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O testemunho sobre a Ditadura Militar Brasileira nos documentários contemporâneos

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Academic year: 2021

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XI Salão de Iniciação Científica

PUCRS

O testemunho sobre a Ditadura Militar Brasileira nos documentários contemporâneos

Nathalia Silveira Rech1, Cristiane Freitas Gutfreind1 (orientador)

1Faculdade de Comunicação Social, PUCRS

Resumo

Essa pesquisa consiste em compreender e investigar a construção da memória sobre a Ditadura Militar no Brasil, através dos longas-metragens documentais realizados na contemporaneidade, período conhecido no cinema brasileiro como pós-retomada (2002 até os dias atuais). Esses filmes são considerados como um testemunho do que se passou no País no período da Ditadura Militar Brasileira (1964-1985) de uso indevido da força que caçou os direitos individuais, controlou as diferentes mídias e legou uma dor física e social que deixou suas consequências entranhadas na sociedade até a atualidade.

Sabe-se que o filme-testemunho e documentário tornou-se um poderoso instrumento para elaboração da memória. O interesse dessa pesquisa é refletir como essa memória é construída, desconstruída e reconstruída através do testemunho fílmico. O que pretendemos é mapear e compreender como são apresentadas as referências sobre a Ditadura Militar nos documentários e quais modificações produzem na memória coletiva contemporânea sobre esse período histórico. O embasamento teórico será sustentado pelas ideias de Kracauer em que as relações entre a teoria fílmica e a abordagem histórica, no cinema, possibilitam a consciência daquilo que as particulariza na conjuntura contemporânea. Para isso, utilizaremos como ilustração filmes documentais recentes com vocação histórica e que dizem respeito à Ditadura Militar Brasileira.

Em relação à metodologia será realizada uma análise narratológica, a partir dos preceitos de Gérard Génette (1972) que se baseia na interação entre a narrativa e os acontecimentos que ela conta. O ―modo da narrativa‖ permite identificar como a história é contada através da noção, definida por Génette, de ―focalização‖, ou seja, identificar o que vê uma personagem, logo, o que ela sabe. Essas questões aparentemente indistintas (o ver e o saber das personagens) permitem desvendar o ponto de vista do narrador e, assim,

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compreender que o conteúdo temático de um filme nunca é um dado definitivo em si, mas um dado que deve ser construído ao longo da análise. Dessa forma, a análise do discurso da testemunha quanto mais fiel a sua descrição e a sua forma de estilo, mais a sua verificação é segura, possibilitando uma compreensão das relações que compõem o tema central dos filmes da nossa pesquisa, no caso, a Ditadura Militar no Brasil e o discurso crítico em relação ao fato histórico estudado e a construção da memória.

Introdução

Esta pesquisa pretende mapear no intuito de compreender a elaboração da memória sobre a Ditadura Militar no Brasil. Para isso, parte-se do pressuposto que hoje, no país, houve um aumento quantitativo na produção de documentários, sobretudo, em filmes cuja temática diz respeito ao período ditatorial1, além disso, podemos destacar a construção de um discurso histórico através dos filmes. Assim, o período proposto para análise dos longas-metragens documentais brasileiros abrange datas importantes que marcaram o acontecimento histórico em questão, como os 40 anos de maio de 68 e os 30 anos da Lei da Anistia. Destaca-se também um atual resgate do tema devido a fatos históricos importantes, coma a abertura dos arquivos dos militares, a instauração de uma indenização as famílias ou militantes políticos mortos, desaparecidos e/ou torturados e a procura pelos corpos de desaparecidos2.

O cinema constitui-se em um meio de socialização, cuja organização estrutural é socioculturalmente determinada, tendo como capacidade a construção de uma memória social compartilhada por um grande número de pessoas. Por isso, os filmes são um importante objeto de estudo que permite compreender uma sociedade específica. Faz-se importante, então, refletir sobre como a memória histórica é construída, reconstruída e desconstruída pelos filmes-testemunho. Em sendo assim, os filmes permitem identificar o que uma sociedade pensa dela mesma e, especificamente, no caso dessa pesquisa, que discursos críticos são criados através dos filmes.

Como objetivos específicos, partiremos da premissa de que os fatos históricos do passado através das suas referências culturais tornam-se um desafio a ordem instaurada no

1 Segundo pesquisa realizada anteriormente, intitulada a ―Representação fílmica da Ditadura Militar no Brasil‖, podemos destacar o aumento no número de documentários sobre essa temática tendo por critério a exibição desses filmes em salas de cinema: na década de 80 foram produzidos somente três documentários, enquanto que na pós-retomada foram produzidos até o primeiro semestre de 2010, 21 documentários.

2 Nesse sentido, merece destaque as denúncias feitas em um testemunho fílmico recente, Perdão Mister Fiel (Jorge Oliveira, 2009) em que um ex agente do DOI-CODI revela detalhes de como militares torturaram e mataram presos políticos.

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presente e entendimento das consequências desse mesmo fato histórico. Destaca-se também a importância da análise de imagens fílmicas para os Estudos de Comunicação, assim esta pesquisa tem como objetivos específicos:

a) Mapear os discursos fílmicos testemunhais que correspondem o período estudado ressaltando as temáticas relatadas (ex. cenas de tortura, fatos históricos, etc.) e, conseqüentemente, as diferenças entre testemunhos de ―militares‖ e ―militantes‖;

b) Identificar como a recuperação da memória sobre a Ditadura Militar Brasileira é construída através dos filmes-testemunhos documentais;

c) Analisar como esses depoimentos são elaborados em termos imagéticos (montagem, enquadramento, escolhas estéticas), o que determina ou não uma dramatização da história construída.

Justifica-se, então, a escolha desse objeto de estudo pela importância que o cinema tem como produto artístico estratégico na formação da sociedade contemporânea, a partir do que a experiência fílmica aporta a uma sociedade específica em termos de consumação, hábitos, valores simbólicos e imaginários. Assim, os filmes são compreendidos essencialmente como uma representação de uma ―realidade‖ física ou mental, tendo uma linguagem particular articulada a um tempo e um espaço específico, logo, o cinema se constitui em um suporte privilegiado para recuperação da memória, pois pode servir para construir a história de diferentes maneiras expressando acontecimentos, o estilo, a forma de viver e construir um discurso crítico de uma determinada época. Além disso, considerando todas as dificuldades em captar as lembranças do passado em objeto de memória, o filme ainda é considerado, nos dias de hoje, como o melhor suporte para fazê-lo, pois não se dirige apenas as capacidades cognitivas, mas capta as emoções.

Metodologia

Nessa pesquisa, em um primeiro momento, foi realizado um levantamento dos filmes documentais3 que se encaixavam na proposta da pesquisa e a partir deles, definido o que seria entendido como filme-testemunho. Para isso, foi usado como referência os dados da Ancine (Agência Nacional do Cinema) de filmes exibidos nas salas de cinema brasileiras. Esse levantamento quantitativo permite refletir sobre o processo de construção da memória sobre a

3 Adiante apresentamos um levantamento preliminar dos filmes que irão compor o corpus dessa pesquisa.

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Ditadura Militar Brasileira na atualidade, além de permitir um mapeamento dos discursos produzidos por militares e militantes. Ao investigar um filme deve-se considerar as aspirações, as técnicas e o espírito que molda o tempo quando da sua realização. Isto é, a conjuntura possível que permitiu ao realizador conceber o seu filme, tendo em mente que essa conjuntura é sempre formada de fatos controversos e sinuosos. Além disso, pretendemos ressaltar os significados estéticos e o contexto sociocultural e histórico em que foram feitos os filmes-testemunhos, pois, segundo Metz (1972), analisar um filme supõe um estudo da forma de seu conteúdo.

A partir daí, em um segundo momento, será realizada a análise imagética do material coletado. Para isso, evoca-se a teoria desenvolvida por Jacques Aumont e Michel Marie no livro La analisis del film (1998), onde fazem dialogar a psicanálise, a sociologia e a

―narratologia‖. Para os autores, o objetivo de efetuar uma análise da imagem fílmica permite uma melhor compreensão da obra e um esclarecimento sobre a sua linguagem, levando-se em consideração que os filmes são determinados também pelas condições materiais específicas onde são realizados assim como pelas condições psicológicas de sua apresentação ao público, esse moldado por instituições socialmente aceitas e economicamente viáveis.

É assim que será realizada uma análise narratológica, a partir dos preceitos de Gérard Génette (1972) que se baseia na relação entre a narrativa e os acontecimentos que ela conta. O

―modo da narrativa‖ permite identificar como a história é contada através da noção, definida por Génette, de ―focalização‖, ou seja, identificar o que vê uma personagem, logo, o que ela sabe. Essas questões aparentemente indistintas (o ver e o saber das personagens) permitem desvendar o ponto de vista do narrador e, assim, compreender que o conteúdo temático de um filme nunca é um dado definitivo em si, mas um dado que deve ser construído ao longo da análise. Dessa forma, a análise do discurso da testemunha quanto mais fiel a sua descrição e a sua forma de estilo, mais a sua verificação é segura, possibilitando uma compreensão das relações que compõem o tema central dos filmes da nossa pesquisa, no caso, a Ditadura Militar no Brasil e o discurso crítico em relação ao fato histórico estudado e a construção da memória.

O nosso objetivo é, então, através da ―análise narratológica‖ dos filmes-testemunhos da contemporaneidade, revelar fenômenos históricos, definir escolhas estéticas que permitam a reconstrução da memória.

Em sendo assim, pode-se levar em consideração o papel da história no trabalho analítico do corpus dessa pesquisa. Por isso, será confrontado aquilo que sobressai da

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compreensão da análise fílmica, aos dados da história do cinema e da própria história, ressaltando as diferenças entre os relatos apresentados.

Além disso, é realizada uma revisão da literatura referente aos eixos teórico- conceituais da nossa investigação. A ênfase dessa investigação se volta, assim, para um esforço em estabelecer uma dimensão reflexiva que supere aspectos de um trabalho descritivo, restrito à análise imagética, aproximando-o de um trabalho de teorização. Pode-se entender, então, que a dimensão reflexiva que orienta metodologicamente essa pesquisa se constitui em um trabalho teórico-analítico dos filmes do nosso corpus definitivo. Em suma, tal estratégia ao se propor como um trabalho teórico-empírico objetiva criar hipóteses mais amplas sobre a construção do conceito de memória mediante diálogo que se realize no movimento de um processo reflexivo.

Resultados (ou Resultados e Discussão)

— Mapeamento da análise das imagens fílmicas correspondentes aos diferentes discursos testemunhais;

— Perspectiva de construção de um acervo fílmico sobre o tema;

— Perspectiva de elaborar uma investigação sobre a construção da memória do tema estudado a partir de documentários testemunhais;

Corpus da Pesquisa:

Filmes-testemunhos da Pós-Retomada (2002 a 2010) relacionados com o período militar brasileiro

Araguaya - A Conspiração do Silêncio (Ronaldo Duque, 2004) Dom Hélder Câmara - O Santo Rebelde (Erika Bauer, 2004)

Evandro Teixeira - Instantâneos da Realidade (Paulo Fontenelle, 2004) Tempo de Resistência (André Ristum, 2004)

Yã Katu - O Brasil dos Villas Bôas (Nelson Villas Bôas, 2004) Cabra-Cega (Toni Venturi, 2005)

Maria Bethânia - Música é Perfume (Georges Gachot, 2005) Vlado — 30 anos Depois (João Batista Andrade, 2005)

Milton Santos ou: O mundo global visto do lado de cá (Silvio Tendler, 2006) O Sol - Caminhando Contra o Vento (Tetê Moraes, 2006)

Brizola – Tempos de Luta (Tabajara Ruas, 2007)

Castelar e Nelson Dantas no país dos generais (Carlos Prates, 2007) Hércules 56 (Silvio Da-Rin, 2007)

Memória para uso diário (Beth Formaggini, 2007) Nas Terras do Bem-Virá (Alexandre Rampazzo, 2007)

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O longo amanhecer (José Mariani, 2007) Condor (Roberto Mader, 2008)

Simonal - Ninguém Sabe o Duro que Dei (Cláudio Manoel, 2008) Cidadão Boilesen (Chaim Litewski, 2009)

Perdão Mister Fiel (Jorge Oliveira, 2009) Utopia e Barbárie (Silvio Tendler, 2009)

Tabela I – Tabela de filmes-testemunhos a serem analisados

Referências

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Referências

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