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Rodolpho Barreto Sampaio Júnior 1 Eduardo Bavose 2. Sumário. Resumo

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Revista da Faculdade de Direito Milton Campos Nova Lima V. 27 p.1-17 2013

A ação coletiva passiva e as manifestações sociais: a temerária

responsabilização civil dos manifestantes e suas possíveis implicações

políticas e sociais

Rodolpho Barreto Sampaio Júnior

1

Eduardo Bavose

2 Cidade/Estado: Belo Horizonte/MG E-mail: eduardobavose@yahoo.com.br rodolphobsj@mcampos.br

Recebido: 02/10/2013 Aprovado: 30/10/2013

_________________Sumário _________________

Introdução. 2. As manifestações sociais de junho de 2013. 2.1 Uma tentativa de explicar os eventos ocorridos no mês de junho de 2013. 3. 3. A reparação dos danos provocados pelos manifestantes sociais. 3.1 As ações coletivas passivas. 3.2 Tese da admissibilidade da ação coletiva passiva no ordenamento jurídico brasileiro. 4. Conclusão. Referências.

Resumo

O tema que se aborda no presente artigo é o da responsabilização civil dos participantes de manifestações sociais por meio de uma ação coletiva passiva e as suas possíveis implicações jurídicas e políticas. No mês de junho de 2013, foram realizadas diversas manifestações populares por todo o Brasil. Essas manifestações surgiram inicialmente para protestar contra o aumento das tarifas de transporte público, mormente nas cidades de Porto Alegre, São Paulo e Rio de Janeiro. Os protestos ganharam apoio da população devido à repressão da polícia militar dos estados em que ocorreram as manifestações e rapidamente se espalharam por todo o país, com reivindicações das mais diversas possíveis, desde a redução das passagens até o arquivamento de projetos de lei contrários ao interesse coletivo. Não há dúvida de que as manifestações ocorridas foram legítimas, amparadas na liberdade de expressão e de reunião constitucionalmente previstas (art. 5º, IV e XVI, CR/88). Pode-se indagar, no entanto, como responsabilizar os autores dos danos eventualmente causados pelos manifestantes. Uma

1Doutor em Direito Civil. Professor dos Cursos de Graduação e Mestrado da Faculdade de Direito Milton

Campos. Professor Adjunto da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Procurador do Estado de Minas Gerais. Advogado

2Mestre em Direito pela Faculdade de Direito Milton Campos. Professor da Faculdade Novos Horizontes.

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hipótese para a solução deste problema seria a adoção da ação coletiva passiva como instrumento processual utilizado para que certa coletividade possa responder ao processo. Porém, trata-se de solução bastante controvertida, já que, numa interpretação literal do Código de Processo Civil, elaborado sob o paradigma do Estado Liberal, não se verifica a possibilidade da coletividade ser demandada. Ademais, a consideração da ação coletiva passiva em face dos manifestantes pode ter como consequência o desestímulo ao protesto pacífico e à própria expressão da cidadania.

Palavras-chave: Manifestações sociais; ação coletiva passiva; tutela coletiva; legitimação

1

Introdução

No dia 05 de outubro de 2013, a Constituição da República do Brasil completará 25 anos. Como se sabe, ela elenca em seu artigo 5º diversos direitos fundamentais, e dentre os 58 incisos previstos no mencionado artigo se destacam, para o presente trabalho, os incisos IV e XVI, os quais asseguram, respectivamente, a liberdade de manifestação do pensamento, com vedação ao anonimato, e o direito à reunião pacífica, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização.

O ano de 2013 ficará marcado na história pelas manifestações de massa ocorridas em junho, ápice do exercício dos direitos aludidos. Isso porque, naquele mês tiveram início nas cidades de Porto Alegre, São Paulo e Rio de Janeiro, os protestos contra o aumento das tarifas de ônibus. O movimento ganhou apoio da população devido à repressão da polícia militar dos estados em que ocorreram as manifestações, que rapidamente se espalharam por todo o País, com uma agenda variada de reivindicações.

Ocorre que, independentemente da legitimidade das manifestações ocorridas, por vezes o exercício deste direito teve seus limites extrapolados, visto que uma minoria de participantes, desvinculada de quaisquer objetivos coletivos, realizou quebra-quebra e saques nos comércios locais. Com isso, surge a indagação acerca da possibilidade de certo movimento social, como um todo, responder pelos danos provocados, sendo que o único meio processual para a viabilização da reparação material seria através da ação coletiva passiva.

Assim, o objetivo do presente trabalho é analisar a possibilidade jurídica e as consequências do ajuizamento de ação coletiva passiva em face dos movimentos sociais que participaram das manifestações populares.

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As manifestações sociais de junho de 2013

Junho de 2013 foi o mês em que o País registrou o maior conjunto de manifestações de rua de sua história recente. As suas razões ainda não estão claramente definidas pelos estudiosos, sendo certo que demandará muito trabalho para os teóricos tentar explicá-las. Porém, é possível afirmar que as manifestações foram deflagradas com os protestos pelo aumento das tarifas nas cidades de São Paulo, Rio de Janeiro e Porto Alegre, sendo liderados pelo Movimento do Passe Livre.

O movimento foi abraçado pela população e ganhou representatividade, inclusive de brasileiros que vivem em outros países, após a reação desastrosa da polícia militar, - nos estados em que cujas capitais houve manifestações - que, para conter os manifestantes, agiu de forma truculenta, ferindo participantes e alguns jornalistas que cobriam o evento.

Os manifestantes eram, em sua maioria, pessoas da classe média brasileira3, segundo dados de uma pesquisa realizada pelo instituto IBOPE4,

A forma das manifestações de junho é denominada, segundo os teóricos, de "mobilização na esfera pública", que pode ser definida como:

[...] fruto da articulação de atores dos movimentos sociais localizados, das ONGs, dos fóruns e redes de redes, mas buscam transcendê-los por meio de grandes manifestações na praça pública, incluindo a participação de simpatizantes, com a finalidade de produzir visibilidade através da mídia e efeitos simbólicos para os próprios manifestantes (no sentido político-pedagógico) e para a sociedade em geral, como uma forma de pressão política das mais expressivas no espaço público contemporâneo. (Schere-Warren, 2006)

Em razão da rede mundial de computadores, esta forma de manifestação se tornou mais frequente, já que em pouco tempo é possível organizar e convocar milhares de pessoas para que se mobilizem.

3 Em estudo realizado no ano de 2008, a Fundação Getúlio Vargas estabeleceu que a classe média brasileira é

composta por família cuja renda seja igual ou superior a R$ 1.064,00, valores que atualizados pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), correspondem a R$1.440,06. Este valor, convertido em salários mínimos, equivale a 2,12 salários mínimos. Disponível em: <http://apatru.tempsite.ws/arquivos/%7BE5B6DB5D-2D03-4D6E-99E3-E8F03E92FA2A%7D_M3_ANovaClasseMedia_Port_2.pdf>. Acesso em: 02 set. 2013.

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A pedido do programa Fantástico, da Rede Globo de Televisão, o IBOPE realizou uma pesquisa sobre as manifestações e registrou que 26% dos manifestantes sociais tinham renda familiar acima de 5 até 10 salários mínimos e outros 23% tinham renda acima de 10 salários mínimos. Disponível em: <http://g1.globo.com/brasil/noticia/2013/06/veja-integra-da-pesquisa-do-ibope-sobre-os-manifestantes.html> Acesso em: 02 set. 2013.

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Foi justamente isso que ocorreu nas mobilizações de junho deste ano, uma vez que sua organização se deu pela rede mundial de computadores, sobretudo com o uso das redes sociais, com destaque para o Facebook.

2.1 Uma tentativa de explicar os eventos ocorridos no mês de junho de 2013

Uma das características que marcam a democracia é justamente o modelo de representação política, no qual os representantes são os membros eleitos para defenderem os interesses dos representados.

Assim, a "representação política funda-se no exclusivismo do Estado no exercício do poder político, sustentado por uma soberania do indivíduo manifesta por meio do voto. Tal concepção está em consonância com o significado moderno da palavra representar, como uma espécie de agir no lugar do outro." (ALMEIDA, 2011). Este é o conceito da democracia conhecido como "minimalista"5.

Ainda não se conseguiu explicar com segurança os motivos do fenômeno ocorrido no mês de junho de 2013. Entretanto, fala-se que as manifestações de rua, não apenas as ocorridas no Brasil, mas as quem vêm ocorrendo em todo o mundo, seriam devidas à chamada crise de representação política.

Sobre a crise de representação política mundial, ou crise de legitimidade, explica Castells que:

[...] um componente essencial dessa crise de legitimidade consiste na incapacidade de o Estado cumprir com seus compromissos como estado de bem-estar, desde a integração da produção e do consumo, com um sistema globalmente independente e os respectivos processos de reestruturação capitalista. (CASTELLS, 2001, p. 401).

O mesmo autor, em recente entrevista, advertiu que: "Todos os dados mundiais, excetos os da Escandinávia, mostram o desprestigio total dos políticos, partidos e parlamentos. Se os cidadãos pudessem, mandariam todos embora, mas o sistema bloqueou as saídas" (CASTELLS, 2013, p. A14).

E, realmente, parece que a explicação passa mesmo pela chamada crise de representação, sobretudo pelos seguintes aspectos: 1) não houve, em sua maioria, envolvimento de partidos políticos, sendo que os principais representantes do movimento se

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diziam apartidários; 2) o movimento protestava contra a forma com que o governo trata a saúde, a educação e a segurança; 3) havia indignação contra a corrupção, que assola o país; 4) havia também reivindicação de mudanças na política, entre outras bandeiras.

É de se notar que as passeatas de junho, em pouco tempo, surtiram efeitos, já que os prefeitos de várias cidades voltaram atrás no aumento das tarifas de ônibus6; o Senado Federal aprovou o Projeto de Lei 5.900/13 que torna o crime de corrupção hediondo; a Câmara dos Deputados cancelou verba de R$ 43 milhões para a Copa das Confederações e de 2014; dentre outras medidas que integrariam uma “agenda positiva”.

Portanto, visto sob o aspecto de fortalecimento da democracia o movimento foi positivo, uma vez que a população se sentiu inserida no sistema político, haja vista que parte das demandas sociais foram atendidas.

Porém, o problema surge em relação àqueles manifestantes que, desvinculados de qualquer objetivo altruísta, promoveram saques e danos ao patrimônio público ou privado. Essas pessoas, ao agirem desta forma, provocam danos ao Estado e aos particulares e até mesmo à mobilização. A pergunta que se faz é: como buscar a reparação dos prejuízos experimentados pelas vítimas daqueles que, travestidos de manifestantes, causaram danos patrimoniais, já que dificilmente consegue se identificar a autoria desses danos? É essa indagação que se abordar com o presente artigo.

3 A

reparação dos danos provocados pelos manifestantes sociais

O grande problema das vítimas dos danos causados pelos manifestantes é saber em face de quem a ação será movida, uma vez que se trata de movimento bastante heterogêneo. Isso faz com que seja muito complicado identificar-se um autor específico.

Nessa esteira, diante da quase impossível identificação pessoal dos reais causadores dos danos, uma solução seria o ajuizamento de uma ação em face de certa coletividade, via ação coletiva passiva. É essa hipótese que será testada a seguir.

6 Cita-se como exemplo as cidades do Rio de Janeiro, São Paulo e mais quinze cidades que reduziram as tarifas

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3.1 As ações coletivas passivas

A ação coletiva passiva pode ser definida como a ação que é proposta em face de um grupo, de uma coletividade, de uma categoria, e que tem como objeto direitos ou interesses coletivos, ou seja, é a ação que traz a coletividade no polo passivo (DIDIER JÚNIOR; ZANETI JÚNIOR, 2010, p. 411).

Contudo, Gidi alerta que a ação coletiva passiva não pode ser vista como uma ação coletiva ativa às avessas. O autor, ao analisar o instituto no direito norte-americano, assevera que:

[....] a ação coletiva passiva não deve ser compreendida simplesmente como uma ação coletiva às avessas. Portanto, ela não deve ser utilizada por um potencial réu (em uma futura ação coletiva ativa indenizatória por danos individuais) para obter uma sentença que declare que o seu produto não causou danos aos membros do grupo (sentença declaratória negativa de responsabilidade de danos). Na estrutura processual americana, isso não é uma ação coletiva passiva, mas uma ação coletiva ativa iniciada pelo réu. (GIDI, 2007, p.392).

A doutrina a classifica em duas espécies: ordinária ou comum, e duplamente coletiva. A primeira seria a ação coletiva comum ou ordinária, segundo a qual no polo ativo da demanda figuraria uma ou mais pessoas, em face de uma dada coletividade.

Gidi traz alguns exemplos desta espécie de ação coletiva:

[...] a ação coletiva poderá ser utilizada quando todos os estudantes de uma cidade ou de um Estado tiverem uma pretensão contra todas as escolas, cada um desses grupos sendo representado por uma associação que os reúna. Igualmente, ações coletivas poderão ser propostas contra lojas, cartórios, órgãos públicos, planos de seguro-saúde, prisões, fábricas, cidades etc., em benefício de consumidores, prisioneiros, empregados, contribuintes de impostos ou taxas ou mesmo em benefício do meio ambiente. (GIDI, 2007, p. 412)

A outra espécie de ação coletiva passiva é a duplamente coletiva, ou seja, aquela que em ambos os polos da ação estão presentes a coletividade. Exemplo dessa espécie são os litígios trabalhistas coletivos, em que a relação processual é composta pelo sindicato patronal em um lado e o sindicato dos empregados no outro, onde se discutem situações jurídicas coletivas. (DIDIER JÚNIOR; ZANETI JÚNIOR, 2010, p. 415).

Portanto, a espécie de ação coletiva irá depender da parte que estará presente em juízo no polo ativo do processo.

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As ações coletivas passivas podem ser classificadas, ainda, como independentes ou originárias e incidentais ou derivadas.

Maia (2009, p.54) preleciona que as ações coletivas passivas originárias são aquelas que não têm qualquer dependência com uma ação coletiva ativa. Elas decorrem apenas de uma relação jurídica de direito material comum. Já as ações coletivas passivas incidentes ou derivadas, decorrem da existência das ações coletivas ativas ou duplamente coletivas. O autor utiliza como exemplo a ação rescisória de ação coletiva ativa. Desta feita, ocorrerá a inversão dos polos para ser formada a nova relação processual.

As ações coletivas passivas de forma regulamentada tem origem no direito norte-americano, que hoje é prevista pela no art. 23 da Federal Rules of Civil Procedure.

Em análise à ação coletiva passiva no direito norte-americano, Vigliar assinala que o procedimento para as denominadas defendant class action, na essência, não são muito diferentes das ações coletivas ativas. Porém, na ação coletiva passiva, há determinadas peculiaridades:

[....] (a) exige-se, para que ocorra a certification – ou seja, a admissibilidade da demanda como class action –, que o autor comprove tratar-se de ação coletiva, que será ajuizada em face de um dos class members (nas plaintiff class action essa incumbência é do representante adequado da coletividade); (b) c adequacy of

representation, ou seja, que o class membes, efetivamente é um representante da

classe, apto a representar o grupo na qualidade de demandado (class representative); nas plaintiff class action, portanto a caracterização da representatividade adequada é ônus do demandante, que dele se desincumbe sob pena de não receber a

certification; nas defendant class action, o autor da demanda deverá demonstrar que

há interesses da classe, contrários ao seu e que o class member tem condições de representá-la. [...] para que não ocorram eventuais conluios entre o suposto class

representative e o autor da demanda coletiva coletiva passiva. Acrescenta-se que o class member demandado pode [...] negar a sua condição de representante do grupo

demandado, surgindo diversas consequências que deverão ser solucionadas pelo juízo competente (desde a determinação da indicação de outro class member, passando pela denegação da certification, chegando à determinação da manutenção do class member por entender que há sim, no caso concreto, a presença da representação adequada). Dispensável mencionar que, admitida a demanda coletiva em face da coletividade, ocorrerá o que se denomina de collateral estoppel, ou seja, a extensão dos limites subjetivos da coisa julgada material, que não mais se restringirá ao demandado (class member que teve a sua condição de representante adequado reconhecida). A eficácia atingirá a todos do grupo, categoria ou classe de pessoas atingidas pelo resultado da demanda que sofrerão imposição dos efeitos da sentença. (VIGLIAR, 2007, 312-313)

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Sobre os benefícios deste tipo de ação, Gidi afirma que:

A vantagem de uma defendant class action é manifesta nos casos em que há um padrão de conduta ilegal entre um grupo de réus semelhantemente situados, como, por exemplo, várias escolas, penitenciárias, lojas, municípios, cartórios, planos de saúde, franqueados, infratores de uma patente, etc. Com uma única ação coletiva é possível obrigá-los todos a cumprir a lei através de um único processo e uma única decisão, que terá força de coisa julgada em face de todos os membros do grupo. (GIDI, 2007, p.391)

A vantagem referida pelo autor reside no fato de que a demanda em que foram afirmados direitos individuais ou coletivos dirige-se contra uma coletividade, titular de uma situação jurídica passiva fundada num dever ou em um estado de sujeição, por exemplo.

3.2 Tese da admissibilidade da ação coletiva passiva no ordenamento jurídico brasileiro

Definido o instituto da ação coletiva passiva, bem como sua classificação, cumpre agora investigar a possibilidade de sua adoção no ordenamento jurídico pátrio.

Grinover, já em 1986, dizia ser possível a adoção de uma ação coletiva passiva no ordenamento jurídico brasileiro, em interpretação ao art. 5º, parágrafo 2º da Lei 7347/85. Na oportunidade a autora afirmou que:

[...] a Lei 7.347 permite a intervenção, como litisconsortes do réu, aos entes públicos e às associações legitimadas à ação (art.5º, §2º): associações, portanto, constituídas para a defesa do meio ambiente e dos consumidores. Talvez não sejam freqüentes as oportunidades em que os interesses institucionais dos corpos intermediários coincidam com os do réu. Mas não se podem excluir, a priori, ações intentadas não a favor, mas sim contra o interesse coletivo. (GRINOVER, 1986, p.117).

Verifica-se que a processualista – uma das autoras do anteprojeto do Código de Defesa do Consumidor –, antes mesmo da entrada em vigor do diploma consumerista, já sustentava tal possibilidade, de modo que este veio apenas para ratificar a possibilidade de adoção da ação coletiva passiva, sendo que o artigo 5º, parágrafo 2º da Lei 7.347/85 agora deve ser lido em conjunto com os artigos 83 e 107 do Código de Defesa do Consumidor. (GRINOVER, 1986).

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[...] o artigo 107 do CDC, que trata da convenção coletiva de consumo, já é um claro exemplo de possibilidade de se demandar judicialmente a classe em caso de descumprimento de qualquer das cláusulas do aludido contrato, após a sua celebração.

[...]

O art. 83 do CDC, por seu turno, esclarece que para a defesa dos direitos e interesses protegidos pelo Código são admissíveis todas as espécies de ações capazes de propiciar sua adequada e efetiva tutela.

Assim, pode-se afirmar ser perfeitamente possível a propositura de ação em face da classe, a fim de se realizar todas as situações práticas decorrentes dos exemplos já imaginados pela doutrina. (LENZA, 2003, p. 210-211).

Mais a frente, o autor, após citar alguns exemplos, ressalta que, no Brasil, assim como em outros países, também pode ser verificada a aplicação da ação coletiva passiva:

[...] não se pode deixar de vislumbrar, também no Brasil, a moderna tendência, com a sua extraordinária importância prática, de se permitir o ajuizamento de ações coletivas em face de representantes da classe, seguindo experiência do direito alienígena, mas, indiscutivelmente, dentro das particularidades do direito brasileiro, respeitando-o. (LENZA, 2003, p. 213).

Didier Junior Zaneti e Junior sustentam que, mesmo diante da inexistência de norma expressa que estabeleça legitimação coletiva passiva, não constitui óbice à propositura de ação coletiva em face da classe. Os autores expõem suas razões com base na possibilidade de ajuizamento de ação rescisória, cautelar incidental e mandado de segurança contra ato do juiz contra o réu em ação coletiva ativa. Dizem que diante destas possibilidades "admite-se, implicitamente, que algum sujeito responderá pela coletividade, ou seja, admite-se a ação coletiva passiva”. (DIDIER JUNIOR;ZANETI JUNIOR, 2010, p. 425)

Gidi, por sua vez, sustenta que:

Se é verdade que o CDC e a LACP não as contemplam expressamente, também é certo que não as proíbem. Se a tutela coletiva foi permitida pela lei e se há regulamento processual adequado para a matéria, não há por que negar a possibilidade de uma ação coletiva passiva, questão, porém, merece cuidadoso estudo antes que uma palavra final possa ser dada a respeito. (GIDI, 2007, p. 415).

Porém, ainda há, por parte da doutrina7, um apego aos ditames conferidos pelo direito processual individual, que se encontram positivados no Código de Processo Civil. Assim, sempre quando não existe lei específica sobre um assunto qualquer, são utilizadas as regras positivadas no Código de Processo Civil.

7 Cf., a propósito da tese de inadmissibilidade da ação coletiva passiva no ordenamento jurídico brasileiro,

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De fato, o Código de Processo Civil não permite a possibilidade de adoção da ação coletiva passiva. Entretanto, é necessário que seja realizado um verdadeiro diálogo de fontes, o que, diga-se, já ocorre com as ações coletivas ativas, pois as regras rígidas contidas no direito processual individual são incompatíveis com as demandas coletivas, mormente, os problemas relativos à legitimidade e extensão dos limites da coisa julgada.

Um dos principais argumentos utilizados pela doutrina para negar a adoção da ação coletiva passiva no Brasil é realizado com base na interpretação dada ao artigo 6° do Código de Processo Civil, o qual estabelece ser necessária autorização legal para a substituição processual, pois no processo civil comum a legitimidade é ligada à titularidade do direito controvertido.

Esse entendimento, fundado numa interpretação restritiva e literal da lei com que se apega a doutrina para negar, de lege lata, a ação coletiva passiva brasileira, ganha mais força na crença de que o sistema de legitimidade adequada no sistema jurídico brasileiro é ope

legis, ou seja, um sistema rígido de representatividade adequada, tornando impossível a

representação da classe em juízo, já que hodiernamente não existe nenhuma lei estabelecendo a possibilidade de a classe figurar como demandada. (VIGLIAR, 2007, p.315).

Ocorre que, no Brasil, o sistema adotado é um sistema misto de aferição dessa legitimidade, uma vez que o juiz deve verificar se o representante da classe está elencado no rol de legitimados, bem como a adequada representação por parte daquele que se apresentou em juízo (VIGLIAR, 2007).

A legitimação para agir no direito processual coletivo não é realizada apenas sob o enfoque da representação legal, devendo ser observada, também, com base na relevância social da causa e não ligada à titularidade do direito reclamado, possuindo legitimidade para agir a pessoa que possuir as melhores condições possíveis para realizar a defesa da coletividade. Afasta-se, assim, a tese de que a inexistência de texto expresso de lei constituiria obstáculo à adoção da ação coletiva passiva.

É sabido que as ações coletivas ativas se desenvolveram com maior intensidade, uma vez que o sistema processual coletivo brasileiro foi calcado sob a ótica da coletividade como credora de tutela jurisdicional, e não como violadora de direitos.

Esta concepção não pode ser entendida como óbice à possibilidade de a coletividade ser demandada em juízo, pois uma interpretação sistemática do ordenamento jurídico permite concluir ser perfeitamente possível a adoção da ação coletiva passiva no ordenamento jurídico nacional.

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O objetivo do legislador, ao estabelecer no artigo 83 do Código de Defesa do Consumidor que são admissíveis todas as espécies de ações, foi propiciar sua ampla, irrestrita, adequada e efetiva tutela, reforçando, pois, a efetividade do processo. Neste sentido, Grinover, ao afirmar que o Código de Defesa do Consumidor em seu art. 83 dispõe que “para a defesa dos direitos e interesses protegidos por este Código, são admissíveis todas as espécies de ações capazes de propiciar sua adequada e efetiva tutela”. (GRINOVER, 2011, p. 103).

Maia sustenta que não existe no ordenamento jurídico brasileiro “previsão positiva ou negativa em relação à legitimidade extraordinária passiva nos casos de ação coletiva passiva”. (MAIA, 2009, p. 160).

Uma vez que a ação coletiva passiva não é expressamente vedada e nem admitida, a preservação e a garantia do princípio constitucional da inafastabilidade da prestação jurisdicional (art. 5º, inciso XXXV da CR/88) também podem ser utilizadas como argumento favorável à adoção da defendant class action no Brasil, visto que esse é um principio processual constitucional, aplicável tanto ao processo individual, como ao processo coletivo, não podendo ser ferido.

A interpretação restritiva do artigo 6º do Código de Processo Civil acarreta violação ao referido princípio, o que não pode ser admitido. Trata-se princípio previsto no rol dos direitos e garantias fundamentais, os quais possuem aplicação imediata, nos termos do parágrafo 1º do art. 5º da Constituição Federal de 1988.

Neste sentido, Sarlet ao dizer que:

[...] há como sustentar a aplicabilidade imediata (por força do art. 5, § 1º, de nossa Lei Fundamental) de todos os direitos fundamentais constantes do Catálogo (art.5º a 17), bem como dos localizados em outras partes do texto constitucional e nos tratados internacionais. (SARLET, 2007, p. 275).

Vale salientar que, uma vez admitido o processo coletivo passivo, alguns requisitos devem ser observados, para que o referido instituto seja aplicado de uma forma mais segura. São eles:

a) O Poder Judiciário deve conferir ampla publicidade à ação coletiva, em que a coletividade figura como ré, com efetiva divulgação de sua existência, de modo a possibilitar a intervenção de interessados dando maior robustez à defesa da coletividade demandada.

b) O Ministério Público deve atuar, necessariamente, como custos legis, para dar maior segurança jurídica às partes, com o escopo de evitar fraude ao processo.

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c) Deve haver um rígido controle da representatividade adequada do réu em todas as fases do processo, também para evitar fraude e conluio entre as partes e em se verificando a ocorrência de fraude, o juiz deverá nomear um novo representante.

Enfim, no que diz respeito à coisa julgada e seus limites subjetivos, Vigliar anota que, nesse tipo de ações, deve ser destacado que o contraditório é observado quando presente a adequada representação da coletividade. Portanto, a coisa julgada deve se estender aos membros ausentes, mesmo que o resultado do litígio tenha sido contrário aos interesses da coletividade demandada. (2007, p. 317).

Em decisão datada de 2008, o Tribunal de Justiça do Espírito Santo reconheceu expressamente o ajuizamento de ação coletiva passiva, desde que observado o requisito da representatividade adequada. No mesmo julgado, o Tribunal reconheceu, ainda, a extensão subjetiva dos efeitos do julgado aos membros ausentes:

CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO COLETIVA PASSIVA (DEFENDANT CLASS ACTION). ILEGITIMIDADE PASSIVA. AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR. PRECATÓRIO DA "TRIMESTRALIDADE" (LEI Nº 3.935/87). INCONSTITUCIONALIDADE. PRECEDENTES VINCULANTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. RELATIVIZAÇÃO DA COISA JULGADA. PROCEDÊNCIA.

1. A classe tem legitimidade para figurar no pólo passivo de demanda coletiva, desde que observado o requisito da representatividade adequada, mesmo que não exista previsão normativa explícita. O ativismo judicial permite seja a admissibilidade inferida das garantias constitucionais do acesso à justiça, da vedação do non liquet, do due process of law e outras, pois "não se deve excluir a priori, de

lege lata, a via do acesso à justiça contra a classe, porquanto a defining function do

juiz, própria das ações coletivas (ativas ou passivas), autoriza a solução judicial de situações justapostas às previstas em Lei (...)" (ADA PELEGRINI GRINOVER, O Processo,São Paulo: Perfil, 2005, pp. 219-221). 2. A procedência da demanda coletiva passiva (defendant class action) afeta a esfera individual dos associados independentemente do exercício pessoal do contraditório. Com maior razão se participam, em polos invertidos, exatamente aqueles que figuraram na demanda geradora do ato objurgado. 3. A inexigibilidade da obrigação, por ineficácia do título judicial (sentença ou acórdão) fundado em Lei ou ato normativo declarados inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal ou em aplicação ou interpretação tidas por incompatíveis com a Constituição da República, pode ser reconhecida quando a declaração ocorreu "[...] em controle concentrado ou difuso (independentemente de resolução do senado) [...]" (RESP 803099/SP, relator ministro TEORI ZAVASCKI, DJ 6.3.2006, p. 253). (TJES; ADInc 100070019698; Tribunal Pleno; Rel. Des. Samuel Meira Brasil Junior; Julgado em 12/06/2008, DJES 14/07/2008; Pág. 18)

Há que se destacar ação coletiva passiva recente em que o STJ impôs limite ao direito de greve à Federação Nacional dos Policiais Federais – FENAPEF, em ação proposta pela União. A decisão foi assim ementada:

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CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. DIREITO DE GREVE. SERVIÇO PÚBLICO. POLÍCIA FEDERAL. ÓRGÃO ESSENCIAL À DEFESA DO ESTADO E DAS INSTITUIÇÕES DEMOCRÁTICAS. CONFLITO ENTRE

DIREITOS FUNDAMENTAIS. NECESSIDADE DE PONDERAÇÃO.

ORIENTAÇÃO DO STF. MI 708/DF.

1. É indiscutível a relevância jurídico-política do direito de greve dos trabalhadores, alçado pela Constituição da República à categoria de direito fundamental social ou de segunda geração (art. 9°), conforme clássica definição doutrinária. 2. A disciplina específica das funções da Polícia Federal é encontrada, na Constituição da República, em seu Título V, que versa sobre a defesa do Estado e das instituições democráticas. Daí se depreende a centralidade dessa instituição para a preservação da ordem jurídica inaugurada pelo constituinte de 1988.

3. Indubitável a legitimidade do pleito dos policiais federais por vencimentos adequados às essenciais funções exercidas, o que se afigura imprescindível para garantir a atratividade da carreira e uma bem-sucedida política de recrutamento, de modo a selecionar os melhores candidatos. Em outras palavras, mais do que um pleito corporativo, é do interesse da própria sociedade e do Estado brasileiro que seus policiais federais tenham remuneração satisfatória.

4. Entretanto, o caso concreto apresenta sério conflito entre o direito de greve pelo servidor público e o direito social à fruição de serviços públicos adequados e contínuos, cuja solução exige a aplicação de juízo de ponderação.

5. No MI 708/DF, o STF reconheceu que, em razão das particularidades do caso concreto e dos serviços essenciais em questão, é possível fixar regime mais rígido que o imposto pelos arts. 9° e 11 da Lei 7.783/1989, bem como conceder Medida Cautelar para a garantia de percentual mínimo de servidores em atividade, "ou mesmo a proibição de qualquer tipo de paralisação", o que, evidentemente, requer situação de excepcionalíssima gravidade, sob pena de completo esvaziamento de tão relevante direito constitucional.

6. O STJ, por sua vez, vem reconhecendo o direito de greve dos servidores públicos, mas tem imposto limites ao seu exercício, com a finalidade de manter a continuidade do serviço público (Pet 7.884/DF, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, Primeira Seção, DJe 7/2/2011; AgRg na Pet 7.883/DF, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Rel. p/ acórdão Ministra Eliana Calmon, Primeira Seção, DJe 21/6/2010).

7. O periculum in mora fica suficientemente demonstrado pelo risco de dano aos bens jurídicos protegidos pela atuação da Polícia Federal (art. 144, § 1°, da CF), caso prossiga a paralisação, sem qualquer critério.

8. Por seu turno, o fumus boni iuris encontra-se presente nos limites impostos pela ordem jurídica ao exercício do direito de greve em atividades essenciais à sociedade. 9. Liminar parcialmente deferida para determinar a manutenção em atividade dos servidores da Polícia Federal nos seguintes termos: a) 100% (cem por cento) nas hipóteses de plantão em unidades instaladas em portos e aeroportos e para o atendimento das requisições da Justiça Eleitoral, nos 1° e 2° turnos das eleições; b) 70% (setenta por cento) nas atividades de Polícia Judiciária, de inteligência e em unidades de fronteira; c) 50% (cinquenta por cento) nas funções de Polícia Administrativa; d) 30% (trinta por cento) nas tarefas residuais. Estabeleço multa diária no valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais), em caso de descumprimento. (Pet 9460/DF, Rel. ministro HERMAN BENJAMIN, Primeira Seção, julgado em 19/09/2012, DJE 24/09/2012)8.

A aplicação do instituto no direito brasileiro, de lege lata, é inegável e decorre do mundo atual, sendo de bom alvitre reconhecê-la para que o sistema processual brasileiro

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possa cumprir os princípios constitucionais de celeridade e efetividade, que não podem ser afastados.

A grande dificuldade, como se viu, é a de saber contra quem será proposta a ação, ou seja, quem será o representante da coletividade. Para suavizar essa dificuldade é que no Brasil se adota um controle misto da representatividade adequada, tese defendida por Vigliar, conforme anotado acima.

Por outro lado, não há dúvida de que a ação tem que ser movida contra um dos legitimados coletivos previsto no artigo 82 do Código de Defesa do Consumidor, não sendo possível a propositura da ação contra um movimento social que não goza de personalidade jurídica. Desta forma, não seria possível que um ente sem personalidade jurídica, como o Movimento do Passe Livre, responsável pelo início das manifestações de junho de 2013, figurasse como representante adequado de todos os manifestantes sociais.

Igualmente, não é possível afirmar que o Movimento do Passe Livre represente todos os participantes das manifestações ocorridas Brasil afora, servindo, assim, de representante adequado, visto que as manifestações não eram homogêneas, possuindo várias agendas e propostas.

Ademais, a possibilidade de consideração da representatividade adequada de um ente despersonalizado, como o Movimento do Passe Livre, poderia ter como trágica consequência o retorno ao estado de inação da população, que visualizando a possibilidade de sua responsabilização civil por danos causados por terceiros, mesmo se manifestando pacificamente, não correria o risco de se expressar na esfera pública.

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Conclusão

O presente estudo teve como propósito verificar a viabilidade da ação coletiva passiva em face dos integrantes de manifestações sociais nas quais ocorreram danos ao patrimônio público ou privado.

Verificou-se a possibilidade de adoção da ação coletiva passiva, de uma forma geral, no ordenamento jurídico. Isso porque, o art. 83 do Código de Defesa do Consumidor estabelece que, para a defesa dos direitos e interesses protegidos pelo Código, são admissíveis todas as espécies de ações capazes de propiciar sua adequada e efetiva tutela.

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Para tanto, sustenta-se a possibilidade de aferição da legitimidade adequada realizada pelo juiz, o que afastaria o óbice à propositura de ação coletiva em face da classe. Ressalta-se que apenas através do controle da representatividade adequada é garantido o devido processo legal, pois apenas a aferição da idoneidade realizada pelo magistrado, caso a caso, permitirá que seja verificado se o representante está defendendo os interesses dos substituídos.

Admite-se, portanto, de lege lata, que uma coletividade organizada possa assumir o polo passivo, como ré, desde que conste no rol dos legitimados previstos no art. 82 do CPC e que a represente adequadamente. O controle da sua adequada representação será realizado pelo magistrado, de acordo com as peculiaridades do caso a ele apresentado, de modo a primar pela participação das partes, em observâncias às garantias constitucionais.

O Judiciário deve conferir ampla publicidade à ação coletiva, em que a coletividade figura com ré, com efetiva divulgação de sua existência, de modo a possibilitar a intervenção de interessados dando maior robustez à defesa da coletividade demandada.

Deve haver, ainda, a necessária participação do parquet como custos legis, para dar uma maior segurança jurídica às partes, com o escopo de evitar fraude ao processo.

Concluiu-se, porém, que a ação coletiva passiva não poderia ser utilizada para responsabilizar os participantes das manifestações sociais de junho de 2013, uma vez que em tais manifestações não havia nenhum dos coletivos legitimados previsto no artigo 82 do CDC. Pelo contrário, a organização que deu início às mobilizações, conhecida como Movimento do Passe Livre, sequer é detentora de personalidade jurídica.

Ademais, ainda que se superasse a questão da legitimidade, mediante a identificação de ente que atendesse ao requisito da representatividade adequada, dever-se-ia ter em consideração as consequências políticas e sociais da responsabilização de certa coletividade pelos danos causados pelos participantes de manifestações sociais. Tal responsabilização poderia afastar a sociedade civil da esfera pública, restringindo seu poder de mobilização, pairando como a espada de Dâmocles sobre aqueles atores sociais que, finalmente, redescobriram a força da sociedade civil.

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Defendant class action and social demonstrations: a reckless civil liability of

the protesters and its possible policy and social implications

ABSTRACT

This article analyzes the civil liability of protesters in social demonstrations through a defendant class action and its possible social and political implications.In June 2013, there were various demonstrations throughout Brazil. Initially protesting against the increase in public transport fares, especially in the cities of Porto Alegre, São Paulo and Rio de Janeiro, the demonstrations have gained popular support because of the repression of the military police of the states in which they occurred. Street protests quickly spread throughout the country with the most diverse claims. There is no doubt that the demonstrations were legitimate, protected by the freedom of expression and assembly constitutionally provided (art. 5, IV XVI, CR/88). However, how to hold accountable those responsible for the damage caused by the protesters? One hypothesis for the solution of this problem would be to adopt the defendant class action. Nevertheless, this solution is quite controversial, since brazilian Code of Civil Procedure doesn’t consider this model of class action. Moreover, prosecuting protesters may have as a consequence the discouragement to peaceful protest and the very expression of citizenship.

Keywords: Social demonstrations; defendant class action; tutela collective; legitimation

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