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O CURRÍCULO PAULISTA DO ENSINO MÉDIO POR MEIO DOS CADERNOS DO PROFESSOR DE HISTÓRIA: UM ESTUDO SOBRE O EIXO CIDADANIA

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O CURRÍCULO PAULISTA DO ENSINO MÉDIO POR MEIO

DOS CADERNOS DO PROFESSOR DE HISTÓRIA: UM

ESTUDO SOBRE O EIXO CIDADANIA

Roberta Rueda Ballejo BONTADINI PPGE-Centro Universitário Moura Lacerda E-mail: picorrbb@gmail.com

Alessandra DAVID PPGE-Centro Universitário Moura Lacerda E-mail: davidalessandra@uol.com.br

Eixo temático 2: Políticas e práticas de formação continuada e desenvolvimento profissional de professores da educação básica.

1. Currículo: contexto, atores e intenções

O trabalho possui como objetivo geral analisar o tema cidadania proposto pelos Cadernos de História do Ensino Médio do Estado de São Paulo. Esses Cadernos foram elaborados pela Secretaria da Educação do Estado de São Paulo, em 2008, como material de apoio para que o Currículo do Estado de São Paulo fosse implementado. Constitui-se em um material destinado aos professores, organizados por disciplina, de acordo com a série, ano e bimestre, contendo situações de aprendizagem a serem utilizadas pelo professor para ensinar o conteúdo selecionado.

Apresentada como solução para elevar a qualidade do ensino no Estado de São Paulo, a nova proposta curricular foi oferecida à rede estadual paulista concomitante à exigência de ser colocada em prática. Tal situação causou um desconforto aos professores da rede estadual paulista, haja vista não terem participado da elaboração dessa proposta e terem que a aplicá-las em sala de aula, muitas vezes sem concordarem com a mesma. Esse fator, em razão de uma das pesquisadoras ser professora de História nesta rede de ensino, foi preponderante na escolha deste tema de pesquisa. Para a realização da mesma serão utilizados, como objeto de estudo, os Cadernos de História destinados ao Ensino Médio (última fase da educação básica), novamente, pelo fato de uma das autoras, há 13 anos lecionar em uma escola estadual que possui apenas classes dessa etapa de ensino. Neste sentido, pretende-se com esta pesquisa, refletir criticamente em torno das experiências cotidianas, visto que, como mencionamos

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anteriormente, o processo de elaboração da proposta curricular não foi discutido na escola e tampouco há espaço e tempo para discuti-la em outras ocasiões, como as reuniões de ATPC (Aula de Trabalho Pedagógico Coletivo).

Ao estabelecermos um diálogo entre a pesquisa acadêmica e o cotidiano escolar, observamos que tendo o currículo paulista como objetivo principal desenvolver nos alunos habilidades e competências para atuarem na vida profissional, surge a indagação: uma pessoa que dedica 12 anos de sua vida (nove anos no Ensino Fundamental e três no Ensino Médio) ao estudo, amparado em um currículo por competências e habilidades, terá oportunidade de conseguir qual tipo de emprego?

Seria muito crítico entender que por meio deste currículo há uma explícita continuidade de perpetuação das desigualdades sociais existentes em nossa comunidade? Afinal, o aluno da escola pública tem acesso tão somente a este ensino básico, ancorado em competências mínimas, enquanto o aluno de escola particular tem acesso a um ensino conteudista, teórico, conceitual que o prepara para o ingresso nas universidades mais conceituadas do País.

Como docente do ensino médio da rede pública paulista vejo com frequência antigos alunos ocuparem vários postos de trabalho, como frentista de posto, empacotador de supermercado, balconista de farmácia, vendedor de loja de roupas, entregador de pizza, etc., ou seja, trabalhando no setor terciário da economia. A grande maioria, portanto, consegue empregos relacionados ao setor do comércio varejista ou no setor secundário. Ao mesmo tempo me deparo com outra realidade, os alunos que ao final do Ensino Médio tinham o desejo de prosseguir os estudos e cursar uma universidade pública não têm conseguido atingir esta meta de vida. Ao longo de 13 anos de atuação nessa rede de ensino, observo uma diminuição drástica na quantidade de alunos que, ao concluir o Ensino Médio, trilham o caminho da universidade. Ser aprovado nas universidades públicas torna-se cada vez mais um sonho muito distante para os alunos da rede pública paulista, haja vista que o vestibular exige conhecimento baseado em conteúdo, não em competências; além disso, poucos possuem condições de pagar uma universidade particular.

Diante de tal fato, escutamos os seguintes comentários: “a escola pública era boa no meu tempo”, “sempre estudei em escola pública e fui aprovado direto no vestibular”, “a escola pública perdeu sua qualidade” etc. Paralelo a estes comentários os professores da escola pública sentem-se desmotivados e desprestigiados, pois o fracasso do sistema público de ensino é propagado tendo como uma de suas causas a incompetência do professor. Na tentativa de desmistificar a incapacidade do docente e

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entendendo que a escola pública, nos dias de hoje, modificou sua finalidade, analisamos nosso objeto de pesquisa, ancorados na teoria crítica de currículo.

A palavra currículo escolar é um termo conhecido pelas pessoas que trabalham em instituições de ensino, normalmente, associado ao conjunto de conteúdo de uma determinada disciplina e as formas de executá-lo. O que pouco se discute nas escolas, e fora delas, é que o currículo exprime as intenções do sistema educacional, como pontua Pacheco (2005), para quem, a conceituação de currículo é problemática, pois não existe um consenso em sua definição, visto que o currículo depende dos contextos em que se situa e das pessoas que nele intervém. Na constituição do currículo estão contidos as intenções e os interesses, portanto, uma proposta curricular é uma construção social historicizada, dependente de inúmeros condicionalismos.

[...] o currículo depende dos contextos em que se situam e das pessoas que neles intervêm. Para lá das intenções, existem os interesses e as forças que se movem à sua volta. Quer dizer: o currículo é uma intersecção de práticas diversas, funcionando como um sistema no qual se integram vários subsistemas. E responder a “O que é o currículo?, é algo que nos levará a identificação dos contextos, actores e intenções. (PACHECO, 2005, p. 36)

Para analisarmos os Cadernos do Professor (material pedagógico que possui conteúdo e atividades com base no Currículo Oficial do Estado de São Paulo) devemos compreender o contexto histórico no qual foi formulado, para conseguirmos detectar os fatores econômicos e políticos que influenciam sua construção. Para tanto, fizemos uma análise macroestrutural avaliando a relação entre os programas internacionais e a política curricular brasileira, verificando a influência dos organismos internacionais na elaboração dos objetivos do Currículo Oficial do Estado de São Paulo.

Em 1950, o teórico Theodore W. Schultz desenvolveu a teoria do Capital Humano que defendia que o principal fator do crescimento econômico era o Capital Humano, ou seja, os seres humanos, ao serem qualificados estariam preparados para atuar no mercado de trabalho e assim proporcionariam um aumento na produtividade e, consequentemente o crescimento econômico de cada país. A ideia de vincular o desenvolvimento do indivíduo ao desenvolvimento econômico das nações foi disseminada como forma de melhorar a posição social das pessoas e diminuir as desigualdades sociais, entretanto esse pensamento depositava no indivíduo a responsabilidade de conquistar melhores condições de vida, não considerando os diversos fatores que causam a desigualdade econômica e social, tais como: a concentração fundiária; a política fiscal injusta; a existência de leis trabalhistas que regulam a compressão dos salários, a flexibilização da jornada de trabalho, a contratação por trabalho intermitente e a dificuldade de acesso aos serviços básicos, como por

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exemplo, saúde, transporte, saneamento básico etc. exime-se o Estado de sua responsabilidade de promover o Bem Comum, ou seja, proporcionar condições que permitam o desenvolvimento integral de todos os indivíduos. Esta teoria influenciou a literatura educacional, nos anos decorrentes, como por exemplo, o Relatório Delors, produzido pela Comissão Internacional sobre Educação para o século XXI, coordenado por Jacques Delors.

Neste documento é apontado a necessidade da educação ser voltada ao desenvolvimento de competências nos jovens; competências estas que permitiriam aos estudantes se adequarem ao mundo globalizado e o desenvolvimento de habilidades flexíveis para os futuros trabalhadores se adaptarem a qualquer emprego. Esta valorização do desenvolvimento de habilidades e competências é propagada em detrimento da aprendizagem intelectual do aluno, pois ao dar destaque à vinculação da educação ao mundo do trabalho e às demandas sociais atuais, negligência o pleno desenvolvimento do ser humano e o preparo para o exercício da cidadania.

A partir de 1990, no Brasil, a política educacional brasileira passou a sofrer diretamente a influência e o financiamento do Banco Mundial que auxilia os países em desenvolvimento a estruturarem sua economia, dentro dos padrões de desenvolvimento neoliberal. Entretanto, para receber investimentos o Banco “sugere” mudanças nas políticas educacionais dos países beneficiados pelo investimento. Primeiramente, o Banco concedia créditos apenas ao desenvolvimento da infraestrutura econômica, posteriormente a educação passa a ser incluída no setor de créditos, em razão do Banco defender que o combate à pobreza de um país depende do aumento da produtividade interna, assim a educação passa a ser regida pelas regras neoliberais do Banco Mundial por se considerada meio de proporcionar inclusão social.

Ao associar a educação como um meio para que os indivíduos consigam viver melhor observamos que o objetivo da educação, dentro do contexto neoliberal, tem se resumido a proporcionar conhecimentos e habilidades específicas que o sistema produtivo exige. A teoria neoliberal argumenta que o Estado de bem-estar social, voltado para atender aos direitos da população (saúde, educação, trabalho, etc.) não foi eficiente para combater a pobreza, pois a sociedade sendo beneficiada constantemente pelo Estado em suas necessidades básicas, tende a uma acomodação diante da atuação do Estado como provedor de direitos. Isso seria considerado um entrave para uma economia em desenvolvimento. O neoliberalismo afirma que as melhorias sociais são advindas das riquezas produzidas. Embasado na teoria neoliberal, o Banco Mundial passa a sugerir transformações nas instituições escolares por entender a educação como meio de

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erradicar a pobreza e proporcionar aos indivíduos o acúmulo de capital. Nesse pensamento, a escola tem como finalidade acabar com a pobreza, proporcionando oportunidade ao indivíduo de conseguir emprego e, consequentemente, acumular riqueza.

As discussões acerca da concepção pedagógica produtivista, iniciada na década de 1970, ainda fazem parte do debate educacional nos anos 90. A educação permanece vinculada à formação de mão de obra para servir o interesse do mercado competitivo, onde o neoprodutivismo associa a educação como um investimento no capital humano na disputa pela empregabilidade. [...] São, portanto, discursos repletos de concepções pedagógicas que priorizam o desenvolvimento de habilidades e competências, na tentativa que delas derivem uma teoria curricular vinculada a uma teoria da aprendizagem eficiente. (OLIVEIRA, 2012, p. 57 – 58)

Em consonância com a concepção pedagógica produtivista, em 2008, justificando a necessidade de melhorar a educação, a Secretaria da Educação do Estado de São Paulo desenvolveu um currículo para o Ensino Fundamental e Ensino Médio, contendo uma base comum de conhecimentos, competências e habilidades para que toda a rede escolar trabalhasse de forma homogênea. Além do currículo base, foram elaborados materiais apostilados, os Cadernos do Professor e do Aluno.

Em contraposição à ideologia propagada pelos organismos internacionais de que a educação é um mecanismo para a redução da pobreza e necessária para o desenvolvimento econômico do Pais, há estudos que criticam a finalidade da educação como formadora de mão de obra, pois esta serviria tão somente para atender aos interesses do mercado e não para reduzir as injustiças econômicas; a crítica destina-se, em especial, a teoria curricular que prioriza o desenvolvimento de habilidades e competências. Este questionamento é ancorado, por exemplo, nos estudos de Michael Apple. Esse autor, segundo Gandin e Lima (2016), ao analisarem sua contribuição para os estudos de currículo, afirma que o currículo é um meio em que os grupos sociais disseminam uma ideologia. Assim, entende o currículo como um campo de disputas ideológicas, em que não se deve perguntar apenas, “ o que” deve ser ensinado e “ como” deve ser ensinado, mas sim, enfatizou a importância de fazermos as perguntas ‘por que” determinado conhecimento é selecionado para compor o conteúdo escolar e aos interesses “ de quem” esta seleção atende?

O currículo, portanto, é alvo de disputas dos grupos sociais que tentam se manter no poder, sendo que é por meio da seleção de conteúdos que a ideologia econômica e política é naturalizada cotidianamente na escola. Assim, se amplamente difundida, a ideologia dominante permite a hegemonia de um grupo social sobre o outro, sem necessitar do uso da força, pois existe uma dominação consentida. Dessa forma,

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podemos compreender que a escola é um meio para legitimar o discurso, pois o discurso cotidianamente repetido é legitimado e a ideologia, na atualidade, a neoliberal, é colocada em prática.

Por este motivo, os Cadernos do Professor e do Aluno têm se constituído como “um material estruturado à prova dos professores” haja vista que, com atividades extremamente pré-estabelecidas não permitem análises e reflexões sobre os problemas de ordem sócio econômica e política do cotidiano, ficando o professor preso a um currículo planejado sem sua participação e sem poder exercer sua autonomia intelectual, pela obrigatoriedade de ensinar as situações de aprendizagem sugeridas no Caderno dos Alunos.

Enquanto a escola era seletista, o conhecimento trabalhado por ela era, como nomeia Young (2007), um conhecimento dos poderosos, conhecimento esse que proporcionava o acesso à universidade e consequentemente a ascensão aos postos de comando tanto na economia quanto na política do país. Hoje, a escola pública paulista não se detém à transmissão de conhecimentos que dê condições ao aluno de disputar em condições de igualdade uma vaga na universidade, nem se detém a transmitir um conhecimento realmente importante para a formação do sujeito.

Ao usar a palavra “conhecimento” em termos gerais, considero útil fazer uma distinção entre duas ideias: “conhecimento dos poderosos” e “conhecimento poderoso”. O “conhecimento dos poderosos” é definido por quem detém o conhecimento. Historicamente e mesmo hoje em dia, quando pensamos na distribuição do acesso à universidade, aqueles com maior poder na sociedade são os que têm acesso a certos tipos de conhecimento; é a esse que eu chamo de “conhecimento dos poderosos”. É compreensível que muitos críticos sociais do conhecimento escolar equiparem o conhecimento escolar e o currículo ao “conhecimento dos poderosos” (...) Assim, precisamos de outro conceito, no enfoque do currículo, que chamarei de “conhecimento poderoso”. Esse conceito não se refere a quem tem mais acesso ao conhecimento ou quem o legitima, embora ambas sejam questões importantes, mas refere-se ao que o conhecimento pode fazer, como, por exemplo, fornecer explicações confiáveis ou novas formas de se pensar a respeito do mundo. Era isso que os chartistas pleiteavam com seu slogan “conhecimento realmente útil” (YOUNG, 2007, p. 1294) Nesse sentido, ao compreendermos que o Currículo Paulista ao evidenciar, nos Cadernos do Professor e do Aluno, o ensino de habilidades e competências está utilizando-o como instrumento disciplinador, que não proporciona uma educação voltada para a constituição do sujeito como cidadão.

2. Cidadania: um “Conhecimento Poderoso” para a transformação social.

Mediante o novo Currículo do Estado de São Paulo e entendendo que o currículo não deve ser somente colocado em prática pelos docentes, mas também

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analisado e criticado, devemos refletir se essa mudança na redefinição da seleção de conteúdos, e dos métodos de ensino proporcionam aos alunos uma aprendizagem significativa. Para tanto nos valemos da análise do eixo Cidadania constante dos Cadernos do Professor de História do ensino médio.

Das reflexões sobre o ensino de História destacamos os seguintes trabalhos: Bittencourt (2006) observa que o objetivo do ensino de história é a formação de um cidadão crítico e o entendimento do sentir-se sujeito histórico, além disso, devemos refletir qual tipo de cidadão o currículo pretende formar: se apenas possui como pretensão formar o sujeito como cidadão político, conhecedor dos direitos políticos e civis que possui, e dos deveres que necessita cumprir (votar, pagar impostos, etc.) ou se também deve-se desenvolver a cidadania social trabalhando conceitos como igualdade, diferenças étnicas e sociais, lutas e conquistas.

Pinsky e Pinsky (2013) acreditam que a prática de ensino de História deve ser rica em conteúdo e socialmente responsável. Destacam que a finalidade dessa disciplina não deve se limitar em preparar os alunos a responderem as questões do vestibular, mas se preocupar com a formação humanista dos discentes, desenvolvendo a concepção de seres humanos como sujeitos da história, salientando o potencial transformador deste ensino.

Bezerra (2013) afirma que o ensino de História deve proporcionar aos alunos aprendizagens essenciais, tais como: formar cidadãos autônomos, críticos, participativos, que atuem na sociedade com competência e responsabilidade. O autor também evidência que o conhecimento trabalhado nas aulas de História devem ser os necessários para que os alunos exercitem a cidadania. Também destaca que o objetivo da disciplina não é transmitir o conteúdo curricular como algo a ser assimilado e decorado, mas desenvolver a capacidade de articular conhecimentos, competências e valores para que o aluno possa transformar a sociedade. Assim sendo, o conhecimento histórico não deve se limitar à explanação de fatos e conceitos, o professor deve enriquecer suas aulas com debates sobre valores, normas e atitudes.

Os valores sociais que influenciam a conduta e interferem no exercício da cidadania são transmitidos primeiramente, no ambiente familiar e, posteriormente, aperfeiçoados no convívio social. Entretanto, o que percebemos é a inexistência ou a divergência de valores que colaborem para as relações sociais harmônicas, sendo necessário que a escola, como espaço para a prática da cidadania, também atue na conscientização do sujeito em relação aos valores e atitudes que contribuam para a existência de uma sociedade baseada no processo de cidadania de seus membros.

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Afirmar que os professores devem formar cidadãos para atuarem conscientemente no meio em que vivem, não é atribuir uma nova função a este profissional, que já se queixa de desempenhar papéis diversificados na tentativa de atender as necessidades dos alunos. O professor deve atuar, assim como a família, com a função de agente de socialização, visto que a escola é uma instituição social educativa, que é responsável não só por transmitir cultura aos jovens, mas prepará-los para desenvolver autonomia intelectual, pensamento crítico e um comportamento ético que os auxiliem a serem cidadãos conscientes.

A escola, como organização social, deve proporcionar um processo de ensino e aprendizagem que valorize a educação para a vida em sociedade, entretanto não deve apenas preparar o aluno para o mundo do trabalho, mas preocupar-se também em prepara-lo para o exercício da cidadania. Portanto, a seleção de conteúdos e a metodologia de ensino devem favorecer uma educação baseada em valores, fato este que justifica a necessidade de averiguarmos se o currículo escolar se preocupa com este objetivo educacional. No estado de São Paulo, os Cadernos do Professor constituem-se o principal, se não o único material didático utilizado pelos professores, para prepararem suas aulas, portanto a análise do mesmo faz-se relevante para diagnosticarmos se e o quanto o currículo trabalhado tem colaborado na formação de uma sociedade cidadã.

Após a análise das obras que explicitam as funções da disciplina de História, algumas reflexões evidenciadas pelos autores proporcionaram a elaboração de algumas indagações que nortearão a apreciação dos Cadernos do Professor. Essas indagações auxiliarão na análise principal desta pesquisa, ou seja, se uma das tarefas fundamentais do ensino de História é preparar o aluno para o exercício da cidadania, o conjunto de atividades propostas, nos Cadernos do Aluno, tem como objetivo a formação cidadã dos discentes?

Compreendendo que a cidadania, atualmente, abrange três aspectos primordiais: direitos civis, políticos e sociais, as atividades programadas abordam aspectos que contemplem estes três desdobramentos? Qual tipo de cidadão a proposta curricular pretende formar? Existem diferentes definições de cidadania, visto que este conceito possui diferentes concepções históricas, ou seja, o conceito de cidadão teve significados diferentes em determinadas sociedades e até mesmo em uma única sociedade podemos observar que seu significado variou em determinados momentos históricos. Neste trabalho, a definição de cidadania que irá orientar a pesquisa pode ser resumida na definição abaixo:

Ser cidadão é ter direito à vida, à liberdade, à propriedade, à igualdade perante a lei: é, em resumo, ter direitos civis. É também participar do

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destino da sociedade, votar e ser votado, ter direitos políticos. Os direitos civis e políticos não asseguram a democracia sem os direitos sociais, aqueles que garantem a participação do indivíduo na riqueza coletiva: o direito à educação, ao trabalho, ao salário justo, à saúde, a uma velhice tranquila. Exercer a cidadania plena é ter direitos civis, políticos e sociais (PINSKY, 2006, p. 9)

A palavra cidadania é destacada como um dos objetivos da educação, no currículo escolar. Assim como seu emprego não pode estar desvinculado de toda a complexidade de seu significado, devemos analisar se o Currículo Paulista há o comprometimento em associar as competências ao exercício da cidadania plena e ativa.

Para tanto, analisamos o processo histórico da cidadania no Brasil, com base no trabalho de Carvalho (2012), com a pretensão de fazermos uma contraposição, visto que o mapeamento dos estágios sucessivos da cidadania permite-nos perceber que o tema pode ser trabalhado em todos os períodos históricos brasileiros, iremos analisar se há situações de aprendizagem, nos Cadernos do Professor, que contemplem o tema cidadania e verificaremos se as atividades sugeridas são suficientes para que se entenda o conceito e contribua para uma educação voltada à cidadania ou se as atividades, por serem pontuais, não são suficientes para abarcar a complexidade da formação cidadã.

Antes de analisarmos as situações de aprendizagem, podemos observar na Proposta Curricular do Estado de São Paulo uma contradição, há uma citação evidenciando que o ensino de Ciências Humanas é necessário ao exercício da cidadania.

Para Mello (1998), na área de Ciências Humanas, destacam-se as competências relacionadas à apropriação dos conhecimentos dessas ciências com suas particularidades metodológicas, nas quais o exercício da indução é de importância crucial. A autora propõe, também, que o ensino de Ciências Humanas deve desenvolver a compreensão do significado de identidade, da sociedade e da cultura, que configuram os campos de conhecimentos das Ciências Humanas, incluindo, de modo significativo, os estudos necessários ao exercício da cidadania (São Paulo, 2008, p.38-39).

Logo na página seguinte, destacamos o seguinte excerto:

Sobre a missão de formar cidadãos, convém lembrar que essa missão não compete, direta e exclusivamente, ao (à) professor (a) de História e nem à escola, em seu conjunto, já que as bases dessa formação são trazidas à sala de aula pelos alunos, armazenadas nos espaços sociais que eles frequentam, em especial a família. É claro que os docentes, inclusive os de História, devem participar de maneira ativa do processo de percepção e formação dos valores constituintes da cidadania, mas isso não significa que deva abdicar de suas funções de docência, deixando de ensinar sua disciplina e produzir conhecimento sobre ela (São Paulo, 2008, p. 41).

Mediante a afirmação de que o docente deve se preocupar com a formação de valores constituintes da cidadania, desde que esta função não atrapalhe suas funções de

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docência, ficamos com a seguinte indagação: afinal, formar o aluno como cidadão não se constitui como uma de nossas funções como docente?

Neste sentido, analisaremos como o tema Cidadania é abordado nos Cadernos do Professor de História dos 1º/2º/3º anos do Ensino Médio, a partir das situações de aprendizagem sugeridas.

3. Considerações Finais

Até este momento, podemos parcialmente concluir que é sobre a concepção de poder que devemos analisar e criticar as realidades vividas por nós, nas escolas. Não devemos nos esquecer que existe uma estreita relação entre educação e poder, poder este que matriz curricular aos interesses econômicos, determinando qual tipo de educação as classes sociais menos favorecidas poderão ter acesso para que ocorra a perpetuação da dominação social e econômica. Assim, acreditamos que analisar o currículo escolar pela ótica da teoria crítica do currículo é uma maneira de diminuir o fardo que os professores carregam de serem responsáveis pelo “insucesso” do sistema educacional público.

Entendemos que por meio da escola temos a possibilidade de formarmos pessoas conscientes, autônomas, críticas e participativas. A escola é um espaço para a aprendizagem e o exercício da cidadania; o diálogo e a convivência nesta instituição devem preparar os alunos para serem cidadãos plenos que conheçam seus direitos e deveres; que sejam ativos na tarefa de fazer valer os direitos já garantidos em lei; cumpridores dos deveres para viverem bem em comunidade e que anseiem pela expansão da cidadania.

Para alcançar o objetivo geral proposto faz-se necessário ainda estudarmos as legislações anteriores a elaboração do Currículo Paulista, como a LDB 4.024/61, a Lei Federal 5.692/71, a LDB 9.394/96, os Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Médio (PCNEM) de 1999, o Decreto 2.1833 de 1983, e as Diretrizes Curriculares Nacionais para Ensino Médio de 2010. Igualmente, analisar os documentos oficiais da Secretaria da Educação que abordam a criação da Proposta Curricular do Estado de São Paulo e dos Cadernos do Professor da disciplina de História, especialmente para averiguar as políticas públicas educacionais que embasaram a construção desse material e examinarmos o Caderno do Professor, por meio das situações de aprendizagem, verificando nelas as temáticas curriculares propostas, buscando àquelas relacionadas à cidadania para analisarmos se o currículo de História dá destaque ao “conhecimento dos poderosos” ou defende o “conhecimento poderoso”?

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3. Referências

BEZERRA, H. G. Ensino de História: conteúdos e conceitos básicos. In: KARNAL, L. (Org.). História na sala de aula: conceitos, práticas e propostas. 6. ed., 3ª reimpressão. São Paulo: Contexto, 2013. p.37-48.

BITTENCOURT, C. M. F. Capitalismo e cidadania nas atuais propostas curriculares de História. In: BITTENCOURT, C. M. F. (Org.). O saber histórico na sala de aula. 11. ed. São Paulo: Contexto, 2006. P. 11-27.

CARVALHO, J. M. de. Cidadania no Brasil: o longo caminho. 15. ed. Rio de Janeiro: civilização Brasileira, 2012.

GANDIN, L. F.; LIMA, I. G. A perspectiva de Michael Apple para os estudos das políticas educacionais. Educação e Pesquisa. São Paulo, v. 42, n. 3, p. 651-664, jul. /set. 2016. OLIVEIRA, M. de S. As implicações da implementação do currículo oficial do Estado de São Paulo no cotidiano de uma escola. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade Estadual Paulista - “Júlio de Mesquita Filho”, Presidente Prudente, 2012. PACHECO, J. A. Escritos curriculares. São Paulo: Cortez, 2005.

PINSKY, J.; PINSKY, C. B. (Orgs.). História da Cidadania. 4. ed. São Paulo: Contexto, 2006.

PINSKY, J.; PINSKY, C. B. Por uma História prazerosa e consequente. In: In: KARNAL, L. (Org.). História na sala de aula: conceitos, práticas e propostas. 6. ed., 3ª

reimpressão. São Paulo: Contexto, 2013. p.17-36

SÃO PAULO (Estado). Proposta curricular do estado de São Paulo. [2008]. Fundação para o Desenvolvimento da Educação, 2008.

YOUNG, M. Para que serem as escolas? Educação e Sociedade. V. 28, n.101, p. 1287 – 1302, set. / dez., 2007.

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