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O QUE FAZER QUANDO AS FÁBRICAS NÃO FECHAM? BALANÇO DAS POLÍTICAS PARA A PROMOÇÃO DO COOPERATIVISMO NA VENEZUELA

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O QUE FAZER QUANDO AS FÁBRICAS NÃO FECHAM?

BALANÇO DAS POLÍTICAS PARA A PROMOÇÃO

DO COOPERATIVISMO NA VENEZUELA

Área 4) Capitalismo Contemporâneo, Socialismo e Economia Solidária

Henrique T. Novaes hetanov@ige.unicamp.br

Paulo A. de Lima Filho palf@uol.com.br Instituto Brasileiro de Estudos Contemporâneos

Resumo

Este artigo pretende avaliar, ainda que provisoriamente, as políticas cooperativistas que vem sendo implementadas pelo governo de Hugo Chávez. Como ponto de partida, observamos as estratégias adotadas pela classe trabalhadora e pelos governos da Argentina, Brasil e Uruguai quando as fábricas fecharam. Em contraposição àquele momento de efervescência social e fechamento de inúmeras fábricas, a América Latina presencia hoje um quadro de relativo crescimento econômico. Disto decorre nossa pergunta: O que fazer então quando as fábricas não fecham? Para dar uma resposta a esta questão, nos reportamos às políticas que vem sendo implementadas pelo governo chavista para promover o cooperativismo de trabalhadores e comparamos brevemente com as políticas de Lula e Kirchnner. Apesar de requerer um maior volume de pesquisas, nos parece que a tendência das políticas cooperativistas do governo brasileiro e argentino é a o do não comprometimento com uma proposta de transformação substantiva da sociedade, significando muito mais uma experiência de contenção social. Como iremos ressaltar, isso não decorre do papel dos Ministérios que impulsionam o cooperativismo, mas da tendência destes governos que ainda atribuem um papel pouco estratégico ao cooperativismo de trabalhadores. Enquanto isso, na Venezuela a promoção do cooperativismo parece estar inserida numa ótica de

desenvolvimento endógeno.

Palavras-chave: Cooperativismo, Movimentos de Fábricas Recuperadas, Argentina, Brasil, Uruguai, Venezuela

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Introdução

Este artigo pretende analisar, ainda que provisoriamente, as políticas que vem sendo adotadas na Venezuela para promover a criação de cooperativas de trabalhadores. Para tanto, resolvemos partir do seguinte questionamento: O que fazer quando as fábricas não fecham?i

Sabendo que muitas fábricas no Brasil, Argentina e Uruguai foram arrendadas ou adquiridas pelos trabalhadores quando fecharam ou foram abandonadas, sendo, portanto, uma política implementada pela classe trabalhadora em momentos de crise, nosso objetivo é observar de que forma o Governo venezuelano vem tratando o tema do cooperativismo num contexto onde poucas fábricas fecham.

No entanto, antes de analisar o caso Venezuelano, acreditamos que era imprescindível retratar brevemente os casos de recuperação de fábricas pelos trabalhadores na América Latina, para depois descrever o que vem sendo feito na Venezuela.

Como suporte teórico para o debate, procuramos sistematizar a análise de István Mészáros sobre autogestão, principalmente nos seus dois principais livros: Para além do capital e O poder da ideologia. Mészáros, se pautando nas experiências históricas e na teoria marxista da possibilidade de uma transição socialista, nos ajuda a compreender os dilemas de uma radical transformação social e a necessidade de se trabalhar com a noção de ataques duplos para se implementar a autogestão. Encerramos o artigo com algumas conclusões.

O que fizeram os trabalhadores quando as fábricas fecharam?

Diversas foram as formas de luta da classe trabalhadora num contexto de fechamento de fábricas no Brasil, Argentina e Uruguai nos últimos 25 anos. Acreditamos que as Fábricas Recuperadas (FRs) surgiram num contexto de crise estrutural do capital. Aquilo que aparece nos jornais argentinos, brasileiros e uruguaios como sendo uma crise violenta, porém conjuntural, é vista por Mészáros (2002) como uma “crise estrutural do capital” (isso não significa dizer que o capital se autodestrua), que abrange a periferia e o centro do capitalismo. É neste contexto de crise estrutural que surgem na Argentina os piqueteiros, as assembléias de bairro, os ahorristas damnificados, os clubes de troca e nos três países as FRs e as cooperativas popularesii.

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No entanto, faz necessária uma advertência. Mesmo sabendo que o objetivo primordial das FRs seja a defesa dos postos de trabalho, elas não são uma resposta automática às condições macroeconômicas dos anos 1990, mas também o resultado de um novo contexto, de um novo clima político social e de uma crise estrutural do capital. Na Argentina, as FRs surgem como cooperativas de necessidadeiii, empresas de porte médio e pequeno que surgem de um processo de encolhimento e esvaziamento das fábricas no fim dos anos 1990 e início do século, que se acentuou com a crise de 2001 (FAJN et al., 2003, p. 65). Mais precisamente, trata-se de um novo fenômeno social ou num novo método desenvolvido pelas classes trabalhadoras argentina, brasileira, uruguaia etc que é o resultado de uma mistura de clima social e uma saída para trabalhadores que não encontravam mais na luta sindical tradicional uma saída para sua reprodução social (MURÚA;ABELLI, 2004). Cruz (2006) parece concordar conosco sobre o surgimento desta novidade na história da América latina quando afirma que

(...) o surgimento de milhares de iniciativas econômicas de tipo associativo – cooperativas, associações, empresas recuperadas, instituições comunitárias de crédito, clubes de trocas etc. – no Cone Sul da América Latina, a partir dos anos 90, representa a emergência de um fenômeno econômico e social que, embora guarde estreitas relações com experiência anteriores, tem características específicas, que resultaram das transformações ocorridas nas últimas décadas, tanto da economia quanto da sociedade latino-americana (CRUZ, 2006, p.1).

Frente a este novo contexto, muitos trabalhadores destes países optaram por ocupar fábricas, reivindicar a expropriação definitiva dos meios de produção, repartição igualitária do excedente e instalação de mecanismos de decisão parlamentarista no seio da unidade produtiva.

Não podemos esquecer que o ato de recuperar a fábrica significa para o trabalhador recuperar algo no qual ele se sente participante, que ajudou a construir, que faz parte da sua história de vida. Não é preciso dizer que muitos trabalhadores viveram um grande período de escravização promovido pelo antigo dono durante o processo anterior à falência. Verificou-se através do relato de trabalhadores que eles apenas recebiam o dinheiro para o passe de ônibus durante meses, sem qualquer perspectiva de ver seu salário de volta.

Um problema que apareceu à academia como essencialmente defensivo, sendo o resultado de uma crise avassaladora do desemprego, desvela uma realidade e nos leva a pensar nas FRs como sendo um fato histórico que enseja um olhar muito mais

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amplo do que uma simples questão de emprego, mas também no tema da alienação do trabalho (BIALAKOWSKY, 2004; NOVAES, 2005a).

Na Argentina, as empresas recuperadas abrangem campos que não encontramos no Brasil: Clínicas de exame, Hospitais, Supermercados, Escolas e somam um total aproximado de 180 fábricas e 12000 trabalhadores. No Uruguai, as FRs devem girar em torno de 20iv. Na Argentina, é preciso ressaltar que muitas dessas fábricas operam hoje com 1/5 dos trabalhadores dos tempos gloriosos. Metade das 87 empresas investigadas por Fajn et al. (2003) tem menos de 30 empregados e 25% mais de 70.

No Brasil, a Secretaria Nacional de Economia Solidária (SENAES - Ministério do Trabalho e Emprego) já iniciou o mapeamento da quantidade de FRs e os setores que elas pertencem. Até a presente data, não conseguimos obter uma informação precisa quanto ao número de FRs sobreviventes no Brasil, mas deve girar em torno de 150. Cabe esclarecer também que, assim como na Argentina e Uruguai, no Brasil a grande maioria das FRs está no setor metalúrgico, no setor têxtil e de calçadosv. Dentre as pesquisas realizadas até o momento, verificamos duas tendências. De um lado, alguns pesquisadores afirmam que tudo mudou depois do arrendamento ou aquisição dos meios de produção. No outro extremo, há uma linha argumentativa que afirma que nada mudou, pois as FRs estão diante do sistema produtor de mercadorias e a relação capital-trabalho se reproduz dentro de todas as empresas, sejam elas de trabalhadores ou de patrões.

Se os primeiros ignoram os entraves para a emancipação humana que a não generalização da expropriação dos expropriadores representa. Se também subestimam a impossibilidade de redirecionar a produção para a satisfação das necessidades humanas ocupando apenas algumas poucas fábricas, o segundo grupo de pesquisadores fecha os olhos para as possibilidades que os Movimentos de FRs têm de dissolver o caráter de mercadoria da força de trabalho.

Na mesma linha, aqueles que têm como proposta a tomada do poder, não percebem que o capital não se extingue subitamente, por decreto. Enquanto isso, aqueles que não caem na falácia do enquanto não tomarmos o poder, nada mudará, nos mostram as permanências e mudanças nas FRs, mas tendem a adotar uma visão microscópica da realidade social.

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Uma boa via argumentativa para resolver estes problemas parece ser a de Gaiger (2002). De acordo com este pesquisador, as formas de produção da ES são atípicas porém podem conviver - sem abalar - o capitalismo (GAIGER, 2002).

Gaiger também afirma que há na ES algumas peculiaridades que as diferenciam dos empreendimentos capitalistas convencionais. Segundo Gaiger (2002), as relações sociais de produção dos empreendimentos solidários não são apenas atípicas em relação ao modo de produção capitalista, mas contrárias à forma social de produção assalariada. Nesta, o capital emprega o trabalho, naqueles, os trabalhadores empregam o capital. Para Gaiger, a ES não reproduz em seu interior as relações capitalistas, mas tampouco elimina ou ameaça a reprodução da forma tipicamente capitalista. Para ilustrar e desenvolver sua argumentação, este pesquisador cita o exemplo dos assentamentos rurais: “a socialização da terra e do trabalho, quando em graus avançados, rompe com a lógica e a tradição da pequena produção familiar e introduz vínculos de outra natureza” (GAIGER, 2002, p.9).

Há, portanto, uma modificação da forma social de produção, porém, a “base técnica permanece intocada ou superficialmente inalterada. Para os pequenos produtores rurais integrados a agroindústria e para as empresas falidas, a única saída é adotar a base material moderna oferecida como mercadoria e curvar-se ao capital comercial e financeiro (GAIGER, 2002). Estes empreendimentos não se reproduzem sob uma base material nova, mas sim sob uma base subsumida. É isso que Gaiger chama de “subsunção formal inversa”, uma forma de reprodução que deixa as formas sociais atípicas em situação de “instabilidade, mas não descredencia de todo a sobreviverem no interior do modo de produção capitalista” (GAIGER, 2002, p.10). Em nossa pesquisa, retratamos as FRs da Argentina, Brasil e Uruguai e chegamos às seguintes conclusões: apesar de inseridas no sistema produtor de mercadorias e tendendo a reproduzir as relações de trabalho herdadas, as FRs promoveram processos de mudanças nos âmbitos:

a) software: mudanças de natureza cultural ligadas à repartição do excedente (isto é, retiradas mais próximas ou igualitárias), adequação parcial da fábrica aos interesses dos trabalhadores, apropriação do conhecimento do processo produtivo sem modificação da divisão do trabalho; b) orgware: apropriação do conhecimento do conhecimento do processo produtivo com modificação da divisão do trabalho; c) hardware: aquisição de maquinário, adaptações e repotenciamento.

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As FRs observadas, embora tenham promovido processos que se inserem na tipologia de sete modalidades de Adequação Sócio-Técnica propostas na metodologia desenvolvida na pesquisa, parecem encontrar obstáculos devido:

a) à naturalização da organização do processo de trabalho pelos cooperados, b) ao fetiche da tecnologia, que leva a que se acredite que a última tecnologia é sempre a melhor e se ignore o caráter relacional da tecnologia, e c) ao tempo necessário para uma transformação significativa das forças produtivas e da forma de repartição do excedente e d) à não generalização da expropriação dos expropriadores (NOVAES, 2005d)vi.

O que fazer quando as fábricas não fecham? o caso venezuelano

Se é verdade que a ocupação de fábricas é um novo fenômeno social ou num novo método desenvolvido pela classe trabalhadora sendo o resultado de uma mistura de clima social e uma opção para trabalhadores que não encontravam mais na luta sindical tradicional uma saída para sua reprodução social, quais devem ser então as políticas adotadas em momentos de crescimento econômico e geração de postos de trabalho alienantes?

Para não dar respostas abstratas a esta questão, procuraremos avaliar preliminarmente as políticas para o cooperativismo que vem sendo implementadas pelo Governo Bolivariano de Hugo Chávez, ou seja, pelo Estado.

Como vimos, o motor que impulsionou – num primeiro momento – a tomada das fábricas argentinas, brasileiras e uruguaias quando estas fechavam ou estavam na iminência de fechar foi a possibilidade de nunca mais ter um emprego, o abandono das fábricas pelos antigos patrões e o clima de inquietação social. Nestes casos, as propostas surgiram num explícito conflito com os antigos patrões e com o Estado, que fizeram de tudo para impedir o controle operário das fábricas. No que se refere às políticas para o cooperativismo de trabalhadores, conforme veremos a seguir, nestes países a proposta surgiu claramente como forma de conter o desemprego em massa.

Na Venezuela está se conformando uma nova forma de relação Estado-Movimentos Sociais, bem diferente da esboçada nestes outros países. Isso pode ser visto nas ações deliberadas de expropriação de empresas (e terras improdutivas), simbolizando uma política explícita que facilita a luta dos movimentos sociais. Ao

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nosso ver, a diferença fundamental é que na filosofia de Chávez está implícita uma antecipação ao fechamento das fábricas e um diálogo maior com os trabalhadores que buscam a estatización bajo control obrerovii. Isso não significa, ao contrário do que se pensa, que a relação entre os trabalhadores e o governo de Chávez não esteja cheia de contradições.

Quanto à criação de novos empreendimentos sob a ótica do cooperativismo popular, ainda que o pano de fundo também seja a geração de trabalho e renda (e não a amenização do desemprego como no Brasil e Argentina), esta se dá dentro da proposta de desenvolvimento endógeno.

Podemos concluir então que o cooperativismo é o núcleo central do novo modelo de desenvolvimento endógeno proposto por Chávez enquanto que no Brasil e na Argentina as políticas para o cooperativismo fazem parte de uma agenda de contenção do desemprego e não ocupam lugar de destaque na proposta dos governos Lula e Kirchnner.

Breve histórico da Venezuela

Não é possível falar da Venezuela sem dar atenção especial ao papel do petróleo na economia daquele país. Antes da subida de Chávez, o petróleo era considerado um bem privado abocanhado pelas elites deste país. Se antes o petróleo inibia o desenvolvimento de outras atividades produtivas, com Chávez verifica-se uma mudança de rota, ao torná-lo um bem público ao investir uma parte significativa do excedente na área social (MARINGONI, 2002).

Ainda de acordo com Maringoni, o novo do governo Chávez é que ele quer transformar o petróleo numa riqueza pública. E isso a elite econômica não quer permitir, daí o golpismo de 2002 (MARINGONI, 2004)viii.

De acordo com Rattner (2005),

a impopularidade de Chávez entre a burguesia e a classe média de seu próprio país é decorrente de um conjunto de programas sociais, financiados com os lucros da estatal petrolífera PDVSA, decorrentes da elevação constante dos preços de petróleo no mercado mundial, a partir do segundo semestre de 2004. Essas atividades sociais, denominadas “missões”, são orientadas para a mobilização e conscientização das comunidades carentes através de conselhos, consultas populares e orçamentos participativos (RATTNER, 2005, s/nº) .

Rattner acredita que, dentre essas missões, “merece destaque especial a integração entre esta iniciativa e o programa de preparação para a economia solidária e a formação de cooperativas nas quais são aproveitados recursos humanos

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previamente preparados pelas “missões” educativas e, em seguida, orientados para o desenvolvimento local” (RATTNER, 2005, s/nº).

Ainda não se sabe se efetivamente se trata de uma revolução bolivariana rumo ao socialismo tal como vem sendo pronunciada, ou se teremos um “socialismo cristão” (CHÁVEZ, Roda Viva, 3 de outubro de 2005). Poderão criar também uma variante de um capitalismo popular, de um capitalismo humanizado (uma contradição em termos), de um capitalismo coletivo, ou a criação de um inédito Estado do Bem-Estar na América Latina. Ainda assim, ocorreu de fato uma revolução política, democrática e popular, dentro da ordem do capital e contra a velha ordem deste, que aponta para níveis crescente de controle social sobre aquele. Um bom objeto de pesquisa seria qualificar a evolução desse controle.

De qualquer forma, é significativo o aumento do orçamento nas áreas sociais; o incentivo à organização e à participação popular; além da prática diária de transformação da riqueza petroleira com um bem do povo venezuelano e não de uma pequena elite como historicamente foi (MARINGONI, 2004).

Maringoni acredita que o processo político venezuelano não conta com uma organização social tão desenvolvida como a do Brasil; mas tem características próprias. O que eles estão fazendo é o que classicamente se chamava de uma revolução a partir do alto. Eles tentam, a partir da conquista do governo federal, impulsionar as transformações sociais (MARINGONI, 2004).

Mesmo sem saber em detalhes como vem sendo implementadas as políticas estatais como um todo, nos parece que as políticas para promoção do cooperativismo de trabalhadores acontece num ambiente de transformação social através da combinação de políticas que vem de cima (Estado) com as políticas de baixo (dos movimentos populares), o que nos permite minimizar a afirmação de Maringoni sobre a transformação vinda do alto, ao menos para o caso do cooperativismo. É este o tema da próxima seção.

Políticas de expropriação e estímulo ao cooperativismo

Em janeiro de 2005, Chávez expropriou a antiga fábrica de papel e celulose Venepal. Da falência desta empresa, da pressão dos trabalhadores e da decisão do Estado de recuperá-la sob co-gestão por motivos de interesse público, surgiu a Invepal. Trata-se de uma empresa que se tornou estatal, onde seus trabalhadores que agora integram a Cooperativa de Industria y Papel (Covinpa), administrarão as

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ações, junto com os Ministérios do Trabalho, Economia Popular e Finanças (51% do capital provém do Estado e 41% da cooperativa dos trabalhadores). Recentemente o governo deste país anunciou a intenção de expropriar mais 700 fábricas que estão improdutivas ou trabalhando muito abaixo de sua capacidade.

Outra forma de promoção do cooperativismo que vem sendo implementada no Governo de Chávez é através das compras do Estado. Ao utilizar as demandas do Estado, Chávez parece sinalizar com a democratização dos fundos públicos, antes destinados apenas a pequenas parcelas do empresariado nativo e transnacional. Rattner (2005) dá destaque a uma outra missão. Além da educação para o desenvolvimento local (citada nas linhas acima) e a missão para a saúde, há uma outra missão que ganhou o nome de Mercal. Para ele, esta missão procura

assegurar o acesso da população a uma alimentação básica sadia. Isso se dá através da criação de uma ampla rede de lojas que atendem milhares de consumidores de baixa renda, com frutas e verduras plantadas em hortas comunitárias. A melhoria da segurança alimentar – e conseqüentemente da saúde - anda de mãos dadas com a geração de renda local. Essa preocupação com a população desempregada e os jovens egressos das escolas resultou também na formação de cooperativas de costura, de fabricação de calçados e de hortas para abastecer com verduras e frutas as escolas e creches (RATTNER, 2005, s/nº).

É evidente que está havendo a criação quantitativamente significativa de cooperativas na Venezuela. Resta saber sobre as possibilidades de auto-sustentação destas cooperativas, pois verificamos, tomando por base as políticas implementadas na Prefeitura de São Paulo (Marta Suplicy, entre os anos 2000-2004), que logo após a mudança do partido que assumiu, a grande maioria das cooperativas criadas naquele governo desvaneceu-seix.

A política adotada nas Incubadoras de algumas regiões da Venezuela também parece ser um exemplo claro de privilégio para a geração de trabalho pela via coletiva. Se antes não havia nenhuma prioridade para a Incubação de cooperativas, agora, algumas províncias somente incubam cooperativas.

Alguns leitores, bem informados sobre as políticas para a criação de Incubadoras de Cooperativas no Brasil, devem estar dizendo que no Governo Lula tivemos um crescimento substancial do número de Incubadoras de Cooperativas. Mais uma vez, temos a impressão que os programas de Incubação de Incubadoras bem como o financiamento para a Incubação de Cooperativas, apesar de ter se tornado uma política, ainda não se transformou numa ação-chave deste governo.

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Isso pode ser visto nas declarações e na desconfiança que alguns policy-makers anunciam sobre a Incubação de Cooperativas. Ao nosso ver, a Política Científica e Tecnológica central do Ministério da Ciência e Tecnologia brasileiro ainda está alicerçada na construção de Parques e Pólos Tecnológicos , o que evidencia mais uma vez que a Incubação de Incubadoras de Cooperativas e a Incubação de Cooperativas é uma política menor, jogada para escanteiox.

Ainda sobre o caso brasileiro, verificamos o papel ainda pouco estratégico que o governo de Lula vem dando ao cooperativismo. Um sintoma bem claro da pouca relevância que Lula atribui ao cooperativismo é a forma como foi criada a Secretaria Nacional de Economia Solidária (SENAES), 4 meses depois do 1º dia de Governo. Ao que tudo indica, esta Secretaria somente foi criada devido à pressão (de baixo) do movimento de Economia Solidária. Trata-se de uma pedra proto-socialista num colar declaradamente pró-capitalista.

É necessário ressaltar que ainda que não concordemos com muitas das posições do secretário Paul Singerxi, trata-se de um fiel defensor do cooperativismo popular, inclusive dentro de uma ótica socialista, algo que parece não se repetir em outras esferas deste governo. Evidentemente, tanto no Brasil quanto na Argentina o cooperativismo não está sendo impulsionado pela ausência de política dos Ministérios do Trabalho, mas pela pouca importância atribuída a este no quadro de direita popular ou, no máximo, de social-democracia tardia que se configura em alguns ministérios mais à esquerda.

Ao contrário disso, na Venezuela, é certo que a criação de cooperativas de trabalhadores é uma política central e estratégica do processo de desenvolvimento endógeno. Não só devido à larga escala e o grau de abrangência da política, mas também pelo papel atribuído ao cooperativismo na construção de uma nova sociedade. Ao que tudo indica, as políticas cooperativistas vem contribuindo para a satisfação das necessidades de produção e consumo do povo venezuelano. Não queremos, com isso, tomar o Governo de Chávez como uma espécie de modelo nem ignorar a dificuldade de fazer definhar o sociometabolismo do capital (conforme veremos na argumentação de Mészáros), mas salientar que o cooperativismo pode entrar em diferentes propostas de sociedade, sendo a de Lula e Kirchnner a de contenção social e a de Chávez como uma proposta de revolução política democrático-popular.

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Podemos representar simbolicamente de que forma se dá a combinação entre as políticas gerais ou macro do Brasil, Argentina e Venezuela. Se no Brasil e na Argentina há pequenos vetores que impulsionam o cooperativismo de trabalhadores e estes são anulados pelas macro-políticas das outras esferas do Governo, na Venezuela, parece que não há oposição entre o que promove o Ministério da Economia Popular e as demais políticas do governo chavista.

Contribuições de István Mészáros para o debate: a necessidade de ataques duplos

A obra de Mészáros é uma boa contribuição para a dialética da autogestão num contexto histórico social onde não há a generalização da expropriação dos expropriadores ou, para o nosso caso, quando as fábricas não fecham nem são tomadas pelos trabalhadores.

A visão de Mészáros sobre as políticas necessárias a uma possível transição socialista para além do capital não pode ser compreendida sem se observar que sua proposta de mudança global tem por objetivo não só o fim do capitalismo, como sugerem os autores da ES, mas o fim do sistema sóciometabólico do capital. Para Mészáros, o programa de superação prática da alienação capitalista poderia ser concretizado como a substituição dos instrumentos incontroláveis e reificados do capitalismo por instrumentos controláveis de intercâmbio humano. Mas essa é uma tarefa sócio-histórica que requer um longo prazo de maturação onde se deve considerar a possibilidade de reversões (MÉSZÁROS, 1981)xii.

Segundo Mészáros, é impossível divisar uma ordem reprodutiva socialista viável mantendo-se as formas existentes e as camadas de complexidades mistificadoras do sistema do capital. A idéia de que “a microeconomia” poderia e deveria ser, com segurança, entregue à fetichizada e desumanizadora tirania do mercado, regulando adequadamente, ao mesmo tempo, a “macroeconomia”, sob o slogan de um “socialismo de mercado” fictício, é totalmente incoerente como concepção e totalmente desastrosa como política prática, seja “à la Iugoslávia” ou “à la Gorbatchev” ou de qualquer outra forma” (MÉSZÁROS, 2002, p. 931). A aceitação desta idéia significa apenas a renúncia total à possibilidade de que os seres humanos possam, um dia, controlar a incontrolabilidade do sistema do capitalxiii.

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Chamando a atenção o fato de que a expropriação dos expropriadores “deixa em pé a estrutura do capital”, Mészáros afirma que a questão fundamental é o “controle global do processo de trabalho pelos produtores associados, e não simplesmente a questão de como subverter os direitos de propriedade estabelecidos” (MÉSZÁROS, 2002, p.628). Ou ainda, que a expropriação dos expropriadores é apenas um pré-requisito, não significando quase nenhuma alteração no que se refere à necessidade do controle global do processo de trabalho pelos produtores associados (MÉSZÁROS, 2002, p. 628)xiv.

Mészáros critica os equívocos da esquerda cooperativista, pois esta não se atentou para a necessidade de promover ataques duplos ao sistema sociometabólico do capital. Vejamos:

De fato, nada é realizado por mudanças – mais ou menos facilmente reversíveis – apenas dos direitos de propriedade, como testemunha amplamente a história das “nacionalizações”, “desnacionalizações” e “privatizações” no pós-guerra. Mudanças legalmente induzidas nas relações de propriedade não têm garantia de sucesso mesmo que abarquem a ampla maioria do capital privado, quanto mais se se limitarem à sua minoria falida. O que necessita radicalmente ser alterado é o modo pelo qual o “microcosmo” reificado da jornada de trabalho singular é utilizado e reproduzido , apesar de suas contradições internas, através do “macrocosmo” homogeneizado e equilibrado do sistema como um todo (MÉSZÁROS, 2002, p. 629).

Mészáros enfatiza que as relações capitalistas de propriedade representam não mais que o pré-requisito material e as garantias legalmente sancionadas à articulação substantiva desse complexo global de reprodução sociometabólica. É este complexo que necessita de uma reestruturação radical, de tal modo que um “macrocosmo” qualitativamente diferente e conscientemente controlado possa ser erigido a partir das autodeterminações autônomas de “microcosmos” qualitativamente diferentes.

A relação de troca à qual o trabalho está submetido não é menos escravizante que a separação e a alienação das condições materiais de produção dos trabalhadores. Ao reproduzir as relações de troca estabelecidas em uma escala ampliada, o trabalho pode apenas multiplicar o poder da riqueza alienada sobre ele próprio (MÉSZÁROS, 2002). E ele prossegue:

A triste história das cooperativas nos países capitalistas, apesar de suas genuínas aspirações socialistas no passado, é eloqüente a esse respeito. Mas mesmo a estratégia de subverter as relações de propriedade de capitalismo privado pela “expropriação dos expropriadores” pode, sem a reestruturação radical das relações de troca herdadas, apenas arranhar a superfície, deixando o capital nas sociedades pós-capitalistas – ainda que

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numa forma alterada – no controle pleno do processo de reprodução. Deste modo, nada pode ser mais absurdo do que a tentativa de instituir a democracia socialista e a emancipação do trabalho a partir do fetichismo escravizador do “socialismo de mercado” (MÉSZÁROS, 2002, p. 629). Neste sentido, Mészáros acredita que a possibilidade de uma modificação inclusive das menores partes do sistema do capital implica a necessidade de ataques duplos, constantemente renovados, tanto às “células constitutivas ou “microcosmos” (isto é, o modo pelo qual as jornadas de trabalho singulares são organizadas dentro das empresas produtivas particulares) com os “macrocosmos” auto-regulantes e aos limites estruturais auto-renovantes do capital em sua inteireza” (MÉSZÁROS, 2002, p.630 – grifos no original)xv.

Para teorizar sobre a dialética da parte e todo e sobre a necessidade de ataques duplos, Mészáros se apóia na crítica de R. Luxemburgo a Bernstein. Para esta pensadora, o problema das cooperativas não está na falta de disciplina dos trabalhadores, tal como advogava Bernstein. A contradição das cooperativas é que elas têm que governar a si mesmas com o mais extremo absolutismoxvi. Nelas, os trabalhadores são obrigados a assumir o papel do empresário capitalista contra si próprios – uma contradição que responde pelo fracasso das cooperativas de produção, que ou se tornam puros empreendimentos capitalistas ou, se os interesses dos trabalhadores continuarem predominando, terminam por se dissolver. Para Mészáros, sob o capitalismo, a disciplina - “regime absolutista natural do capitalismo” - é impiedosamente imposta ao trabalho pelo autoritarismo do local de trabalho e pela tirania do mercado (incluindo, claro, o mercado de trabalho). O impulso de impor emana dos imperativos expansionistas de produção do capital, e deve prevalecer a todo custo, não importa o quanto sejam desumanas e deformadoras as conseqüências (MÉSZÁROS, 2002, p. 971).

Neste sentido, a verdadeira questão é, portanto, para Mészáros, “a relação dialética entre o todo e suas partes”. Sob o sistema do capital, os escalões do topo de sua estrutura de comando, com a sua perversa centralidade, usurpam o lugar do todo e dominam as partes, impondo a sua parcialidade como “interesse do todo”. É assim que a totalidade auto-sustentada do capital pode se afirmar, provocando um curto-circuito não dialético na relação parte/todo, como um sistema orgânico. A alternativa hegemônica socialista, portanto, envolve, a reconstituição dialética objetiva das partes e do todo, das menores células constitutivas até as relações produtivas e distributivas mais abrangentes, de modo não conflitante (MÉSZÁROS, 2002, p. 980).

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Sendo assim, o sucesso do planejamento depende, para Mészáros:

da coordenação das suas atividades produtivas e distributivas livremente consentida por aqueles que executam os objetivos conscientemente divisados. Portanto, o planejamento genuíno é inconcebível sem uma substantiva tomada de decisão de baixo, pela qual tanto a coordenação lateral como a integração abrangente de práticas reprodutivas se tornam possíveis. E vice-versa, pois, sem o exercício conscientemente planejado e amplamente coordenado das suas energias e habilidades criativas todo discurso sobre a tomada de decisão democrática dos indivíduos não possui qualquer substância. Apenas juntos os dois poderão definir as exigências elementares da alternativa hegemônica socialista à ordem sociometabólica do capital (MÉSZÁROS, 2002, p. 980).

Poderíamos concluir, interpretando Mészáros, que a auto-administração dos produtores associados deve ser pensada como uma alternativa hegemônica à ordem social do capital. Ao contrário do que vislumbra a Economia Solidária, Mészáros advoga a necessidade de ataques duplos: por um lado o controle coordenado da produção através da democracia substantiva dos produtores e a necessidade de mudanças qualitativas nos microcosmos (fábricas) e por outro, mudanças para dentro dos muros das fábricas, tais como as sinalizadas na primeira parte deste artigo.

Michael Burawoy, faz a sua análise sobre os problemas da transição ao socialismo partindo da seguinte pergunta: de que adianta o controle fabril (dentro da empresa), quando os trabalhadores não têm meios de influenciar o “poder central”? (BURAWOY, 1990, p. 201). Para ilustrar sua idéia, ele cita o exemplo da Argélia durante os anos 1961 e 64, país onde a autogestão afetou somente aqueles setores marginais da economia que eram administrados pelos colonos. O controle operário não tocou nas indústrias nacionalizadas, nos campos de petróleo, muito menos nas empresas estatais (NOVAES, 2005b). O destino da autogestão foi lacrado (sealed) devido à falha dos trabalhadores e campesinos em ampliar seu controle para além dos pequenos negócios e fazendas herdadas dos colonos. Em alguns setores, os comitês de gestão controlaram prosperamente as relações na produção, mas isso perdeu significado devido à falta de habilidade para controlar as relações de produção entre as empresas e entre as empresas e os consumidores bem como a distribuição da mais valia entre as empresas e o Estado (BURAWOY, 1990). Ele conclui observando que a autogestão perde seu significado se as decisões essenciais são feitas fora da fábrica (BURAWOY, 1990, p. 201). É por isso que ele defende o planejamento socialista da produção. Para ele, a construção da autogestão necessita de uma “coordenação a partir de baixo das empresas” ou, em

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outras palavras, a “apropriação do controle da produção” de todas as fábricas pelos trabalhadores (NOVAES, 2005b). Interpretando Burawoy, se os trabalhadores administrarem as fábricas através de decisão democrática, tal como enfatiza a ES, apesar de haver a possibilidade de auto-administração dos assuntos cotidianos, o Estado ou algum órgão administrativo alheio aos trabalhadores ainda continuará estipulando as condições nas quais as fábricas se tornam autoreguladas: o que será produzido, com quais materiais, de qual fonte. No entanto, se o Estado, os órgãos administrativos ou a “agência de planejamento central” estiverem sujeitos à influência “de baixo”, através dos mecanismos de participação dos conselhos fabris (BURAWOY, 1990a, p.13), é bem provável que os trabalhadores conseguirão atingir graus crescentes de controle social, combinando de certo modo democracia com centralização, evitando a burocracia por um lado, e o desgoverno da produção, por outro.

Considerações finais

Talvez simbolizando muito bem o que está acontecendo na primeira metade do século XXI, verifica-se a ausência de um projeto social radical por parte dos Governos de Lula e Kirchnner e também por parte dos movimentos sociais, pois estes não têm um norte para além do capital.

Isso pode ser visto na crítica que fazem Vieitez e Dal Ri (2003) aos movimentos sociais brasileiros. De acordo com estes:

até o presente momento, exceto no caso do MST e de casos isolados, a economia solidária encontra-se voltada para si própria. Ela trabalha pelas bordas da economia dominante, como se um acordo tácito tivesse sito feito entre ela e os sindicatos. Os sindicatos estão voltados para os trabalhadores assalariados empregados. E a economia solidária desenvolve empreendimentos econômicos alternativos às empresas capitalistas, em geral nos setores de mão-de-obra intensiva. Isto segue assim, mesmo no caso da Central Única dos Trabalhadores que, a duras penas e depois de muito tempo, acabou criando uma Secretaria para o desenvolvimento da economia solidária. A economia solidária leva em seu bojo fábricas controladas pelos seus trabalhadores que se reivindicam da autogestão democrática. Mas, a autogestão democrática, como princípio organizador de todas as fábricas, e ou de toda sociedade, não é preconizada nem mesmo a título especulativo. Dessa forma, o que se pretende? Supõe-se, talvez, que a economia solidária possa expandir-se ininterruptamente às custas da empresa capitalista, até o ponto de chegar a confrontá-la de algum modo? Ou imagina-se que ela terá um espaço fundamental na sociedade sem alienar propriamente a organização capitalista da sociedade? (Vieitez; Dal Ri, 2003, p. vi – grifo nosso).

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Por outro lado, como o horizonte dos governos de Lula e Kirchnner parece ser o da contenção social e não da transformação social substantiva, o cooperativismo torna-se funcional a nova fatorna-se do capitalismo, caracterizada pela acumulação flexível (D. Harvey).

Longe de causar um abalo sísmico no sistema, aquilo que teoricamente se constituiria como uma alternativa radical, apontada por alguns como os germes do socialismo no oceano capitalista, pode acabar se tornando uma via de controle social dos pobres onde as classes dominantes mantêm o domínio do núcleo duro da economia (VAINER, 2000).

Junto a isso, não podemos subestimar a capacidade de rejuvenescimento e superação de problemas que o capitalismo possui, além de sua capacidade de cooptação das formas atípicas de produção que possuem um potencial revolucionário, o que dificulta ainda mais a avaliação sobre o grau de sentido social da produção, ou seja, no caráter dermercantilizador que os Movimentos de FRs vem dando à economia.

Se é verdade, como aponta o lema do Movimento Nacional de Empresas Recuperadas (MNER), que toda empresa que “fecha, deve ser ocupada e colocada para produzir”, o que fazem os trabalhadores quando as fábricas não fecham?xvii Procuramos evidenciar neste artigo os limites e possibilidades da autogestão diante do modo de produção capitalista bem como as políticas necessárias para se construir a autogestão quando as fábricas não fecham.

Acreditamos que um olhar microscópico – aquele que analisa a autogestão somente no local de trabalho - ignora os determinantes da produção de mercadorias e a necessidade de re-fundação do planejamento socialista da produção. Por outro lado, aqueles que apostam somente na tomada do poder, ignoram as possibilidades que as fábricas recuperadas e as cooperativas de trabalhadores têm de fazer definhar o sociometabolismo do capital e por fim à alienação do trabalho (NOVAES, 2005c). É por isso que recorremos principalmente à análise da obra de Mészáros, pois este sinaliza com uma proposta de ataques duplos, que aqui foi representada como sendo a transformação dentro dos muros das FRs (microcosmo) e fora dos muros (macrocosmo) das mesmas para se efetivar transformações substantivas.

Quanto às políticas para a promoção do cooperativismo de trabalhadores, muito se tem debatido sobre a funcionalidade sistêmica destes empreendimentos, ou mais precisamente, o papel dos empreendimentos com características autogestionárias

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para rejuvenescer o capital, e/ou sobre as possibilidades destes ajudar a sepultar o sistema sociometabólico do capital. Ao que tudo indica, as políticas para o cooperativismo que vem sendo adotadas na Venezuela parecem se inserir num contexto de criação de um projeto socialista da revolução democrático-popular impulsionado – ao menos num primeiro momento – por um governo que tem como meta a construção de uma nova sociedade que tem dois pilares fundamentais: a participação direta da população e a promoção do cooperativismo dentro de uma proposta de desenvolvimento endógeno, ao contrário dos governos de Lula e Kirchnner.

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O nome do artigo tem como inspiração o livro organizado por Rogério Valle (2001): Autogestão - O que fazer quando as fábricas fecham?

ii

Sobre a crise dos últimos 25 anos, ver Lima Filho (2002) e Fajn et al. (2003). Sobre as conseqüências da crise na periferia no capitalismo nos últimos 25 anos e o seu impacto no mercado de trabalho argentino, ver Coraggio (2005).

iii

As palavras são do professor Gabriel Fajn para diferenciar as cooperativas de necessidade das cooperativas ideológicas.

iv

Para saber sobre o cooperativismo no Uruguai antes do fenômeno das FRs, ver Bertullo et al. (2003).

v

Sobre a história do surgimento das FRs no Brasil e o debate em torno da autogestão, ver Cruz (2006), Faria (2005), Novaes (2005d), Tiriba (2005), Vieitez e Dal Ri (2001) e Valle et al. (2001). Na Argentina ver, dentre outros, Fajn et al. (2003), Ghibaudi (2004), Informe (2003), Trinchero (2003), Buffa et al. (2006) e Novaes (2005a). No Uruguai, ver Marti et al. (2004) e Novaes (2005a).

vi

Outra conclusão deste estudo é a verificação que os partidários da ES acreditam que a tecnologia convencional, engendrada sob a égide das relações sociais de produção capitalistas para atender à lógica de acumulação das grandes empresas, pode ser usada sem significativas modificações nos empreendimentos autogestionários que preconizam (Novaes, 2005d).

vii

Assim como na Argentina e em menor medida no Brasil, muitos trabalhadores reivindicam a estatização das fábricas com controle operário. Pode-se verificar que não há um consenso entre os trabalhadores latino-americanos com relação a estatização ou autogestão das fábricas. É interessante observar ainda que nem o governo brasileiro nem o argentino estatizou nenhuma fábrica.

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viii

Numa aula, um professor da Unicamp disse que se os empresários brasileiros são perigosos, os da Venezuela são 10 vezes mais.

ix

Uma ressalva faz-se necessária. Freqüentemente alguns analistas apressados afirmam que o cooperativismo deveria funcionar sem subsídios do Estado. Esquecem que não existe uma empresa capitalista perfeita, que não usa os fundos públicos para sua manutenção no capitalismo. Se formos para o campo da agricultura, o argumento se aprofunda, pois não existe um país no mundo que não subsidie seus agricultores. Neste sentido, por que querem que eles que as cooperativas alcancem a perfeição que nem mesmo as empresas capitalistas conseguem?

x

Sobre a crítica pela esquerda às Incubadoras de Cooperativas, ver Oliveira (2003), Oliveira e Dagnino (2004). Sobre a crítica aos Parques e Pólos Tecnológicos, ver Dagnino (2004).

xi

Ver, por exemplo, Dagnino e Novaes (2005), Novaes (2005b-Parte II) e Novaes (2005c).

xii

Para maiores detalhes sobre a relação entre alienação e cooperativismo, ver Novaes (2005b). Storch (1985) acredita que é inconcebível tratar a alienação apenas na dimensão da empresa isolada, pois suas determinações estão principalmente no nível da sociedade.

xiii

Desde que o controle da produção e da distribuição esteja alienado do trabalho, o exercício separado de controle deve ser protegido pela expropriação do conhecimento exigido pelas funções reprodutivas societárias (MÉSZÁROS, 2002, p. 929). A desabonadora divisão e fragmentação do trabalho que acompanha a estrutura da produção de mercadorias priva totalmente o trabalho vivo da supervisão e do controle do processo de trabalho da sociedade, junto com a sua dimensão distributiva (MÉSZÁROS, 2002, p. 628).

xiv

Ao analisar a proposta dos movimentos de Economia Solidária da América Latina, Quijano (2002) chega à conclusão de que o que está em voga é a sobrevivência das classes oprimidas, mas não necessariamente a construção de sistemas alternativos de produção.

xv

Para Mészáros, mediação não deve ser confundida com gradualismo e reformismo.

xvi

Lembremos que para Luxemburgo uma cooperativa usa todos os métodos que lhe permitem enfrentar seus competidores no mercado.

xvii

Numa pesquisa realizada no fim de 2004 junto a trabalhadores de FRs, perguntaram se era legítimo ocupar fábricas que não fecharam: 90% dos trabalhadores responderam que não.

Referências

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