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PRESTAÇÃO DE ALIMENTOS DEFINITIVOS A FAVOR DO EX-CÔNJUGE

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Tribunal da Relação do Porto Processo nº 1158/14.7TBPVZ.P1 Relator: FILIPE CAROÇO

Sessão: 20 Abril 2017

Número: RP201704201158/14.7TBPVZ.P1 Votação: UNANIMIDADE

Meio Processual: APELAÇÃO Decisão: REVOGADA

PRESTAÇÃO DE ALIMENTOS DEFINITIVOS A FAVOR DO EX-CÔNJUGE

Sumário

I - Na pendência do casamento, o dever de prestar alimentos, integrado no dever conjugal de assistência, tem uma dimensão diferente do dever de alimentos posterior ao divórcio.

II - Enquanto neste último caso há um dever humanitário de solidariedade e socorro marcado pela relação conjugal anterior, sendo o dever de alimentos limitado à garantia de um nível de subsistência condigna, na pendência do casamento, ainda que os cônjuges estejam separados de facto, devem garantir reciprocamente, em matéria de alimentos, um nível de vida tendencialmente semelhante àquele que tinham enquanto durou a comunhão de vida,

influenciado pelo tempo decorrido desde a separação, os laços persistentes e a situação atual de cada um deles.

III - O art.º 2016º, nºs 1 e 2, do Código Civil, na redação que foi introduzida pela Lei nº 61/2008, de 31 de outubro, consagra o princípio segundo o qual os cônjuges devem prover à sua própria subsistência depois do divórcio, quer se trate de divórcio por mútuo consentimento, quer de divórcio sem o

consentimento do outro cônjuge.

IV - A título excecional, nas condições previstas no subsequente art.º 2016º-A, pode um dos ex-cônjuges ser obrigado a prestar alimentos definitivos a favor do outro, mas a prestação limitar-se-á a garantir ao beneficiário o necessário à subsistência, contando com o valor de rendimentos próprios que o beneficiário consegue obter pela sua força de trabalho, nunca devendo os alimentos

constituir um incentivo à ociosidade.

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Texto Integral

Proc. nº 1158/14.7TBPVZ.P1 – 3ª Secção (apelação)

Comarca do Porto - Juízo de Família e Menores de Vila do Conde Relator Filipe Caroço

Adj. Desemb. Judite Pires

Adj. Desemb. Aristides de Almeida

Acordam no Tribunal da Relação do Porto I.

B…, residente na Rua …, nº .., …, Póvoa de Varzim, instaurou ação de divórcio sem consentimento do outro cônjuge contra C…, residente na Rua …, …, Matosinhos, invocando a rutura definitiva do casamento, com base na

separação de facto do casal, nos termos da alínea a) do art.º 1781º do Código Civil, com as alterações introduzidas pela Lei nº 61/2008, de 31 de outubro.

Citada, a R. contestou a ação e deduziu reconvenção.

Quanto àquela, impugnou parcialmente os factos, mas nada opôs a que o divórcio seja decretado.

Em sede de reconvenção, alinhou um conjunto de factos tendente a sustentar a sua dependência económica na pendência da vida em comum e depois dela, para defender o alegado direito a receber alimentos do demandante, quer na pendência da ação, quer posteriormente, com o seguinte pedido:

«(…)

- Deve ser julgado procedente, por provado, o pedido de alimentos, condenando-se o A. a pagar à R., a esse título, a quantia mensal de eur.

1.260,00€, a prestar, por transferência bancária, até ao dia 5 do mês a que respeite, e sendo a quantia actualizada anualmente, com base no índice de inflação publicado pelo Instituto Nacional de Estatística em relação ao ano anterior ao da actualização.

- Deve, igualmente, ser julgado procedente, por provado, o pedido de

alimentos provisórios, fixando-os na importância de eur. 650,00€, a prestar pela mesma forma e no mesmo tempo.» (sic)

Em resposta, o A. defendeu a improcedência do pedido reconvencional, por ser de negar o direito que a reconvinte invocou.

Foi elaborado despacho saneador tabelar, identificou-se o objeto do processo e definiram-se dos temas de prova.

Realizada a audiência final, foi proferida sentença fundamentada, com o dispositivo que se segue, ipsis verbis:

«Assim e nestes termos, de harmonia com o disposto nos artºs 1781º, 1773º,

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1781º, nº 1, al. a) e 1782º do Código Civil, na redacção da Lei 61/2008, de 30.10, decido:

A)-Decretar o divórcio entre Autor e Ré e a consequente dissolução do seu casamento.

B)- Absolver o Autor da totalidade do pedido reconvencional apresentado pela Ré Reconvinte.

Custas a cargo do autor, dado que está a exercer o direito potestativo do divórcio, nos termos do artº 535º nº 2 al. a) do C.P.C. e da Ré reconvinte relativamente ao pedido reconvencional efectuado.

Fixo em € 30.000,01 o valor da acção para efeitos de custas.

Registe e notifique e oportunamente cumpra-se o artº. 78º do C.R.Civil.»

Inconformada, recorreu a R. alegando com as seguintes CONCLUSÕES:

«1ª – Conforme os elementos de prova que os autos oferecem, mormente o depoimento de parte prestado em audiência e os depoimentos das

testemunhas invocadas, deve:

A - Ter-se como provado que:

- A ré esteve sempre colocada na dependência económica de seu marido;

- Assoberbada também com a organização e trabalho doméstico;

- A ré nunca recebeu, efectivamente, qualquer salário da D…;

- A ré tem vindo a angariar trabalhos esporádicos em tarefas de serviço doméstico, auferindo reduzida retribuição.

- Além das alinhadas no facto provado nº 49, que a ré despende mensalmente, em média, em alimentação, eur. 400,00€, em vestuário e calçado, eur. 150,00€

e em combustível e manutenção de automóvel, eur. 100,00€.

2ª – Com base nos mesmos elementos, deve o facto provado nº 30 ser alterado de forma a ficar formulado “para o que contava, por vezes, com ajuda de

mulheres-a-dias”.

3ª – Ainda com base nos mesmos elementos de prova e na decorrência das alterações requeridas deve, evitando contradição, deve ter-se como não provado o facto assente sob o nº 43,.

4ª– O depoimento de parte é forma de confissão judicial e foi prestado de forma espontânea e inequívoca, pelo que deve bastar-se como suficiente no sentido da demonstração dos factos em causa.

5ª - Os depoimentos das testemunhas que invocamos foram prestados denotando interesse pelo esclarecimento da verdade, produzidos em condições de merecerem credibilidade.

6ª – A reforma introduzida pelo Decreto-Lei nº 61/2008, de 31 de Outubro, manteve inalterado o preceito do art. 2009º do mesmo diploma, pelo que o ex- cônjuge permanece obrigado a prestar alimentos.

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7ª - A conjugar esta obrigação subsistente com a alteração legislativa, que prevê que cada cônjuge deverá prover à sua subsistência, depois do divórcio.

8ª - Nunca, porém, no sentido de que, pura e simplesmente, o dever de prestar alimentos cessa com o divórcio.

9ª - A conjugação das duas normas há-de ser feita, como se diz no douto acórdão Desse Tribunal, de 27 de Outubro de 2016, proc. nº

1412/14.8T8VNG.P1 – “nas condições previstas no subsequente art. 2016º-A, pode um dos ex-cônjuges ser obrigado a prestar alimentos a favor do outro, contanto que este demonstre impossibilidade ou grave dificuldade de prover, por si, à sua subsistência.”

10ª - Correspondente ao disposto no art. 2016º-A, nº 1, do Código Civil.

11ª - No que ao nosso caso interessa, a duração do casamento, a idade dos cônjuges, as suas qualificações profissionais e possibilidades de emprego, os seus rendimentos ou proventos e, de modo geral, todas as circunstâncias que influam sobre as necessidades de quem recebe e das possibilidades de quem presta.

12ª - Tendo em vista que o direito a receber alimentos não pressuporá a

impossibilidade de prover ao seu sustento, bastando que esteja demonstrada a grande dificuldade.

13ª - A antiguidade do casamento, a prestação voluntária de alimentos e a continuidade de prestação de trabalho na gestão dos bens do casal – facto provado nº 24, mesmo após a separação.

14ª - A ré não tem habilitações técnicas ou académicas que lhe permitam angariar emprego que proporcione rendimentos que não sejam muito reduzidos.

15ª - Com 53 anos de idade, não irá já consegui-las e irá continuar a não conseguir mais do trabalhos esporádicos e incertos, que mais esporádicos e incertos serão no futuro.

16ª - Todas estas circunstâncias, que resultam dos factos dados como provados e daqueles que ora propugnamos como tal sejam declarados, adequam-se à previsão do art. 2016º-A, nº 1, do Código Civil, pelo que sustentam a condenação do autor a pagar alimentos à ré.

17ª - Finalmente e sempre sem conceder, o pedido de alimentos foi formulado na reconvenção, a qual deu entrada em Juízo em 26 de Janeiro de 2015.

18ª - Em plena vigência do casamento e da sociedade conjugal, as razões em que a douta sentença se fundamenta para a denegação do direito a alimentos não têm cobertura legal, uma vez que as disposições dos arts 2016º e 2016º-A valem para depois do divórcio.

19ª - Acrescendo como provado que, durante dez anos após a separação – facto nº 33 - o que corresponde a cerca de dois anos antes da entrada do

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pedido de alimentos, o autor ter prestado espontaneamente alimentos no montante mensal de eur. 1.300,00€, tal pressupõe a possibilidade de o fazer e o reconhecimento da sua necessidade por parte da autora, durante esse

período não existe qualquer impedimento a que os mesmos sejam decretados.

20ª - Os alimentos são devidos desde a propositura da acção – art. 2006º, do Código Civil.

21ª - As resumidas necessidades da ré traduzem-se na média mensal de eur.

904,37€.

22ª - Será razoável a fixação da quantia mensal de eur. 500,00€.

23ª - Mas, até ao decretamento do divórcio, nenhuma razão legal há para que o pedido de alimentos não deva proceder integralmente, em montante até inferior ao que o autor prestou voluntariamente após a separação.

24ª - Verificam-se os pressupostos legais do art. 2004º do Código Civil.

25ª -Nos termos do disposto no art. 662º, nº 1, do Código de Processo Civil, Esse Tribunal pode alterar a decisão acerca da matéria de facto.

26ª - Ao decidir como decidiu, sempre salvo o devido respeito, que é muito, a Meritíssima Juíza a quo não fez a adequada ponderação da prova produzida, no que tange à decisão da matéria de facto, e proferiu decisão violadora das disposições dos arts 356º, 358º, 2004º, 2006º, 2009º, 2016º e 2016º-A do Código Civil.» (sic)

Pretende, assim a R., que a sentença seja alterada em sede de matéria de facto e que o A. reconvindo seja condenado a pagar-lhe alimentos no montante mensal de €1.260,00, desde a proposição da ação e até ao trânsito em julgado da sentença que decrete o divórcio, e de €500,00 após esta.

*

Em contra-alegações, o recorrido argumentou que nada se apurou quanto à alegada impossibilidade da R. prover, por si, ao seus sustento, procurando e prestando trabalho e que as testemunhas por ela indicadas referiram que o prestava, apesar de desconhecerem o respetivo rendimento. A decisão em matéria de facto não deve ser alterada e a situação da R. não se enquadra no nível de exigência que o art.º 2016º, nº 1, do Código Civil estabelece para o reconhecimento do direito a alimentos por parte do ex-cônjuge.

*

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

* II.

O objeto do recurso está delimitado pelas conclusões da apelação, acima transcritas, sendo que se apreciam apenas as questões invocadas e

relacionadas com o conteúdo do ato recorrido e não sobre matéria nova, excepção feita para o que for do conhecimento oficioso (cf. art.ºs 608º, nº 2,

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635º e 639º, do Código de Processo Civil).

O Tribunal deve apreciar todas as questões decorrentes da lide, mas, embora o possa fazer, não tem que discutir todos os argumentos ou raciocínios das partes, ou seja, apenas deve considerar o que for necessário e suficiente para resolver cada questão[1].

Para decidir está a questão da pensão de alimentos provisórios e definitivos a favor da R. e a cargo do A., ex-cônjuges; saber se há condições para ser

atribuída e, na afirmativa, qual deve ser o seu montante, o que passa também --- atentos os termos da apelação --- pela revisão da decisão em matéria de facto.

* III.

É a seguinte a matéria de facto dada como provada na 1ª instância:[2]

1- Autor e Ré contraíram casamento civil, em 27 de Abril de 1991, sem convenção antenupcial (Doc junto a fls. 9).

2- Desta relação conjugal entre Autor e Ré não nasceram filhos.

3- Desde Abril de 2002, Autor e Ré nunca mais nunca mais conviveram.

4- O casamento das partes culminou uma relação de namoro e vida em comum de perto de dois anos.

5- A R. é natural da República Federativa do Brasil, onde residia.

6- Conheceu o A. numa sua passagem pela cidade do Porto, em férias.

7- Tendo-se conhecido, encetaram de imediato uma relação de namoro, rapidamente convertida numa vida em comum, como se cônjuges fossem.

8- Tomaram de arrendamento uma casa sita à Rua Henrique Pousão, na cidade do Porto.

9- O A. acolheu a filha da Ré, Ana Paula, como se sua filha fosse e nessa condição a tratou ao longo dos treze anos de vivência familiar.

10- A R. teve algumas ocupações.

11- O casal mudou de casa duas vezes.

12- Nos primeiros anos da década de 90 para a Rua …, ainda na cidade do Porto, na …o.

13- Perto do final da mesma década, para uma moradia, na Freguesia …, Concelho de Matosinhos.

14- Estas mudanças corresponderam ao incremento da vida económica do casal, por virtude da crescentemente abastada condição económica do A..

15- Pouco tempo depois da mudança para esta casa, o A. instou a R. a que se dedicasse a uma nova actividade.

16- O A. era, em conjunto com sua mãe e seus irmãos, detentor do capital de uma sociedade – D…, Lda.

17- Esta sociedade tinha sido gerida por vários membros da família do A., mas,

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então, verificara-se vacatura na gerência.

18- Então, o A. animou a R. a que assumisse esse encargo.

19- O que esta passou a fazer.

20- Nunca foi formalmente nomeada como gerente.

21- Foi inscrita na Segurança Social como se fosse trabalhadora, com a categoria profissional de secretária (doc. fls. 59).

22- Foi declarado que a Ré auferia o ordenado mínimo.

23- A Ré exercia a gerência de facto daquela sociedade.

24- Sendo esse trabalho tido como integrante da gestão corrente dos bens do casal.

25- Após a separação em Abril de 2002, A R. permaneceu na gerência da D….

26- Às vezes, recebia dinheiro da D….

27- O trabalho de gerência da D… prolongou-se até há cerca de dois anos, ocasião em que a empresa fechou por se ter tornado inviável.

28- Incumbia à R. a direcção da vida doméstica.

29- Cuidando da manutenção e limpeza da casa, do tratamento das roupas de todos os elementos do agregado e da confecção das refeições.

30- Para o que apenas contava com a ajuda de uma empregada.

31- A Ré, conjuntamente com uma sócia, antes de trabalhar na D… trabalhou numa loja de roupar de criança, que lhe foi oferecida pelo Autor.

32- Apenas passou a trabalhar a tempo completo quando iniciou a sua actividade na D….

33- Após a separação, o A. passou a contribuir, voluntariamente, para os alimentos da R. com a quantia mensal de 1.300,00€, o que fazia por

transferência para a conta desta, no Banco E… com o nº ……….(docs. fls. 86 a 103).

34- O que fez durante 10 anos.

35- O Autor é economista, administrador de várias empresas do grupo

económico F…, entre outras, a G…, SA (doc. nº 40), a F1…, SA (doc. nº 41), e a F2…, SA (doc. nº 42), as duas primeiras com sede em Esposende e a terceira com sede em Belo Horizonte, República Federativa do Brasil.

36- O Autor declarou às finanças, no ano de 2012, um rendimento de 182.000,04€.

37- O Autor declarou às finanças, no ano de 2013, um rendimento de 182.002,80€.

38- O Autor declarou às finanças, no ano de 2014, um rendimento de 182.047,32€ (doc. fls. 186 a 188).

39 -A R. nasceu em 1 de Novembro de 1963.

40 -Tem como únicas habilitações literárias o ensino básico.

41- Não fala ou escreve qualquer língua estrangeira.

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42- Desde o fecho da D…, tem procurado ocupação, e encontra-se a trabalhar no Porto a efectuar limpezas em diversas casas.

43- Recebe remuneração pela actividade desempenha, em valor que não foi possível ao certo apurar, mas aproximado do ordenado mínimo nacional.

44- Vive sozinha e não tem ninguém a seu cargo.

45- Por força do seu casamento, fruiu de um nível de vida elevado, compatível com o de seu marido e proporcionado por este.

46- O casal não se impunha a quaisquer restrições económicas em qualquer das suas actividades ou hábitos pessoais.

47- Todos os anos faziam férias fora de casa, nomeadamente no Algarve, em Andorra e em …, onde mantinham casa tomada de arrendamento.

48- À data da separação, a A. tinha um veículo de gama média-alta para as suas deslocações pessoais.

49- Os gastos médios domésticos da R. são, em média mensal:

- Electricidade – eur. 84,00€;

- Gás – eur. 48,00€;

- Telefone e televisão – eur. 14,37€;

- Condomínio, com fundo de reserva – eur. 90,00€;

- Água – eur. 18,00€. (docs nºs 35 a 39).

50- O Autor tem pago mensalmente o valor da hipoteca da casa onde reside a Ré, no montante mensal de aproximadamente 450,00€ mensais.

51- Paga o IMI no montante de 370€/ano.

52- Há cerca de um ano efectuou o pagamento do condomínio em atraso no montante de 5.000,00€.

53- Tem empréstimos pessoais, pelos quais paga uma prestação mensal de cerca 1.110,00€.

54- Tem uma casa no Brasil pela qual paga a renda mensal de cerca de 600,00

€.

55- Suporta as despesas da sua casa, na qual reside com a sua actual companheira, que não trabalha.

56- O Autor não pretende reatar a sua relação conjugal com a Ré.

*

O tribunal recorrido deu como não provada a seguinte matéria:[3]

A- Desde o início da relação conjugal e mesmo antes do casamento, o A.

pretendia que a R. não trabalhasse fora de casa, querendo que esta se ficasse pela gestão das moradas que habitaram e pela educação e acompanhamento da filha.

B- A Ré esteve sempre colocada na dependência económica de seu marido.

C- E assoberbada também com a organização e trabalho doméstico.

D- Todo o trabalho de decoração, montagem, instalação dos móveis e demais

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cómodos e construção do jardim da vivenda do casal, foi da R.

E- A Ré nunca recebeu, efectivamente, qualquer salário da sociedade D….

F- A Ré tenha renunciando a qualquer carreira profissional independente.

G- O dinheiro recebido e referido a 26 dos factos provados eram uma retribuição a título de prémio pelos resultados anuais.

H- A prolongada devoção à vida do casal e a cessação da actividade da D…

deixaram a Ré na impossibilidade de procura de trabalho.

I- A Ré está desempregada.

J- Já teve cortes de fornecimento de energia eléctrica e água, por incapacidade de pagamento.

K- Gasta, em média mensal:

Para alimentação – eur. 400,00€;

Para vestuário e calçado – eur. 150,00€;

Para artigos de higiene e limpeza – eur. 100,00€;

Para combustível e manutenção do seu automóvel – eur. 200,00€;

Para lazer (pequenas deslocações, cinema, idas a cafés ou restaurantes) livros, cabeleireiro e “alfinetes” – eur. 150,00€.

* IV.

A.

1ª Questão: a modificação da decisão em matéria de facto A recorrente pretende que seja dado como provado:

- A ré esteve sempre colocada na dependência económica de seu marido;

(facto B)

- Assoberbada também com a organização e trabalho doméstico; (facto C) - A ré nunca recebeu, efetivamente, qualquer salário da D…; (facto E) - A ré tem vindo a angariar trabalhos esporádicos em tarefas de serviço doméstico, auferindo reduzida retribuição. (facto I)

- Além das alinhadas no facto provado nº 49, que a ré despende mensalmente, em média, em alimentação, €400,00, em vestuário e calçado, €150,00 e em combustível e manutenção de automóvel, €100,00. (facto K)

Pretende ainda que:

- O ponto 30 seja alterado para o seguinte teor: “para o que contava, por vezes, com ajuda de mulheres-a-dias”.

- O ponto 43 seja dado como não provado (evitando contradição com o facto cuja prova propõe em facto D).

Para o efeito indica o depoimento de parte do A. e os depoimentos

testemunhais de H… e mãe I…, bem como os documentos nºs 2 a 34, juntos com a contestação.

Quanto aos depoimentos fez a recorrente a indicação das passagens da

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gravação que considerou relevantes para a pretendida modificação da decisão.

Deu, assim, satisfação ao ónus de impugnação a que se refere o art.º 640º, nº 1, al.s a), b) e c) e nº 2, al. a), do Código de Processo Civil.

Na fundamentação da decisão em matéria de facto, a sentença destaca, a

propósito da matéria impugnada, o depoimento de parte do A., os depoimentos das duas referidas testemunhas (mãe e filha) e de J…, sem prejuízo de

documentos juntos ao processo.

Foi integralmente ouvida a gravação da prova oralmente produzida, o que permitiu a formação de uma ideia global e uma melhor perceção das circunstâncias de vida do casal.

J… adquiriu conhecimento de factos por ser colega do A. na administração do Grupo F…, onde aquele trabalha com a função de presidente do conselho de administração, compondo a testemunha também aquele conselho.

A testemunha H… é filha da testemunha I…. A primeira era das relações do A.

ainda antes deste ter passado a viver com a R. (começaram a viver juntos dois anos antes do casamento) e tornou-se grande amiga do casal depois de

conhecer a demandada, amizade que persistiu com esta última depois da separação, em 2002, até à atualidade. A I… já conheceu A. e R. casados e revelou-se muito próxima da R. sobretudo depois da separação. Uma e outra já lhe têm emprestado dinheiro nas dificuldades que a R. revela para satisfazer encargos normais da sua vida desde que o A. deixou de fazer transferências para a sua conta bancária.

Vejamos então.

Facto B: A R. esteve sempre na dependência económica de seu marido.

É um facto conclusivo. Os factos concretos que substanciam a causa de pedir constam já da matéria de facto dada como provada, designadamente dos pontos 10, 15, 18, 19, 21, 22, 25, 26, 27, 28, 29, 30, 31 e 32, de onde se extrai que a R. também trabalhou e auferiu rendimentos na pendência do casamento.

O depoimento de parte e os depoimentos testemunhais não deixam a menor dúvida de que foio A. que, quase exclusivamente, contribuiu para a

generalidade dos encargos da vida familiar enquanto houve comunhão de vida. A loja de roupa de criança e adolescente não teve êxito e fechou algum tempo depois de ter aberto e não se conhece rendimento significativo da R.

pelo seu desempenho na atividade da D…, empresa de pequena dimensão, então apenas com um trabalhador, além da R., a funcionar de modo arcaico e que acabou por ficar sem qualquer atividade.

O A. tinha uma boa condição económica pelo rendimento que tirava

mensalmente do seu trabalho, com o qual o casal suportava a generalidade das suas despesas, incluindo a aquisição de veículos e de imóveis onde viveu, designadamente a vivenda de …, cujo pagamento do fianciamento está em

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curso. As testemunhas foram unânimes nesta matéria.

Decompondo o facto conclusivo, podemos traduzir a realidade no seguinte facto:

Enquanto viveram juntos, antes e durante o casamento, foi o A. que suportou quase exclusivamente, com os rendimentos do seu trabalho, todas as despesas do casal.

Facto C: Assoberbada também com a organização e trabalho doméstico.

Tanto o A. como as testemunhas H… e I… referiram, de modo muito seguro, que a R. se dedicou sobretudo à vida doméstica, organizando as refeições, decorando e limpando a casa e cuidando das roupas, mas tinham uma empregada doméstica/barra mulher-a-dias que colaborava com ela nesse desempenho.

Assoberbada, significa sobrecarregada, com excesso de trabalho, quase

humilhada por um esforço inexigível e abusivo (que lhe seria imposto pelo seu marido).

Ninguém deixou esta ideia, incluindo aquelas suas duas amigas.

Os factos dados como provados nos pontos 28, 29 e 30 traduzem bem a realidade.

O facto C deve permanecer na matéria não provada.

Facto E: A R. nunca recebeu, efetivamente, qualquer salário da D…

Não é possível negar que a R. auferiu rendimentos da D…. É difícil admitir que nada tenha recebido ao longo de cerca de dois anos que geriu (de facto) a empresa. O A., no seu depoimento, referiu-se a empréstimos que a sociedade fez à R., mas, não obstante ser ele o gerente (de direito), sempre esteve distanciado da vida da empresa, como reconheceu. O empréstimo pode ter sido um rótulo para capear a saída de rendimentos para o casal.

As regras da experiência comum apontam no sentido de que ninguém gere uma empresa durante dois anos sem que dali obtenha qualquer rendimento, por ínfimo que seja.

Os documentos bancários em referência (2 a 34 juntos com a contestação) não têm que espelhar necessariamente todo e qualquer rendimento que a R.

auferisse da D….

O documento nº 1 junto com a contestação respeita a um recibo (nº 3) de vencimento da R. na D…, Lda. relativo ao mês de junho de 2002, com um rendimento líquido recebido de €409,29.

Pouco ou muito, algumas vezes a R. obteve rendimentos da D….

Mantendo-se o ponto 26 dos factos provados, deve manter-se também o facto E como não provado.

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Facto I: A R. tem vindo a angariar trabalhos esporádicos em tarefas de serviço doméstico, auferindo reduzida retribuição.

As testemunhas que mostraram conhecer a vida da R., a H… e a I…, quiseram deixar a ideia de que a R. realiza apenas esporadicamente serviços domésticos por conta de outrem (limpezas, confeção de refeições e vigilância de idosos).

Contudo, sobretudo a I…, deram conta de que o seu rendimento mensal se aproxima do salário mínimo nacional e que presta serviços em várias casas da cidade do Porto, para onde se desloca todos os dias, no seu veículo automóvel.

Ora, se se desloca diariamente para trabalhar na cidade, não é crível que o seu trabalho seja esporádico, ainda que possa ser algo precário.

O facto I deve permanecer parte da matéria dada como não provada.

Facto K: Além das despesas alinhadas no facto provado nº 49, a R. despende mensalmente, em média, em alimentação, €400,00, em vestuário e calçado,

€150,00 e em combustível e manutenção de automóvel, €200,00.

Quanto a este ponto, mais do que aquilo que a R. gasta ou pode gastar, importa saber o que necessita de despender para a assegurar a sua

sobrevivência e o exercício da sua vida normal, designadamente para poder continuar a prestar trabalho.

A R. vive sozinha, afetando o seu rendimento exclusivamente ao seu interesse pessoal.

Não tirando alguma relevância ao que as testemunhas disseram na matéria da quantificação daquelas despesas --- aliás, com grande insegurança, como resulta muito claro da audição da gravação ---, imperam aqui as regras da lógica e da experiência comum, devendo aceitar-se a necessidade que a R. tem de se alimentar, de se vestir e de se transportar, designadamente para o

trabalho, no que faz diariamente cerca de 50 km.

Parece-nos adequado quantificar a necessidade de despesas mensais

indispensáveis com alimentação em €300,00, com vestuário e calçado numa média de €60,00 (nem todos os meses se faz despesa deste tipo), em artigos de higiene e limpeza €15,00 e em combustível e manutenção do automóvel no valor de €120,00. O lazer não acarreta despesa indispensável à subsistência da R., pode tê-las, ou não, em medida variável, conforme as suas

possibilidades.

Assim, deve aditar-se à matéria de facto provada, o seguinte facto:

Para subsistir, a R. necessita ainda de realizar despesas mensais aproximadas, com alimentação no valor de €300,00, com vestuário e calçado no valor de

€60,00, em artigos de higiene e limpeza no valor de €15,00 e em combustível e manutenção do automóvel no valor de €120,00 (total: €495,00).

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Ponto 30 dos factos provados

Foi dado como provado que a R., no exercício das atividades domésticas, contava com a ajuda de uma empregada.

Não se provou exatamente --- porque as testemunhas não o referiram --- o tempo da prestação de trabalho pela empregada na casa do casal, embora seja razoavelmente seguro que nem todos os dias tal serviço fosse prestado. Não sabemos se ia a dias ou a horas ou em qualquer outra unidade de tempo…, sabemos que ia com alguma regularidade, o que, com toda a propriedade, representa colaboração, ajuda, auxílio, numa atividade que era da R. Não predominava o trabalho da empregada, mas o trabalho da R. Era aquela que ajudava esta, não o contrário. E foi isso que se deu como provado.

Mantém-se o ponto 30 dos factos provados.

Ponto 43 dos factos provados

Está dado como provado que a R. recebe remuneração pelo trabalho que desempenha, em valor que não foi possível, ao certo, apurar, mas aproximado do rendimento mínimo nacional.

Este facto deve manter-se como provado. As duas testemunhas arroladas pela R., H… e I…, suas amigas, afirmaram o facto dado como provado.

Nada justifica que se dê como não provado este ponto e que se dê como provado o ponto I, como supra deixámos exposto.

Em resumo, da impugnação da decisão em matéria de facto resulta apenas o aditamento aos factos provados dos seguintes pontos novos:

32 - A. Enquanto viveram juntos, antes e durante o casamento, foi o A.

que suportou quase exclusivamente, com os rendimentos do seu trabalho, todas as despesas do casal.

49 - A. Para subsistir, a R. necessita ainda de realizar despesas mensais aproximadas, com alimentação no valor de €300,00, com vestuário e calçado no valor de €60,00, em artigos de higiene e limpeza no valor de

€15,00 e em combustível e manutenção do automóvel no valor de

€120,00 (total: €495,00).

*

2ª questão: Verificação dos requisitos da atribuição de pensão de alimentos provisórios e alimentos definitivos a favor da R., a cargo do A., enquanto cônjuges separados e ex-cônjuges, e os respetivos montantes

Na reconvenção, a R. pediu a fixação de duas pensões sucessivas de

alimentos: uma a título provisório, pelo valor mensal de €650,00 enquanto não for estabelecido o montante definitivo, outra, a título definitivo, pelo valor

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mensal de €1.260,00 para vigorar depois daquela.

Já na apelação, a recorrente defende que o A. deve ser condenado a prestar alimentos à R., nos montantes mensais de €1.260,00, desde a proposição da ação e até ao trânsito em julgado da sentença que decrete o divórcio, e de

€500,00 € após esta.

Por alimentos entende-se tudo o que é indispensável ao sustento, habitação e vestuário (art.º 2003º, nº 1, do Código Civil[4]).

Relevam aqui, principalmente, as disposições legais dos art.ºs 2003º e seg.s do Código Civil, diretamente vocacionados para os alimentos devidos no âmbito das relações familiares; casos em que a obrigação alimentícia tem raízes legais nas instituições familiares, sejam elas o casamento, a filiação ou a adoção.

Dita a regra que a obrigação de alimentos visa, essencialmente, acudir a situações de necessidade do credor. Surge quando aquele fica sem condições de poder, por si próprio, granjear a sua vida, satisfazer as necessidades

primárias da sua existência como ser humano. Segundo a mesma regra, os alimentos não se esgotam no sustento, habitação e vestuário, incluem também outras necessidades como sejam as relacionadas com tratamentos médicos e medicamentosos.

Na pendência do casamento há uma obrigação recíproca de alimentos entre os cônjuges, nos termos do art.º 1675º do Código Civil (cf. art.º 2015º do mesmo código). De acordo com aquele normativo legal, tal dever insere-se no dever conjugal de assistência (que abrange ainda o dever de contribuir para os encargos a vida familiar) e mantém-se durante a separação de facto, se esta não for imputável a qualquer dos cônjuges. Se esta for imputável a um dos cônjuges, ou a ambos, o dever de assistência só incumbe, em princípio, ao único ou principal culpado. Só excecionalmente o tribunal pode, por motivos de equidade, impor esse dever ao cônjuge inocente ou menos culpado,

considerando, em particular, a duração do casamento e a colaboração que o outro cônjuge tenha prestado à economia do casal (nºs 2 e 3 do art.º 1675º).

Assim, os cônjuges, na pendência do casamento e ainda que numa situação de separação de facto relevante, estão reciprocamente obrigados a prestar

alimentos, concretizando-se desde logo o respetivo direito quando um dos cônjuges se encontra em situação de necessidade de prover às despesas fundamentais.

Ocorrendo separação de facto do casal, como acontece no caso, o dever de alimentos como que se autonomiza[5], perdendo razão de ser as despesas que faziam em função da comunhão de vida.

Nos alimentos provisórios impera a urgência visando-se, sobretudo, com concisão, garantir ao cônjuge o socorro que o retire da situação de carência

(15)

em que se encontre, enquanto não houver pagamento da primeira prestação definitiva.

Na vigência do anterior Código de Processo Civil, na versão do Decreto-lei nº 329-A/95, de 12 de dezembro, a prestação alimentícia provisória era fixada em função do estritamente necessário para o sustento, habitação e vestuário do requerente e também para as despesas da ação, quando o requerente não pudesse beneficiar de apoio judiciário. Embora ali se devesse abarcar tudo quanto se revelasse imprescindível a uma vida condigna, a prestação por alimentos não ia além das necessidades básicas sumariamente apuradas pelo tribunal (respetivo art.º 399º, nº 2).

O art.º 2007º, nº 1, do Código Civil determina que “enquanto se não fixarem definitivamente os alimentos, pode o tribunal, a requerimento do alimentando, ou oficiosamente se este for menor, conceder alimentos provisórios, que serão taxados segundo o seu prudente arbítrio”.

Com efeito, não se devendo perder de vista a provisoriedade dos alimentos atribuídos, o julgador hoje, como anteriormente, deve usar de um juízo de prudência na averiguação dos pressupostos da atribuição daqueles alimentos e, verificando-se aqueles, fixar com razoabilidade a respetiva prestação.

Porém, enquanto no domínio do anterior Código de Processo Civil a sua prudência estava virada para a medida do estritamente necessário ou

indispensável a uma vida condigna, no atual regime, ditado pela eliminação do dispositivo do nº 2 do art.º 399º do velho código e a possibilidade de valência da inversão do contencioso, o juízo de prudência deve, em tese geral, reportar- se a um esforço de aproximação do valor da prestação de alimentos

provisórios ao critério da definitividade, prevenindo a sua ultrapassagem, em razão da impossibilidade da sua restituição ditada pelo art.º 2007º, nº 2, do Código Civil. Mas, tratando-se de alimentos entre cônjuges e ex-cônjuges, atentar-se-á nas suas especificidades.

No caso dos autos, estando A. e R. separados de facto (não tendo ainda cessado o vínculo conjugal), a obrigação de alimentos integra-se no dever de assistência conjugal (art.º 1675º nºs 2 e 3 do Código Civil), tendo essa

obrigação natureza e conteúdo diferentes da obrigação de alimentos que

vigora após a dissolução do vínculo conjugal (art.ºs 2016º e 2016º-A do Código Civil), pois, como já dissemos, na separação de facto, a obrigação de alimentos (já não a contribuição para os encargos da vida familiar) tem, essencialmente, a mesma extensão que teria se eles continuassem a viver em comum, e daí que sobre o cônjuge obrigado recaia o dever de assegurar ao outro não apenas o indispensável ao sustento, habitação e vestuário, mas ainda tudo o que seja suficiente para lhe garantir o nível de vida que se aproxime da condição económica e social que beneficiava a família aquando da separação.

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Como se refere no acórdão da Relação de Lisboa de 14.9.2010[6], “no caso dos cônjuges, dada a situação social e económica decorrente do próprio casamento, a obrigação alimentar no âmbito da separação conjugal de facto envolve a tendencial e tanto quanto possível aproximação ao nível social, económico e de dignidade existente antes da suspensão da sociedade conjugal

”.

De todo o modo, importará ter sempre presente que na fixação dos alimentos (tudo o que é indispensável ao sustento, habitação e vestuário) se deve

atender às possibilidades (“meios”) daquele que houver de prestá-los e à necessidade daquele que houver de recebê-los (artºs. 2003º nº 1 e 2004º nº 1 do Código Civil), devendo atender-se, igualmente, às possibilidades de o alimentando prover à sua subsistência (art.º 2004º, nº 2, do Código Civil).

Acrescenta-se ali: “A medida da necessidade é definida por múltiplos factores, designadamente a situação social, idade, estado físico e de saúde, proventos e possibilidades de angariar sustento da pessoa que há-de receber os alimentos;

a medida das possibilidades assenta, basicamente, nos rendimentos do obrigado (não para que a eles se recorra até ao seu total consumo ou

exaustão, mas para que, sensatamente, se encontre medida proporcional a esses rendimentos, o que pode significar que se não consiga eliminar por

completo a situação de carência da pessoa a quem a prestação é efectuada (cf.

Pires de Lima e Antunes Varela, in “Código Civil Anotado”, Volume V, pg. 581).

(…)

Corolário do duplo princípio plasmado no artº 2004º nº 1 do Código Civil, a Lei manda ainda proceder à dedução baseada na possibilidade de o alimentado prover à sua subsistência, se “o segundo factor que conta para a fixação da prestação alimentícia é a real necessidade do credor, é evidente que na concretização monetária de tal necessidade se há-de abater tudo aquilo com que, seja com os seus rendimentos, seja com o seu trabalho, o alimentando possa concorrer para a sua manutenção” (cf. Pires de Lima e Antunes Varela, in “Código Civil Anotado”, Volume V, pg. 582)”.

Se, basicamente, na separação de facto do casal, o padrão de referência dos alimentos se deve aferir pelas possibilidades e necessidades que os cônjuges tinham, em conjunto, antes da suspensão da comunhão de vida, de acordo com o seu nível sócio económico, não podemos ser de todo insensíveis às

alterações da capacidade económica que ocorram relativamente a cada um deles durante a separação, já que o casamento subsiste, incluindo o dever de assistência recíproca pela medida da realização dos alimentos (art.º 1675º do Código Civil).

Tal como a eventual redução de rendimentos posterior à separação pode

tornar inexigível a obrigação de um deles de prover alimentos a favor do outro

(17)

e determinar, inelutavelmente, uma redução do estatuto económico dos cônjuges na pendência do casamento, uma melhoria apreciável dos rendimentos de um deles, ainda que separados, há de influenciar,

positivamente, pelo menos ao nível da possibilidade de serem prestados, o estatuto do outro enquanto o casamento subsistir, sem que se esqueça, no entanto, que já não fazem vida em comum e que, de facto, a vida separada acarreta acentuada autonomização pessoal e exigências diferentes para cada um deles.

É inquestionável, face aos factos provados, que a separação de facto do casal não é imputável a qualquer das partes, daí que não esteja afastado o dever de assistência do A., nos termos do nº 3 do art.º 1675º do Código Civil.

Quanto aos alimentos definitivos, desde a versão inicial do Código Civil (Decreto-lei nº 47334 de 25 de Novembro de 1966) até à versão introduzida pela Lei nº 61/2008, de 31 de Outubro[7] (aqui aplicável), com a alteração do art.º 2016º e a adição do art.º 2016º-A, os alimentos devidos entre os ex- cônjuges foram vistos, primeiro, basicamente, como uma sanção sobre o cônjuge único culpado ou o cônjuge principal culpado pelo divórcio quando ambos sejam considerados culpados, passando depois a predominar a sua natureza indemnizatória na reforma de 1977 (Decreto-lei nº 496/77, de 25 de novembro), que ainda se mantém na dita recente atualização do referido art.º 2016º, como parte de uma reforma mais abrangente que eliminou a

apreciação da culpa como fator relevante da atribuição de alimentos entre os ex-cônjuges.

Quanto ao montante de alimentos, enquanto na versão inicial do Código Civil não existia norma especial relativa a alimentos em caso de separação judicial de pessoas e bens ou divórcio, devendo aplicar-se a regra geral do art.º 2004º, segundo a qual os alimentos eram proporcionados aos meios daquele que haveria de prestá-los e à necessidade daquele com direito a recebê-los, considerando também a possibilidade de o alimentando prover à sua

subsistência, a reforma de 1977 estabeleceu um regime especial para o efeito no art.º 2016º, nº 3, segundo o qual “na fixação do montante dos alimentos deve o tribunal tomar em conta a idade e estado de saúde dos cônjuges, as suas qualificações profissionais e possibilidades de emprego, o tempo que terão de dedicar, eventualmente, à criação de filhos comuns, os seus rendimentos e proventos e, de modo geral, todas as circunstâncias que influam sobre as necessidades do cônjuge que recebe os alimentos e as possibilidades do que os presta”.

Foi assim também que a doutrina e a jurisprudência transitaram da ideia de que o cônjuge culpado deveria proporcionar ao alimentando uma situação económica tendencialmente idêntica à da constância do matrimónio, para a

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posição de que “o direito a alimentos do divorciado, ao abrigo do art.º 2016º, tem natureza alimentar, pelo que não nasce por mero efeito da verificação do pressuposto da culpa previsto no n.º 1 do mesmo artigo, nem tem como

finalidade assegurar ao requerente o mesmo padrão de vida que usufruía na vigência do casamento”[8].

A versão atual do Código Civil, dada pela Lei nº 61/2008, foi mais longe.

Viabilizando o divórcio a pedido de um cônjuge sem o consentimento do outro, com afastamento da apreciação da culpa por violação dos deveres conjugais, e com base na mera constatação de rutura do casamento (art.ºs 1773º, nº 3 e 1781º), além de reforçar a ideia de que qualquer dos cônjuges tem direito a alimentos, independentemente do tipo de divórcio (por mútuo consentimento ou sem o consentimento do outro), afirmou o princípio de que cada ex-cônjuge deve prover à sua própria subsistência depois do divórcio (art.º 2016º, nº 1) e deixou expresso em letra de lei que “o cônjuge credor não tem o direito de exigir a manutenção do padrão de vida de que beneficiou na constância do matrimónio” (art.º 2016º-A, nº 3).

Para a determinação do montante de alimentos a atribuir ao ex-cônjuge

necessitado, além dos elementos acima referidos e indicados no art.º 2016º, nº 3, na versão da reforma de 1977, a última reforma acrescentou:

- A duração do casamento;

- A colaboração prestada à economia do casal; e - Um novo casamento ou união de facto.

Se o princípio da autonomia económica do ex-cônjuge não foi tão longe quanto se chegou a propor[9], a verdade é que cada um dos ex-cônjuges deverá em princípio prover à sua subsistência. Só se a um deles tal não for possível, terá então o direito a receber alimentos do outro cônjuge, em montante que lhe permita garantir um mínimo de vida digna, e sempre de acordo com as reais possibilidades económicas do ex-cônjuge obrigado a prestá-los. Este direito, assentando num dever assistencial que perdura para além do casamento, passou a ter carácter subsidiário[10] e, seguramente, limitado pela obrigação de socorro numa situação de grande exigência resultante de manifesta

carência de meios de subsistência num quadro de impossibilidade ou grave dificuldade de obtenção de rendimento suficiente à realização de uma vida minimamente condigna.

É neste conjunto de circunstâncias e condições, essencialmente previstas nos art.ºs 2007º (alimentos provisórios) e 2016º e 2016º-A (alimentos definitivos), e à luz dos factos provados que há de determinar-se o direito e, na afirmativa, o montante da pensão de alimentos a prestar pelo A. a favor da Reconvinte.

Começando pelos alimentos provisórios, ponderando o critério legal acima enunciado, vemos que o próprio A., após a separação de facto do casal,

(19)

reconheceu o estado de carência económica da R. e passou a contribuir

voluntariamente com quantia mensal aproximada de €1.300,00 a favor do seu cônjuge, assim agindo ao longo de dez anos, até ao ano de 2012.

Aquando da separação a R. trabalhava e continuou a gerir a D…, Lda., dali auferindo, por vezes, algum dinheiro, por mais dois anos, até ao encerramento da empresa.

Admitindo que a reconvinte pouco ganhou naquela empresa, temos que ela foi aceitando aquela contribuição do marido ao longo de dez anos, fazendo, assim, face às suas despesas pessoais, sem que se conheça reclamação para valor superior, mas também sem que isso obstasse a que procurasse trabalho remunerado, o que revela até esforço louvável.

Por força do casamento, usufruiu de um nível de vida elevado, compatível com o de seu marido e proporcionado, sobretudo, por este.

Dados os elevados rendimentos por ele auferidos (pontos 36, 37 e 38), também após a separação, é manifesto que, mesmo continuando o A. a pagar as

mensalidades do empréstimo contraído para aquisição da casa onde a R.

continuou e continua a viver, assim como o respetivo IMI, nem com a

transferência mensal da quantia de €1.300,00 de que passou a beneficiar a reconvinte poderia continuar com um nível de vida semelhante ao que tinha antes da separação, na comunhão de vida com o A.

Todavia, pendendo o casamento, aquele valor foi tacitamente aceite pela R.

como suficiente e adequado durante a separação. Passou ela a procurar trabalho remunerado que obteve no desempenho de trabalho doméstico, porventura, apenas depois do A. ter deixado de fazer a referida transferência mensal, no ano de 2012 (a R. não provou a acumulação de valores).

Tudo ponderado, considerando que a R. passou a auferir uma remuneração mensal do seu trabalho próxima do valor rendimento mínimo nacional, atualmente de €557,00 e que o seu conjunto de despesas necessárias à sua subsistência é de cerca de €750,00, temos como justo e equilibrado, também face à elevada capacidade económica do A., estabelecer a sua obrigação de pagar alimentos provisórios a favor da reconvinte, enquanto seu cônjuge, no valor da diferença entre o que lhe vinha prestando mensalmente (€1.300,00) e o rendimento mensal que aquela passou a auferir (cerca de €557,00), ou seja, a quantia de €743,00, desde a data da reconvenção em que foram pedidos, até ao trânsito em julgado da decisão que os atribui (alimentos provisórios).

Passando aos alimentos definitivos, importa realçar que a R. está casada com o A. desde abril de 1991 e vive com eles desde 1989, tendo feito vida em comunhão ao longo de cerca de 13 anos. Apesar de não terem filhos em comum, a R. foi uma mulher dedicada ao A. e à vida doméstica, cuidando da

(20)

manutenção e limpeza da casa, do tratamento das roupas do casal e da confeção das refeições, contando embora com alguma ajuda de uma

empregada. Ainda acumulou esse esforço com a direção de uma empresa da família do A., a D…, Lda. e, anteriormente, numa loja de roupa de criança que o A. montou.

Enquanto o A. tem formação superior, é gestor de empresas e aufere um elevado rendimento do seu trabalho, a R. está deslocada do seu país de

origem, ficou em Portugal por causa do casamento que celebrou com o A., tem uma formação académica básica, não fala nem escreve outra língua que não seja o português, sujeitou-se à realização de trabalhos de limpeza que

continua as executar regularmente para poder viver, ainda que auferindo apenas um rendimento mensal próximo do salário mínimo nacional. Tem já cerca de 53 anos de idade e ainda vive sozinha.

Nestas condições, a R. não pode aspirar a melhorar a sua condição económica e, embora trabalhe com regularidade, a sua atividade está normalmente

marcada por alguma precariedade funcional.

Para viver com o mínimo de dignidade, necessita de cerca de €750,00 por mês, conforme despesas pessoais indispensáveis, assinaladas nos pontos 49 e 49-A dos factos provados.

Com efeito, encontra-se a R. numa situação pessoal que não lhe permite ambicionar um rendimento superior ao salário mínimo nacional, podendo mesmo perder o seu rendimento, ao mesmo tempo que necessita de cerca de

€200,00 --- a diferença entre o que aufere e o que tem que gastar --- para viver com o mínimo de dignidade. Justifica-se, no caso, a atribuição de alimentos definitivos, afastando-nos da regra geral de que cada cônjuge deve prover à sua subsistência depois do divórcio.

Tudo ponderado, incluindo o disposto nos art.ºs 2016º e 2016º-A do Código Civil, assiste à R. o direito a alimentos definitivos pelo referido montante de

€200,00, cujo pagamento está facilmente ao alcance do Reconvindo, face ao elevado rendimento mensal de que beneficia e às despesas que lhe são conhecidas.

A apelação procede parcialmente.

*

SUMÁRIO (art.º 663º, nº 7, do Código de Processo Civil):

I - Na pendência do casamento, o dever de prestar alimentos, integrado no dever conjugal de assistência, tem uma dimensão diferente do dever de alimentos posterior ao divórcio.

II - Enquanto neste último caso há um dever humanitário de solidariedade e socorro marcado pela relação conjugal anterior, sendo o dever de alimentos limitado à garantia de um nível de subsistência condigna, na pendência do

(21)

casamento, ainda que os cônjuges estejam separados de facto, devem garantir reciprocamente, em matéria de alimentos, um nível de vida tendencialmente semelhante àquele que tinham enquanto durou a comunhão de vida,

influenciado pelo tempo decorrido desde a separação, os laços persistentes e a situação atual de cada um deles.

III - O art.º 2016º, nºs 1 e 2, do Código Civil, na redação que foi introduzida pela Lei nº 61/2008, de 31 de outubro, consagra o princípio segundo o qual os cônjuges devem prover à sua própria subsistência depois do divórcio, quer se trate de divórcio por mútuo consentimento, quer de divórcio sem o

consentimento do outro cônjuge.

IV - A título excecional, nas condições previstas no subsequente art.º 2016º-A, pode um dos ex-cônjuges ser obrigado a prestar alimentos definitivos a favor do outro, mas a prestação limitar-se-á a garantir ao beneficiário o necessário à subsistência, contando com o valor de rendimentos próprios que o beneficiário consegue obter pela sua força de trabalho, nunca devendo os alimentos

constituir um incentivo à ociosidade.

* V.

Pelo exposto, acorda-se nesta Relação em julgar a apelação parcialmente

procedente e, em consequência, revogando a sentença recorrida, condena-se o A. reconvindo a prestar alimentos a favor da R. reconvinte:

A- Provisórios, pela quantia mensal de €743,00, desde a data da reconvenção (onde foi deduzido o respetivo pedido) até à data do trânsito em julgado da decisão;

B- Definitivos, pela quantia mensal de €200,00, desde a data em que transitar em julgado a presente condenação.

Os alimentos serão pagos por transferência bancária, até ao dia 5 do mês a que respeitem, sendo, a partir de agora, a quantia atualizada anualmente, com base no índice de variação dos preços no consumidor (com exceção do

mercado da habitação) publicado pelo Instituto Nacional de Estatística em relação ao ano anterior ao da atualização.

*

CUSTAS

As custas da apelação serão suportadas pela apelante e pelo apelado na proporção do decaimento.

As custas da reconvenção, na 1ª instância, são a cargo da reconvinte e do reconvindo, também na proporção do decaimento.

*

Porto, 20 de abril de 2017 Filipe Caroço

(22)

Judite Pires

Aristides Rodrigues de Almeida _____

[1] Cardona Ferreira, Guia de Recursos em Processo Civil, Coimbra, 4ª edição, pág.s 54, 103 e 113 e seg.s.

[2] Por transcrição.

[3] Por transcrição.

[4] Diploma a que pertencem todas as disposições legais que se citarem sem menção de origem.

[5] Podendo prosseguir depois do divórcio, nas condições previstas nos art.ºs 2016º e 2016º-A, do Código Civil.

[6] Proc. 34813/09.3T2SNT.L1-1, citando o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 7.5.2009, ambos in www.dgsi.pt.

[7] Posteriormente, foram ainda alterados os art.ºs 2019º e 2020º pela Lei 23/2010, de 30 de agosto.

[8] Amadeu Colaço, Novo Regime do Divórcio, Almedina, 2ª edição, pág.s 148 e 149, citando, entre outros, os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 18.6.1985, de 8.2.2000, de 16.5.2002 de 27.1.2005 e de 14.11.2006.

[9] No texto da Proposta de Lei n.º 509/X, que chegou a ser aprovada no Plenário da Assembleia da República e no âmbito da qual resultou o Decreto da AR n.º 232/X, era então estipulado, no artigo 2016.°-B do C.C, que a

obrigação de alimentos devia ser estabelecida por um período limitado, salvo razões ponderosas, sendo que este período podia ser renovado. Aquele

preceito foi eliminado.

[10] Amadeu Colaço, ob. cit., pág. 153.

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