sistemas (Bateson e Matura) etc.3 Desta feita, a nova realidade quântica, “Propõe um universo em construção, que se

or-ganiza, conjugando determinações e probabilidades, com complexidade cres-cente. Um universo com diferentes níveis de realidade, alguns deterministas e outros probabilistas, como tessitura de interdependências” (ANTÔNIO, 2009, p. 20-21). Nesse sentido, a incerteza e a desordem estão por toda a parte, em especial na escala quântica da natureza, mas “Não se trata de uma desordem de

(4)

degradação e desorganização. É uma desordem constitucional que faz neces-sariamente parte da physis, de todo ser físico” (MORIN, 2016, p. 57).

Assim, nos defrontamos hoje com uma nova realidade complexa que rompeu com os elos da simplicidade exigindo novos parâmetros de inteligência. Conforme Jacques Ardoino (2010, p. 551):

O mundo, considerado sob o ângulo de suas regularidades, como que obedecen-do a um princípio de ordem e de organização, é simples, com a condição de que seja visto desta maneira. Ele se complexifica a partir do momento em que uma inteligência da desordem se elabora para refinar, enriquecer e tonar mais sutil o olhar que se dirige aos fenômenos. Estes não são mais supostamente divisí-veis, suscetíveis de ser reduzidos em elementos mais simples, ao sabor de uma análise-decomposição, mas são, ao contrário, postulados como não suscetíveis de ser decompostos, devido à própria natureza do tecido que os constitui, em função da inteligência que quer apreendê-los.

Desta maneira, entra em crise uma visão de mundo-máquina da Modernidade e que dava ao homem uma sensação de segurança e controle diante da natureza. Ao contrário, nos deparamos nestes dias com uma nova percepção de realidade na qual “não há apenas ordem, mas também desordem; não há apenas determinis-mos, mas também acasos; e em situações nas quais emerge a incerteza” (MO-RIN; CIURANA; MOTTA; 2009, p. 18), o que causa tamanha perplexidade. E como exemplo disto temos a própria educação onde as maiorias dos professores,

acostumados a trabalhar com os métodos e as certezas do passado, encontram-se hoje atônitos diante da nova realidade educacional, assim como revela Maria Moraes (2016, p. 1):

A realidade educacional, como hoje se apresenta, não deixa de ser um grande desafio para a maioria dos professores acostumada a trabalhar com certezas e verdades, com causalidade linear, previsibilidade e estabilidade. Para qualquer ser humano, é difícil compreender o caos, a ordem fazendo parte da desordem, a incerteza e o indeterminismo inseridos na dinâmica da vida e, hoje, tão pre-sentes na realidade construída e nas relações que acontecem nos ambientes edu-cacionais. Na verdade, enfrentamos tempos incertos e fluidos com ferramentas intelectuais de outras épocas, de outros tempos, observando a realidade como se fosse estável, homogênea e pré-determinada.

Portanto, surge cada vez mais clara a necessidade de uma mudança cognitiva e de no-vos métodos educacionais que rompam com o modelo simplificador da reali-dade por um modo complexo de pensar a vida e o mundo. E para isto, Edgar

(5)

Morin (2000) sugere uma ‘reforma’ do procedimento de conhecimento, o que corresponde, essencialmente, ao postulado do ‘pensamento complexo e trans-disciplinar’.

DAS CIÊNCIAS DA RELIGIÃO AO ENSINO RELIGIOSO

As Ciências da Religião constituem uma área singular de estudo do Sagrado com mais de 150 anos de história e presente em diversos países do mundo. Enquanto área de conhecimento surgiu no final século XVIII, mas sua institucionaliza-ção se deu somente no século XIX, quando foi criada a primeira cátedra de Ciências da Religião, na Suíça, em 1873. Com o tempo, veio a se institucio-nalizar também na Holanda (1877), França (1879), Bélgica (1884), Inglaterra (1904), Alemanha (1910) e Itália (1924).

No Brasil, as Ciências da Religião se desenvolveram pelo final da década de 1970, com a instituição de Programas de Pós-graduação em Ciências da Religião na PUC-SP, UFJF-MG e na UMESP, em São Bernardo-SP. Atualmente a área conta com “26 cursos de graduação, normalmente licenciaturas, segundo o reconhecimento do Ministério de Educação e Cultura - MEC, bem como, em 12 programas de pós-graduação, reconhecidos e recomendados pela CAPES/ MEC” (ARAGÃO; SOUZA, 2018, p. 48).

O foco das Ciências da Religião é a religião enquanto fenômeno presente na história da humanidade e nas culturas, mas sem abordá-lo com o pressuposto da fé. Em seu espectral interdisciplinar, as Ciências da Religião investigam o fato religioso à luz da História, Antropologia, Sociologia, Teologia, Filosofia, Psicologia etc., com uma visão geral de todas as religiões. As Ciências da Religião, portanto, são uma área de conhecimento singular, com objeto, métodos e teorias específicas que se executa como tal e se institucionaliza “a partir de uma composição interna sempre interdisciplinar e transdisciplinar” (PASSOS; USARSKI, 2013, p. 26). Por sua vez, o Ensino Religioso constitui uma disciplina de aplicação das Ciências da

Religião na sociedade, mas é marcado por uma história de disputas e conflitos entre Estado e Igreja. Fundamentando-se em Sérgio Junqueira e Anísia Figuei-redo, Cícero Silva (2013, p. 8) nos ajuda a entender que:

O Ensino Religioso sempre fez parte o quadro da Educação nacional, mas se vê hoje desafiado a sanear as ambiguidades e distorções históricas para manter-se nos sistemas escolares. Durante o período Colonial foi entendido como cateque-se eclesial, o que era bastante conveniente aos interescateque-ses do Padroado. Com a República e a consequente separação entre Igreja e Estado em 1889, surgiram os primeiros questionamentos a um modelo de Ensino Religioso confessional, uma vez que violava o princípio de laicidade do Estado.

(6)

Mas é somente durante o século XX que surge a necessidade de uma nova consciência religiosa decorrente do pluralismo cultural religioso presente no Brasil. Com nova Lei de Diretrizes e Bases nº 9394 de 1996, modificada em seu art. 33/97, e as Resoluções do Conselho Nacional de Educação n° 4/2010 e nº 7/2010, o Ensino Religioso passou a integrar uma das cinco áreas de conhecimento do Ensino Fundamental de 09 (nove) anos conforme a nova regulamentação atual. Assim, o modelo de Ensino Religioso confessional avança para a modalidade

transre-ligiosa das Ciências da Religião, mas ainda sem uma definição política clara quanto a seu papel no currículo escolar. Na prática, ainda funcionam nas esco-las públicas e privadas do país modelos de Ensino Religioso confessional, com raríssimas exceções (SILVA, 2013).

Desta maneira, resta um trabalho político de convencimento das autoridades para ado-ção das Ciências da Religião como novo paradigma epistemológico para o ER, tanto para definição de seus conteúdos e métodos, quanto para a habilitação de seus professores; o que hoje é consenso entre a maioria dos profissionais da área de estudos da religião, como Décio Passos (2007) e Afonso Soares (2010).

Para Afonso Soares (2010, p. 11), que sempre esteve à frente na defesa do ER na es-cola pública, a inserção do componente de Ensino Religioso nas Ciências da Religião desafia a construção de um campo epistemológico mais amplo para a disciplina, pois:

O olhar que lançamos sobre o fenômeno religioso não é confessional, nem per-tence a esta ou àquela ‘teologia’, sua base epistemológica é a Ciência da Reli-gião. Essa abordagem possibilita a análise diacrônica e sincrônica do fenômeno religioso, a saber, o aprofundamento das questões de fundo da experiência e das expressões religiosas, a exposição panorâmica das tradições religiosas e as suas correlações socioculturais. Trata-se, portanto, de um enfoque multifacetado que busca luz na História, na Sociologia, na Antropologia e na psicologia da Reli-gião, contemplando, ao mesmo tempo, o olhar da Educação. Além de fornecer a perspectiva, a área de conhecimento da Ciência da Religião favorece práticas do respeito, do diálogo e do ecumenismo entre as religiões. Contribui desse modo, com uma educação para a cidadania, que, mesmo sem ser anticonfessio-nal, transcende esses comportamentos para poder incidir na formação integral do ser humano.

Enfim, cabe estabelecer para o Ensino Religioso um novo princípio de articulação do conhecimento capaz de aprofundar ângulos de um objeto maior, múltiplo e diversificado, para as quais, possivelmente, o método complexo e transdisci-plinar podem contribuir.

(7)

COMPLEXIDADE, ENSINO RELIGIOSO E TRANSDISCIPLINARIDADE

Para Morin, a complexidade é um desafio, não uma resposta. O desafio de ‘reunir’. O desafio de tratar o que é ‘tecido junto’ e a ‘incerteza’. Descartes havia for-mulado o grande paradigma de fragmentação do conhecimento e de disjunção do sujeito e do objeto, trata-se de partir agora de um paradigma de religação, pois o universo não é compartimentado (MORIN, 2016).

A grande diferença do novo método4 que Morin (2016, p. 37) propõe está justamente no paradigma:

Não se trata mais de obedecer a um princípio de ordem (eliminando a desor-dem), de clareza (eliminando o obscuro), de distinção (eliminando as aderên-cias, participações e comunicações), de disjunção (excluindo o sujeito, a anti-nomia, a complexidade), ou seja, obedecer a um principia que liga a ciência à simplificação lógica. Ao contrário disso, trata-se de ligar o que estava disjunti-vo a partir de um principio de complexidade.

Portanto, sua proposta de método está em superar um princípio organizador do co-nhecimento que isola, separa e desune por um que possa articular o que está separado e religar o que está disjunto5. Fundamentalmente, trata-se de um método fundado em novo paradigma de complexidade, e que comtemple os princípios ‘recursivos’, ‘dialógicos’ e ‘hologramáticos’ (MORIN, 2000), que serão estudados adiante.

Para Morin, a complexidade está na base de tudo. Tudo é complexo. Por isto, o para-digma de complexidade se opõe ao parapara-digma de simplificação. Porém, não se afasta nem nega a simplificação/disjunção. “Na verdade, ele se opõe inte-gralmente ao princípio absoluto de simplificação, mas integra a simplificação/ disjunção, transformando-se em princípio relativo” (MORIN, 2016, p. 457). Portanto, esboça-se um novo modo de pensamento que não elimina os princípios do

pensamento clássico, mas reconhece sua insuficiência para lidar com fenôme-nos complexos do universo. A Física clássica, por exemplo, teve que se abrir às relações da complexidade quando Niels Bohr percebeu que a matéria se manifestava ora como onda, ora como partícula, o que o levou à construção do ‘princípio da complementaridade’: “Esse princípio afirma que as imagens onda e partícula são descrições complementares de uma mesma realidade e ambas são necessárias à descrição da realidade atômica” (MORAES; NAVAS, 2015, p. 40).

Da mesma forma, a Transdisciplinaridade, enquanto abordagem de superação do pa-radigma da simplificação/disjunção, surge da necessidade de desenvolver la-ços entre as disciplinas e ir além delas. Tanto a multidisciplinaridade, quanto

(8)

a interdisciplinaridade e a transdisciplinaridade servem como propósito de transcender os limites entre disciplinas e do conhecimento, porém, com cortes epistemológicos distintos:

Na multidisciplinaridade, tem-se a reunião de varias disciplinas; na interdis-ciplinaridade, toma-se um determinado tema, perpassando-o por varias disci-plinas. Porém, na transdisciplinaridade, abre-se um novo corte epistemológico, resultante da junção ou da transversalidade entre duas ou mais áreas do saber

(CARNEIRO, 2015, p. 13).

Deste modo, a Transdisciplinaridade6 representa um esforço de ir mais longe do que a multidisciplinaridade e a interdisciplinaridade que, apesar de romperem com o isolamento entre as diferentes disciplinas, ainda continuam inscritas na es-trutura da pesquisa disciplinar. A ação transdisciplinar é o que permite trans-gredir as fronteiras das disciplinas e ir além das aparências do conhecimento, da separação sujeito e objeto, da oposição dos opostos, fazendo surgir novas camadas do saber, quem sabe, novas verdades (CARNEIRO, 2015).

Em seus três pilares, a Transdisciplinaridade leva em conta a ‘complexidade’, os dife-rentes ‘níveis de realidade’ 7 e uma lógica não clássica de abertura e “inclusão do terceiro termo de uma proposição” (NICOLESCU, 1999, p. 5), onde o ob-jetivo é a unidade do conhecimento.

Numa perspectiva de desenvolvimento transdisciplinar de conhecimento religioso, Aragão e Souza (2018, p. 43) explicam que:

Enquanto modalidade para organizar o campo dos estudos de religião, ela se desdobra em uma atitude transcultural e uma mística transreligiosa. Em um mesmo nível de realidade, religiões diferentes seriam possivelmente antagônicas e excludentes, mas se considerarmos outro nível ao menos, surge um ‘Terceiro’, que, incluído, as pode reconciliar. Trata-se da base antropológica que constitui a todos e exige uma hospitalidade e comunhão ética, ou da altitude mística para cujo silêncio e sonho comum colaboram com os sons diferentes de todas as tra-dições espirituais.

Assim, a abordagem transdisciplinar considera a realidade estruturada em diferentes níveis de realidade e aberta a uma nova lógica ternária de inclusão. Stéphane Lupasco apresenta a lógica do Terceiro Incluído como uma verdadeira lógica com três valores: A, não-A e T. A lógica do Terceiro Incluído é uma lógica da complexidade, inclusiva, e não exclui a lógica clássica. Trata-se de uma nova lógica, formalizável e formalizada, multivalente e inclusiva, porque supõe uma compreensão da realidade em níveis. Por certo, se continuarmos presos a um

(9)

único nível de realidade há uma eterna luta entre dois elementos contraditórios (A não é não-A), porém, se consideramos a lógica quântica dos diferentes ní-veis de realidade, existe um Terceiro Termo possível que une os opostos (A e não-A) e os inclui na perspectiva do conjunto, do todo (NICOLESCU, 1999). Se aplicada ao Ensino Religioso (ER), a lógica do Terceiro Incluído reconhece a neces-sidade de um procedimento paradoxal por parte daquele que ensina/aprende e se caracteriza por uma ação de acolhida e respeito às diferenças e aos diferen-tes, podendo, assim, contribuir por um novo projeto pedagógico mais amplo de formação do cidadão, e não de catequese ou teologia para filiação das Igre-jas. Na visão dos estudiosos em Ciências da Religião, a lógica transdisciplinar pode abrir o ER a novas dimensões de pedagogia espiritual:

Como resultado do exercício dessa lógica, o Ensino Religioso, no contexto de com-plexidade da nossa ‘aldeia global’, deve se abrir para as dimensões de pedagogia espiritual que existem entre e além de todas as tradições religiosas, deve resgatar os valores humanos e a abertura mística que as espiritualidades, religiosas e não religiosas, podem trazer para a educação dos estudantes. Trata-se ainda, já na produção de conhecimentos no âmbito das Ciências da Religião, de desenvolver uma atitude desconstrutiva e informativa que compara criticamente e interpreta os fatos nos seus contextos históricos, mas também de cultivar abertura reverente para o mistério da realidade, em uma postura formativa e construtiva, ajudando para que as novas gerações possam optar com mais liberdade sobre o significado da transcendência na vida (ARAGÃO; SOUZA, 2018, p. 47).

De modo que a nova lógica transdisciplinaridade de conhecimento favorece a religação e a ecologia dos saberes, reconhecendo a existência de conhecimentos plurais e o diálogo entre os saberes científicos e humanísticos da humanidade (MO-RAES; NAVAS, 2015).

O MÉTODO COMPLEXO

Morin (2009) se opõe à concepção de método como ‘metodologia’, um programa para chegar a um resultado previsto. Ao contrário, parte da possibilidade de conceber um método-caminho, uma disciplina de conhecimento que procura superar a di-tadura da simplificação/disjunção por um princípio de complexidade que possa articular o que está separado e religar o que está disjunto (MORIN, 2016). Nesse sentido, o desafio principal do ensino implica em aprender a religar, e não

apren-der a separar, o que foi feito até o presente. Aliás, esta é uma das grandes pre-ocupações de Morin (2000, p. 11), ao observar a escola e o desenvolvimento das sociedades atuais:

(10)

A tradição do pensamento que forma o espírito das escolas elementares ordena que se reduza o complexo ao simples, quer dizer, que se separe o que está ligado, que se unifique o que é múltiplo, que se elimine tudo aquilo que traz desordens ou contradições para o entendimento. O pensamento que recorta e isola permite aos especialistas e expertos ter grandes desempenhos em seus compartimentos, e, assim, cooperar eficazmente nos setores não complexos do conhecimento, es-pecialmente aqueles concernentes ao funcionamento das máquinas artificiais. Mas a lógica a que obedece estende sobre a sociedade e as relações humanas as restrições e os mecanismos inumanos da máquina artificial com sua visão de-terminista, mecanicista, quantitativa, formalista que ignora, oculta ou dissolve tudo o que é subjetivo, afetivo, livre e criador.

Ao mesmo tempo, a escola e a educação aparecem como campos privilegiados para a reforma do pensamento e uma mutação positiva das sociedades. Por isto, Ed-gar Morin (2000) propõe os três princípios da reaprendizagem pela religação: o Princípio da Dialógica, da Recursividade e o Hologramático 8, que, neste ensaio, tenta-se aplicar aos estudos de religião no Ensino Religioso.

No primeiro Princípio da Dialógica, o autor esclarece que não se procura uma síntese da dualidade como na dialética hegeliana, mas o reconhecimento de que estas lógicas diferentes estão ligadas em uma unidade maior, de forma complexa (complementar/concorrente/antagônica). Morin (2000, p. 48) afirma: “É pre-ciso, em certos casos, juntar princípios, ideias e noções que pareçam opor-se uns aos outros”.

Considerando o Princípio da Dialógica na organização interna dos estudos da religião, cria-se uma possibilidade real de tratar os “conhecimentos religiosos” e as “fi-losofias seculares de vida” numa perspectiva maior de educação, assim como sugere a nova Base Nacional Comum Curricular (BNCC):

Cabe ao Ensino Religioso tratar os conhecimentos religiosos a partir de pressu-postos éticos e científicos, sem privilégio de nenhuma crença ou convicção. Isso implica abordar esses conhecimentos com base nas diversas culturas e tradições religiosas, sem desconsiderar a existência de filosofias seculares de vida (BRA-SIL, 2017, p. 434).

Deste modo, não se trata mais de fazer proselitismo religioso dentro da escola, mas de afrontar pedagogicamente realidades profundas que, numa lógica complexa de pensamento, encontram-se unidas por uma ética republicana de convivência e respeito às diferenças.

O próprio Morin (2002, p. 54) insiste na necessidade de pensar a união dos contrários: “O universo não é compartimentado. Não há morte de um lado, a vida do

(11)

ou-tro; a ordem, a desordem; o amor, o ódio [...] No universo, sente-se a união profunda do que, entretanto, é antagônico”. Por isto, sua compreensão de religião, sagrado, deuses, se refere ao yin e o yang9do taoísmo. Mas não como uma crença, e sim, como um modo de compreender que tudo está ligado, mes-mo os antagonismes-mos. Para Morin (2002, p. 55), “o yin e o yang são um símbolo da dialógica”, que comporta a dúvida e a fé, ao mesmo tempo.

Por outro lado, talvez, o Princípio da Dialógica poderá ajudar o Ensino Religioso a descobrir conexões entre todas as religiões e a nova ciência contemporânea. Nesse seguimento, Décio Passos e Frank Usarski (2013, p. 24) esclarecem, por exemplo, que:

Vale observar que, em nossos dias, alguns ramos das ciências estabelecem laços ambíguos com formas e conteúdos irracionais, construídos no seio da cultura de um modo geral, em nome de epistemologias mais abrangentes e profundas. As nítidas linhas divisórias entre racional e irracional, o místico e o científico já não são tão consensuais como nos tempos de constituição das ciências mo-dernas, a partir do século XIX. Muitas abordagens científicas apontam, e até mesmo, terminam em territórios transcendentes e espirituais que recolocam o religioso em um lugar epistemológico supostamente superior à própria ciência, como uma nova metafísica que desvela o fundamento último do real abordado pela razão científica.

Assim, áreas de conhecimento antes separadas pelo paradigma disjuntor, são convida-das ao campo de debate epistemológico, ao confronto significativo convida-das ideias, fazendo surgir, quem sabe, novas clarificações, novas camadas do saber que poderiam até aprofundar o sentido último do viver.

No que se refere ao Princípio de Recursividade, pensemos, por exemplo, na vantagem de um circuito recursivo de aprendizagem. Conforme Morin (2000, p. 48), em todo circuito recursivo “os efeitos e os produtos são necessários à sua produção e à sua causação”, de onde se entende que se superam as consequ-ências das leis mecânicas de causa e efeito (causalidade linear). Desta forma, a elaboração de conhecimento se torna um processo recursivo entre objeto/ sujeito, sujeito/objeto, aluno/professor, professor/aluno. Assim, “O professor caracterizar-se-á, nesse processo, como um dodiscente (docente que aprende) e o estudante como um didocente (discente que ensina), de modo que um e outro estejam a todo o tempo ensinando e aprendendo [...]” (OLIVEIRA et al., 2007, p. 135).

Nesta perspectiva de pedagogia interativa, o Ensino Religioso se enriquece por um processo circular e criativo de trocas de energias entre professor/aluno, aluno/ professor. O professor se converte um facilitador do conhecimento dentro de

(12)

um processo de educação interativo e includente, hoje relacionado às teorias Construtivista e Sociointeracionista.

Já o terceiro Princípio Hologramático realiza a rotação da parte para o todo, do todo para a parte. Desta forma, pode, talvez, ajudar a compreender que a manifestação de sagrado acontece de modo pleno, ou quase, em toda religião. Como num holo-grama, cada religião pode está no sagrado, assim como o sagrado se encontra nas religiões. Nesse sentido, a abordagem da religião no Ensino Religioso não é hierárquica, mas circular, ou seja, não há uma religião superior nem inferior, mas a importância do todo, sem, entretanto, perder a importância das partes.

Morin (2000, p. 49) caracteriza este terceiro princípio dizendo que se refere “ao ponto do holograma que contém quase a totalidade da informação da figura represen-tada. Não somente a parte está no todo, mas o todo está na parte”. Claro que a realidade é muito mais complexa que no holograma físico. Não é tão simples dizer, por exemplo, que a sociedade, entendida como um todo, está no indi-víduo que está na sociedade. Deste modo, o próprio princípio é relativizado, assim como nos esclarecem Morin, Ciurana e Motta (2009, p. 34-35):

Além disto, nas sociedades complexas que comportam pluralismos e antagonis-mo (sociais, políticos e culturais), esses antagonisantagonis-mos podem enfrentar-se no seio de um mesmo espírito, provocando conflitos internos, double blind [duplo vínculo], crise, busca. Desde modo, o que está presente no espírito individual não é unicamente o Todo enquanto dominação, mas também, eventualmente, o todo enquanto complexidade.

Esta experiência de abertura e respeito a toda religião enquanto ponto do holograma que contém a quase totalidade da informação da figura representada, ou seja, do sagrado, pode ainda favorecer ao aluno um processo de aprendizagem e construção de conhecimento crítico e reflexivo diante de qualquer sistema de referência, muito próximo do que sugere Frank Usarski (apud SOARES, 2010, p. 124) quando situa as contribuições que a Ciência da Religião pode trazer para o Ensino Religioso:

A contribuição da Ciência da Religião consiste em possibilitar [ao aluno] com-parações contrastantes entre sistemas de referência. Aprende-se que nenhum ser humano que tem sua língua, seus pensamentos e seus valores pode viver sem um sistema de referência. Aprende-se também que nenhum sistema de referência pode ou deve reclamar para si validade absoluta.

Desta forma, se busca um tipo de saber da realidade em movimento, em espiral, que não se fecha em nenhuma verdade absoluta ou ideia totalitária. Busca-se, por

(13)

certo, superar um ‘conhecimento envelhecido’ que marcou a história do Ensi-no Religioso por um conhecimento significativo e pertinente. Não sem razão, Gaston Bachelard (apud MORIN; CIURANA; MOTTA, 2009, p. 28) já dizia que “o obstáculo para a aprendizagem do conhecimento científico não é o erro, mas a fixação de um conhecimento envelhecido”.

Assim, quem sabe, se possa compreender que no processo laico de educação do cida-dão deve-se resguardar “a pluralidade, a igualdade e a liberdade de consciên-cia como direitos fundamentais e anteriores ao direito à educação religiosa” (DINIZ; LIONÇO; CARRIÃO, 2010, p. 100). Por fim, tão importante quanto aprender a diversidade das religiões, é aprender a respeitar a existência de cidadãos que não professam nenhuma fé, como lembram os autores supraci-tados. Desta feita, talvez, se alcança a intuição do sábio Zen Mumon (apud MORIN; CIURANA; MOTTA, 2009, p.15), quando afirma que: “O grande caminho não tem portas, milhares de caminhos levam a ele”.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Como se percebeu, lidar com o fenômeno religioso é lidar com um objeto de estudo extremamente complexo e diversificado, tanto de experiências e linguagens, quanto de expressões e significados, o que resiste a pesquisas simplificado-ras e uma abordagem linear e determinista do conhecimento. Disso recorre, reconhecido a complexidade deste campo, a necessidade de uma abordagem inusitada inspirada na teoria da complexidade e na atitude transdisciplinar, capaz de fazer avançar, possivelmente, o conhecimento científico das experi-ências de sagrado através de uma concepção de racionalidade mais ampla e adequada.

No Brasil, as Ciências da Religião constituem uma ciência em construção, assim como o Ensino Religioso enquanto matéria específica para os estudos das experi-ências humanas de sagrado no espaço público. A questão da epistemologia, como é sabida, ainda suscita muitas inquietações, tanto do ponto de vista teóri-co quanto metodológiteóri-co, e assim deve ser. Ao lado disto, cresce gradualmente o interesse e a relevância das pesquisas do fenômeno religioso nas academias do país, quer na área das Ciências Humanas, quer da Teologia e das Ciências da Religião.

Nesta perspectiva é que Passos e Usarski (2013, p. 23) consideram que “a Ciência da Religião ainda carece de exames mais detalhados do ponto de vista de sua composição como ciência nos aspectos teórico e metodológicos”, de forma que estamos tratando de muitas questões que permanecem em aberto. No en-tanto, parece cada vez mais clara a necessidade de uma abordagem sempre interdisciplinar ou transdisciplinar de estudo da religiosidade e da religião que

(14)

busca superar a fragmentação do conhecimento especializado por uma aproxi-mação mais globalizante do objeto de pesquisa.

Assim, nos parecem consideráveis as diversas contribuições da epistemologia da com-plexidade para a elucidação do fenômeno religioso e a fundamentação epis-temológica das Ciências da Religião, por consequência, do Ensino Religioso público, como tentamos sinalizar neste ensaio. A transdisciplinaridade e os princípios da reaprendizagem pela religação (Recursividade, Dialógico e o Hologramático) possibilitam redimensionar os limites e a prática do Ensino Religioso por uma abordagem científica laica e plural, o que é mais coerente com o estatuto do Estado republicano moderno.

Por fim, e parafraseando Luiz Pondé (2008), o campo científico de estudos do fenô-meno religioso brasileiro é ‘um caso clínico típico de complexidade’, e como tal, não suporta uma abordagem de pesquisa/ensino linear e determinista da realidade. Cabe, assim, admitir para o campo epistemológico das pesquisas/ ensino das Ciências da Religião e do Ensino Religioso um paradigma de com-plexidade e uma nova perspectiva transdisciplinar sobre a religião num proces-so de produção de conhecimentos regido por relações de complementaridade, recursividade, antagonismo e incerteza.

LAY RELIGIOUS TEACHING: A COMPLEX AND TRANSDISCIPLINARY LOOK Abstract: this essay addresses epistemological issues of religious education in Brazil

with theoretical contribution of the paradigm of complexity of Edgar Morin and the transdisciplinary approach. Til up to date the public religious educa-tion is treated so ambiguous by the educaeduca-tion systems of the country, acting both for general formation of citizens as to the religious affiliation of churches. Such a situation makes the discipline fragile and vulnerable to criticism from those who argue for the status of the secular State and the positivist school. However, it seems to us that this is not to exclude the teaching about religion in school, but to go round its limits through new paradigms. In this way, we believe that the emergence of the paradigm of complexity and the transdisci-plinary approach in education can help the Religious Teaching to give another dimension to its limits and practice in order of lay Teaching and respect to the cultural and religious diversity in Brazil.

Keywords: Religious education. Complexity. Transdisciplinarity. Secularism. Third included.

Notas

1 Uma discussão sobre os dados, impasses, transformações e as dinâmicas do novo campo religioso brasileiro pode ser encontrado em Aragão, Cabral e Valle (2014).

(15)

2 Não há consenso quanto a esta nomenclatura, na verdade, é possível encontrar um conjunto de terminologias diferentes nesta área. Para Passos e Usarski (2013, p. 25), as diferentes explicitações epistemológicas só revelam o jogo inevitável da unidade e da pluralidade: “quando afirmam a unidade da abordagem e do objeto (Ciência da Religião), a unidade da abordagem e a diversidade do objeto (ciência das religiões), a diversidade da abordagem e a unidade do objeto (ciências da religião) e ainda a diversidade de ambos (ciências das religiões)”. No entanto, para este estudo adotamos a designação “Ciências da Religião”, se referindo à pluralidade de abordagens e a unidade de objeto, porque acreditamos que é o que se faz no Brasil. Porém, preservaremos a nomenclatura utilizada por cada autor em citações diretas ou indiretas.

3 Para maiores esclarecimentos nesse sentido, conferir os trabalhos de Marilda Behrens (2013).

4 Morin não fornece um método, mas parte em busca dele. Para o francês, o método precisa ser compreendido de uma maneira nova, não como uma metodologia (receituário técnico) ou um programa, mas como caminhada. E para isto, Morin (2009) faz referência a María Zambrano, que “postula um método-caminho”, que não está pronto, mas que emerge durante a experiência e se apresenta no final.

5 E por isto insiste que, “nossa necessidade histórica implica encontrar um método que de-tecte, e não que oculte as ligações, articulações, solidariedades, implicações, imbricações, interdependências, complexidades” (MORIN, 2016, p. 29).

6 Para um dos seus maiores expoentes na atualidade, o físico romeno Basarab Nicolescu (1999, p. 53, grifo do autor) afirma: “A transdisciplinaridade, como o prefixo ‘trans’ indica, diz respeito àquilo que está ao mesmo tempo entre as disciplinas, através das diferentes disciplinas e além de qualquer disciplina. Se objetivo é a compreensão do mundo presente, para o qual um dos imperativos é a unidade do conhecimento”.

7 Por Níveis de Realidade, Nicolescu (1999, p. 31) entende: “[...] um conjunto de sistemas variantes sob a ação de um número de leis gerais: por exemplo, as entidades quânticas submetidas às leis quânticas, as quais estão radicalmente separadas das leis do mundo ma-crofísico. Isto quer dizer que dois níveis de realidade são diferentes se, passando de um ao outro, houver ruptura das leis e ruptura dos conceitos fundamentais (como, por exemplo, a causalidade)”. Hoje se reconhece a existência de pelo menos três diferentes níveis de realidade: o nível macrofísico, o nível microfísico e o ciberespaço-tempo.

8 Assim, o princípio da recursividade tem como razão antepor-se ao princípio da causalida-de linear por uma icausalida-deia causalida-de causalida-desenvolvimento do conhecimento em espiral; o princípio da dialógica, diferentemente da dialética de Hegel que procurava unificar as premissas pela síntese; busca ligar duas ou várias lógicas diferentes em uma unidade, de forma complexa (complementar, concorrente e antagônica) sem que a dualidade se perca na unidade e, por fim, o princípio hologramático, procura quebrar os esquemas simplificantes do paradigma clássico reconhecendo que não somente a parte está no todo, mas o todo também está na parte (MORIN, 2000).

9 Na tradição da cultura chinesa, o yin e o yang representam um princípio feminino e outro masculino, porém, mais do que isto, representam os pólos extremos de um único todo. Conforme Capra (1982, p. 25-26): “Nada é apenas yin ou apenas yang. Todos os fenôme-nos naturais são manifestações de uma contínua oscilação entre os dois pólos; todas as transições ocorrem gradualmente e numa progressão ininterrupta. A ordem natural é de

(16)

equilíbrio dinâmico entre o yin e o yang”. Para uma visão mais detalhada, o leitor poderá consultar esta obra de Capra.

Referências

ANTÔNIO, Severino. Uma nova escuta poética da educação e do conhecimento. São Paulo: Paulus, 2009. (Pedagogia e educação).

ARAGÃO, Gilbraz S.; SOUZA, MAilSOn F. C. Transdisciplinaridade, o campo das ciências

da religião e sua aplicação ao ensino religioso. Estudos Teológicos, São Leopoldo, v. 58, n. 1, p. 42-56, jan./jun., 2018. Disponível em: <http://www.periodicos.est.edu.br/index.php/estu-dos_teologicos/article/view/3261/pdf.> Acesso em: 12 nov. 2018.

ARAGÃO, Gilbraz S.; CABRAL, Newton; VALLE, Edênio (Orgs.). Para onde vão os estudos da religião no Brasil. São Paulo: ANPTECRE, 2014.

ARDOINO, Jacques. A complexidade. In: MORIN, Edgar. A religação dos saberes: o desafio do século XXI. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2010. p. 548-558.

BEHRENS, Marilda Aparecida. O paradigma emergente e a prática pedagógica. 6. ed. Petró-polis: Vozes, 2013.

BOTELHO, André da Conceição da Rocha. Teologia na Complexidade: do racionalismo teológico ao desafio transdisciplinar. Tese (Doutorado em Teologia) - Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2007.

BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria da Educação Básica. Base nacional comum cur-ricular. Brasília, DF, 2017. Disponível em: <http://basenacionalcomum.mec.gov.br/wp-content/ uploads/2018/04/BNCC_19mar2018_versaofinal.pdf>. Acesso em: 25 out. 2018.

CAPRA, Fritjof. O ponto de mutação. Tradução: Álvaro Cabral. São Paulo: Cultrix, 1982. CARNEIRO, Maria Francisca. Metodologia da transdisciplinaridade e teoria do conhecimen-to. Curitiba: Juruá, 2015.

DESCARTES, René. Descartes: vida e obra. Tradução da Editora Nova Cultura Ltda. São Paulo: Nova Cultura, 1999. (Coleção Os Pensadores).

DINIZ, Debora; LIONÇO, Tatiana; CARRIÃO, Vanessa. Laicidade e ensino religioso no Bra-sil. Brasília: UNESCO; LetrasLivres; EdUnB, 2010.

MORAES, MARiA CândidA. Paradigma educacional emergente. COEB – VI

Congres-so de Educação Básica. Florianópolis. Fev. 2016. Disponível em: <http://docplayer.com. br/71012410-Paradigma-educacional-emergente.html>. Acesso em: 09 nov. 2018.

MORAES, MARiA CândidA; NAVAS, Juan Miguel Batalloso (Colab.).

Transdisciplinarida-de, criatividade e educação: fundamentos ontológicos e epistemológicos. Campinas: Papirus, 2015. (Coleção Práxis).

MORIN, Edgar. O método: a natureza da natureza. 18. ed. Tradução de Ilana Heineberg. Porto Alegre: Sulina, 2016.

MORIN, Edgar. Introdução ao Pensamento Complexo. 3 ed. Tradução de Eliane Lisboa. Insti-tuto Piaget, Lisboa, 2007.

(17)

MORIN, Edgar. Edgar Morin: ninguém sabe o dia que nascerá. Tradução: Maria Leonor F. R. Loureiro. São Paulo: Ed. da UNESP; Belém, UEPA, 2002.

MORIN, Edgar. Complexidade e transdisciplinaridade: a reforma da universidade e do ensino fundamental. Tradução: Edgard de Assis Carvalho. Natal: EDUFRN, 2000.

MORIN, Edgar; CIURANA, Emilio-Roger; MOTTA, Raúl Domingo. Educar na era planetá-ria: o pensamento complexo como método de aprendizagem pelo erro e incerteza humana. 3. ed. Revisão técnica da tradução de Edgard de Assis Carvalho. São Paulo: Cortez/UNESCO, 2009.

NICOLESCU, Basarab. O manifesto da transdisciplinaridade. Tradução: Lúcia Pereira de Souza. São Paulo: Triom, 1999.

OLIVEIRA, Lilian Blanck et al. Ensino Religioso no Ensino Fundamental. São Paulo: Cortez, 2007. (Coleção docência em formação. Série ensino fundamental).

PASSOS, João Décio; USARSKI, Frank (Orgs.). Compêndio de Ciência da Religião. São Paulo: Paulinas/Paulus, 2013.

PASSOS, João Décio; USARSKI, Frank. Ensino Religioso: construção de uma proposta. São Paulo: Paulinas, 2007. (Coleção temas do ensino religioso).

PONDÉ, Luiz Felipe. Em busca de uma cultura epistemológica. In: TEIXEIRA, Faustino (Org.). A(s) Ciência(s) da Religião no Brasil: afirmação de uma área acadêmica. São Paulo: Paulinas, 2008. p. 11-66.

SILVA, Cícero Lopes. Contribuições da metodologia transdisciplinar para a fundamentação do ensino religioso no contexto da escola laica. Dissertação (Mestrado em Ciências da Reli-gião) - Pontifícia Universidade Católica de Pernambuco, Recife, 2013.

SOARES, Afonso M. L. Religião e educação: da Ciência da Religião ao Ensino Religioso. São Paulo: Paulinas, 2010. (Coleção temas do ensino religioso).

Referências

Documentos relacionados

Να γραφεί πρόγραμμα για PLC με το οποίο να ελέγχεται η λειτουργία του παραπάνω κυλίνδρου... Σχήμα 1 :

Como metodologia, utilizou-se, levantamento bibliográfico, assim possibilitando o conhecimento sobre a importância da atuação do profissional de estética e cosmética

Mais recentemente foi introduzida a prevenção primária através das vacinas contra o HPV (Gardasil® e Cervarix®). Prevê- se que num futuro, a médio prazo, a diminuição

Através das análises, conclui-se, em um modo geral, que a realização dos eventos em Bonito é de grande importância para o fluxo turístico, pois através deles toda a cadeia

Na sequência da reconstrução da cidade de Lisboa depois do grande terremoto de 1755, foi identificado em 1771 um edifício termal público de época romana, usualmente conhecido

Assim como em italiano, dada a riqueza do paradigma verbal em espanhol, é possível usar o verbo na 2ª pessoa do singular com sujeito nulo como estratégia para a expressão do sujeito

seguido o fiscal interceptou a velhinha e, todas as vezes, o que ela levava no saco era areia. Diz que foi aí que o

Prática musical diversificada em grupo III – Vivência prática grupal direcionada às atividades de apreciação, execução e composição musical, utilizando os instrumentos