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1.1- Interesse histórico e económico das leguminosas I.1 – Família

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I.1 – Família Leguminosae

1.1- Interesse histórico e económico das leguminosas

As leguminosas têm sido cultivadas, e usadas na alimentação humana desde há milhares de anos. Delwiche (1978) sugeriu que a origem das leguminosas deverá datar do período Jurássico. Renfrew (1966) relata a existência de sementes de Pisum, Vicia e Lens, na Grécia, no período Neolítico. Zohari e Hopf (1973) citam que as lentilhas foram cultivadas entre 7000 a 6000 a.C. e que o grão de bico deverá ter sido inicialmente cultivado mais tarde volta de 5450 a.C. Sementes de várias espécies de Lupinus foram usadas como alimento por mais de 3000 anos, em torno do Mediterrâneo, e há mais de 6000 anos na região montanhosa dos Andes (Petterson, 1998). O cultivo do Lupinus albus deverá ter ocorrido, no velho Egipto, por volta de 2000 anos a.C.

As plantas com fins alimentares desempenham um papel importantíssimo, fornecendo, dum ponto de vista global, cerca de 80% da energia e 65% das proteínas alimentares. São, cada vez mais, uma fonte alimentar a explorar, como suplemento na alimentação humana, ou mesmo como fonte alimentar principal, em continentes como o Africano e o Asiático. Na medida em que os recursos alimentares, e principalmente os cerealíferos, estão cada vez mais encarecidos, o número de pessoas que passam fome no mundo, passou de 850 para 925 milhões, em 2007. Estes são números da Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação, divulgados pelo director-geral da organização, Jacques Diouf. Segundo os dados da FAO, referidos pelo director-geral da ONU, os preços dos produtos alimentares sofreram um aumento de 12% em 2006 e de 24% por cento em 2007. A Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação teme que a crise mundial possa ter um impacto directo no número de pessoas que passam fome todos os dias no mundo, uma vez que se podem esgotar os recursos que são usados para comprar comida e alimentar milhões de pessoas no mundo. Teme-se, ainda, que haja falta de recursos para investir na agricultura dos países em desenvolvimento, para pôr em prática uma agricultura sustentável, com implementação de novas culturas e resolução do problema da fome, e que a ONU e a FAO acabem por ser esquecidas pelas regiões doadoras de recursos, como Estados Unidos e Europa.

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A introdução na agricultura de ″novas″ espécies de leguminosas, historicamente ainda não enraizadas nos hábitos alimentares mas que, pela sua riqueza nutritiva, possam ser uma opção alimentar, dará com certeza um contributo para diminuir o flagelo da fome, a nível mundial.

As leguminosas englobam plantas com fins alimentares, que contribuem muito significativamente para a alimentação humana e animal. O termo ″leguminosa″, inclui, tipicamente, sementes dos seguintes géneros: ervilha (Pisum), ervilhaca (Vicia), lentilha (Lens), fava (Vicia), chícharo (Lathyrus), feijão (Phaseolus) vermelho, rosa, branco, manteiga, verde, soja (Glycine), amendoim (Arachys) e tremoço (Lupinus).

Entre estas espécies a soja tem sido a mais estudada e a mais utilizada, quer na alimentação humana, quer em rações para animais. Apresenta um valor nutritivo elevado e um excelente teor lipídico e proteico, apesar da tradicional deficiência, encontrada para as leguminosas em geral, em aminoácidos sulfurados, Met (metionina) e Cys (cisteína). Estes aspectos têm levado à sua aplicação em alimentos tradicionais do Extremo Oriente, como os tofu, a yuba, o miso e os molhos de soja, sendo cada vez mais consumida no Ocidente. Desempenha ainda um papel fundamental na alimentação do gado.

A nível mundial os cereais continuam a ser o alimento com maior produção (FAOSTAT), encabeçados pelo cultivo do arroz e trigo, com uma produção de cerca de 610 milhões de toneladas (MT), para cada uma das espécies (2005), sendo a China, a Índia, a Indonésia e o Bangladesch, os maiores produtores para a primeira espécie, e a China e a Índia, para a segunda espécie. Entre as leguminosas, a produção de soja encabeça a lista, com 190 MT em 2004, sendo cerca de 50% desta quantidade produzida nos Estados Unidos da América, seguida pelo Brasil (51 MT), Argentina (38 MT), China (16 MT) e Índia (8 MT). O tremoço tem uma representatividade bem menor (2005), sendo produzido principalmente na Austrália (0,952 MT), Alemanha (95 000 toneladas) e Bielorrússia (78 600 toneladas), tendo Portugal uma produção de 10 toneladas. A forrageira ervilhaca é produzida principalmente pela Federação Russa (388 629 toneladas), seguida da Etiópia (146 617 toneladas), Turquia (134 300 toneladas) e México (92 000 toneladas).

1.2- Importância das leguminosas na alimentação humana e animal

As plantas com fins alimentares são cada vez mais uma fonte a explorar, como suplemento e/ou constituinte da alimentação humana. Na medida que os recursos

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alimentares estão cada vez mais centralizados, deixando milhões de pessoas com escassez alimentar, numa situação trágica de fome e pobreza, as leguminosas (associadas aos cereais), já o sendo, poderão, cada vez mais, ser uma alternativa de manutenção de vida. Além das propriedades nutricionais, as leguminosas contêm, factores antinutricionais, que poderão contrariar os benefícios da sua aplicação. O estudo destes factores, a sua aplicação prática e o modo de os eliminar (tecnologicamente), deverão ser tidos em consideração.

1.2.1- Valor proteico

As leguminosas são uma excelente fonte de nutrientes, apesar de exibirem limitações nutricionais no que respeita ao seu equilíbrio aminoacídico, uma vez que têm um défice nos aminoácidos sulfurados, metionina e cisteína.

1.2.1.1- Reservas proteicas em sementes de leguminosas

As sementes de leguminosas possuem um teor, tipicamente, elevado em proteínas.

Mossé e Pernollet (1983) mostraram que este teor proteico varia entre as diferentes espécies de leguminosas, de 12 a 55 %, sendo, no entanto, mais vulgar encontrar valores de 20 a 40 %. No caso da soja e do tremoço foram, por exemplo, encontrados valores superiores a 38% e 40% (Derbyshire et al., 1976; Guéguen e Cerletti, 1994).

Dentro das leguminosas, a soja é, sem dúvida, a mais importante, sendo utilizada, principalmente, como suplemento proteico e como oleaginosa.

As proteínas de reserva, das sementes de leguminosas, não tem actividade metabólica, nem têm qualquer papel estrutural no tecido cotiledonário. Estão armazenadas em organitos especializados de reserva, os vacúolos de reserva proteica (PSV, do inglês ″protein storage vacuoles″), anteriormente conhecidos como corpos proteicos (Shewry et al., 1995; Ferreira et al., 2003). Além das proteínas de reserva, as mais representativas, existem ainda, muitas outras proteínas menores, incluindo proteases, inibidores da amilase, lectinas, lipoxigenases, e proteínas de defesa, que por várias razões são relevantes na qualidade nutricional e funcional da planta.

Algumas destas proteínas podem adoptar o papel de reserva. Do ponto de vista fisiológico, as proteínas de reserva têm um papel trófico primordial, que é o de

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fornecer aminoácidos e outros compostos azotados às jovens plantas, durante um período curto, mas crítico, até se tornarem autotróficas. Nesta situação, qualquer proteína que seja realmente mobilizada logo após a germinação, poderá ser considerada proteína de reserva. Em situações de deficiências drásticas de azoto, para além das proteínas de reserva, as plantas (como todos os organismos vivos) utilizam progressivamente proteínas estruturais ou funcionais para propósitos tróficos, de modo a fornecer aminoácidos para a reciclagem das proteínas vitais.

As proteínas de reserva de sementes partilham, conjuntamente, numerosas características com as proteínas de reserva animais; por exemplo: são todas proteínas tróficas secretórias, têm capacidade de se associar entre si, exibem uma relativa multiplicidade e polimorfismo e a sua deposição parece-se com a das reservas de fosfato.

As proteínas de reserva de sementes consistem em séries polimórficas de moléculas, codificadas por famílias de multigenes (Lycett et al., 1983; Pernollet e Mossé, 1983).

1.2.2- Classificação das proteínas de reserva de dicotiledóneas

A classificação mais usada das proteínas de reserva de sementes data de 1924, quando Osborne classificou estes polímeros em quatro grupos, de acordo com as suas características de extracção e solubilidade.

Albuminas - solúveis em água;

Globulinas - solúveis em soluções salinas diluídas (insolúveis em água);

Prolaminas - solúveis em misturas álcool/água (70-90% (v/v) (insolúveis nas soluções anteriores)

Glutelinas - solúveis em soluções diluídas de ácidos ou bases (insolúveis nas soluções anteriores)

Esta classificação, apesar de antiga, continua a ser utilizada, por ser bastante prática. As albuminas e as globulinas, constituem as duas classes proteicas mais representativas das leguminosas (dicotiledóneas), sendo as prolaminas e as glutelinas, as classes proteicas, com maior representatividade, ao nível dos cereais (monocotiledóneas).

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1.2.2.1- Albuminas

As albuminas, com funções de reserva são proteínas com o coeficiente de sedimentação 2S, a segunda fracção mais representativa das proteínas de reserva nas leguminosas. Algumas albuminas podem ser consideradas um grupo particular das proteínas, havendo autores que as considerem como proteínas de reserva (Shewry et al., 1995; Salmanowicz, 2000), ou como um grupo de proteínas com um papel metabólico. Na verdade, muitas das proteínas constituintes desta fracção desempenham funções bioquímicas como sejam, por exemplo, as actividades enzimáticas de lipoxigenases, glucosidases e proteases, envolvidas na degradação das proteínas de reserva. Outras albuminas, como os inibidores de proteases (factores anti-trípticos) ou lectinas, estão implicadas nos mecanismos de defesa (Gueguan, 1991). A grande maioria destas proteínas estão presentes em quantidades muito baixas - são as proteínas ″housekeeping″.

A representatividade das albuminas nas sementes secas das leguminosas é variável, geralmente de 12 a 15%, dependendo principalmente da fracção 2S, podendo variar com o método de extracção, a espécie e o genótipo (Gueguen e Cerletti, 1994).

1.2.2.2- Globulinas

As globulinas são as proteínas mais representativas das sementes de leguminosas (60% a 90%), encontrando-se presentes não só nas dicotiledóneas, mas também nas monocotiledóneas (incluindo cereais e palmeiras) e esporos de fetos (Templeman et al., 1987). Podem dividir-se em dois grupos baseados no seu coeficiente de sedimentação (S20w) (Danielson, 1949): globulinas do tipo 11S (valor médio 10 a 13S), denominadas globulinas do tipo legumina, e globulinas 7S (valor médio 6 a 9S), denominadas globulinas do tipo vicilina. O termo legumina data de 1827 (Braconnot), quando este investigador decidiu apelidar de legumina as proteínas que podiam ser extraídas das leguminosas. Em 1898, Osborne e Campbell separaram duas fracções das proteínas extraíveis com soluções salinas diluídas, das sementes de ervilha, a legumina e a vicilina, sendo a legumina menos solúvel que a vicilina. Assim, e em resumo, as globulinas, dividem-se em globulinas 11S, também chamadas leguminas, e em globulinas 7S ou vicilinas. A acrescentar a esta variedade de terminologias, alguns autores atribuíram ainda diferentes nomes a estas proteínas, de acordo com o nome

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da espécie estudada, como a glicinina, legumina de Glycine max e a vicinina, legumina de Vicia sativa, entre muitos outros exemplos. No caso do género Lupinus, a globulina do tipo legumina recebeu a designação de α-conglutina e a proteína do tipo vicilina a de β-conglutina (Moriwiecka, 1961). A γ-conglutina é uma proteína característica do género Lupinus, havendo controvérsia quanto ao ser considerada, ou não, como proteína de reserva.

i. Globulinas 11S

As globulinas 11S são as proteínas de reserva maioritárias, não só da maioria das leguminosas mas também de muitas outras dicotiledóneas (por exemplo, compostas e cucurbitaceas). A proteína nativa consiste em seis pares de polipéptidos que interactuam de modo não covalente formando seis subunidades. Cada um destes pares ou subunidade consiste num polipéptido ácido, de massa molecular de ≈40 kDa , e num polipéptido básico, de massa molecular de ≈20 kDa, ligados por uma ponte dissulfureto. Cada subunidade é sintetizada sob a forma de um polipéptido precursor que, após a formação da ponte dissulfureto, sofre um processo de proteólise limitada, com a formação de dois polipéptidos ligados covalentemente. As leguminas não são glicosiladas, com excepção das proteínas 12S do Lupinus (Duranti et al., 1988). Este dado contrasta com as globulinas 7S, como veremos adiante.

As α-conglutinas são proteínas 11S, constituídas por subunidades de elevada massa molecular, que variam, de acordo com cada espécie, em número de subunidades e massa molecular e em que as cadeias polipeptídicas de cada subunidade estão unidas por ligações dissulfureto. São proteínas hexaméricas, com uma massa molecular nativa de ≈300 kDa.

i.i. Globulinas 7S

São globulinas tipicamente triméricas, de massa molecular de 150 a 190 kDa, que não contêm resíduos de cisteína, não formando pontes dissulfureto. A sua composição detalhada em subunidades é bastante variável devido aos diferentes graus de processamentos pós-traducional, que estas proteínas podem sofrer, como proteólise limitada e glicosilação. Por exemplo, as subunidades da vicilina de ervilha são inicialmente sintetizadas como grupos de polipéptidos de massa molecular de ≈47 e

≈50 kDa, mas a proteólise pós-traducional e a glicosilação originam subunidades de massa molecular entre 12,5 e 33 kDa (Gatehouse et al., 1984; Casey et al., 1986,

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1993). Estas subunidades são difíceis de purificar e caracterizar, mas a clonagem molecular dá-nos a sua origem e a identificação dos locais de clivagem proteolítica e de glicosilação.

A β-conglutina do Lupinus albus é um membro da família das proteínas de reserva 7S, que são as globulinas glicosiladas mais representativas. Estas globulinas são constituídas por 10 a 12 subunidades principais (de 15 a 72 kDa) e por um número considerável de subunidades menores, sem ligações dissulfureto e com uma massa nativa de 185 kDa.

A influência da espécie, da origem vegetal e das condições de cultura sobre a composição qualitativa e quantitativa das globulinas 7S e 11S, tem sido sobretudo estudada para as leguminosas. Sendo assim, e para o caso da soja e do tremoço, tem-se observado que as proteínas do tipo 7S se encontram numa proporção muito superior às proteínas do tipo 11S. A relação 7S/11S para estas duas espécies é de cerca de 1,6 (Thank e Shibasaki, 1976) e de 1,3, respectivamente (Duranti et al., 1981). No caso da ervilha e da fava, a fracção dominante é a legumínica, existindo para a ervilha resultados bastante variáveis para a respectiva relação, dependendo do genótipo da semente. Relativamente à ervilhaca (Vicia sativa ), o teor proteico das suas sementes também é elevado, da ordem dos 40% (teor em N), sendo a classe das vicilinas (globulinas 7S) menos representativa que a das leguminas (globulinas 11S) (Ribeiro et al., 2004).

1.2.2.3- Prolaminas e Glutelinas

Enquanto que as albuminas e as globulinas são proteínas de reserva largamente distribuídas nas plantas com florescência, as prolaminas e glutelinas estão principalmente representadas nos cereais (monocotiledóneas). Dependente da sub- familia a que pertencem os cereais, assim as prolaminas estão mais ou menos representadas, 50% a 60% para a sub-família Panacoidea: milho, sorgo e milho miúdo ou, 40% a 50% para a tribo Triticeae que inclui trigo, cevada e arroz, seguindo-se em representatividade, as glutelinas (Pernollet e Mossé, 1983).

As glutelinas, proteínas de reserva maioritárias em algumas espécies de leguminosas, como o arroz, assemelham-se estruturalmente às globulinas do tipo legumina, em vários aspectos: (i) contém polipéptidos ácidos (34 a 37 kDa) e básicos (21 a 22 kDa) (Zhao et al., 1983, Krishnan e Okita, 1986); (ii) o polipéptido mais leve

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tem 25% de homologia com o polipéptido básico da legumina de ervilha (Zhao et al., 1983); o percursor da glutelina tem 32% de homologia com o percursor A1aB1b da glicinina (Higushi e Fukasawa, 1987). As glutelinas, contrariamente às globulinsa 11S são geralmente glicosiladas. Apesar da similaridade estrutural, entre as glutelinas e globulinsa 11S, as diferentes solubilidades apresentadas, podem estar relacionadas com diferentes características de hidrofilia do terminal carboxilo do polipéptido ácido (Higushi e Fukasawa, 1987).

Costa e colaboradores (1996), isolaram e caracterizaram um polipéptido básico, glicosilado, de 23 kDa (G23), proveniente do Lupinus albus, com características de solubilidade das glutelinas, e com quantidades apreciáveis de metionina (2,0%), cisteína (5,8%) e lisina 3,5%, comparativamente às proteinas de reserva do L. albus caracterizadas por Duranti et al., (1981), conferindo interesse nutricional a este polipéptido.

Análises moleculares e bioquímicas recentes, feitas para as proteínas de reserva e os genes que as codificam, indicam que estas deverão ser divididas em globulinas, albuminas e prolaminas (Shewry e Casey, 1999), sendo as glutelinas (segundo a classificação Osborne, 1924) consideradas como um outro tipo de globulinas ou de prolaminas (Shewry e Tatham, 1999). Um estudo recente sobre 17 cultivares de Lupinus albus portuguesas refere, a importância das características de glicosilação das glutelinas no estabelecimento de grupos de cultivares, com a mesma origem geográfica e precocidade de florescência, importante característica agronómica (Vaz et al., 2004).

1.2.3- Factores antinutricionais

As sementes de leguminosas possuem reservas, que podem ser de origem proteica, ou não, reconhecidas como de defesa para a planta, mas nutricionalmente indesejáveis, ou mesmo tóxicas, para o homem e outros animais. Estes compostos antinutricionais podem dividir-se em compostos antinutricionais proteicos e compostos antinutricionais não proteicos:

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1.2.3.1- Compostos antinutricionais proteicos

. Inibidores de hidrolases

Provocam a inibição irreversível de várias enzimas digestivas (Leterme et al., 1992).

São exemplos os inibidores da tripsina, do tipo Bowman-Birk e do tipo Kunitz e, os inibidores da α-amilase (Moreno et al., 1990).

. Lectinas

São proteínas que exibem especificidade para açúcares, como as hemaglutininas que aglutinam as células sanguíneas (Etzler, 1985). A sua toxicidade manifesta-se pela inibição do crescimento em animais de laboratório e diarreias, vómitos e naúseas no homem.

1.2.3.2- Compostos antinutricionais não-proteicos

. Alcalóides

São um factor limitante na aceitação de várias sementes de leguminosas, entre as quais o Lupinus, devido ao seu sabor amargo e à sua toxicidade (Cuadrado et al., 1992). As sementes amargas de Lupinus, contém um valor superior a 2% em alcalóides, geralmente lupinina, citisina, esparteína, lupanina e anagirina (Wink, 1994).

. Ácido fitico

Responsável pela diminuição da biodisponibilidade de minerais essenciais, formando complexos insolúveis, que têm menor facilidade de digestão e de absorção no intestino delgado. Podem, ainda, inibir a actividade de diversos enzimas (Knuckles et al., 1989).

. Compostos fenólicos

São exemplo os taninos, que podem reagir com as proteínas, com os resíduos de lisina ou de metionina, tornando-as indisponíveis durante a digestão (Davies, 1981).

. Saponinas

Compostos isoprénicos que têm a capacidade de lisar eritrócitos e outras células, como as da mucosa intestinal, afectando a absorção de nutrientes (Hudson, 1979).

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. Glicosidos

Os glicosidos vicina e convicina, de Vicia faba, podem ser responsáveis por um tipo de anemia hemolítica, conhecida por favismo, em indivíduos com deficiência em glucose-6-fosfato desidrogenase (G6PD) (Jalal e Mohammad, 2005).

. Resíduos de α-D-galactosidos

Quando ligados à glucose constituinte da sacarose. A ausência da enzima α- galactosidase, nos animais e no homem, impede a digestão destes oligossacáridos, induzindo a formação de gases intestinais (Fleming, 1981). Recentemente estes compostos têm sido encarados como fonte de pré-bióticos, contribuindo para o crescimento de bifidobactérias (Gibson e Roberfroid, 1995).

A composição química das sementes é variável, por ser determinada, entre outras coisas, por factores genéticos; por este motivo, varia muito entre espécies, entre variedades e cultivares (Vaz et al., 2004). Algumas modificações da sua composição podem resultar de práticas agronómicas (aplicação de fertilizantes azotados ou datas de cultivo) ou podem ser impostas por condições ambientais prevalecentes durante o desenvolvimento e maturação da semente.

1.2.4- Propriedades funcionais das proteínas de leguminosas

A funcionalidade nutricional de uma proteína, refere-se às características nutricionais, que além da composição química, fazem com que, determinada proteína, neste caso de leguminosas, seja eficazmente utilizada, permitindo assim evidenciar a sua qualidade como proteína. As propriedades de estrutura/reologia, hidratação e de superfície, são exemplos de atributos que fazem com que as proteínas tenham comportamentos diferenciais nos sistemas alimentares, ao nível da sua solubilidade, tumefacção, absorção/desabsorção de água, gelificação e agregação, entre outras (Kinsella, 1979), podendo, ou não beneficiar as características nutricionais de determinada proteína..

O estudo da funcionalidade nutricional das proteínas iniciou-se com o estudo da composição em aminoácidos (AA), a proporção existente entre AA essenciais e AA totais (% E/T), a deficiência em determinados AA essenciais (metionina e cisteína nas leguminosas e lisina para os cereais), a existência de inibidores de proteases, o efeito

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tóxico/antinutricional de algumas proteínas, como as lectinas, e a qualidade proteica (digestibilidade, % de utilização e valor biológico).

1.2.4.1- Composição aminoacídica

A composição em AA típica das globulinas, as proteínas 7S e 11S, estão contempladas, para algumas espécies, nas Tabelas I-1.1 e I-1.2. Observando os resultados obtidos, por diversos investigadores, para a representatividade dos 19 AA estudados, verifica-se que existe variabilidade na composição aminoacídica e deficiência em aminoácidos sulfurados, tendo aparentemente as 11S um teor mais elevado em metionina (Jin et al., 2000). Ambas as proteínas 7S e 11S, contêm elevadas quantidades dos ácidos aspártico e glutâmico, o que atribui um carácter acídico a estas proteínas, tendo a maioria um ponto isoeléctrico (pI) compreendido entre 4 e 5. As quantidades de lisina e arginina variam consideravelmente. A variabilidade de AA existente, para as leguminosas, varia de acordo com a representatividade das fracções 7S e 11S.

Com o advento da tecnologia de DNA recombinante, técnicas de transferência de genes e a engenharia genética, estabeleceram-se estratégias com o propósito de aumentar o valor biológico das sementes de leguminosas, de modo a contrariar as suas limitações, o que nunca se conseguiu com as técnicas convencionais de selecção (Müntz et al., 1998): (i) engenharia para aumentar os níveis de metionina livre; (ii) engenharia nas proteínas de reserva endógenas com aumento do número de resíduos de metionina; (iii) e transferência de genes externos codificantes de proteínas ricas em metionina, parecendo, esta última estratégia, ser a mais promissora. A soja, entre outras leguminosas, foi já manipulada geneticamente, mediante introdução de um gene da noz do Brasil, semente com um elevado teor em metionina (da ordem dos 18,8%), resultando, para a soja num aumento de 26% de metionina.

1.2.4.2- Qualidade nutricional das proteínas

A digestibilidade e o valor biológico de uma proteína, são factores que estão relacionados com o comportamento da proteína no sistema alimentar e com a variabilidade alimentar. Num tipo de alimentação racional e equilibrada, dá-se uma complementação nutricional, que irá minimizar as deficiências aminoacídicas que

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Tabela I-I.1- Composição aminoacídica das globulinas 11S Aminoácido Arachis hypogeaaBrassica napusCitrullus vulgarisCicer arietinumaGlycine max Helianthus annusaPhaseolus vulgarisa Pisum sativum I II

Vicia faba Asx 13,3 12,0 9,9 9,8 13,910,89,5 11,8 12,711,4 Thr 2,8 4,84,0 4,3 4,1 3,6 4,9 3,1 3,2 Ser 6,0 4,66,6 6,8 6,5 5,0 7,3 5,5 5,9 Glx19,4 21,2 15,6 13,925,120,113,122,1 16,520,8 Pro 5,5 5,83,6 ND*6,9 5,1 5,1 NR**4,9 Gly 7,4 6,58,0 7,5 5,0 7,5 8,0 6,2 NRNR Ala 6,2 5,37,2 6,4 4,0 6,5 6,9 5,5 5,8 ½ Cys 0,7 0,60,8 0,8 1,7 2,2 0,6 0,8 0,7 0,8 Val 5,1 7,06,1 5,5 4,9 6,2 7,0 5,2 4,8 Met VT 2,12,5 1,0 1,3 2,0 1,5 0,6 0,5 lle3,9 6,04,7 4,4 4,9 4,9 4,9 3,4 4,1 Leu 7,1 10,2 7,1 8,0 8,1 6,9 8,7 7,9 8,0 Tyr 3,3 NR2,5 2,5 4,5 2,1 2,9 1,4 2,6 Phe 4,9 6,65,1 4,9 5,5 5,0 3,6 3,6 4,2 His2,0 2,52,1 2,4 2,6 2,3 3,0 2,3 2,5 Lys 2,1 3,82,3 5,2 5,7 1,9 7,8 5,6 4,2 Arg 10,2 8,411,9 7,6 8,9 6,9 4,8 8,5 7,5 10,0 Trp ND 1,2ND ND 1,5 1,0 0,7 1,3 NR NH3NR 2,5 NR NR 1,6 NDNR NR NRNR Resultados expressos em g aminoácido/100 g de proteína. a Resultados expressos em moles por cento; **ND – não determinado; **NR – não declarado; VT- vestígios Resultados compilados de: Derbyshire et al. (1976) (A. hypogea, C. arietinum P. vulgaris C. vulgaris H. annus); Fukushima (1991) (G. Max); Koyoro e Powers (1997) (P. sativum I); Murray (1979) ( sativum II); Morie Utsumi (1979) (V. faba); e Swenke et al. (1981) (B. napus, na sequência resultados obtidos por Simon et al., 1985).

3,1 5,2 4,4 3,3 4,1 0,6 4,7 7,7 3,2 3,8 2,8 5,5 1,2 e P. de

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Pisum ivum IIk

Vicia fabaVicia sativa 12,0 13,7 11,9 11,2 4 2,9 2,9 2,7 8 6,9 5,1 7,1 19,3 18,7 17,6 18,0 5 4,6 NR*3,9 1 NR2,5 2,9 0 5,2 3,1 3,0 4 0,2 0,3 0,0 6 5,3 4,3 3,7 2 0,2 0,4 0,6 1 5,1 5,2 5,7 2 10,2 9,3 9,3 0 1,5 3,8 4,0 2 4,9 6,8 5,8 1 1,6 2,4 2,7 9 8,0 8,1 8,1 3 6,0 7,8 10,7 1 0,4 NR 0,0 NR NRNR NR Resultados expressos em g de aminoácido/100 g de proteína (N×6,25).*NR - não declarado; **VT - vestígios a β-conglicinina; b globulina básica 7S (Yamauchi et al., 1984); c aglutinina (Lotan et al., 1974); d glicoproteina II do feijão (Putzai e Watt, 1970); d faseolina cristalizada do feijão comumdos jardins (Johnson et al., 1982); f,g lectina e arcelina, respectivamente (Osborn, 1988);h extracto de globulina do feijão da china (Phaseolus mungo) (Padhye e Salunkhe, 1979); i ”Kintoki bean” (Phaseolus vulgaris) (Hamaguchi et al., 1977); globulina do feijão tepari (Sathe et al., 1994); k ervilhas secas B-160 (Koyoro e Powers (1987); os restantes resultados são da autoria de Derbyshire et al. (1976).

Tabela I-I.2- Composição aminoacídica das globulinas 7S Aminoácido Cicer arietinum Glycine Max Ia IIb IIIcLupinus angustifoliusPhaseolus vulgaris Id IIe IIIf IVg Vh VIiPhaseolus acutifoliussat I Asx12,3 14,1 9,8 14,0 1,7 12,4 13,2 12,5 15,0 12,5 16,5 13,4 Thr2,9 2,8 6,9 5,6 1,7 3,4 7,1 9,6 7,3 2,3 7,5 2,7 3, Ser 6,2 6,8 6,8 6,8 3,4 6,7 8,3 14,4 11,5 6,1 8,1 8,0 5, Glx 19,9 20,5 14,2 7,2 24,5 15,1 16,0 6,7 8,2 16,7 8,1 15,0 Pro NR 4,3 6,8 6,0 2,7 2,9 3,4 3,7 3,3 5,0 3,2 4,3 3, Gly4,0 2,9 4,9 2,8 1,4 2,7 4,5 6,8 5,7 5,6 4,7 7,9 3, Ala3,0 3,7 4,7 5,3 1,3 3,0 4,4 6,6 6,1 5,2 4,1 5,6 3, ½ Cys 1,2 0,3 0,7 0,0 1,5 0,3 0,2 0,1 0,6 VT** 0,0 0,0 0, Val 4,6 5,1 7,1 6,3 2,5 5,2 5,8 7,7 7,1 6,3 8,0 5,7 4, Met 1,0 0,3 2,6 4,9 0,0 0,7 0,5 0,0 0,2 VT0,0 1,0 0, Ile 4,4 6,4 3,9 5,8 4,9 5,6 5,2 5,4 4,7 4,9 5,7 4,6 5, Leu 8,9 10,3 10,6 9,5 6,3 9,1 9,1 8,9 6,7 8,7 9,8 8,7 9, Tyr 2,8 3,6 2,1 2,9 5,7 3,5 3,6 2,3 3,0 2,4 2,7 3,4 3, Phe 7,2 7,4 5,7 7,3 5,2 6,6 6,6 5,7 6,5 5,6 8,9 5,5 6, His 2,8 1,7 4,8 2,7 2,3 2,6 1,5 4,7 5,9 3,5 0,9 1,9 2, Lys 7,1 7,0 3,4 5,6 4,0 5,6 5,8 1,1 2,4 5,9 4,0 5,3 7, Arg9,5 8,8 4,4 3,4 15,2 5,0 5,2 2,4 4,7 5,3 4,9 5,2 7, Trp NR 0,3 NR4,1 0,0 0,8 NR2,0 0,9 4,0 10,3 1,5 0, NH3NR 1,7 NR NR2,3 1,8 NRNR NR NRNR NR

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determinada proteína possa exibir. Será, por exemplo, a complementação registada quando da ingestão de cereais com leguminosas, em que por um lado, é suprimida a deficiência em lisina existente para os cereais, e por outro, a deficiência em aminoácidos sulfurados, tradicional das leguminosas. A digestibilidade de uma proteína é importante para a sua utilização mas, por si só, não chega para conferir um bom valor biológico à proteína. Por exemplo, as proteínas das sementes do Phaseolus vulgaris têm uma digestibilidade da ordem de 90%, mas um valor biológico de 43,0%.

As sementes de leguminosas, devido à sua deficiência em aminoácidos sulfurados, deverão ser encaradas, do ponto de vista alimentar humano, na perspectiva da manutenção do equilíbrio, e não na perspectiva do crescimento. Este facto, faz com que a maioria das leguminosas, com algumas excepções, como no caso da soja, não sejam utilizadas na alimentação infantil.

A digestibilidade e o valor biológico das proteínas de leguminosas são, tipicamente, inferiores ao das proteínas animais, pelo facto de que nas leguminosas existe uma ou duas fracções proteicas com elevada representatividade, constituindo mais de 50% do conteúdo proteico total. Dos diversos estudos feitos para racionalizar o facto das proteínas de leguminosas terem menor valor nutricional, relativamente às animais, resultaram uma série de factores ou possíveis razões explicativas (Sathe, 2002):

1- Deficiência em aminoácidos sulfurados (principalmente metionina);

2- Natureza compacta da maioria das proteínas de reserva (globulinas 7S e 11S);

3- Presença de inibidores enzimáticos, particularmente inibidores da tripsina e quimotripsina;

4- Presença de compostos fenólicos;

5- Presença de lectinas;

6- Obstáculo espacial motivado pela presença de açúcares nas proteínas de reserva principais (as globulinas 7S são tipicamente glicosiladas);

7- Ligação de fitatos às proteínas, provocando uma diminuição da susceptilbilidade das proteínas à proteólise;

8- Interacções proteína-proteína. As albuminas (fracção solúvel na água) interagem com as proteínas de reserva mais representativas, diminuindo a velocidade de proteólise;

9- Baixa digestibilidade das proteínas solúveis na água;

10- Diminuição da proteólise por interferência física devido à presença de fibras.

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Para além destes, outros factores poderão influenciar os diversos mecanismos acima citados. Por exemplo, os minerais, podem mediar interacções entre fitatos e proteína, e os polifenóis podem ligar-se a proteínas, incluindo as digestivas, e influenciar a susceptibilidade destas à proteólise.

Os taninos são compostos fenólicos que existem num teor entre os 2 a 3%

(relativamente a 100 g de peso seco), nas sementes secas de leguminosas, e que por diferentes possíveis mecanismos, podem interferir com a utilização proteica do seguinte modo (Sathe, 2002):

1- Diminuição da ingestão do alimento devido ao sabor adstringente dos taninos;

2- Diminuição da solubilidade proteica, devido à interacção proteína-tanino;

3- Inibição das enzimas proteolíticas;

4- Diminuição da susceptibilidade dos complexos proteína-taninos às proteinases;

5- Efeitos adversos dos taninos no tracto digestivo;

6- Efeito tóxico dos taninos absorvidos;

7- Combinação de um ou mais dos factores, de 1 a 6.

Com a inclusão recente dos fenóis nas dietas alimentares, com o objectivo de beneficiar a saúde pública, e tendo em atenção o que já foi dito, convém avaliar cuidadosamente este tipo de intervenção, face ao seu potencial antinutritivo. Diversos estudos sobre a acção dos fenóis em proteínas de leguminosas (Aw e Swanson, 1985;

Elkin et al., 1996) levam-nos a concluir que deverá ser feita uma avaliação critica e séria sobre a influência dos fenóis na digestibilidade proteica.

As lectinas poderão ocorrer nas leguminosas em quantidades apreciáveis, dependendo do tipo de leguminosa. Valores entre 0 e 15% do teor proteico total poderão corresponder a lectinas. As lectinas exibem propriedades químicas interessantes como: aglutinação de eritrócitos, actividade mitogénica (indução da mitose em linfócitos), aglutinação de células malignas, ligação a açúcares, especificidade para grupos sanguíneos humanos e toxicidade para os animais. As lectinas são, por si só, resistentes à proteólise, pelo que poderão ter um efeito tóxico quando ingeridas (Putzai, 1987; Putzai et al., 1989).

A ligação de fitatos às proteínas poderá originar perda de solubilidade das proteínas, diminuindo a sua digestibilidade ou, causar a inactivação das enzimas

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digestivas, reduzindo a digestão proteica e baixando a qualidade nutricional da proteína. Estudos in vitro (Vaintraub e Bulmaga,1991; Sathe e Sze-Tao, 1997) e in vivo, não foram, no entanto, conclusivos (Thompson e Serranio, 1986).

1.2.4.3- Propriedades físico-químicas das proteínas com utilidade na tecnologia de separação proteica e alimentar

i. Solubilidade proteica

A maioria das proteínas de reserva de leguminosas têm um ponto isoeléctrico (pI) ácido, devido à sua riqueza em ácidos aspártico e glutâmico. Uma vez que a maioria das proteínas de reserva são albuminas e globulinas, com pI num intervalo de pH ácido, são eficientemente solubilizadas em meios alcalinos (pH 8,5 a 10), sendo o meio aquoso eficiente para as para as albuminas. O ajuste do pH, das soluções proteicas solubilizadas, ao do intervalo de pH dos pontos isoeléctricos correspondentes, permite separar e concentrar a maior parte das proteínas.

i.i. Capacidade de retenção de água

A capacidade de retenção de água, por parte das proteínas de leguminosas, está dependente do tipo e da quantidade de proteína, bem como da presença dos componentes não-proteicos existentes na preparação. A maioria das preparações proteicas de leguminosas retém uma quantidade de água entre 5 a 6 vezes a sua massa (Sathe, 2002). Esta capacidade de retenção está parcialmente dependente do pH do sistema envolvente, uma vez que este controla a carga eléctrica da(s) proteína(s). Exibindo, as proteínas de leguminosas, dum modo geral, um pI acídico, os valores de pH neutros ou levemente alcalinos conferem à proteína uma carga negativa, enquanto que um pH ácido, confere uma carga positiva. Quando o valor de pH do meio é igual ao pI, a carga da proteína é neutra. A capacidade de retenção de água, é importante para as características finais de um produto, como a retenção de humidade ou o grau de secura.

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i.i.i. Capacidade de retenção de óleo

A capacidade de retenção de óleo é importante para o desenvolvimento de produtos alimentares fritos, assim como para a estabilidade durante a conservação dos produtos, i.e., impregnação de odores e desenvolvimento de ranço oxidativo.

Muitas proteínas de leguminosas retêm um teor <5 g óleo / g proteína, apesar de o valor poder ser variável. Algumas leguminosas como o grão-de-bico e proteína de soja, são usadas, principalmente em países orientais, para dar textura estaladiça e efeito ruidoso aos produtos alimentares fritos. A textura alcançada, nestes preparados, deve-se à acção conjunta das proteínas e de hidratos de carbono. Deve-se, ainda, ter em atenção que só algumas leguminosas podem ser utilizadas neste tipo de alimentos. Na verdade, o desenvolvimento de odores desagradáveis, impede a utilização de muitas leguminosas neste tipo de formulações alimentares.

i.v. Gelificação

A capacidade de as proteínas formarem gel, tem a ver com a concentração proteica. Contrariamente à gelatina, de origem animal, cujo gel se forma com uma concentração proteica da ordem de 1 a 2% (m/v), as proteínas de leguminosas necessitam de uma concentração de 10 a 20% (m/v), e de uma temperatura elevada (maior do que 70 ºC, para algumas leguminosas, comparado com 4 ºC para a gelatina) para formarem instantaneamente o gel. O Tofu de soja é o exemplo de um sucedâneo de proteína de soja, em que a formação do gel é induzida pelo calor.

O mecanismo da gelificação proteica envolve vários passos, que incluem a desnaturação proteica, a formação de uma malha proteica mediada por interacções entre proteína-proteína e proteína-componentes não proteicos (como o cálcio) e a formação do gel. Este mecanismo está dependente de vários factores, como: o tipo de proteína e a respectiva fonte proteica; a concentração proteica no meio; o pH do meio;

a força iónica (μ); a influência da temperatura do meio, sobre as diferentes proteínas envolvidas; a presença de componentes não proteicos (principalmente lípidos e hidratos de carbono); e ainda os pârametros mecânicos (corte, agitação e torção, entre outros) do meio. Com a especialização tecnológica existente, as ″carnes″ texturizadas de soja têm cada vez uma maior implementação e aceitação. Produtos similares, à base de outras leguminosas, não têm tido tanta aceitação, sendo geralmente consumidos a nível local.

(18)

v. Actividade de superfície

A actividade da superfície proteica, relaciona-se directamente com as propriedades coloidais da proteína, que, por sua vez, influenciam as propriedades de formação de emulsão e de espuma, que são importantes no desenvolvimento de produtos alimentares. A maioria das proteínas de reserva de sementes de leguminosas (por terem uma estrutura rígida), não tem uma boa capacidade de formação de espuma, nem confere estabilidade à espuma, quando comparada com as proteínas animais, as proteínas de ovo e leite, por exemplo. Parece, no entanto, que as proteínas glicosiladas conferem um aumento da solubilidade, da formação de espuma e das propriedades emulsionantes (Pedrosa et al., 1997).

1.2.5- Propriedades nutracêuticas das leguminosas

Os livros antigos, entre os quais o Velho Testamento (1º Capítulo do Livro de Daniel) (Kushi et al., 1999), são o testemunho de que o homem tinha já a noção de dieta alimentar, referindo que a saúde era beneficiada com a ingestão de pouca carne e alto teor de cereais. Registos antigos, de medicina tradicional chinesa e indiana, testemunham o emprego de espécies locais, no tratamento de doenças. Outras indicações do uso fitoterapêutico das leguminosas provêm de regiões do Mediterrâneo, em que as sementes de leguminosas têm sido consumidas desde há séculos, constituindo um dos elementos da chamada dieta mediterrânica (DeFeo et al., 1992; Guarrera, 2005), que já ganhou o seu lugar como uma dieta equilibrada e preventiva de doenças cardiovasculares.

O termo ″nutracêutico″ resulta da fusão dos termos ″nutrição″ e ″farmacêutico″.

Este termo foi dado por Stephen De Felice, fundador da ″Fundação para a Inovação em Medicina, USA″, em 1989. Ele definiu nutracêutico como qualquer ″alimento, ou parte de alimento, que forneça benefício médico ou de saúde, incluindo a prevenção e tratamento de doenças″. Entre os componentes alimentares reivindicativos desta acção, temos; lípidos, vitaminas, minerais, fibras, flavonóides e, menos frequentemente, proteínas e péptidos. A maioria destes compostos, biologicamente activos, provêm do reino plantae (Scarafoni et al., 2007).

O efeito benéfico que os alimentos poderão ter na saúde do homem, pode ser apresentado em duas formas, a que se baseia na composição química do alimento em

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questão (secção 1.2.4.1), e a que se baseia em estudos científicos e apresentação de resultados (secção 1.2.4.2), de modo a objectivar as conclusões e fazer uma relação científica com a sua composição química (Duranti, 2006).

1.2.5.1- Efeitos benéficos das sementes de leguminosas

i. Doenças cardiovasculares

A ingestão frequente de leguminosas secas, em paralelo com uma dieta pobre em gorduras saturadas, pode ajudar a controlar a homeostase lipídica e, consequentemente, reduzir o risco de doenças cardiovasculares (DCV). Parece que o elevado teor em fibra, o índice glicémico baixo e a presença de componentes menores como fitosteróis, saponinas e oligossacáridos, exibida pelas leguminosas, são os agentes responsáveis por estas propriedades.

i.i. Diabetes

Pelo facto de exibirem um índice glicémico baixo, associado a um alto teor de fibras não digeríveis, tem sido atribuído às leguminosas uma acção controladora nos indivíduos diabéticos. Além disso, as sementes de leguminosas contribuem para prevenir a resistência à insulina, característica da diabetes mellitus tipo 2.

i.i.i. Doenças do tracto digestivo

O aumento da velocidade do trânsito intestinal, provocado pelas leguminosas, tem efeitos benéficos, uma vez que diminui a absorção do colesterol, provoca a digestão incompleta do amido e a diminuição dos processos fermentativos. Estes factores têm sido considerados benéficos na prevenção do cancro, especialmente no cancro do colo do útero.

i.v. Excesso de peso e obesidade

Apesar do seu conteúdo lipídico, em amido e em proteínas, atribui-se às sementes de leguminosas o controlo do peso corporal, pelo seu efeito de satisfação da saciedade, que se traduz numa menor necessidade de ingestão de alimentos.

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1.2.5.2- Efeitos benéficos demonstrados para proteínas de leguminosas seleccionadas

Numa revisão feita por Duranti (2006), salientam-se exemplos de estudos feitos com várias leguminosas, incluídas em dietas alimentares, e a sua repercussão sobre determinados parâmetros biológicos (teor de colesterol e teor de glucose no sangue), bem como estados fisiológicos como o excesso de peso e a obesidade. A Tabela I-1.3 resume o tipo de actividade biológica que se obteve para fracções peptídicas extraídas e purificadas de diversas sementes de leguminosas, entre as quais, a soja, o tremoço e a fava.

No estudo do efeito das leguminosas em situações de prevenção e tratamento/minimização das consequências de uma doença, deve ter-se em atenção que estudar individualmente a actividade biológica dos nutrientes com acção nutracêutica é importante. Este estudo, permite elucidar os mecanismos de acção, desenhar protocolos de intervenção e calibrar o efeito dose/resposta. Não devemos, no entanto, esquecer que a ingestão do órgão, no seu todo, neste caso as sementes de leguminosas (principalmente), devido ao seu teor em proteínas, fibras, vitaminas, minerais e ainda outros constituintes (oligossacáridos, isoflavonas, fosfolípidos, saponinas e antioxidante), resultam, num efeito sinergístico, que contribui para uma maior protecção, por exemplo ao nível cardiovascular (Anderson e Mayor, 2002).

i. Efeito hipocolesterémico e de controlo da homeostase lipídica pelas proteínas de soja

A comprovação de que as leguminosas trazem efeitos benéficos, quando incluídas nas dietas alimentares, foi testemunhada em 1999, quando a FDA (Food and Drug Administration) Americana permitiu a rotulagem de alimentos que incluíam um valor ≥ 6,25 g de proteína de soja, por dose alimentar, como alimento preventivo de doenças coronárias. É do conhecimento científico que a substituição de proteína animal por proteína de vegetais, numa dieta para indivíduos hipercolesterémicos, reduz significativamente o teor de colesterol (Hodges et al,, 1967), estando ainda em estudo a identificação dos compostos responsáveis, que poderão incluir, por exemplo, fitoesteróis, fibras dietéticas e componentes proteicos. A primeira evidência, in vivo, do testemunho de que as globulinas 7S da soja, reduzia os níveis de colesterol plasmático nos ratos, foi feita por Lovati et al., (1992). Neste estudo, observou-se que

(21)

Tabela I-1.3- Actividade expressa de péptidos/proteínas bio-activos, provenientes de sementes de leguminosas

Péptidos/proteína Semente de leguminosa

Actividade intrínseca Actividade biológica

Cadeia α´ da globulina 7S

Soja n.d. -Regulação dos receptores-

LDL

- Redução do colesterol e dos triacilglicérois plasmáticos - Actividade anti-ateromatosa Proteínas de reserva

não definidas

Fava, tremoço e outras

n.d. -Redução do colesterol e dos

triacilglicéroisplasmáticos Inibidor (Bowman-Birk)

das proteases de serina

Soja, ervilha e outras

Inibidor da

tripsina/quimotripsina

- Anti-cancerígeno - Anti-inflamatório - Anti-obesidade

-Anti-degenerativo e doenças auto-imunes

Inibidor da α-amilase Várias fontes Inibidor da α-amilase - Controlo do peso - Obesidade - Diabetes

γ-Conglutina Tremoço n.d. - Hipoglicémica - Hipocolesterémica

Lectinas Várias fontes Ligação a grupos

glicosilo

- Anti-cancerígeno - Imuno-modulação ACE inibidor de

péptidos

Soja Tratamento com

alcalase/fermentação das proteínas de soja

- Hipotensivo

n.d.: não disponível

(adaptado de Duranti, 2006)

além da redução da ordem dos 35% em colesterol plasmático nos ratos, também o teor dos triacilgliceróis, tinha uma redução. Estudos posteriores revelaram que era a subunidade α´ da globulina 7S que conferia esta actividade (Duranti et al., 2004), estando neste momento, os mesmos investigadores a testar a possibilidade de clonagem e expressão, desta subunidade, em organismos hospedeiros apropriados, que permitam obter a subunidade α´, com bioactividade.

Estas evidências directas, que suportam a associação epidemiológica, entre a ingestão das proteínas de soja e a prevenção do risco das doenças cardiovasculares

(22)

(Anderson e Major, 2002) levaram, devido ao grande impacto na saúde do homem, ao estudo de outras sementes de leguminosas, com efeito na homeostase lipídica (Lasekan et al.,1995; Dabai et al., 1996). Sirtori e colaboradores (2004), relatam, pela primeira vez, o envolvimento de proteínas do tremoço (Lupinus), na redução do colesterol no plasma total, assim como dos níveis de LDL- colesterol no rato, tendo-se avançado a hipótese de ser a γ-conglutina, a proteína responsável. Outros estudos foram encetados, com a Vicia faba, tendo também sido promissores, devido à acção benéfica manifestada sobre os lípidos. Weck e colaboradores (1983), tinham já demonstrado que, em ratos hipercolesterémicos, a Vicia faba tinha uma eficácia comparável à da soja, na redução do colesterol. Este efeito, foi posteriormente confirmado por Macarulla et al., (2001).

i.i. Controlo glicémico efectuado por alguns componentes químicos de Lupinus

Alguns alimentos ricos em hidratos de carbono induzem, após ingestão, uns mais que outros, uma redução da hiperglicémia e hipercolesterémia (Lang et al., 1999).

Estes alimentos de baixo índice glicémico (IG), originam na resposta pós-prandial, um baixo teor de glucose no sangue, quando comparado com um alimento de referência.

As sementes de leguminosas exibem um baixo IG, que se pensa poder atribuir à sua constituição em amido, que actua por redução da absorção do colesterol e da glucose (Jenkins et al., 1988). Põe-se, no entanto, a questão seguinte: e as leguminosas que contêm menos amido, e exibem este tipo de actividade, como a soja e o tremoço?

Vários autores dão a sua contribuição a esta problemática, indicando possíveis factores envolvidos.

a) proteínas

O tremoço é uma leguminosa rica em proteínas, em que as suas propriedades medicinais têm sido exploradas, tendo sido, particularmente descrita a actividade anti- diabética em sementes tostadas (Orestano, 1940). O estudo do princípio activo responsável por esta actividade de controlo da glucose, levou ao estudo de uma proteína específica, a γ-conglutina, em Lupinus albus (Scarafoni et al., 2007), que representa 5% das proteínas totais da semente e cuja função permanece desconhecida. Esta proteína, devido à sua semelhança de sequência aminoacídica (63%) com a proteína Bg7S da soja, que exibe ligação à insulina (Hanada e Hirano, 2004), revelou-se uma séria candidata como hipoglicemizante, tendo sido feito,

(23)

recentemente, o seu estudo molecular e metabólico. A γ-conglutina isolada revelou, in vitro, ligar-se à insulina e, em ensaios de actividade biológica realizados em ratos, em que se ministrou a proteína na dieta, demonstrou reduzir os níveis de glicemia, dum modo semelhante à droga anti-diabética a metformina (biguanida) (Magni et al., 2004, Morrazoni e Duranti, 2004).

As dietas terapêuticas à base de proteínas/péptidos, são dietas particularmente complexas devido às várias transformações que estes nutrientes sofrem desde a produção da formulação até à sua digestão. No estudo dos péptidos e proteínas biologicamente activos deve-se ter em atenção todo o caminho metabólico e alterações fenotípicas sofridas, incluindo:

- estabilidade da estrutura do polipéptido e da conformação nativa, durante o percurso gastro-intestinal;

- modalidades de absorção ao nível da barreira intestinal;

- destino metabólico e eliminação;

- efeitos tópicos versus efeitos sistémicos;

- identificação do modo de acção: direccionado para células marcadas (receptores?);

- acção indirecta (veiculação e/ou interacção com outros componentes);

- número de variáveis, que incluem resposta individual, modo de administração (formulação), efeito da matriz, processo de produção e potencial alergenecidade.

Como se pode prever, perante tantas variantes, é difícil controlar a biodisponibilidade de uma proteína/péptido e estabelecer dosagens apropriadas, sem antes efectuar um estudo concertado envolvendo estes parâmetros.

b) alcalóides quinolizidínicos

A lupanina e a esparteína são alcalóides quinolizidínicos. Estes alcalóides reduzem os níveis de glucose no sangue, actuando por inibição dos canais de K+ e Na+ ao nível do pâncreas (Paolisso et al., 1985; Körper et al., 1998) e aumentando a secreção de insulina, dum modo semelhante à droga anti-diabética glibenclamida (sulfonilureia). A acção controladora do ATP, ao nível dos canais de K+, desempenha um papel crucial na secreção da insulina (Fig.I-1.1). Quando os níveis de glucose aumentam no sangue, as células dos ilhéus de Langerhans libertam insulina, o que vai aumentar a utilização de glucose em muitos tecidos. A glucose sanguínea vai ser transportada activamente, por um transportador de glucose (GLUT2), para as células dos ilhéus de Langerhans. Esta glucose é metabolizada na glicólise e ciclo do ácido cítrico, sendo

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