LEI nº 9.455/97
LEI DE TORTURA ESQUEMATIZADA
PREVISÃO CONSTITUCIONAL:
O bem jurídico tutelado pela Lei de Tortura é a dignidade da pessoa humana, protegendo a integridade física e mental, e a vida da vítima.
A CF prevê a dignidade da pessoa humana como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil. Além disso, o Brasil se obrigou a reprimir a tortura através de tratados internacionais.
“Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem co-mo fundamentos:
[...]
III - a dignidade da pessoa humana”.
“Art. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos se-guintes princípios:
[...]
II - prevalência dos direitos humanos”.
“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
[...]
III - ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante;
[...]
XLIX - é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral”.
O CRIME DE TORTURA SEGUNDO A LEI 9.455/97:
“Art. 1º Constitui crime de tortura:
I - constranger alguém com emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe sofrimento físico ou mental:
a) com o fim de obter informação, declaração ou confissão da vítima ou de terceira pessoa;
b) para provocar ação ou omissão de natureza criminosa; c) em razão de discriminação racial ou religiosa;
II - submeter alguém, sob sua guarda, poder ou autoridade, com emprego de violência ou grave ameaça, a intenso sofrimento físico ou mental, como forma de aplicar castigo pessoal ou medida de caráter preventivo.
Pena - reclusão, de dois a oito anos
§ 1º Na mesma pena incorre quem submete pessoa presa ou sujeita a medida de segurança a sofrimento físico ou mental, por intermédio da prática de ato não previsto em lei ou não resultante de medida legal”.
Conforme art. 1º da Lei de Tortura, haverá crime de tortura com o constrangimento sobre a vítima, mediante o emprego de violência ou grave ameaça, com a ocorrência de sofrimento físico ou mental, sendo imprescindível que esteja presente as finalidades previstas nos incisos I e II, pois, do contrário, estaremos diante de crimes comuns de lesão corporal ou ameaça.
Além disso, o sofrimento físico ou mental deverá ser intenso, o que demandará juízo de valor sobre o caso concreto
O §1º visou coibir, de forma específica, a tortura praticada dentro do sistema prisional (penitenciárias, CDP’s e medidas de segurança), pois, segundo estatísticas, eram os locais com maior incidência do crime de tortura.
OMISSÃO PENALMENTE RELEVANTE:
“§ 2º Aquele que se omite em face dessas condutas, quando tinha o dever de evitá-las ou apurá-evitá-las, incorre na pena de detenção de um a quatro anos”.
O §2º do art. 1º revela que o legislador resolveu dar tratamento diferenciado (privilegiado) ao garantidor omisso. Segundo o CP, quando a omissão é penalmente relevante (omissão imprópria ou crime omissivo por comissão), ou seja, nas hipóteses dos chamados
garantidores, aquele que se omite responde pelo resultado criminoso (mesmas penas de quem praticou a conduta). No caso da Lei de tortura, o garantidor omisso terá pena menor.
TORTURA QUALIFICADA:
“§ 3º Se resulta lesão corporal de natureza grave ou gravíssima, a pena é de reclusão de quatro a dez anos; se resulta morte, a reclusão é de oito a dezesseis anos”.
Tratam-se de hipóteses de crimes agravados pelo resultado, ou seja, crimes preterdolosos.
Com isso, o resultado mais grave deverá ser alcançado culposamente, pois, se doloso, haverá concurso de crime de tortura e os crimes de lesão corporal grave ou gravíssima, ou homicídio.
CAUSAS DE AUMENTO DE PENA:
“§ 4º Aumenta-se a pena de um sexto até um terço: I - se o crime é cometido por agente público;
II – se o crime é cometido contra criança, gestante, portador de deficiência, adolescente ou maior de 60 (sessenta) anos;
III - se o crime é cometido mediante sequestro”.
O §4º apresenta hipóteses de aumento de pena na tortura funcional, punindo-se com maior rigor o funcionário que se vale da condição de agente público para empregar a tortura; quando a vítima apresenta maior vulnerabilidade (criança, gestante, deficiente, adolescente ou idoso); ou, se o modus operandi se der por meio de sequestro.
EFEITO AUTOMÁTICO DA CONDENAÇÃO:
“§ 5º A condenação acarretará a perda do cargo, função ou emprego público e a interdição para seu exercício pelo dobro do prazo da pena aplicada”.
Diferentemente da Lei que pune o crime de Abuso de Autoridade, onde a perda do cargo é hipótese facultativa de sanção administrativa e penal (depende de fundamentação), na Lei de Tortura constitui efeito automático da condenação (não depende de fundamentação) a perda do cargo, função ou emprego público, bem como a proibição para o exercício de qualquer função pública pelo dobro da pena aplicada.
VEDAÇÃO A FIANÇA, GRAÇA OU ANISTIA:
“§ 6º O crime de tortura é inafiançável e insuscetível de graça ou anistia”.
Proíbe-se a liberdade provisória mediante o pagamento de fiança (mas não proíbe a liberdade sem fiança).
Além disso, veda-se a concessão das causas extintivas da punibilidade graça e anistia (valendo as mesmas considerações feitas quando do estudo da Lei nº 8.072/90).
REGIME INICIAL PARA O CUMPRIMENTO DA PENA:
“§ 7º O condenado por crime previsto nesta Lei, salvo a hipótese do § 2º, iniciará o cumprimento da pena em regime fechado”.
Segundo o §7º do art. 1º, o condenado pelo crime de tortura deverá iniciar o cumprimento da pena em regime fechado, com exceção do condenado por “tortura omissiva” (§2º).
Obs: Assim como na Lei nº 8.072/90, tal dispositivo sofre críticas por parte da doutrina, sob o fundamento de violação ao princípio da individualização da pena.
EXTRATERRITORIALIDADE DA LEI DE TORTURA:
“Art. 2º O disposto nesta Lei aplica-se ainda quando o crime não tenha sido cometido em território nacional, sendo a vítima brasileira ou encontrando-se o agente em local sob jurisdição brasileira”.
O art. 2º prevê nova modalidade de extraterritorialidade incondicionada (aplicação da Lei Brasileira para fatos praticados no estrangeiro, sem nenhuma condição).
A Lei de Tortura será aplicada a fatos praticados no estrangeiro quando a vítima for brasileira, ou, mesmo quando praticado contra estrangeiro ou brasileiro, o agente encontrar-se em local sob a jurisdição brasileira (ex: torturador que fugiu para o Brasil).
VIGOR:
“Art. 3º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação”.
Publicação no D.O.U. em 08/04/1997.
LEI DE TORTURA E ECA:
“Art. 4º Revoga-se o art. 233 da Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 - Estatuto da Criança e do Adolescente”.
Assim prescrevia o art. 233 do ECA:
“Art. 233. Submeter criança ou adolescente sob sua autoridade, guarda ou vigilância a tortura:
Pena - reclusão de um a cinco anos. § 1º Se resultar lesão corporal grave: Pena - reclusão de dois a oito anos. § 2º Se resultar lesão corporal gravíssima: Pena - reclusão de quatro a doze anos. § 3º Se resultar morte:
Pena - reclusão de quinze a trinta anos”.
Diego Luiz Victório Pureza Advogado.
Professor de Criminologia, Direito Penal e Legislação Penal Especial em diversos cursos preparatórios para concursos públicos.
Pós-graduado em Ciências Criminai. Pós-graduado em Docência do Ensino Superior
Pós-graduado em Combate e Controle da Corrupção: Desvios de Recursos Públicos. Palestrante e autor de diversos artigos jurídicos.