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Contributos para uma reflexão sobre a marcha do Processo Penal e sua maior celeridade (A)

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Contributos para uma reflexão sobre a marcha do Processo Penal e sua maior

celeridade (A)

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GRAVAÇÃO DE DEPOIMENTOS

Inegavelmente que o nosso Código de Processo Penal (CPP) é um óptimo diploma legal. Bem pensado e bem estruturado, não deverá ser alterado na sua essência sistemática. E muito menos em função deste ou daquele caso concreto.

Não é, por isso, sobre o sistema que nos propomos aqui reflectir.

Antes pretendemos ponderar alterações pontuais ao CPP na esteira das também pontuais alterações que a sua vigência (desde 1988) tem vindo a impôr. Sem precipitações e sempre com enormes cautelas, por forma a não adulterar o sistema e a não diminuir as garantias de defesa do arguido constitucionalmente previstas. Aqui, nesta comunicação, as alterações que queremos ver reflectidas são, desde logo, ao nível da celeridade processual.

As duas últimas grandes alterações ao CPP – introduzidas pela Lei n.º 59/98, de 25.08 e pelo DL n.º 320-C/2000, de 15 de Dezembro – tiveram já em vista esse objectivo da celeridade processual.

E, diga-se, com sucesso no que concerne às audiências de julgamento, cujos adiamentos foram drasticamente reduzidos, sobretudo em virtude das novas regras de notificações dos respectivos intervenientes, das novas regras de justificação de faltas e ainda em virtude de, por regra, a falta do arguido ter deixado de ser motivo desses adiamentos. O que, aliás, e curiosamente, teve por consequência a diminuição do número de faltas a julgamento, quer dos arguidos quer dos demais intervenientes processuais.

Foi um passo muito importante esse, como o demonstra o aumento exponencial de audiências de julgamento realizadas desde a entrada em vigor daquelas alterações.

Todavia, a prática continua a demonstrar que é necessário ir mais longe na celeridade processual.

Porque o número de processos é cada vez maior – é sempre muito maior a quantidade de processos criminais iniciados do que a dos concluídos anualmente – e, em consequência, o período de tempo necessário para concluir um processo é cada vez mais alongado. Com as terríveis consequências de todos conhecidas: o desânimo de Funcionários Judiciais, de Magistrados e de Advogados; a correspondente desmotivação e correlativa diminuição de produtividade e de eficácia; a “bola de neve” subsequente, a culminar com o total descrédito na justiça.

Assim, propomos neste Congresso da Justiça um conjunto de reflexões tendentes à obtenção de maior celeridade processual.

***

INQUÉRITO E INSTRUÇÃO:

Os artigos 275.º (autos de inquérito) e 296.º (auto de instrução) do CPP determinam que as diligências de prova realizadas no inquérito ou na instrução são reduzidas a auto.

Como é sabido, os inquéritos e as instruções – mais aqueles do que estas - são constituídos fundamentalmente por diligências de prova. E sobretudo pelo interrogatório do arguido, pelas declarações do assistente e das partes civis, e pelos depoimentos das testemunhas. Tudo sempre reduzido a auto escrito.

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O tempo despendido nessas diligências pelos Funcionários do Ministério Público (MP) e dos Juízos de Instrução Criminal, pelos respectivos Magistrados, pelos Órgãos de Polícia Criminal e pelos Advogados, quando admitida ou imposta (caso do defensor no interrogatório do arguido) a respectiva presença, é extremamente longo e trabalhoso.

Isso porque a diligência não se reduz apenas à identificação do declarante e às perguntas e respostas respectivas; isto é, a diligência não é só verbal. É também reduzida a escrito, com maior ou menor síntese. Esta redução a escrito é, normalmente, mais demorada do que a parte verbal da diligência e é sempre uma sua repetição; com maior ou menor súmula, mas sempre repetição.

Ora, a celeridade processual exigida nos dias de hoje não se compadece com repetições; porque repetição significa dobrar o tempo; e dobrar o tempo nesta matéria é desperdício de tempo.

É o que temos andado a fazer; a desperdiçar tempo nos inquéritos e nas instruções. Cada inquérito e cada instrução perduram, em regra, pelo tempo de dois inquéritos e de duas instruções. Porque se repetem por escrito os actos verbais.

Se se pudessem somar as horas despendidas com tais tarefas escritas, ao longo de um ano, em todos os tribunais portugueses, com toda a certeza que alcançaríamos vários milhões de horas.

Por isso, propomos que todos esses depoimentos, em inquérito e em instrução, sejam pura e simplesmente gravados. Não escritos.

Como sucede na fase de julgamento.

Logo que se iniciasse a diligência, passar-se-ia a gravar em fita magnética dupla tudo o que aí se passasse, desde a identificação do declarante até ao seu depoimento integral. Apenas os despachos e requerimentos seriam reduzidos a escrito no auto respectivo, aí se identificando também a fita magnética respectiva e a identificação das voltas respectivas (como sucede com a acta de audiência de julgamento).

Esta gravação deveria ocorrer no primeiro interrogatório judicial de arguido detido, em todos os demais interrogatórios de arguido (judiciais ou não judiciais), em todas as declarações tomadas ao assistente ou às partes civis, em todos os depoimentos de testemunhas e em todas as acareações.

Todas as demais diligências de prova, pela sua própria natureza (pense-se na prova pericial, na prova por reconhecimento, na reconstituição do facto, nos exames, revistas e buscas, nas escutas telefónicas), continuariam a ser reduzidas a escrito, como até aqui.

Por outro lado, e diferentemente do que sucede na audiência de julgamento, esta gravação não seria, em regra, transcrita, nem no inquérito, nem na instrução. Apenas três excepções: uma, nos casos de especial complexidade - a declarar pelo Juiz de instrução - e, mesmo assim, só se a autoridade judiciária que dirigir a fase do processo em causa entendesse indispensável a transcrição; outra, no caso de recurso interposto durante a instrução (aí, como na fase de julgamento, o tribunal procederia à transcrição de todas as diligências de prova gravadas durante o inquérito e a instrução); outra ainda, em caso de ser necessário extraír certidão de um qualquer depoimento.

Haveria, por isso, que alterar em conformidade os artigos 275.º e 296.º do CPP – que ordenam que aquelas diligências de prova sejam reduzidas a auto -, bem como o artigo 101.º, n.º 2, também do CPP, na parte que respeita à transcrição da gravação.

Da mesma forma, os artigos 271.º (declarações para memória futura, durante o inquérito) e 294.º (declarações para memória futura, durante a instrução) do CPP, haveriam de ser alterados de modo a prever apenas a gravação do respectivo depoimento, sem redução a escrito (salva a transcrição no final do julgamento, em caso de recurso).

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Só há, assim, que tirar todo o proveito da tecnologia. Se podemos gravar a diligência verbal, por que não fazê-lo?

Por que motivo haveremos de reduzi-la a escrito? Por ser mais cómoda a sua leitura do que a sua audição? Mas será que o é?

Mais: o que há de mais fiel do que uma gravação integral da diligência verbal? Uma sua súmula escrita? Muitas vezes sucede que quem redige o auto não consegue exprimir com clareza o depoimento do declarante. Todos sabemos que assim é.

Deste modo, os Magistrados do MP, os Juízes de instrução criminal e os Advogados, durante o inquérito e a instrução, em vez de ler, teriam de ouvir a gravação das diligências; para analisarem a existência ou inexistência de indícios, decidirem-se por uma acusação ou pronúncia, por um arquivamento ou não pronúncia, por esta ou aquela medida de coacção, ou para, fosse qual fosse o objectivo, analisarem os autos.

A fita magnética dupla destinar-se-ia, fundamentalmente, a ser disponibilizada aos Advogados que requeressem a confiança do processo e a garantir a salvaguarda da gravação em caso de extravio ou de anomalia de uma das gravações.

Por outro lado ainda, em inquérito, o interrogatório do arguido e a inquirição de testemunhas deveriam ser levados a cabo apenas pelos Magistrados do MP, sem possibilidade de delegação em funcionário ou em órgão de polícia criminal, à semelhança do que já sucede na fase da instrução – cfr. art. 290.º, n.º 2, do CPP. O MP realizaria essas diligências, gravando-as apenas. Não as reduzindo a escrito.

Esta imposição teria a vantagem da imediação da prova, ficando, em consequência, o procurador respectivo com conhecimento directo e imediato do teor daqueles depoimentos. O que, com a demais prova, lhe permitiria decidir-se pela acusação e/ou arquivamento do inquérito, pela promoção desta ou daquela medida de coacção, pela produção deste ou daquele meio de prova e pela realização deste ou daquele meio de obtenção de prova, sem necessidade, regra geral, de ouvir a gravação dos depoimentos. Bastar-lhe-ia actuar da mesma forma que ele próprio, os Advogados, e os Magistrados judiciais actuam no final da audiência de julgamento; o MP e os Advogados a fim de produzirem as respectivas alegações orais e os Juízes a fim de proferirem a correspondente sentença. Apenas num ou outro caso se imporia a audição da gravação para esclarecimento de qualquer dúvida ou para relembrar qualquer pormenor.

Sendo certo que o tempo despendido pelos Magistrados do MP nessas diligências seria muito mais reduzido do que hoje - porque não se procederia à redução a escrito daqueles depoimentos, sendo tudo oral e gravado, e porque o MP teve conhecimento directo e imediato dos depoimentos prestados. Haveria, por isso, que alterar em conformidade o artigo 270.º, do CPP, de modo a conferir-se ao seu n.º 1 uma redacção idêntica à usada no n.º 2 do artigo 290.º, do CPP.

Na instrução, o Juiz respectivo teria de ouvir a gravação dos depoimentos prestados em inquérito, mantendo competência exclusiva para proceder ao interrogatório do arguido e à inquirição de testemunhas – como estipula o n.º 2 do artigo 290.º, do CPP. Todavia, como acima se disse, também aqui seria imposta a gravação dos depoimentos, sem lugar à respectiva transcrição.

O Advogado, no inquérito e na instrução, teria também de proceder à audição das gravações daqueles depoimentos sempre que quisesse e pudesse ter acesso ao processo. Para o efeito, para além do acesso aos autos respectivos, ser-lhe-iam disponibilizadas, por prazo a fixar pela autoridade judiciária respectiva, as fitas magnéticas (um dos duplicados) contendo a gravação dos depoimentos prestados em inquérito e/ou em instrução.

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Em consequência de todo o exposto, também os artigos 356.º e 357.º, do CPP, deveriam ser alterados por forma a que aí se fizesse referência não apenas à LEITURA de anteriores declarações, mas igualmente à audição das supra mencionadas gravações.

Obviamente que, fazendo parte integrante do processo, as fitas magnéticas gravadas em inquérito e em instrução acompanhá-lo-iam sempre.

Estamos convencidos que esta é uma boa solução para resolver a lentidão da marcha processual penal. Porque se reduz sempre em metade o tempo gasto até aqui, nos inquéritos e nas instruções, com os depoimentos de arguidos, assistentes, partes civis e testemunhas.

Sabemos, porém, que não será fácil implementá-la, sobretudo pela dificuldade que muitos de nós temos na adaptação à inovação.

Recorde-se, todavia, que foram muitos e longos os anos necessários até que se aceitasse a gravação da prova produzida em audiência de julgamento. E hoje tudo é, em regra, gravado.

Não tenhamos medo da inovação e lembremo-nos sempre que os tribunais existem para servir o cidadão comum e não as comodidades de cada um de nós. E se, de quando em quando, para ganharmos tempo - estamos convencidos que muito tempo mesmo - fôr preciso ouvir “cassetes”, pois ouçamo-las. Todos teremos a ganhar.

Porto, 08 de Agosto de 2003.

Rui da Silva Leal – Filho, Vice-Presidente do Conselho de Deontologia do Porto da Ordem dos Advogados

Contributos para uma reflexão sobre a marcha do Processo Penal e sua

maior celeridade (B)

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INSTRUÇÃO

Uma das muitas causas de atrasos processuais é a fase da instrução.

No final do inquérito, haja acusação ou arquivamento, é sempre possível a existência de instrução. Consoante os casos, a requerimento do arguido ou do assistente.

E muitas vezes, há que admiti-lo, a instrução é requerida pelo arguido apesar de se saber que a decisão instrutória só muito dificilmente será diferente do despacho final de inquérito. Porque é patente a suficiência de indícios resultante do inquérito; porque a instrução, como o inquérito, e como os Senhores Juízes de instrução não se cansam de afirmar, é uma fase meramente indiciária; porque, sendo assim, não carece a instrução das certezas e da segurança que se exige na fase de julgamento.

Por outro lado, e sempre na perspectiva do arguido, se a instrução tem por finalidade sindicar judicialmente a decisão final do inquérito, que melhor meio e local para fazê-lo do que a audiência de julgamento?

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Dir-se-á que a sujeição a julgamento resulta sempre em vexame, em humilhação do arguido. Será. Mas não será também assim na instrução? Com a agravante de que o arguido requerente da instrução, em caso de pronúncia, sujeita-se não só à instrução como também ao julgamento...

PROPOMOS, POR ISSO, A RESTRIÇÃO DA FASE DA INSTRUÇÃO, QUANDO REQUERIDA PELO ARGUIDO, A DOIS ÚNICOS CASOS:

- NOS CRIMES PÚBLICOS PUNÍVEIS COM PENA DE PRISÃO DE MÁXIMO IGUAL OU SUPERIOR A OITO ANOS, relativamente a factos pelos quais o MP tiver deduzido acusação;

- NOS CRIMES PARTICULARES, relativamente a factos pelos quais o assistente tiver deduzido acusação particular NÃO ACOMPANHADA PELO MP.

Assim, ficaria vedado ao arguido requerer a abertura da instrução nos seguintes casos:

- Em qualquer caso de arquivamento do inquérito, obviamente;

- Nos crimes particulares em que o assistente tivesse deduzido acusação particular acompanhada pelo

MP;

- Em todos os crimes semi-públicos;

- Em todos os crimes públicos puníveis com pena de prisão de máximo inferior a oito anos.

Haveria, assim, que alterar em conformidade o artigo 287.º, do CPP.

Deste modo, restringidos fortemente os casos de abertura da instrução pelo arguido, passar-se-ia de imediato do inquérito com acusação para a fase do julgamento. Sem que as garantias de defesa do arguido saíssem minimamente beliscadas, uma vez que, em julgamento, terá sempre a possibilidade e a oportunidade de apresentar a sua defesa, a sua prova, a sua argumentação. Mais: normalmente com melhores garantias de sucesso, por não ter aberto o jogo antecipadamente, em instrução...

Lograr-se-ia, assim, inegavelmente, maior celeridade processual.

Em simultâneo, libertar-se-ia um grande número de juízes de instrução que poderiam desempenhar outras funções noutros tribunais.

Porto, 10 de Agosto de 2003 Rui da Silva Leal – Filho

Vice-Presidente do Conselho de Deontologia do Porto da Ordem dos Advogados

Referências

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