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DESAFIOS E PERSPECTIVAS PARA A INCLUSÃO DE UM ESTUDANTE SURDO NO CURSO DE LICENCIATURA EM QUÍMICA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS E TECNOLÓGICAS

DEPARTAMENTO DE QUÍMICA

KEVIN LOPES PEREIRA

DESAFIOS E PERSPECTIVAS PARA A INCLUSÃO DE UM ESTUDANTE SURDO NO CURSO DE LICENCIATURA EM QUÍMICA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA

VIÇOSA – MINAS GERAIS

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KEVIN LOPES PEREIRA

DESAFIOS E PERSPECTIVAS PARA A INCLUSÃO DE UM ESTUDANTE SURDO NO CURSO DE LICENCIATURA EM QUÍMICA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA

Monografia apresentada ao Departamento de Química da Universidade Federal de Viçosa como parte das exigências para a conclusão do Curso de Licenciatura em Química.

ORIENTADOR: Vinícius Catão de Assis Souza

VIÇOSA – MINAS GERAIS

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KEVIN LOPES PEREIRA

DESAFIOS E PERSPECTIVAS PARA A INCLUSÃO DE UM ESTUDANTE SURDO NO CURSO DE LICENCIATURA EM QUÍMICA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA

Aprovada em 25 de junho de 2018.

Profa. Daniele Cristiane Menezes Departamento de Química – UFV

(Avaliadora)

Profa. Cristiane Lopes Rocha de Oliveira Departamento de Educação – UFV

(Avaliadora)

Prof. Vinícius Catão de Assis Souza Departamento de Química – UFV (Orientador e Coordenador da Disciplina)

Monografia apresentada ao Departamento de Química da Universidade Federal de Viçosa como parte das exigências para a conclusão do Curso de Licenciatura em Química.

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Aos meus pais, Gino e Adriana, e a todas e todos que de alguma maneira compartilharam comigo o seu amor e carinho, dedico este trabalho.

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AGRADECIMENTOS

Não consigo expressar em palavras toda a minha gratidão a Deus, pelo cuidado, sustento, amor e inspiração dado a mim durante o processo de construção deste trabalho. Ele é o que há de melhor em mim: toda honra e glória pertence a Ele!

Agradeço aos meus pais, Gino e Adriana, por me amarem e me apoiarem nessa jornada, investindo em meus sonhos, me suportando em minhas dúvidas e me aconselhando. Aos demais familiares, agradeço por todo apoio e carinho, sempre acreditando em mim.

À Raquel, por se fazer tão presente mesmo estando longe. Pelas várias noites junto ao telefone, as lágrimas e alegrias compartilhadas... Pelo amor!

Ao Quarteto (André, Tati e Mayelli), pela amizade, os “rolês”, estudos, filmes, pelo apoio espiritual e pelas brincadeiras também.

À família 1521 (Célio, Thiago, William, Jefferson “beavis”, Otávio, Daiane, Marcelo “pequi”, Luís “bananeira”, Anderson, Brian, Joelson “jobinha”, Elza, Reinaldo “matipó”, Alexandra, Rafael “feipa”, Thamires, Beatriz “bia”, Marcelo “negão”, Andréia “déia”, Bruno “gaffa”, Patrícia “patty”, Rodrigo “mandruvá”). Sou extremamente feliz por ter compartilhado tantos momentos memoráveis com vocês. Todos os Rock’s, as “zueiras” sem fim, ventos, jantas, jogos, conversas, discussões e rodas de música. Vocês são realmente uma família para mim.

À QUI 13 (Nathália “naty”, Ronald “molejo”, Maíra “mama”, Guelci “gui”, Lucas “côgo”, Vanessa, Clara), pelos estudos de última hora, pelas mais diversas conversas, pelo carinho, viagens e doideiras dessa turma. Agradeço por fazerem parte de minha vida. Afirmo que ela se tornou mais divertida com a presença de vocês.

À Kamila, pelas infinitas gravações, duetos, conversas sobre Deus e sobre a vida. Quase psicólogos um do outro “rsrsrs”. Sua amizade é muito importante para mim.

À banda de Louvor PIBV, pelos momentos de comunhão, ensaios, arranjos e por dividirem comigo o prazer de poder louvar a Deus.

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À PIBV, por me acolher em Viçosa e ser uma família para mim, me aproximando de Deus e de uma vida em comunhão com pessoas que possuem um mesmo propósito. Agradeço por todos os momentos que passamos juntos.

Aos professores da UFV e DEQ, por todo suporte dado, por compartilharem conhecimento e me auxiliarem na descoberta do profissional que sou. Agradeço em especial à profa. Daniele Menezes (juntamente com todos os amigos do LAB 412), pelas conversas e discussões sobre Química Inorgânica, experimentos e “assuntos gerais”. Ao prof. Vinícius Catão, por acompanhar de perto este trabalho e incentivar minha trajetória neste universo dos surdos e da Língua Brasileira de Sinais (Libras), além de me orientar sobre o futuro.

Aos companheiros da AAACE e do JJB-UFV, por me proporcionarem momentos de risada, descontração e muitas emoções. Vocês são sensacionais!

Agradeço à profa. Cristiane Botelho, pela orientação e pela oportunidade de trabalhar no Projeto Surdo Cidadão, bem como meus companheiros de trabalho: Ana Paula Abrantes e Eduardo Gomes. Agradeço aos meus amigos surdos (Tiago, Regiane, Ruimar, Ana e Samuel), por compartilharem comigo a sua cultura e língua, além de todo carinho.

Por fim, agradeço ao estudante surdo, a professora e as intérpretes que possibilitaram que esse trabalho se tornasse real. Obrigado pela disposição e gentileza para comigo. Este trabalho também pertence a vocês!

A todas e todos que contribuíram, direta ou indiretamente, para a conclusão desta etapa em minha vida: MUITO OBRIGADO!!!

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Blessed be the mystery of love.

[Abençoado seja o mistério do amor.]

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RESUMO

PEREIRA, Kevin Lopes. Desafios e perspectivas para a inclusão de um estudante surdo no curso de Licenciatura em Química da Universidade Federal de Viçosa. Monografia de conclusão do curso de Licenciatura em Química. Universidade Federal de Viçosa, Junho de 2018. Orientador: Prof. Vinícius Catão de Assis Souza.

A Constituição Federal define que Educação é um direito de todos(as) e responsabilidade do Estado, devendo ser garantido o desenvolvimento de qualquer pessoa, independente da sua condição. Neste sentido, estudos relacionados à educação dos surdos discutem a importância de assegurar tais direitos, favorecendo uma educação de qualidade por meio da acessibilidade linguística (Língua Brasileira de Sinais – Libras). Assim, o presente trabalho se alinha com tal discussão, abordando a Educação Inclusiva na perspectiva dos surdos, tendo o foco no Ensino Superior e na Lei 13.409/2016, que estabelece cotas para pessoas com deficiência nas universidades federais. Com esta Lei, a probabilidade dos estudantes surdos ingressarem nas instituições federais aumenta, intensificando-se a necessidade de avaliar intensificando-se as universidades estão preparadas para lidar com estas demandas. Desta forma, analisou-se o processo de inclusão de um estudante surdo ingressante no primeiro semestre de 2018 pela Lei da cota no curso de Licenciatura em Química da Universidade Federal de Viçosa (UFV). Para coletar os dados aqui analisados, oito aulas de Química Fundamental foram acompanhadas, considerando a importância desta disciplina para o curso. Além disso, notas de campo foram feitas e discutidas com o orientador. Posteriormente, a professora e os dois intérpretes foram entrevistados com o objetivo de compreender as suas percepções sobre o processo de ensino, além das condições de trabalho vivenciadas e os desafios encontrados no dia a dia. Com a análise dos dados, verificou-se que a UFV tem buscado estratégias e políticas de acessibilidade fomentadas pela Unidade Interdisciplinar de Políticas Inclusivas (UPI), de modo a acolher os estudantes surdos e permitir a eles uma equiparação de oportunidades por meio da acessibilidade linguística. Em relação ao curso de Química, verificaram-se alguns desafios para o estudante surdo e demais profissionais. Destaca-se a dificuldade constatada no processo de tradução/interpretação dos conceitos específicos da Química, o que compromete a acessibilidade linguística, além da barreira comunicacional entre o estudante surdo/professora e o estudante surdo/estudantes ouvintes, dificultando a interação social das partes, algo fundamental para favorecer o desenvolvimento pessoal e profissional ao longo do processo formativo. Por fim, analisou-se criticamente algumas das ações inclusivas implementadas na UFV e suas repercussões no ensino, destacando o que é benéfico e precisa ser reforçado, além do que tem demonstrado não contribuir com o processo de formativo e poderia ser aprimorado.

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ABSTRACT

PEREIRA, Kevin Lopes. Challenges and expectation for the inclusion process of a deaf student in the Bachelor in Chemistry at the Federal University of Viçosa. Undergraduate Thesis Submitted to the Department of Chemistry in Partial Fulfillment of the Requirements for the Degree of Bachelor in Chemistry. Federal University of Viçosa (Brazil), June 2018. Supervisor: Dr. Vinícius Catão de Assis Souza.

The Brazilian Federal Constitution defines that Education is a duty of the government for all, and the full development of any person, whatever its human condition, must be guaranteed by the State politics. Then, some researches related to the education of the deaf discuss the importance to ensure these rights, favoring a quality education in the school and the university through the linguistic accessibility (Brazilian Sign Language - Libras). The present investigation is aligned to this discussion and recognizes the importance to debate the inclusion (Education for all) in the perspective of the deaf people at university approach. Considering the Brazilian Law 13.409 (2016), which establishes the quotas for people with some disabilities in federal universities, the probability of deaf students join in these institutions was favored and, consequently, the importance to evaluate if these institutions are prepared to receive such students. Thus, in order to analyze the process of a deaf student’s inclusion that join in the Bachelor of Chemistry at Federal University of Viçosa (Brazil), eight classes of the Fundamental Chemistry Course were followed, considering the importance of this content for the Chemistry’s Bachelor. Notes were gathered from classroom observations, discussed with the advisor of this research. In addition, the teacher and the Brazilian sign language interpreters were interviewed in order to understand about the teaching process and working conditions, difficulties and challenges in the classroom. Based on the data analyzed, it was verified that the University seeks strategies and policies for accessibility through its Politics for Students' Educational Inclusion at University, in order to welcome the deaf student and allow him to equalize opportunities considering linguistic accessibility. In relation to the Chemistry Bachelor, this poses great challenges for the deaf student and the professionals involved. The difficulties in the translation/interpretation process of the specific Chemistry’s concepts are highlighted, which hinders the linguistic accessibility, as well as the communication barrier between the deaf student/teacher and the deaf student/ hearing students, which prevents social interaction between the group, that is important to favor personal and professional development. Finally, this research presents some formative actions in the University and their educational repercussions, highlighting what is beneficial and needs to be reinforced, besides what does not contribute to the inclusion process and should be improved. Keywords: Deaf Education; Chemistry; Brazilian Sign Language; Educational Inclusion; University.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 11

1.1CAMINHOS PERCORRIDOS PARA A CONSTRUÇÃO DO OBJETO DE PESQUISA ... 11

1.2BREVE DISCUSSÃO SOBRE O PROCESSO DE INCLUSÃO EDUCACIONAL ... 12

1.3OBJETIVO GERAL ... 16

1.4OBJETIVOS ESPECÍFICOS ... 16

2 REFERENCIAIS TEÓRICOS: HISTÓRICO DA EDUCAÇÃO DOS SURDOS, LEGISLAÇÃO BRASILEIRA E ENSINO DE CIÊNCIAS/QUÍMICA ... 16

3 ASPECTOS METODOLÓGICOS DA PESQUISA ... 21

3.1AMOSTRA E COLETA DE DADOS ... 23

4 RESULTADOS E DISCUSSÃO ... 23

4.1ANÁLISE DAS AULAS DE QUÍMICA FUNDAMENTAL ... 23

4.1.1 Observações sobre as aulas ... 31

4.2ANÁLISE DAS ENTREVISTAS COM A PROFESSORA E OS INTÉRPRETES ... 32

4.2.1 A professora de Química Fundamental ... 32

4.2.2 Os Tradutores Intérpretes de Língua de Sinais e Português (TILSP) ... 37

4.3OBSERVAÇÕES SOBRE OS DADOS ... 41

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS E IMPLICAÇÕES DO TRABALHO PARA O ENSINO DE CIÊNCIAS/QUÍMICA ... 42

5.1CONSIDERAÇÕES SOBRE A ACESSIBILIDADE LINGUÍSTICA (LIBRAS) ... 43

5.2CONSIDERAÇÕES SOBRE A ESTRUTURA FORNECIDA... 43

5.3CONSIDERAÇÕES SOBRE AS INTERAÇÕES SOCIAIS ... 44

5.4IMPLICAÇÕES PARA O ENSINO DE CIÊNCIAS/QUÍMICA ... 45

6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS... 46

ANEXO I ... 49

ANEXO II ... 50

ANEXO III ... 51

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1 INTRODUÇÃO

1.1 Caminhos percorridos para a construção do objeto de pesquisa

A temática abordada neste trabalho se relaciona com minha vida de várias maneiras. As ideias presentes em cada página desta monografia podem ser consideradas parte das muitas vivências, reflexões, paixões e sonhos expressos durante a minha graduação. Desde cada relação estabelecida, orientações ou conversas sobre o futuro, tudo contribuiu para que, de escolha em escolha, eu chegasse no contexto em que realizei este trabalho.

A educação se tornou meu foco ainda no Ensino Médio. Pensava sobre como era especial o trabalho de um professor. As apresentações de trabalho, aulas de reforço e orientações aos colegas de sala realizadas me ajudavam a entender sobre o que me cativava e como isso poderia futuramente se tornar a minha profissão. Semelhantemente, a Química se tornou meu alvo logo ao ingressar no Ensino Médio. Entre todas as novidades, estudar as substâncias, os elementos e as interações que ocorrem no nosso mundo foi, de longe, a mais prazerosa descoberta, estreitando ao passar dos anos as possibilidades e se tornando então a minha escolha: trabalhar com o ensino de Química.

Ao entrar na Universidade, constatei que minhas certezas geraram mais dúvidas. Ao se deparar com esse espaço, que contempla várias áreas do conhecimento e estabelece diversas relações entre elas, a Química revelou-se mais ampla. Porém esta amplitude foi o que me possibilitou estabelecer relações entre esta área do conhecimento e as formas possíveis de ensinar os estudantes surdos.

Em minha cidade natal, Divinópolis (MG), eu não tive contato com a comunidade surda. Minha primeira experiência com eles aconteceu na Primeira Igreja Batista de Viçosa, que os recebia para participarem do culto, interpretado por pessoas que possuíam o domínio da Língua Brasileira de Sinais (Libras) e que eram escaladas conforme a disponibilidade. Manifestei certa curiosidade ao observar os intérpretes, a maneira como expressavam as mensagens em Libras. Percebi que seria interessante investir meu tempo para a aprendizagem desta língua, para poder interagir com os surdos que iam à Igreja e também para meu crescimento pessoal e profissional.

Participei de dois minicursos realizados pelo Projeto Surdo Cidadão, coordenado pela prof.ª Cristiane Botelho, do Departamento de Matemática (UFV). Este Projeto de Extensão trabalha com a divulgação da Libras e com aulas de Matemática e Química/Ciências para

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estudantes surdos, em uma perspectiva bilíngue. Estes minicursos me auxiliaram nos primeiros passos em meu processo de aprendizagem da Libras. O mais interessante é que eu não imaginava que meses depois eu faria parte deste mesmo Projeto. O envolvimento com o Surdo Cidadão me proporcionou experiências maravilhosas, principalmente no que diz respeito ao contato com os estudantes Surdos. Posteriormente, visto que era necessário melhorar minha comunicação em Libras, investi em outros cursos e me dediquei de forma mais intensa a aprendizagem desta língua.

Em relação ao meu trabalho com a Química, durante aproximadamente dois anos eu estagiei no laboratório da profa. Daniele Menezes, que me instruiu com todo carinho e dedicação. Neste período, trabalhei principalmente com meus conhecimentos químicos, sempre refletindo sobre o que me chamava mais atenção e me motivava. Esta experiência me ajudou a crescer como profissional e a ser mais maduro em relação as minhas concepções da Química e seus processos. Neste período reforcei minhas ideias sobre o quanto estudar Química era importante para mim e como essa ciência me encantava, sendo essencial para eu reconhecer que realmente este era este o caminho que almejava seguir.

Movido pelo desejo de ser útil para a sociedade e, de alguma maneira, por meio do meu trabalho, trazer contribuições válidas para a comunidade científica, promovi a união de três de minhas paixões: o ensino, a Química e a Libras. Com a orientação do prof. Vinícius Catão, eu fui conduzido a refletir sobre temas relacionados à inclusão, metodologias de ensino e, principalmente, sobre o tipo de professor que eu queria ser. Pensar sobre o ensino de Química para surdos, para mim, se constituiu como um grande desafio e, ao mesmo tempo, uma atividade prazerosa. Tal desafio, futuramente, seria foco da minha monografia e dos estudos posteriores à graduação.

Após todas as reuniões de orientação conduzidas pelo prof. Vinícius, sempre com muita sinceridade e paciência, me encontro no momento em que apresentar este trabalho é também contar um pouco da minha história, com os “sotaques” das muitas experiências vivenciadas ao longo desta trajetória formativa. Se tais “sotaques” não se estivessem presentes, este processo não faria sentido. Então avante, porque a história continua!

1.2 Breve discussão sobre o processo de Inclusão Educacional

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sejam elas de caráter social, linguístico ou político. Existe um número pequeno, porém considerável, de publicações relacionadas ao processo de inclusão dos estudantes surdos na Educação Básica, sobretudo quando comparadas com as publicações que referem-se a educação e inclusão de surdos no Ensino Superior.

Bem como na Educação Básica, a presença do surdo no Ensino Superior aponta alguns desafios para os envolvidos no processo de ensino e aprendizagem. Desafios estes que estão relacionados à: (i) efetiva inclusão dos alunos, visto que poucos dos envolvidos (estudantes e professores) possuem o domínio da Libras (1º Língua dos surdos) e conhecem as especificidades da cultura surda; (ii) carência de sinais em Libras que se equivalem a termos característicos, em português, das áreas de estudo; (iii) falta de formação específica por parte do Tradutor Intérprete de Língua de Sinais/Língua Portuguesa (TILSP), sendo um dificultador na compreensão inicial de determinados conceitos para sua posterior interpretação/tradução; e (iv) oferecimento de um suporte para os estudantes surdos, considerando a estrutura das universidades e a necessidade de um investimento financeiro para a contratação de intérpretes, monitores e outros profissionais envolvidos. Tais desafios precisam ser discutidos, dada a importância da inclusão dos surdos no contexto educacional. A educação, segundo Quadros (2003, p.85), “deveria estar calcada em um plano que atenda de fato as diferenças: sociais, políticas, linguísticas e culturais no contexto brasileiro”. Quando se procura contemplar as diferenças, a educação inclusiva não é considerada como um problema, mas como um desafio. Bisol et al. (2010) acreditam que as instituições de Ensino Superior:

[...] precisam rever profundamente o modo como lidam com o ensinar e o aprender. Precisam conhecer a surdez, pensar sobre as diferenças linguísticas e culturais e sobre o modo como essas diferenças incidem na vida acadêmica desses estudantes. (BISOL et al., 2010, p. 169)

Autores como Lacerda (2006), Oliveira e Benite (2015), Sousa e Silveira (2011), discorrem sobre temas relacionados à inclusão escolar de estudantes surdos, considerando que tal inclusão pode ser caracterizada como um movimento que, segundo Pereira, Benite e Benite (2011), é historicamente recente. Estes últimos autores também consideram “a educação de surdos como objeto de estudo urgente, visto que muitos professores já vivenciam em suas salas de aula experiências com esses educandos” (PEREIRA; BENITE; BENITE, 2011, p. 48). Pode-se também ressaltar o fato de que a educação constitui-se como

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um direito, assegurado pela Constituição de 1988, de todos os cidadãos. Sendo assim, se determinado grupo não recebe uma educação digna e eficiente, não podendo usufruir de seus direitos, tal circunstância já deveria ser considerada como um objeto de estudo urgente.

No Brasil, a Educação Inclusiva (EI) ganhou certa notoriedade com a publicação da Lei de Diretrizes e Bases (LDB) em 1996, que baseou-se na Declaração de Salamanca (1994). Essa declaração defende a democratização das oportunidades educacionais, reforçando que todos os grupos e classes sociais precisam receber uma educação adequada para seu desenvolvimento cognitivo.

Os surdos, contemplados pela EI, representam um grupo que por muito tempo foi estigmatizado. Eram rotulados como incapazes de se desenvolverem, pois tinham uma “deficiência”, não se encaixando na percepção de “normalidade” que a sociedade possuía. Desta maneira, estes eram privados de seus direitos humanos fundamentais (SACKS, 1998). Atualmente, sabe-se que os surdos se desenvolvem normalmente, desde que educados conforme suas diferenças linguísticas, que constituem-se como a principal diferença entre a educação de ouvintes e de surdos.

Em todo o Brasil, somam-se aproximadamente 9,7 milhões de “deficientes auditivos” segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2010. Nesta pesquisa, o IBGE considera a surdez como um quadro clínico de intensidade e não por questões culturais. Sendo assim, estes dados englobam um espectro de pessoas com surdez moderada até as pessoas com surdez profunda, representando cerca de 5% da população brasileira.

Ao longo dos anos, os surdos vêm conquistando seu espaço e reconhecimento na sociedade como parte ativa dela. Algumas leis e decretos que favorecem a comunidade surda e suas necessidades educacionais já foram aprovadas como, por exemplo, a Lei Nº 10.098, de 19 de Dezembro de 2000, que estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida (BRASIL, 2000); a Lei Nº 10.436, de 24 de Abril de 2002, que dispões sobre a Língua Brasileira de Sinais (BRASIL, 2002); o Decreto Nº 5.626, de 22 de Dezembro de 2005, que regulamenta as leis apresentadas anteriormente, demandando, por exemplo, a inserção da Libras nos cursos de Licenciaturas, Pedagogia e Fonoaudiologia (BRASIL, 2005).

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Em 28 dezembro de 2016 foi sancionada a Lei Nº 13.409, que altera a Lei nº 12.711, de 29 de agosto de 2012, para dispor sobre a reserva de vagas para pessoas com deficiência nos cursos técnicos de nível médio e superior das instituições federais de ensino (BRASIL, 2016). Por meio desta Lei, o Sistema de Seleção Unificada (SISU) de 2018 na UFV aplicou a determinação de reserva de vagas para estudantes com necessidades especiais permanentes, sejam estas físicas, auditivas, visuais, mentais ou múltiplas. Mediante estas circunstâncias, a probabilidade das universidades receberem tais estudantes aumenta, bem como a necessidade de pensar se estas instituições estão preparadas para incluí-los no meio acadêmico, ofertando-lhes todas as oportunidades e possibilidades que são oferecidas, no caso dos surdos, a um ouvinte (equiparação de oportunidades e quebra das barreiras linguísticas).

Para que essa inclusão aconteça, elaboram-se políticas afirmativas visando assegurar o direito constitucional à educação de pessoas com necessidades especiais (PNE), demonstrando certo zelo por parte do governo. Porém, isto não garante que tais políticas sejam aplicadas corretamente. Nestas circunstâncias, o ensino desse grupo de pessoas fica comprometido. Assim, é necessário o desenvolvimento de pesquisas voltadas para temas que vão de encontro à inclusão destes indivíduos no Ensino Superior.

No presente ano de 2018, um estudante surdo (ES) ingressou no curso de Licenciatura em Química da UFV pela Lei das Cotas (BRASIL, 2016). Tal situação caracteriza-se como uma oportunidade de caracteriza-se avaliar o processo de inclusão deste estudante, com foco no ensino de Química, bem como as relações estabelecidas em sala de aula entre ES e TILSP, professora e demais estudantes ouvintes. Em seu primeiro período, o ES cursou a disciplina Química Fundamental1, na qual são abordados conceitos gerais que, em sua maioria, já foram estudados no Ensino Médio, mas agora de maneira aprofundada e mais detalhada.

Sabe-se que a Química é uma Ciência Exata composta por termos e conceitos com definições técnicas e complexas, em sua maioria. Ela representa um desafio para o estudante surdo que tem como primeira língua (L1) a Libras, que possui modalidade gestual-visual e necessita de associações e comparações para compreender tais termos e conceitos que, em grande parte dos casos, não possuem um sinal específico para sua tradução do

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Informações detalhadas sobre esta disciplina introdutória ao curso de Química (Bacharelado e Licenciatura) da Universidade Federal de Viçosa, com o Programa Analítico, podem ser obtidas em:

http://www.catalogo.ufv.br/interno.php?ano=2017&curso=BQI&campus=vicosa&complemento=BQI&periodo =1&disciplina=QUI102#disciplina

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português para a Libras. Nesse sentido, o Professor e os TILSP exercem importante função no processo de ensino e aprendizagem deste estudante.

Sendo assim, o foco deste trabalho consistiu na análise das relações estabelecidas entre Professor, TILSP e ES, sendo estas relações internas ou externas ao ambiente da sala de aula. Sobre as relações internas, investigou se o estudante teve devida acessibilidade linguística (presença de intérpretes nas atividades acadêmicas), se os conceitos químicos estão sendo traduzidos/interpretados de modo claro e coerente, se o ambiente de estudo favoreceu de alguma maneira o processo de ensino e aprendizagem, dentre outras. Sobre as relações externas, cabem questionamentos relacionados à existência ou não de um suporte para o estudante surdo e de uma relação entre professor e TILSP para avaliação das aulas.

O presente trabalho deriva da necessidade de contribuir para uma reavaliação do processo de ensino e aprendizagem, com vistas a compreender o desafio atual de se pensar a educação inclusiva no espaço acadêmico de uma universidade federal, tomando como recorte uma disciplina introdutória do curso de Licenciatura em Química.

1.3 Objetivo geral

Avaliar o processo de inclusão de um estudante surdo em aulas de Química Fundamental, disciplina ofertada no primeiro período do curso de Licenciatura em Química da UFV.

1.4 Objetivos específicos

• Analisar como se deu o processo de inclusão do estudante surdo, relacionado com sua acessibilidade linguística, durante as aulas de Química Fundamental.

• Conhecer as percepções da professora e dos intérpretes sobre o processo de ensino estabelecido na sala de aula, suas condições de trabalho, dificuldades e desafios.

2 REFERENCIAIS TEÓRICOS: HISTÓRICO DA EDUCAÇÃO DOS SURDOS, LEGISLAÇÃO BRASILEIRA E ENSINO DE CIÊNCIAS/QUÍMICA

A Lei da Libras (Lei n° 10.436 de 24 de abril de 2002) juntamente com o decreto n° 5.626 de 22 de dezembro de 2005 que a regulamenta, podem ser tomados como um marco na luta pelos direitos educacionais para os surdos, pois reconhecem a língua dessa comunidade e a sua importância. Há um histórico envolvendo a educação dos surdos no

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Brasil e apesar das conquistas serem recentes, os acontecimentos relacionados a educação desta comunidade datam do século XIX.

Em 1855, o professor Eduard Huet chega ao Brasil a mando de Dom Pedro II, que promoveu a iniciativa da criação de instituições destinadas ao atendimento escolar de pessoas com necessidades especiais - PNE. Huet era francês, surdo e possuía conhecimentos de metodologias para o ensino de surdos, juntamente com Dom Pedro II, foi responsável pela criação, em 1857 no Rio de Janeiro, do Imperial Instituto dos Surdos-Mudos, hoje chamado de Instituto Nacional de Educação de Surdos - INES. A influência de Eduard não se limitou a fundação do INES, a Língua Brasileira de Sinais - Libras foi criada por meio de uma junção da Língua Francesa de Sinais (LSF) e os sinais já usados pela população surda brasileira (STROBEL, 2006).

Observando a situação atual da educação de surdos, Beltrami e Moura (2015) afirmam que é possível perceber uma ruptura em determinada parte da história que envolve esse tema. Isso ocorreu por um período de tempo, pois os surdos foram proibidos de utilizarem a língua de sinais, conforme decidido no Congresso de Professores em Milão (1880), onde buscavam a “normalização” dos surdos. Isto não agradou a todos, e alguns surdos resistiram a essa decisão, lutando para que a língua de sinais fosse valorizada. A desvalorização da língua de sinais provocou um atraso no desenvolvimento da educação desses indivíduos, que só foi reforçada novamente, após os movimentos de luta e resistência, com a implantação do bilinguismo como metodologia adequada para se aprimorar o ensino dos surdos, sendo então tal ruptura destacada pelas autoras.

Ao passar dos anos, entre altos e baixos, os sujeitos surdos sempre lutaram pelos seus direitos educacionais. Como consequência disso, no Brasil, estudos relacionados à educação de surdos ganham força com a crescente notoriedade dada a essa comunidade através da divulgação de sua cultura e do incentivo, por parte do governo, dado a projetos e pesquisas que abordam temas relevantes para os surdos. Destaque também expresso, por exemplo, no Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), de 2017, que tomou como tema de sua redação: “Desafios para formação educacional de surdos no Brasil”. Para esta edição da prova, segundo INEP (2017), 7.603.290 pessoas se inscreveram.

A trajetória educacional no Brasil se inicia na Educação Básica, a Química em si é abordada somente no Ensino Médio, sendo então, possivelmente, o primeiro contato dos estudantes com essa ciência. Sendo assim, alguns autores discutem a inclusão dos surdos no

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ensino médio, Lacerda (2006), por exemplo, com uma abordagem mais ampla, afirma que a inclusão não se limita apenas a surdez, ela se refere a busca de formas melhores de interagir com indivíduos de outra cultura, com uma língua diferente, outra fé religiosa, entre outros. Benite, Benite e Ribeiro (2015) consideram que para qualquer proposta de educação inclusiva (EI), é fundamental que se estabeleça uma prática educacional que leve em consideração a diversidade da sala de aula compromissada com as particularidades de cada estudante. A EI é contra quaisquer formas de exclusão e discriminação, independentemente de suas origens.

Visto isso, na educação de surdos, propõe-se que as escolas e instituições adotem a educação bilíngue, pela qual o surdo é reconhecido como uma comunidade que possui língua e cultura própria. Esta modalidade permite que os surdos sejam instruídos em sua língua natural, no Brasil a Libras, que é reconhecida como primeira língua. Utiliza-se também do português, porem como uma segunda língua (BELTRAMI; MOURA, 2015).

Por fim percebe-se que, com a inclusão escolar, os estudantes surdos passam a frequentar as escolas regulares, porém não cria-se um espaço bilíngue. Nestas instituições, por exemplo, os conhecimentos químicos são apresentados por um professor de Química, não em Libras, mas em Língua Portuguesa. Então, para que os estudantes surdos tenham devida acessibilidade linguística, é necessária a presença do Tradutor Intérprete de Língua de Sinais/Língua Portuguesa (OLIVEIRA; BENITE, 2015), profissão reconhecida na Lei nº 12.319 de 1º de setembro de 2010 (BRASIL, 2010), considerando-se que o surdo tem o conhecimento da Libras. Então, se o acesso linguístico for comprometido, o letramento científico também ficará.

Considerando a quase inexistência de um ensino bilíngue para os surdos nas escolas regulares, pensar sobre a educação desses indivíduos nas condições atuais reais é extremamente importante. Deste modo, é possível refletir sobre as ações que estão sendo realizadas e melhorá-las.

No sistema vigente na maioria das escolas de educação básica no Brasil, nas aulas de Química, segundo Oliveira e Benite (2015), o professor assume a função de mediador do conhecimento químico, enquanto o TILSP age como intermediador desse processo. Para os ouvintes, o professor media a relação entre os estudantes e os conhecimentos científicos. Em se tratando dos surdos, o TILSP intermedia a mediação feita pelo professor entre tais

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conhecimentos e o estudante surdo, acrescentando uma etapa em comparação ao processo que se estabelece com os ouvintes.

Sendo assim, sobre a educação de surdos, Beltrami e Moura (2015) apresentam que:

Entre os surdos e ouvintes há uma única e grande distinção: a linguagem oral. Se por um lado, a qualidade de ser surdo foi anteriormente relacionado à tragédia e à culpa, por ser “diferente” dos demais ao passo que possui uma deficiência auditiva necessitando de um cuidado especial voltado para a educação dos mesmos, por outro lado, com o romper da visão estereotipada voltada a normalização do ser deficiente, no lugar da “cura” para esses busca educá-los segundo a sua cultura e natureza particular, afim de apropriá-los de sua linguagem, distanciando-se da ideia de anormalidade, de incompetência, de patologia, de inferioridade e aberração, inclinando-se para ser igualitário, com suas capacidades e habilidades individuais. (BELTRAMI; MOURA, 2015, p. 159)

Tomando como base a visão apresentada pelas autoras, o sujeito surdo em seu processo educacional precisa ser educado de modo contextual às suas necessidades linguísticas, culturais e seus costumes. Ainda que a presença do TILSP possa aumentar as probabilidades da ocorrência de concepções alternativas incorretas, durante o processo de interpretação, o uso da língua de sinais caracteriza-se como algo que aproxima o ES de sua cultura. Vale lembrar que a tentativa de oralização e, consequentemente, a proibição do uso da língua de sinais no passado, representou para a comunidade surda um retrocesso no que se refere ao seu desenvolvimento educacional. Tal fato corrobora com a ideia de que uma educação eficiente deve aproximar o estudante do que é contextual ao mesmo, para os surdos, destaca-se o uso da Libras, sua língua natural.

Sendo assim, faz-se necessário um bom domínio da Língua de Sinais e a apropriação da mesma por parte do surdo. Sobre a criança surda, Sacks (1989) afirma que:

[...] a língua deve ser introduzida e adquirida o mais cedo possível, senão seu desenvolvimento pode ser permanentemente retardado ou prejudicado [...]. Assim que a comunicação por sinais for aprendida - e ela pode ser fluente aos três anos de idade -, tudo então pode decorrer: livre intercurso de pensamento, livre fluxo de informações, aprendizado da leitura e escrita e, talvez, da fala. (SACKS, 1989, p. 38)

O autor fortalece a ideia de que, havendo um aprendizado consistente da Língua de Sinais, seu cognitivo pode se desenvolver normalmente, visto que este domina sua língua e pode se comunicar, bem como ter acesso às informações que lhe forem necessárias para seu aprendizado. Com base nisso, destaca-se novamente a importância da Língua de Sinais e da promoção uma acessibilidade linguística no processo de ensino e aprendizagem dos surdos. Além das questões já apresentadas, no ensino de química acrescentam-se alguns desafios,

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pois como afirmam Pereira, Benite e Benite (2011, p. 52) “os conceitos químicos são essencialmente simbólicos, assim se designam como um sistema geral de signos para os quais não existe correspondência na língua de sinais”. Há somente uma pequena parcela dos conceitos Químicos que possuem um equivalente em Libras, isso caracteriza-se como um desafio para o TILSP.

Diante disso, é importante que o TILSP interprete os conceitos apresentados dando a eles um significado coerente e que faça sentido para o estudante, novamente considerando cultura e costumes. A presença desse profissional é essencial visto que há uma barreira linguística entre professor e estudante surdo. Juntamente com o intérprete, o professor trabalha para que essa contextualização social e cultural da linguagem Química aconteça, respeitando seus significados para não criar concepções incorretas dos conceitos. Também, a utilização de uma comunicação visual e outros recursos que auxiliem a linguagem oral estimulando outros sentidos, principalmente quando não há correspondências para as simbologias químicas em Libras, é essencial. Sem o uso de tais estratégias, o aprendizado dessa Ciência pelos estudantes surdos poderá estar comprometido (PEREIRA; BENITE; BENITE, 2011).

Além da falta de sinais correspondentes em Libras para os conceitos químicos, outro dificultador é apresentado por Souza e Silveira (2011), os autores afirmam que os professores, em sua maioria, não possuem formação para trabalhar com os surdos, apresentando dificuldades na construção dos conceitos químicos para estes estudantes, bem como os intérpretes geralmente não possuem formação em todas as suas áreas de atuação. Sendo assim, defendem a necessidade de um trabalho conjunto entre os intérpretes e professores para que os sentidos seja produzidos de maneira correta e posteriormente, juntamente com o surdo, criarem sinais que representem esses conceitos. Segundo Souza e Silveira (2011):

Os alunos surdos têm dificuldades na aprendizagem em química em função da especificidade da linguagem química e da escassez de termos químicos na língua de sinais. Esse fato, associados ao despreparo dos docentes e ao desconhecimento dos intérpretes português/libras em relação ao saber químico, pode contribuir para a falta de interesse dos alunos surdos pela química escolar. (SOUZA; SILVEIRA, 2011, p. 42)

O conjunto de fatores apresentado pelos autores pode não só provocar certo desinteresse pelos estudantes surdos, mas também prejudicar a aprendizagem da química

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Não somente no Ensino Básico, as questões apresentadas anteriormente também são válidas para o Ensino Superior. Algumas diferenças são apresentadas por Bisol et al. (2010), que classifica a universidade como um contexto novo para os estudantes surdos, com exigências superiores às que encontravam na Educação Básica. Estas circunstâncias podem representar a possibilidade de experiências positivas em um ambiente de diversidade. Os autores ainda afirmam que a inclusão de PNE no Ensino Superior é recente, portanto as universidades precisam “repensar suas estratégias e investir em pesquisas que contribuam para um maior entendimento dos desafios e para criação de contextos que favoreçam os processos inclusivos” (BISOL et al., 2010, p. 168).

A entrada dos surdos no Ensino Superior representa mais um passo relacionado ao acesso à educação por esta comunidade. Porém, reflexos da Educação Básica podem dificultar o avanço desses indivíduos no ensino superior. Muitas vezes, faltam conteúdos prévios importantes aos surdos (DAROQUE; PADILHA, 2012), visto que estes em grande parte não recebem uma educação adequada no ciclo básico e não compreendem conceitos que seriam fundamentais para a construção de uma linguagem científica mais consistente. Tal defasagem e outras dificuldades irão permanecer enquanto a escola for organizada para atender somente os estudantes ouvintes. Para superar tais problemas, é necessário buscar um caminho bilíngue e multicultural (CRUZ; DIAS, 2009).

As questões relacionadas ao ensino de surdos, seja na Educação Básica ou Superior, devem ser discutidas para que estes tenham uma educação de qualidade e que os permita possuir um olhar crítico para as situações da vida. Em se tratando do ensino superior, este por sua vez, pode favorecer a abertura de horizontes e representar um percurso um tanto doloroso, pois retira o estudante de seu espaço de conforto, apresentando novos desafios (BISOL et al., 2010). Tal processo pode ser um marco para estes estudantes que em breve serão profissionais e “representarão para as próximas gerações de surdos, possibilidades novas e mais amplas de realização e de qualidade de vida” (BISOL et al., 2010, p. 168).

3 ASPECTOS METODOLÓGICOS DA PESQUISA

Esta pesquisa é de natureza qualitativa, empregando diferentes estratégias de investigação que se baseiam em textos e imagens (CRESWELL, 2007). Este autor afirma que a metodologia qualitativa é fundamentalmente interpretativa, onde o pesquisador interpreta

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os dados, podendo tirar conclusões sobre seu significado. Tal metodologia se divide em três grupos: pesquisa documental, estudo de caso e etnografia.

Gil (2002) aponta que a pesquisa documental se aproxima da pesquisa bibliográfica, porém seu material de estudo se diferencia. Ela faz uso de documentos que ainda não receberam nenhum tratamento analítico como, por exemplo, cartas, fotografias, gravações, dentre outros. Já o estudo de caso permite uma análise mais aprofundada de um ou poucos objetos de investigação, de modo a permitir que estes sejam amplamente conhecidos (GIL, 2002). Assim, o presente trabalho fez uso do estudo de caso, pois como apresentado, este permite analisar determinada unidade profundamente (GODOY, 1995), sendo ideal para a avaliação dos aspectos referentes ao processo de inclusão do estudante surdo na disciplina Química Fundamental.

Para realizar este trabalho, oito aulas de Química Fundamental foram observadas. Durante essas aulas, realizaram-se anotações sobre pontos importantes das mesmas, conforme recomendações sugeridas por Lüdke e André (1986), que são as seguintes: (i) fazer as anotações em um tempo próximo ao momento da observação; (ii) indicar dia, hora e local das observações; e (iii) distinguir as informações descritivas, as falas, as citações e as observações pessoais do pesquisador. Estas informações foram registradas em um caderno de campo e discutidas posteriormente com o orientador.

É importante destacar que, de acordo com Alves-Mazzotti (2001), quando uma pesquisa qualitativa tem o pesquisador observador fazendo parte da dinâmica social investigada, como foi o caso desta pesquisa, a investigação deve combinar a observação participante com outros instrumentos de coleta de dados, principalmente para assegurar uma maior confiabilidade à mesma. Por isso, foi feita entrevista semiestruturada com os professores e também anotação em caderno de campo. Segundo Bogdan e Biklen (1994), o caderno de campo se configura como um material descritivo que relata a parte mais subjetiva das etapas de uma pesquisa qualitativa que adota a observação participante, principalmente na ênfase especulativa proporcionada pelo desenvolvimento destas primeiras impressões.

Também, por meio de entrevistas semiestruturadas com os profissionais envolvidos no processo formativo (professora e intérpretes), traçou-se um panorama sobre questões importantes que envolveram: as ações realizadas para facilitar o processo de ensino e

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Essas entrevistas caracterizaram-se como semiestruturadas para que houvesse um direcionamento prévio, porém mantendo certa flexibilidade. Também, usou-se a gravação direta, pois esta permite o registro de todas as expressões orais e também possibilita que o entrevistador volte toda sua atenção para o entrevistado (LÜDKE; ANDRÉ, 1986). Posteriormente, estas entrevistas foram transcritas, usando o sistema de codificação proposto por Marcuschi (1986), e analisadas com base no referencial teórico apresentado inicialmente. Conforme definido por Marcuschi (1986), usou-se: (i) (( )) para indicar observações do entrevistador; (ii) (+) para representar pausas na fala; (iii) /.../ um corte na produção de alguém.

3.1 Amostra e coleta de dados

As aulas de Química Fundamental foram escolhidas para serem observadas devido a: (i) presença do estudante surdo e, consequentemente, as intérpretes na turma; (ii) importância da disciplina para o estudante que cursa o primeiro período da graduação, visto que é pré-requisito para as outras disciplinas específicas da química; e (iii) proximidade e facilidade de acesso ao local onde ocorrem as aulas.

As aulas foram observadas sequencialmente e ocorreram entre os meses de Março e Maio de 2018. Entre os temas abordados pela professora, destacam-se: características dos modelos atômicos de Bohr e Schröndinger, configuração eletrônica e ligações químicas. Esses conteúdos permitiram a análise do processo de tradução e interpretação frente conceitos complexos e conceitos que permitem o uso de modelos e comparações.

Além das aulas, foram feitas entrevistas (ANEXO I) com a professora (P) e as duas intérpretes que atuaram nas aulas (TILSP1 e TILSP2). As respostas foram gravadas, diante da autorização de P, TILSP1 e TILSP2, que assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (Anexo II). Ainda, o estudante surdo foi contatado antes do início das ações propostas anteriormente. Apesar de ser peça fundamental em todo o processo, não foi foco deste trabalho avaliar aprendizagem deste estudante, mas sim as oportunidades que lhe foram oferecidas, bem como uma devida acessibilidade linguística e inclusão.

4 RESULTADOS E DISCUSSÃO

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A seguir, será apresentado um esquema da sala de aula e dos elementos e pessoas que compõem o espaço (Figura 1). Na sequência, discutirá a descrição das oito aulas de Química Fundamental que foram acompanhadas para análise nesta pesquisa.

Figura 1. Esquema da sala onde as aulas acontecem.

Este esquema representa a posição em que comumente se encontram o estudante surdo (ES), a Tradutora e Intéprete de Língua de Sinais e Português (TILSP) e a professora (P). Cabe destacar aqui que a professora se movimenta por todo o espaço da sala e o intérprete se mantém fixo no espaço próximo ao quadro e tela de projeção. Durante as oito aulas, o estudante surdo foi acompanhado por duas intérpretes: TILSP1 e TILSP2. Elas se revesaram assumindo, TILSP1, as aulas de segunda-feira e, TILSP2, de sexta-feira. As aulas aconteciam segunda e sexta-feira, no turno da noite. Na segunda feira, eram duas aulas de cinquenta minutos seguidas, na sexta-feira, três aulas de ciquenta minutos. As aulas abaixo foram consideradas por um dia de aula, sendo estas de 1h40 (segunda) ou 2h30 (sexta) de duração.

AULA 01 – TILSP1

Nesta aula, o tema estudado foi: Modelo Atômico de Bohr. Desde o início, verificou-se certa dificuldade por parte da intérprete em expressar alguns termos científicos e definições relacionados ao tema da aula. Entende-se que isto é natural devido à formação da intérprete ser deslocada da área das Ciências. Souza e Silveira (2011, pg. 41), em sua

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pesquisa, também descrevem certa dificuldade de entendimento dos conceitos químicos por parte dos intérpretes envolvidos. Os autores ainda destacam que essa situação de deslocamento se caracteriza como “um fator preocupante do trabalho desenvolvido por esses profissionais”. A dificuldade apresentada por TILSP1 possivelmente causou a perda parcial do sentido de alguns conceitos, por exemplo: para a definição de “níveis de energia”, a intérprete usa um classificador que remete mais às características da posição do elétron. Sua mão direita estava fixa e configurada em S, configuração de mão (CM) 7, segundo quadro proposto por Pimenta e Quadros (2006, p. 63) (APÊNDICE I), representando o núcleo, a esquerda, curvada (CM 29), fazia um movimento marcando “camadas” que iam se afastando do núcleo, demarcando somente o espaço de cada nível (Figura 2). Deste modo, o conceito de “energia quantizada”, aplicável à definição dos níveis energéticos, não foi muito explorado.

Figura 2. Representação em Libras dos “níveis de energia” usada por TILSP1.

Em outro momento, ao explicar que o elétron pode receber energia, a professora contextualiza citando o exemplo da lâmpada fluorescente tubular, instalada na própria sala de aula, em que a luz emitida pela mesma é explicada pelas transições eletrônicas que acontecem após o elétron receber energia. Essa energia é fornecida inicialmente pela diferença de potencial aplicada na lâmpada, porém a intérprete usa o sinal de calor para representar tal energia, possibilitando um entendimento errôneo, por parte do estudante surdo, sobre o funcionamento deste objeto. Souza e Silveira (2011) afirmam que estabelecer um diálogo entre professor e intérprete é essencial para minimizar essas distorções dos conceitos químicos no processo de interpretação e tradução.

Ainda, julga-se importante destacar que o ES fez questão de copiar as informações fornecidas pela professora no quadro. No momento em que ele faz suas anotações, parte da

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fala da professora, interpretada para a Libras, se perdeu. O estudante não consegue fazer ambas as coisas, copiar e observar a intérprete, sendo então algo negativo, considerando que há perdas de definições e sentidos que deveriam ser estabelecidos e aprendidos por meio das ações docente, mediada pela TILSP1. ES não se manifestou com frequência nesta aula. Sua única intervenção foi ao questionar a professora, que detalhava as equações do modelo atômico de Bohr, sobre como o valor da velocidade da luz foi determinado e o porquê desse ser um valor fixo.

AULA 02 – TILSP2

Esta aula iniciou-se com a professora convidando o estudante surdo, que se encontrava fora da sala, para entrar, para que assim ela iniciasse sua aula. Atitudes semelhantes a essa são recorrentes durante as aulas e demonstram um constante cuidado e gentileza por parte da professora. Tais atitudes contrapõem as descrições feitas, por exemplo, nos artigos de Souza e Silveira (2011) e Benite, Benite e Ribeiro (2015) que, em seus estudos de caso, identificaram professores que possuem resistência à presença do estudante surdo e não lidam bem com o mesmo.

Conceitualmente, a aula seguia com estudos sobre o modelo atômico de Bohr. Em determinado momento, a professora explorava os conceitos de inversa e diretamente proporcional, abordando as equações de energia e suas variáveis envolvidas na teoria atômica de Bohr. Tais conceitos foram representados pela intérprete, dando margem para um entendimento errôneo de que duas grandezas proporcionais sempre possuem o mesmo valor e esses valores crescem conjuntamente. Com configuração de mão em B (CM 56), cada mão representava uma variável, as duas no mesmo nível subiam e desciam juntas, trazendo uma possível ideia de igualdade e não de proporcionalidade (Figura 3).

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Nestas circunstâncias, o estudante surdo apresentou dificuldades para se compreender os conceitos. A professora percebendo a dúvida repetiu as definições usando gestos semelhantes aos utilizados pela intérprete: mãos sobem juntas para indicar variáveis diretamente proporcionais e mãos se movem em direções opostas para definir grandezas inversamente proporcionais.

De modo geral, outras dificuldades em expressar termos específicos são encontradas como, por exemplo, a definição de Algarismos Significativos. A professora trata tal conceito de modo natural, considerando que este já foi aprendido pelos estudantes na Educação Básica. Não há como afirmar se o estudante surdo compreendeu ou não o termo, ou se já o conhecia, porém este não foi explicado pela intérprete que só usou da datilologia para expressá-lo. Como sua função não é explicar e sim interpretar e traduzir os ensinamentos da professora, visto que o estudante não se manifestou, o termo não foi devidamente detalhado e não houve a utilização de um sinal para caracterizar o conceito.

É interessante destacar que mesmo com todas as dificuldades relacionadas aos sinais e termos específicos, TILSP2 se mostra atenta e cumpre bem sua função, também estabelece um relacionamento visivelmente agradável com o estudante surdo e com a professora, criando um bom ambiente para aprendizagem.

AULA 03 – TILSP1

Nesta aula, abordou-se o tema: Limitações do modelo de Bohr: dualidade onda-partícula e princípio da incerteza. Pela primeira vez, durante o período de observação das aulas, o estudante surdo pede para que TILSP1 permaneça sentada durante a aula. Isso gerou problemas, pois a professora se movia do lado oposto ao da intérprete, que estava no lado direito da sala e um pouco afastada do quadro. Esse posicionamento confundiu o estudante surdo, que dividia sua atenção para: a intérprete, à direita, a professora, se movendo à esquerda, e o quadro com as anotações da matéria. As informações anteriores reforçam a característica visual-gestual da língua de sinais que, diferente do português oral, não pode ser compreendida sem o devido direcionamento e atenção do olhar, com exceção do Surdocego2 que comumente faz o uso da Libras Tátil3.

2

Incapacidade total ou parcial de audição e visão, simultaneamente.

3

Sistema que consiste a Língua Brasileira de Sinais ( LIBRAS ) adaptada ao surdocego. É realizada com a mão do surdocego em cima das mãos do interlocutor. Fonte: https://goo.gl/R82xns

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Observou-se também que a intérprete encontrava-se limitada, considerando que não podia interagir com as imagens e informações presentes no quadro e na tela de projeção. Percebendo isso, o estudante surdo pede para que ela volte à sua posição comum, como representado na Figura 1.

Assim como nas aulas descritas anteriormente, explicar os conceitos científicos permanece como uma das principais dificuldades enfrentadas pela TILSP, bem como o entendimento e interpretação de conceitos químicos e físicos apresentados na aula. Como exemplo, explicou-se que os fótons são definidos como partículas elementares mediadoras da força eletromagnética. No momento em que a professora introduz este conceito, devido a uma possível falta de compreensão por parte da intérprete, esta usa o sinal de “foto” para representar estas partículas (fótons). Este sinal não contempla os conceitos envolvidos na definição dos fótons, sendo um problema para o estudante surdo que possivelmente se apropriou de um sentido inadequado para a palavra.

Verificou-se que a turma, em sua maioria, não possuía o domínio da Libras. O estudante surdo facilitou a comunicação com os ouvintes, pois é parcialmente oralizado, balbuciando as palavras ao sinalizar seus equivalentes na língua de sinais. O uso de desenhos e escrita também é recorrente nessa interação, bem como atitudes do surdo relacionadas ao ensino de sinais para aqueles que se mostram mais interessados na comunicação por meio da Libras. Alguns estudantes estabelecem uma interação com o surdo que é mais frequente. De modo geral, a turma demonstra grande respeito com o estudante surdo, suas condições de linguagem e aprendizagem.

AULA 04 – TILSP1

Esta aula caracterizou-se por possuir termos extremamente técnicos, pois trata-se do modelo matemático e probabilístico proposto por Erwin Schröndinger para descrever o átomo, atualmente aceito como a melhor explicação do mesmo. Assim como em outros casos, é evidente a dificuldade de expressar estes termos abstratos na Libras, não somente por dificuldades linguísticas, mas também pelo significado atribuído a estes conceitos que não são familiares a intérprete.

Como já mencionado, a Libras é uma língua com modalidade gestual-visual. Quando se trata do que é abstrato e não pode ser visto, ela se limita ao uso de associações/relações para tentar explicar, por exemplo, conceitos e fenômenos que possuem tais características.

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Porém, em alguns casos, promover estas relações entre os conceitos científicos é difícil pela especificidade de tais termos. A definição de orbital, por exemplo, não foi bem explorada durante as aulas, no processo de interpretação, por se encaixar nesta classe de termos apresentada acima. Enquanto TILSP1 buscava formas de atribuir sentido a palavra, a professora seguia com as explicações e a intérprete logo a acompanhava sem finalizar as ideias iniciadas.

Além dos problemas relacionados às especificidades dos termos, durante a explicação do spin do elétron, a professora o relaciona com um tipo rotação do elétron em torno de si mesmo. A intérprete expressa essa ideia em Libras substituindo o conceito apresentado pela professora, associando-o a rotação do elétron em torno do núcleo, alterando o real sentido associado a palavra. Novamente afirma-se que estas situações são potencializadas devido à falta de uma formação específica em Química por parte das intérpretes. Esta formação não pode ser exigida por alguns fatores: a intérprete não trabalha somente com disciplinas relacionadas à Química e o cargo de nível D4 não exige formação em nível Superior. Pode-se ainda questionar se haveriam pessoas qualificadas para atender esta demanda específica.

AULA 05 – TILSP1

Seguindo os conceitos gerados a partir dos estudos da estrutura átomo, nesta aula a professora abordou o conteúdo de Configuração Eletrônica. Novamente, o tema trata de questões complexas, gerando dificuldades semelhantes às apresentadas em momentos anteriores.

Nesta aula especificamente, houve a omissão de definições importantes durante o processo de tradução e interpretação. Ao comentar sobre as características dos átomos, apresentadas na Tabela Periódica, a professora cita a massa atômica e, consequentemente, conceitua os isótopos, isto para explicar que a média ponderada destes equivale ao valor da massa de um átomo representada na Tabela. Essa informação dada pela professora não foi totalmente interpretada para o estudante surdo. A intérprete omitiu o termo “isótopo”, tratando somente como um átomo que possui determinada massa.

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Em outro momento, P detalhava a distribuição eletrônica dos íons. Para uma espécie iônica do bloco d da Tabela Periódica, o átomo ao perder um elétron, o tem retirado de seus orbitais s mais externos por questões de repulsão e entropia relacionadas ao número de possibilidades para aquele elétron. Para o orbital do tipo d, existem cinco possibilidades, enquanto para o orbital s, há somente uma. Sendo assim, é mais favorável a retirada do elétron de um orbital s, pois nele a repulsão eletrônica é maior e as possibilidades para o elétron são menores. Isto foi explicado detalhadamente pela professora, porém durante a interpretação usou-se apenas uma simples comparação entre os orbitais d e s. A intérprete marcou os dois orbitais no espaço, para o orbital d, fez o sinal “cinco”, para o orbital s, o sinal “um”. Depois sinalizou que o orbital d possuía mais e o s menos, e que por isso o elétron seria retirado de s. Da maneira que as definições foram apresentadas, omitiu-se os conceitos de repulsão eletrônica e das possibilidades para o elétron em cada orbital. Possivelmente limitando a aprendizagem do estudante surdo.

AULA 06 E 07 – TESTE E PROVA

Na Aula 06 foi aplicado um teste preparatório para a prova, feito pelos alunos em duplas. O estudante surdo optou por fazer o teste em sala, com o acompanhamento da intérprete, visto que lhe é permitido, se este desejar, fazer o teste ou prova em um local diferenciado possuindo um tempo maior para realizá-lo. Na Aula seguinte, os estudantes realizaram uma avaliação, ES também optou por fazer a prova em sala, juntamente com os demais discentes.

AULA 08 – TILSP1 e TILSP2

Durante esta aula, TILSP1 e TILSP2 revezaram-se. A professora abordou o tema: ligações químicas. Ao contrário dos assuntos abordados nas aulas anteriores, essa temática configurou exemplos que permitiram o uso de classificadores e recursos visuais. Desse modo, a aula seguiu com maior fluidez, pois os termos foram bem explorados pelas intérpretes. Isto se deu por que, ao interpretarem conceitos, por exemplo, de distância, força e energia de ligação, o uso de comparações, gráficos, desenhos e novamente os classificadores, facilitaram esse processo de tradução e interpretação.

Neste momento, o estudante surdo se manifestou apenas para solicitar que a professora explicasse novamente o gráfico da energia presente na ligação em função da

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distância. Ela o fez e com muita atenção e revisou termos que já haviam sido ensinados na aula anterior, conceituando uma ligação química e algumas de suas propriedades.

4.1.1 Observações sobre as aulas

Após a observação das oito aulas, de modo geral, é possível apresentar algumas considerações. Vários fatores são importantes para que o processo de ensino e aprendizagem dos estudantes aconteça de maneira satisfatória, cita-se o tempo de aula, as relações estabelecidas no espaço de construção do conhecimento, a postura de P, TILS1 e TILSP2 frente ao estudante surdo, o uso de materiais didáticos como apoio, bem como as metodologias utilizadas.

Em se tratando da duração da aula, essa se mostrou suficiente para que a professora abordasse de maneira profunda as temáticas propostas, sem necessidade de cortes bruscos no conteúdo devido a um limite de tempo. Isto pode ser caracterizado como algo benéfico, pois segundo Chaibue e Aguiar (2016), o tempo é o maior entrave quando se trata da tradução simultânea, sendo assim, é ideal que possa se trabalhar os conteúdos sem pressa.

A respeito das relações estabelecidas na aula, P se mostrou gentil com todos os estudantes, incluindo ES. As intérpretes também estabelecem esse contato agradável, porém não há a barreira comunicativa que existe entre o educando e a professora, e também com os demais estudantes. Sendo assim, reforça-se a importância do conhecimento da Libras pela comunidade acadêmica, meio no qual ES está inserido. Bem como uma sensibilização por parte dos profissionais envolvidos em conhecer a cultura desse estudante e suas condições de aprendizagem.

Essa atenção para a cultura se faz necessária a partir do momento que segundo Benite, Benite e Pereira (2011), a cultura surda é multifacetada, porém possui uma característica que se destaca: seu aspecto visual. A língua de sinais se traduz de modo visual, e essa particularidade é muito significativa segundo os autores. O professor, enquanto educador deve considerar essa singularidade, principalmente fazendo o uso de recursos didáticos que estimulam essa dimensão. Percebe-se que P foi bem atenciosa quanto a esses aspectos na aula, usando projeções com gráficos, representações e tabelas, bem como o uso do quadro para a organização do conteúdo através de esquemas. Tudo de modo bem organizado.

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Sobre a acessibilidade linguística desse estudante, esta é mediada pelo intérprete, que possui domínio da língua de sinais. Durante as aulas, através da interpretação simultânea, a intérprete permite a ES o acesso a informação apresentada por P. Nesse processo, percebe-se que alguns conceitos tiveram seu significado alterado, desviado ou omitido. A Tabela 1 mostra alguns exemplos:

Categoria Conceitos

Mudança de Significado Fótons

Desvio de Significado Níveis de energia; Spin; Inversa e diretamente proporcionais Omissão de Significado Orbitais; Isótopos; Algarismos significativos

Esses termos foram apresentados anteriormente e reforçam a dificuldade existente em versar para libras determinados conceitos químicos. A interpretação simultânea ainda oferece alguns desafios, pois em alguns momentos a intérprete se depara com palavras desconhecidas e isso caracteriza-se como um problema para expressá-las, como demonstrado na análise da aula 04 para a explicação de “orbitais”.

Para os casos onde não há sinais equivalentes em libras para uma palavra em português, a intérprete faz o uso de sinais combinados entre ela e o estudante surdo. Em alguns casos estes sinais são sugeridos por ela e em outros por ES. Essas combinações buscam respeitar os aspectos gramaticais e culturais da Libras, de modo a fazer sentido para o surdo e manter a coerência com o significado do conceito.

4.2 Análise das entrevistas com a professora e os intérpretes

Nesta seção serão apresentadas algumas informações advindas das entrevistas realizadas.

4.2.1 A professora de Química Fundamental

Por meio de entrevistas semiestruturadas, alguns questionamentos foram levantados. Estes tratavam sobre inclusão, formação profissional, dificuldades enfrentadas na educação inclusiva, dentre outros.

Inicialmente a professora (P) foi questionada sobre o conceito que possuía sobre a Tabela 1 – Conceitos que tiveram sentido modificado, desviado ou omitido.

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por ela. Segundo a professora, a inclusão no contexto da universidade é uma proposta muito boa e necessária. P justifica a importância da inclusão afirmando que é preciso considerar as necessidades de cada ser humano:

P: a sociedade vem mudando, essas mudanças são lentas e isso acontece de maneira lenta também na universidade. Mas eu acho uma iniciativa formidável, de inclusão, porque essas pessoas elas devem ser tratadas como iguais, mas elas têm (+) é (+) exigências são diferentes para a maioria das pessoas.

P também afirma que, atualmente, não cabe definir um quadro de normalidade na sociedade e, ainda assim, isso é imposto às pessoas, o que é normal e anormal. Em seu discurso, P defende que ao fazermos parte da sociedade, podemos lutar para romper com essas ideias: “P: Eu acho que a gente tem que derrubar a barreira disto porque nós somos a barreira entre isso.” Em sua fala, ela também pontua que o ser humano possui necessidades distintas, e essas necessidades devem ser consideradas em seus vários níveis, P chama atenção que não só a surdez, cegueira, dentre outros mais conhecidos devem ser considerados, mas também as questões psicológicas. Segundo a professora, muitos estudantes estão com a saúde mental prejudicada, sofrendo de transtornos e crises que envolvem o psicológico. Segundo a professora:

P: Eu vejo a inclusão de maneira mais ampla e eu acho que a gente não pode deixar de lado a saúde mental, não é? Então eu sempre faço essa pergunta pros meus estudantes: como é que anda a sua saúde mental? ((risos)).

Ainda sobre inclusão, P coloca que ela deve ocorrer não somente na universidade, mas na sociedade de forma geral. Diante disto, reitera que vê o que a universidade está fazendo como algo formidável. Sua opinião reflete a visão de um indivíduo que está dentro do sistema e percebe as ações que são feitas por ela e pela instituição em que trabalha, ressaltando os aspectos positivos, que realmente existem, conforme observado nesta pesquisa.

Sobre o papel da Universidade no processo de inclusão do estudante surdo, a professora, como já citado acima, acredita que a instituição tem cumprido bem os seus deveres para com ES. Ela destaca a dedicação e profissionalismo das intérpretes e a estrutura que a UPI oferece para o discente. Porém, coloca que gostaria que TILSP1 e TILSP2 possuíssem mais liberdade para intervir durante a aula. Segundo a docente “eu acho que em determinados momentos essa intervenção deveria acontecer pra não passar algo errado ou errôneo para o estudante” (P). O comentário da professora reflete o seu entendimento sobre algumas dificuldades encontradas no processo de tradução e interpretação, como a

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