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A Terceira Pessoa: Interpretação, Intersubjetividade e Conhecimento em Donald Davidson

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA

FACULDADE DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS

RODRIGO GOTTSCHALK SUKERMAN BARRETO

A Terceira Pessoa

: Interpretação, Intersubjetividade e

Conhecimento em Donald Davidson

Salvador

2014.2

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RODRIGO GOTTSCHALK SUKERMAN BARRETO

A Terceira Pessoa

: Interpretação, Intersubjetividade e

Conhecimento em Donald Davidson

Monografia apresentada ao Curso de Graduação em Filosofia da Universidade Federal da Bahia como requisito parcial para a obtenção do grau de Bacharel em Filosofia.

Orientador: Prof. Dr. Waldomiro José da Silva Filho

Salvador

2014.2

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RODRIGO GOTTSCHALK SUKERMAN BARRETO

A Terceira Pessoa

: Interpretação, Intersubjetividade e

Conhecimento em Donald Davidson

Monografia apresentada ao Curso de Graduação em Filosofia da Universidade Federal da Bahia como requisito parcial para a obtenção do grau de Bacharel em Filosofia.

Orientador: Prof. Dr. Waldomiro José da Silva Filho.

BANCA EXAMINADORA

_____________________________________________________________ Prof. Dr. Waldorimo José da Silva Filho

__________________________________________________________ Prof. Dr. José Antônio Saja Neves dos Santos

__________________________________________________________ Prof. Me. Ricardo Calheiros Pereira

Salvador

2014.2

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AGRADECIMENTOS

Agradeço ao Professor Waldomiro José da Silva Filho pela paciência, competência, disponibilidade e comprometimento com o trabalho de orientação. As indicações de textos, leituras minuciosas e críticas ao trabalho feitas pelo senhor foram fundamentais para conclusão deste trabalho. Agradeço aos docentes da universidade e a todos os funcionários por desempenharem suas funções e tornarem possível o trabalho acadêmico. Agradeço ao grupo Investigações filosóficas pelo trabalho intensivo e construtivo que traz um ambiente de diálogo aberto permitindo a exposição dos nossos trabalhos, como também o rico diálogo gerado entre os temas de trabalho e os especialistas convidados. Ao Pibic pelo auxílio dado a pesquisa que contribuiu significativamente para os avanços realizados no projeto.

Aos meus pais Roque Barreto e Telma Barreto que se empenharam muito para minha educação e me deram todo suporte disponível. Todo amor, carinho e cuidado foram essenciais para elaboração do trabalho e da minha construção pessoal. A minha irmã Mariana pelo apoio que me dá. A minha avó Norma pela preocupação e carinho e a minha família que lhes tenho grande amor.

Agradeço aos meus colegas de curso pelas conversas e trocas de informações significativas para minha formação em especial: Kayk Oliveira, Juliomar Marques, Mariana Cunha, Ygor Borba, Valério Cássio, Igor Adorno, Bruno Silva Douglas Lisboa, Cleyton, Alan Brandão, Fabiano Barcella dentre outros.

Aos meus amigos íntimos aos quais compartilham comigo momentos significativos e formadores em vários aspectos da minha vida. Rafael Cunha, Rafael Sangiovanni, André Leal, Mariana Ramone, Vitor Requião, Dantte Ferreira, Alain Petterson, Hermano Oliveira, Matheus Couto, Raphael Andrade, Estevão Sollero, Tiago Martino, Victor Neri, Cláudia Sayuri, Marina fukunaga, Morgana Gazar, Roman Blanco, Marcel Coura, Fabiano Barcella, Juliana Coura, Luiz Rocha, Conchita Meneses, Dagmar Meneses, Victor Meneses. Em especial agradeço a Yasmin Meneses por todo companheirismo,confiança, carinho, dedicação e apoio.

A todos os citados e aos que por ventura não citei agradeço imensamente por fazerem parte da minha vida e darem suporte na realização deste trabalho.

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RESUMO

Este trabalho monográfico tem como objeto o estudo da possibilidade do conhecimento da terceira pessoa dentro da epistemologia de Donald Davidson, com o objetivo de analisar o papel que a perspectiva da terceira pessoa desempenha no conhecimento do mundo externo e no autoconhecimento, via uma pesquisa bibliográfica. Para tanto, foi feita uma revisão da literatura referente ao objeto em artigos do próprio Davidson, e dos comentadores críticos das obras do filósofo. Primeiramente, para entender o contexto em geral em que a terceira pessoa está inserida é feita uma revisão conceitual, pela obra de John Austin, do problema das outras mentes. O problema das outras mentes é um tema clássico da filosofia moderna, idealista e empirista, que sob preceitos metafísicos tentam fundamentar o conhecimento sobre noções inalienáveis que por fim lhe proporcionassem garantias estáveis e seguras sobre o conhecimento. Entretanto, essas garantias partiam, fundamentalmente, de pressupostos subjetivistas, consequentemente, a realidade exterior e o conhecimento das outras mentes foram afetados, tendo em vista que crenças individuais podem ser totalmente diferentes de como o mundo externo se apresenta. Essas dúvidas são o campo onde se estabelece o cenário cético. O ceticismo por sua vez negará a possibilidade do conhecimento tanto do mundo externo, como das outras mentes. Levando em conta a independência lógica das crenças com o mundo externo, por fim, o ceticismo lança questões sobre a possibilidade do agente conhecer até mesmo os seus próprios estados internos. O trabalho de Davidson é mostrar que os argumentos céticos não são válidos e que, além de possível, o conhecimento do mundo, das outras mentes e o autoconhecimento são indispensáveis. Para isso, ele reformula a concepção do mental sobre a noção holística e procura mostrar a indispensabilidade dessas três formas de conhecimento que, apesar de diferirem na forma de acesso, correspondem a uma mesma realidade compartilhada entre os homens. Outro trabalho do autor é mostrar como é possível haver a assimetria do conhecimento entre a primeira e a terceira pessoa e eles não serem excludentes. A assimetria corresponde, também, as formas que um agente tem para acessar o mundo. Nos casos de primeira pessoa, ao ter uma crença o agente não tem necessidade de recorrer a indícios ou evidências externas para saber que está tendo um pensamento, enquanto no caso do conhecimento dos estados mentais de outras pessoas as informações disponíveis ao agente (intérprete) dependem do que um agente pode notar do comportamento do agente (falante). O conceito central para trabalhar essa problemática é o de interpretação que vigora durante o trabalho de Davidson e culmina em uma concepção onde a mente não pode ser pensada como uma entidade e nem pertencendo a um corpo, mas a uma rede de fatores que trabalham em conjunto num contexto sociolinguístico. Finalmente o estudo apontou que a perspectiva da terceira pessoa pensada como uma comunidade de mentes é parte necessária para o conhecimento da própria mente e do mundo externo.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO...07

CAPÍTULO 1 - O Problema das Outras Mentes...11

1.1 O PROBLEMA DAS OUTRAS MENTES SEGUNDO JOHN AUSTIN...11

1.1.1 Realidade, certeza e segurança...12

1.1.2 Conhecimento e Comprometimento...16

1.1.3 Assimetria entre primeira e terceira pessoa...20

1.2. O PROBLEMA DAS OUTRAS MENTES SEGUNDO DONALD DAVIDSON...21

1.2.1 O Problema da assimetria …...22

1.2.2 Entre Primeira e Terceira Pessoa...24

1.2.3 O argumento contra as linguagens privadas...25

1.2.4 A comunicação como resposta aos problemas das outras mentes e o da assimetria...27

1.2.5 As consequências geradas pelo argumento da linguagem privada...30

Capítulo 2 - AUTORIDADE DE PRIMEIRA PESSOA...32

2.1 O QUE SIGNIFICA A AUTORIDADE DE PRIMEIRA PESSOA...32

2.1.1 A Visão individualística clássica...33

2.2 A VISÃO EXTERNISTA...38

2.3 INTERPRETAÇÃO E A AUTORIDADE DE PRIMEIRA PESSOA...40

Capítulo 3 – A INTERDEPENDÊNCIA DAS TRÊS VARIEDADES DE

CONHECIMENTO...47

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3.2 O HOLISMO DO MENTAL...51

3.2.1 Monismo Anômalo...56

3.2.1.1 Crítica ao Monismo Anômalo...57

3.2.1.2 Defesa de Davidson ao Holismo do Mental e ao Monismo Anômalo...59

3.3 INTERPRETAÇÃO, CARIDADE E O LUGAR DA TERCEIRA PESSOA...62

CONSIDERAÇÕES FINAIS...66

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INTRODUÇÃO

Este trabalho monográfico tem como objeto central estudar a possibilidade do conhecimento de outras mentes e a relevância que este assunto tem para a epistemologia.

Para ser realizado o trabalho foi utilizada como fonte primária artigos seminais do filósofo norte-americano Donald Davidson (1917 – 2003) que tratam de temas como a intersubjetividade, a interpretação da linguagem e o processos comunicativos. O trabalho trata de um comentário crítico desses artigos de Davidson direcionando para as questões voltadas a natureza e a posição epistêmica da “outras mentes”, como, por exemplo conhecimento de terceira pessoa, o falante, o interlocutor e outros termos que se referem a terceira pessoa do singular e do plural.

Davidson foi formado na tradição da filosofia analítica e suas obras foram de grande contribuição para a filosofia da mente, da linguagem e a teoria da ação. Sendo uma referência contemporânea para a abordagem do objetivo monográfico ele se mostra um autor com contribuição relevante para formação acadêmica, discutindo tópicos desde clássicos da filosofia como Platão, a filosofia moderna e a contemporânea filosofia analítica e da linguagem (SMITH e SILVA FILHO, 2005). Como fonte secundária foi utilizada, em sua maioria, filósofos americanos e brasileiros, em geral, comentadores das obras de Davidson. Uma outra fonte foi as obras de filósofos como John Austin, este em específico com uma seção exclusiva para ele, Gilbert Ryle, Ludwig Wittgenstein e René Descartes.

No primeiro capítulo será apresentado e desenvolvido a problemática que envolve o conhecimento do estados mentais de outras pessoas. Primeiramente se mostrará que a pretensão de conhecimento quando envolve garantias que estão para além dos recursos disponíveis a um agente epistêmico, a saber, o seus sentidos, seu discernimento – comparação de um caso com outros – e da sua linguagem, tentam fundamentar tais garantias sob preceitos metafísicos. Se por um lado a metafísica propõe ter um fundamento estável e inalienável para o conhecimento, por outro, as condições de conhecimento são muito restritas (AUSTIN, 1946). Consequentemente surgem alguns problemas em decorrência

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disso. Por exemplo, devido as crenças de um agente serem logicamente independentes do que é o caso no mundo, há uma barreira lógica para que um agente possa conhecer o mundo para além de suas representações (DAVIDSON, 1991). Em seguida será tratada a assimetria do conhecimento entre primeira e terceira pessoa, ou seja, a diferença em que um agente tem para acessar seus próprios estados mentais e o modo como ele acessa os estados mentais de outras pessoas. Essa diferença consiste na forma que um agente tem para acessar seus próprios estados mentais – sem necessitar de recurso a evidências externas, bastando que ele tenha uma crença para que lhe seja outorgável conhecimento a ela – e o conhecimento de outras mentes, diferentemente, é necessário do acesso ao mundo exterior e do que ele pode notar do comportamento das outras pessoas. O primeiro capítulo se concluirá com as observações feitas por Wittgenstein (WITTGENSTEIN, IN: DAVIDSON, 1991; HACKER, 1992) a respeito das crenças terem sido tratadas, durante a história da filosofia, como formas de linguagem privada. A partir desse argumento, Davidson defenderá que a comunicação será o parâmetros para verificação objetiva das crenças e o que, em parte, significará o conteúdo das crenças individuais.

Com os argumentos de Wittgenstein sobre a linguagem privada surgiram algumas teses externistas (Burge, 1975; Putnam, 1979) onde afirmam que o significado das palavras não estão na cabeça e, em alguns casos, o agente ser alheio ou entender parcialmente as palavras que usa. Na visão de Davidson (1987, 1990) essas teses comprometem a autoridade de primeira pessoa, ou seja, o agente passa a não saber sobre aquilo que ele pensa. O segundo capítulo explora essa discussão, apresentando primeiramente a concepção individualística clássica, que concebe toda forma de conhecimento a partir da subjetividade de um indivíduo. Em seguida são apresentadas as críticas externistas ao individualismo subjetivo clássico, como os argumentos de Putnam e Burge. Embora, Davidson concorde com parte das teses externistas e que o significado das palavras dependam do mundo externo ele critica as teses desses dois filósofos por desconsiderar a autoridade de primeira pessoa. Sendo assim, Davidson (1990, 1991) desenvolve o externismo aos seus moldes e defende que o conhecimento do mundo externo, das outras mentes e o da própria mente apesar de diferirem na forma de acesso, consistem em uma

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mesma realidade e todos se interdependem para o pensamento.

O terceiro e último capítulo desenvolve a interdependência das três variedades de conhecimento defendidas por Davidson. Nesse ponto Davidson (1991) considera o mental de maneira holística, isto é, a causa de uma crença é o próprio objeto empírico, no entanto, o significado dele será visto como o compartilhamento linguístico influência no pensamento do agente epistêmico e como a autoridade de primeira pessoa, sobre o padrão de verificação objetiva, pode ser mantida. Davidson entretanto se considera um reducionista e afirma que os eventos mentais são físicos, com a ressalva de que, devido a isso, eles são não-mentais (DAVIDSON, 1997, p. 2). Reduzir eventos mentais a eventos mentais a eventos físicos é uma forma de monismo, pois considera ambos como parte de uma mesma realidade, por Davidson considerar que o mental apesar de poder ser descrito por eventos físicos, no entanto conserva característica semânticas que dizem respeito a um próprio vocabulário, Davidson chama seu monismo de Monismo Anômalo. O filósofo sofre algumas críticas, principalmente de cientistas que assumem posturas realistas metafísicas, para isso, foi utilizado os argumentos de Jaekwon Kim que está contida no artigo de Martins (2005). Posteriormente é apresentada a defesa de Davidson contra as objeções de Kim e de como ele acha plausível manter o seu reducionismo sem afetar o mental.

Por fim, o trabalho monográfico se encerra sobre o conceito de interpretação que é onde Davidson destaca a condição humana que, devido ao estar imerso em uma comunidade linguística e fazer uso de uma linguagem, está sujeito a entender outras pessoas e se fazer entender sobre um esforço interpretativo.

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CAPÍTULO 1

O Problema das Outras Mentes

1.1. O PROBLEMA DAS OUTRAS MENTES SEGUNDO JOHN AUSTIN

Facilmente uma pessoa pode estar enganada sobre o que ela conhece do mundo exterior, isto é, sobre o que ela conhece da realidade. Por exemplo: Qual a garantia que o mundo, tal como se observa é, de fato, assim? Pode ser o caso de se estar sonhando, em delírio, ser uma ilusão, algumas vezes ocorrem confusões e lapsos de memória, outras vezes as condições ambientais não permitem um exame minucioso, as experiências humanas são limitadas e a capacidade descritiva também. Se agora a proposta é querer saber o que se passa na cabeça de outras pessoas, de antemão, essa é uma questão que tem de ser esclarecida.

O problema das outras mentes é uma questão epistemológica que se refere à possibilidade de conhecer estados psicológicos de outras pessoas. Em geral, atribuir estados psicológicos a outras pessoas e tomar suas vidas mentais como objeto epistêmico exige uma atitude interpretativa que recai sobre as condições de conhecimento de um agente que deseja saber o que outra pessoa "tem em mente". Em casos de declarações sobre estados psicológicos é usado certo vocabulário que remete à subjetividade do indivíduo, seus pensamentos, desejos etc. Nesses casos, as condições de conhecimento do agente, disposto a saber o que está se passando na cabeça da outra pessoa, está sujeito a lidar com um campo que aparentemente não pertence ao reino do mundo físico (empírico). Austin escreve:

“Quando de fato descrevemos uma sensação como mental, é porque usamos uma palavra normalmente utilizada para descrever uma sensação física com um sentido especial, transferindo, como quando falamos de desconforto ou fadiga “mental”. Tal se dá, é claro, porque mais está envolvido no estar zangado, por exemplo, do que simplesmente mostrar os sintomas e experimentar as sensações”. (AUSTIN, 1946, p.114)

O que está em questão no exemplo acima é o fato de que descrever eventos mentais envolve comumente fazer comparações com eventos físicos, talvez pelo fato de serem mais

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facilmente localizados empiricamente. Entretanto, uma sensação ou um pensamento são estados psicológicos privados. Privados no sentido de localizar o conteúdo dos estados mentais naquele indivíduo que está tendo aquele pensamento ou aquela sensação. Consequentemente, conhecer algo de natureza tão intrínseca e intransferível é objeto de dúvidas e incertezas porque, no mínimo há uma assimetria entre as condições daquele que investiga os estados mentais de outrem e o indivíduo que está tendo aquela crença, sensação, pensamento que p1.

Essas são algumas situações embaraçosas que configuram o problema das outras mentes. Na primeira sessão desse capítulo será discutido o artigo intitulado “Outras Mentes”, do filósofo inglês John Longshaw Austin (1946), para expor, ao seu modo de ver, as principais problemáticas envolvidas na pergunta: Eu posso conhecer outras mentes?

1.1.1 Realidade, certeza e segurança

Austin separa o problema das outras mentes em duas questões principais: o problema da realidade e o problema da certeza e da segurança. A questão da realidade é uma dúvida metafísica, onde é posta em questão a existência, de fato, de outras mentes e a questão da certeza e da segurança é uma dúvida epistêmica onde é questionada as razões que um interprete pode ter sobre o seu conhecimento de outras mentes.

A. O Problema da realidade

Perguntar sobre a realidade de um estado psicológico, em casos de conhecimento, põe em questão as credenciais ou fatos de um agente de um modo especial. Por exemplo, ao questionar o um agente epistêmico que tenta interpretar outras mentes perguntando-o: “você tem certeza que ele está realmente zangado?”, a pergunta está dirigida a capacidade que o agente tem para acessar a realidade e dar respostas satisfatórias sobre o que é real. Entretanto, acessar a realidade exige

1 "p" é um simbolismo para representar um predicado qualquer. Por exemplo, se estiver escrito João acredita que p. p pode ser susbtituído, por exemplo, por está chovendo. Logo ficaria: João acredita que está chovendo. O mesmo acontece quando se usa o simbolismo S para representar um sujeito qualquer. A analogia se aplica da mesma forma.

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duas condições, em primeiro lugar o agente tem que estar em condições perceptivas favoráveis, pois, caso esteja “sonhando, em delírio, sob influência de mescal, etc.” (AUSTIN, 1946,p.100) estes casos anulariam seu conhecimento, uma vez que levam o agente ao erro, em segundo lugar, o ambiente (natureza) também tem que se apresentar favorável, pois “ a coisa pode ser empalhada, pintada, simulada, artificial, ilusão, fantasia, brinquedo, suposição, fingimento, etc”. (AUSTIN, 1946, p.100) o que não dá condições para que o agente forme crenças verdadeiras.

O modo especial que está sendo usada a palavra realidade se refere, justamente, ao fundo metafísico que ela deseja alcançar. O fundo metafísico pretendido com o emprego da palavra realidade é ter uma fundamentação sólida para o conhecimento de modo que torne-o invulnerável ao erro. No entanto, para Austin, a palavra "real" quando posta nessas condições perde seu uso comum, que é o de contrapor casos "relativos aos propósitos atuais" (AUSTIN,1946, p.101) como, por exemplo, para "distinguir um pintassilgo empalhado de um pintassilgo vivo" (cf. AUSTIN, 1946, p.100), dessa forma:

O ardil dos metafísicos consiste em perguntar "Isto é uma mesa real?" (um tipo de objeto que não tem modo evidente de ser falsificado) e não especificar ou delimitar o que há de errado como ela, de modo que eu me sinto embaraçado a respeito de "Como provar" que isto é uma mesa real. (AUSTIN,1946, p.100)

As pretensões metafísicas fazem com que o critério de conhecimento seja muito elevado o que viola a linguagem, permitindo, por exemplo, extrapolar os casos de uso relativo aos propósitos atuais e tentar obter garantias de conhecimento em

todos os casos possíveis. Austin, coloca duas condições que tem de ser cumpridas

tanto para os casos comuns do uso da palavra "real" como em casos especiais (metafísicos): a) Não há nada que dê suporte inabalável ao conhecimento de forma que um agente sempre esteja em condições de conhecer, por exemplo, o pintassilgo "pode voar antes que eu tenha oportunidade de examiná-lo, ou sem que eu o examine detalhadamente" e não é por motivos como esse que pode se chegar a conclusão de que "porque eu algumas vezes não sei ou não posso descobrir, não posso nunca2" (AUSTIN, 1946, p.101). b) o que é chamado de real não é uma prova

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contra milagres, ou seja, se a crença foi formada por um determinado evento e posteriormente aconteceu algo anormal (o pintassilgo explode) e o agente não tinha motivo nenhum para suspeitar dessa anomalia, o emprego da palavra real foi usado corretamente, pois, as palavras não são preditivas, elas se referem as coisas e eventos presentes e passados, "o que o futuro pode fazer sempre é nos obrigar a

rever nossas ideias sobre pintassilgos ou pintassilgos reais ou sobre qualquer outra

coisa", por esse motivo "as palavras literalmente nos traem" (AUSTIN, 1946, p.101) Os casos de conhecimento que envolvem cenários radicais e afetam tanto o mundo físico (miragens, cenários falsos) como as capacidades sensoriais do agente (mal funcionamento dos órgãos, estar sobre efeito de drogas),sendo que essas informações não são -aparentemente- disponíveis, configuram o problema da realidade.

B. O Problema da Certeza e da Segurança

O problema da realidade surge quando as condições para o conhecimento dependem externamente do agente epistêmico, no entanto, essas condições podem ser direcionadas para um nível mais íntimo. O agente epistêmico tem experiências cognitivas (sensações, percepções, memória), em certa medida, sua vida mental diz respeito à ele próprio e, portanto, suas crenças carregam um traço privilegiado e privado. O ponto que distingue o "conhecimento da realidade" (eventos externos) do "conhecimento das próprias crenças" (eventos internos) são as condições de verdade de cada um. O condicionante, no primeiro caso, é a relação da crença com o mundo e, no segundo caso, é a relação da crença com ela mesma. Ou seja, no primeiro caso a crença é verdadeira se for o fato do mundo também for - a crença de que a maçã é vermelha é verdadeira se de fato a maçã for vermelha - e, no segundo caso, basta o agente ter uma crença para que ela seja verdadeira - a crença que João está sentindo dor é verdadeira se João estiver sentindo dor. Nesse sentido de conhecimento o agente nunca pode estar errado, mesmo que se confunda a respeito do nome que está usando para descrever algo, o conteúdo da experiência é

menos cuidadosamente impedir-me de dar crédito às coisas que não são inteiramente certas e indubitáveis, do que às que nos parecem manifestamente ser falsas, o menor motivo de dúvida que eu nelas encontrar bastará para me levar a rejeitar todas" (DESCARTES, p.258)

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preservado, por exemplo:

(...)utilizar, digamos, a palavra “sorver” ao invés de “sofrer”, fato que pode confundir as outras pessoas, mas não a si mesmo, seja porque ele regularmente emprega “sorver” por “sofrer”, ou porque tal uso foi uma aberração momentânea como quando chamo João de “Alberto” mesmo sabendo muito bem ser ele João – embora lhe seja possível estar “errado” nestes dois sentidos, não lhe é possível estar no sentido mais privilegiado. (AUSTIN, 1946, p.102)

Austin formula um enunciado afim enfatizar um possível caso onde o agente declara algo sobre suas sensações e, por estar numa perspectiva privilegiada, sua crença seria verdadeira: "Eis aqui algo que me parece vermelho agora" (AUSTIN, 1946, p.103), o destaque para o advérbio de tempo "agora" se refere ao caráter ostensivo que o agente, ao fazer o enunciado, testemunha sua percepção atual do objeto vermelho. Em contraste, quando o enunciado não indica o tempo presente (“Eis aqui algo que me parece vermelho), ele fica sujeito a ser interpretado como que em outros casos, para além da percepção atual do indivíduo, o enunciado fosse verdadeiro.

Desse modo o destaque que está pretendendo ser feito com o advérbio “agora” é, justamente, o contato efetivo e contemporâneo do agente com a sua experiência subjetiva (privada) que, a princípio impediria interpretações peremptórias que afirmem que "isto é realmente uma coisa vermelha, uma coisa que pareceria vermelha numa luz normal, ou ainda amanhã e talvez mais que isso: sendo que tudo isso envolve "predição" (senão também um substrato metafísico)". (AUSTIN, 1946, p.102-3) Portanto, declarações no presente do indicativo teriam privilégios por seriam menos passíveis ao erro.

O sentido conhecimento privilegiado é o estado de crença/experiência que somente o agente que se encontra nele atualmente (crendo/experienciando) e, portanto, tem acesso direto e íntimo. Havendo casos desse tipo há, no mínimo, certo modo de conhecimento que não é passível de erro, que é o autoconhecimento (o conhecimento das próprias percepções), isto é, os "enunciados de sensação", de forma que, “quando eles são corretos e feitos por x, então x sabe que são corretos”. (AUSTIN, 1946, p.102). Austin segue em uma direção diferente.

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ambiguidade, não tanto pela ênfase no tempo da declaração, mas na hesitação em afirmar convictamente que algo seja exatamente dessa ou daquela maneira (AUSTIN, 1946, p.103). Nesse ponto ele está tirando a ênfase do status de verdade da crença subjetiva e deslocando para um sentido mais prático. No sentido prático, independente da natureza ou realidade do objeto, o que está em questão será as informações disponíveis ao agente para que ele possa responder. Obviamente, quando o agente não se arrisca e se limita em descrever o evento como uma forma de experiência privada, aparentemente ele não se compromete com a legitimidade das suas declarações para além do que ele percebe naquele instante, ou, ainda mais, tem a garantia de que, no mínimo, as crenças baseadas em estados internos sejam mais evidentes e seguras do que as crenças de “segunda mão” (por testemunho), por exemplo. Para Austin, um agente numa situação prática de comunicação onde tenha que responder uma questão e que, para isso, recorra as suas capacidades de discernimento, a sua capacidade de observação atual, as suas lembranças passadas que se conectem com a atual e que, desse modo, permita-o dar resposta. Ainda assim pode se sentir inseguro se tem em mente uma resposta definitiva, justamente, pelo “tom e expressão, de confiança e hesitação”. (AUSTIN, 1946, p.103), pois ele reconhece que as informações disponíveis são dispersas e que sua respostas pode causar consequências negativas as expectativas do seu interlocutor.

1.1.2 Conhecimento e Comprometimento

O quão confiante o agente se sente para dar uma resposta, faz com que ele pondere, arrisque, hesite, assegure-se e, enfim, declare sua crença. Dar uma resposta (sincera) exige um compromisso com a verdade da crença, o agente pode estar convicto e afirmar peremptoriamente, como no caso : "não importa o que pareça aos outros, seja lá como for na realidade [eu vejo assim]" ou receosamente, como no caso: "neste caso não me sentiria muito seguro para poder distinguir [vermelho de laranja avermelhado]", "não sei realmente dizer se é [vermelho] ou não." (AUSTIN, 1946, p.103). Em ambos os casos, quando a pergunta é dirigida à segurança do agente "envolve (é) dizer que é como outro ou outros que

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experimentamos anteriormente", isto é, lembranças de casos anteriores que permitem comparações com o caso presente. No entanto, memória e reconhecimento são "incertos e falíveis", o que, consequentemente, se torna arriscado declarar o conhecimento de algo através de lembranças, pois, em geral, são imprecisas e o erro é praticamente inevitável, o que faz com que o agente hesite antes de dar uma resposta definitiva. ( AUSTIN, 1946, p. 103).

Austin apresenta duas maneiras distintas de hesitação. O primeiro, é hesitar por nunca ter sido o caso de ter tido uma experiência semelhante anteriormente, por exemplo, degustar pela primeira vez o sabor da folha de louro [ter um primeiro contato com João estando zangado]. Nesse tipo de experiência, é feito um exercício mental onde se busca na memória, lembranças que sirvam para comparar eventos passados semelhantes ao atual e fazer possíveis conexões onde, gradativamente, surjam e se aprendam palavras melhor classifiquem aquele objeto, pensamento, sensação etc., isto ocorre em diferentes graus de sucesso. (AUSTIN, 1946, p. 104). O outro caso de hesitação se deve a “falta de nitidez”. Nem sempre a experiência atual proporciona, imediatamente, uma imagem clara que permita classificar "sem sombra de dúvida" o que é o caso. Por vezes faltam informações, faltam indícios, pode ocorrer um lapso de memória, o que decorre em classificações provisórias e hesitantes. Ocorrem também alguns casos que somente a reflexão e um exame mais acurado das informações não supre a hesitação [por não se conhecer bem], necessita-se de um “discernimento mais aguçado, pela discriminação sensorial” (AUSTIN, 1946, p.104), ou seja, deve haver a oportunidade de se ter experiências suficientes que permitam um melhor discernimento sobre x.

Em ambos os casos de hesitação, o que permite uma melhor acuidade ou segurança do agente é o grau de aproximação que o agente tem com a sua experiência, obviamente o número de experiências não é o que irá determinar de modo que elimine qualquer dúvida sobre aquele conhecimento, no entanto, permite ao agente ter mais credibilidade na sua crença.

Quase sempre, senão mesmo sempre, nós podemos estar muito ou consideravelmente certos se nos refugiarmos numa descrição suficientemente indeterminada da percepção: indeterminação e certeza tendem a variar inversamente (AUSTIN, 1946, p.105)

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Invariavelmente apresentará algum grau de indeterminação, para Austin, o erro dos filósofos, é tentar eliminar definitivamente os erros e buscar a total precisão, caso que, por exemplo, os cientistas acharam um modo equivalente de se relacionar com os fenômenos, substituindo o uso de "é real" ou "é irreal" por "é uma forma alotrópica" , "é desnaturalizado" (AUSTIN, 1946, p.105). Há outros casos onde podem ocorrer anomalias, milagres, ficção e essa é uma possibilidade que pode agir causando hesitação no agente como, por exemplo, miragens, ou algum caso extraordinário. Nesses casos cabe uma melhor averiguação e discernimento Austin exemplifica: “[…] sem primeiro me assegurar de que não é uma miragem, então arrisco meu pescoço, mas se eu tiver assegurado de que não é uma miragem e reconhecer com certeza (como bebo água) então certamente não estou mais arriscando me pescoço”. (AUSTIN, 1946, p.105)

Em casos de conhecer o pensamento ou sentimento de outras pessoas é sempre incerto se o modelo epistêmico que adotamos é conhecer os seus pensamentos da mesma maneira que ela própria os conhece. Como tem sido dito, há certo nível de privacidade nos pensamentos que é intransferível e, de certo modo, inacessível. Austin afirma que esse tipo de dúvida surge com o mal uso de expressões envolvendo a palavra conhecimento. Por exemplo, declarações do tipo “eu conheço seu sentimento a tal respeito”, “ele sabe o que tem em mente”, “posso saber o que lhe vem em mente?” (AUSTIN, 1946), para o filósofo, é um erro gramatical “colocar um objeto direto após “saber”, pois a palavra “que” é passível de ser entendido como um relativo, ou seja “aquilo (ou aquele) que”.(AUSTIN, 1946, p.106), sendo assim, conhecer o "que" está em mente, assume um sentido conotativo a expressão de "aquilo que está na mente", dando a impressão de que há um objeto que ocupa a mente. No entanto, Austin chama a atenção de que a palavra "que" nesses casos tem a função de um interrogativo, sendo assim “Conhecer o sentimento de outra pessoa ou o que se passa na cabeça dele não significa que há um x3 que ao mesmo tempo eu conheço e ele está sentindo. Mas, antes disso, eu

sei a resposta para questão: o que ele está sentindo?” (cf. AUSTIN, 1946, p.106). Portanto, não se trata de uma ontologia do conteúdo de x, mas sim, de uma tentativa de uma resposta satisfatória para x numa situação real de comunicação entre duas

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pessoas. Sobre esse ponto Austin acrescenta: “acreditar em uma pessoa, em autoridade e testemunho, parece ser antes uma parte essencial do ato de comunicação, que constantemente todos realizamos” (AUSTIN, 1946, p.118).

Por fim, com o deslocamento do conhecimento do âmbito metafísico para as práticas linguísticas, se dá por uma ênfase maior nas declarações do agente e seu

compromisso intencional em enunciar sentenças verdadeiras, do que com o exame

da realidade visando atingir um fundamento para o conhecimento, ou, o ponto de partida para que o conhecimento seja invulnerável ao erro. No âmbito do ato comunicativo declarações de conhecimento do tipo “eu sei que” assumem compromissos, do mesmo modo que uma promessa, quando uma pessoa promete a outra que, por exemplo, irá comparecer a reunião às 14h, autoriza a outra pessoa a se fiar nessa declaração e assumir responsabilidades relativas a promessa, dizer “eu sei que S é P” é por em risco a sua reputação e, além disso, “procurar mostrar, não meramente sua certeza a respeito, mas que este algo está ao alcance da sua cognição” (AUSTIN, 1946, p.109).

“Analogamente, dizer “eu sei” é dar um outro passo decisivo. Mas não é dizer: “eu consegui uma façanha de cognição especialmente notável, superior na mesma escala que a de acreditar e ter toda certeza. Assim como prometer não é algo superior, na mesma escala que a de esperar ou tencionar, até mesmo ao mero ter total intenção, pois não há nada nesta escala superior à total intenção. Quando eu digo “eu sei” dou

minha palavra aos outros: dou aos outros minha autorização para dizer que “S é P”.”.

(AUSTIN, 1946, p.108).

Do ponto de vista do agente que se comunica com outro, acreditar e aceitar as declarações de outra pessoa, como dito, é um traço do ato comunicativo. A respeito de “saber que S crê que P”, a questão volta ao ponto da familiaridade e da ocasião de ter tido contato com as respostas que S deu acerca de P, de modo que o agente se sente mais seguro em dar credibilidade as declarações de S. Esses são modos como um agente num ato comunicativo interage com seu interlocutor. No entanto, a base para fazer declarações de conhecimento dos próprios estados mentais, ainda parecem não serem as mesmas nos casos de conhecimento de estados mentais de outras pessoas. O próximo tópico tratará da assimetria dessas duas formas de conhecimento.

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1.1.3 Assimetria entre primeira e terceira pessoa

Até o momento foram apresentadas as problemáticas que envolvem o conhecimento de outras mentes, sobre a perspectiva de Austin. Como foi visto, para ele, por questões linguísticas, quando se pretende conhecer algo tentando estabelecer como o é na realidade, com total certeza e segurança, há um fundo metafísico exigindo critérios elevados para o conhecimento. No entanto, para situações de atos comunicativos os critérios tornam-se impeditivos para que possa ser formulada uma teoria do conhecimento, visto que as experiências humanas e as declarações sobre a realidade são imprecisas, embora as imprecisões sobre uma perspectiva de uma prática linguística pareçam não afetar tão drasticamente o conhecimento a ponto de negá-lo. Portanto, ao se dar ênfase a prática comunicativa as dúvidas metafísicas sobre outras mentes, ao menos em parte, são esclarecidas.

Nesta seção de acordo com o que foi visto da trajetória feita por Austin da tentativa de fundamentação do conhecimento sob preceitos metafísicos, até a filosofia da linguagem que aponta os casos de fundamentações que por tentar estabelecer o conhecimento como algo seguro e estável extrapola a linguagem para além do que ela pode ser usada, a saber, a linguagem não pode predizer o futuro. Neste sentido, se seguirá o percurso feito pela filosofia da linguagem, para isso, será utilizará o pensamento do filósofo Donald Davidson e o modo como ele pensa as práticas comunicativas junto ao desdobramento do problema das outras mentes. É sabido que para haver interlocução é necessário o mínimo de duas pessoas. Portanto, é o caso de apresentar a perspectiva tanto daquele que é objeto de ser conhecido, como a perspectiva do que se dispõe a conhecer. Em outras palavras, apresentar a perspectiva da primeira e da terceira pessoa. Nesse sentido, serão expostas as principais dificuldades entre os diferentes modos que um agente conhece os seus próprios estados psicológicos e o modo como conhece os estados psicológicos de outras pessoas.

Um agente epistêmico tem experiências empíricas que lhe permitem formar crenças sobre o mundo. Do mesmo modo, é esperado que outros seres humanos

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também possuam esta mesma capacidade. Essa é uma prática comum. Entretanto, caso se questione um agente epistêmico sobre o que ele pensa, os meios que ele terá para responder será imediata e não necessitará de apelo a evidências externa, pode-se dizer, inclusive, que em algumas circunstâncias o autoexame, através da introspecção, lhe confere acesso ao que pensa sem apelo ao que se passa fora de sua mente. Em contraste, caso se pergunte ao mesmo agente como conhece os pensamentos de outras pessoas ele não poderia dar nenhuma resposta se não pudesse notar o comportamento delas. Por esse motivo, “se os estados mentais de outros são conhecidos apenas através de suas manifestações comportamentais, e outras manifestações externas, enquanto isso não é verdade para nossos próprios estados mentais, por que devemos pensar que nossos estados mentais são algo como os dos outros?” (DAVIDSON, 1991, p.3). Portanto, para que haja sentido em significar estados mentais de outras pessoas como semelhantes aos casos de primeira pessoa, é necessário que exista um traço comum entre ambos, ou, no mínimo, algo que permita a interação entre essas duas perspectivas distintas da primeira e terceira pessoa.

1.2. O PROBLEMA DAS OUTRAS MENTES SEGUNDO DONALD DAVIDSON

O que um agente acredita a respeito do mundo permite-o dar respostas diferentes a depender da situação em que se encontra e também fazer asserções sobre aquilo no que ele crê. Desse modo, a crença assume um papel determinante para o conhecimento, pois a crença estabelece uma relação intrínseca com a crença, sendo uma condição para o conhecimento que se acredite em algo para que possa conhecê-lo. Portanto, ainda que , nos casos de primeira e terceira pessoa as formas de acesso ao conteúdo de estados mentais sejam distintas, e tenham que ser esclarecidas, ter uma crença, ou seja, acreditar em algo do mundo, e poder expressá-lo, é um passo para o ato comunicativo e um ponto a ser esclarecido. Davidson, nesta passagem, do seu artigo intitulado “Três Variedades do Conhecimento” (DAVIDSON, 1991), distingue o traço peculiar da crença que direcionará a investigação sobre a assimetria para um âmbito em comum:

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A crença é uma condição do conhecimento. Mas para ter uma crença não é suficiente discriminar entre aspectos do mundo, comportar-se de diferentes maneiras em diferentes circunstâncias; um caracol ou uma minhoca faz isto. Ter uma crença requer, a mais, a apreciação do contaste entre crenças verdadeiras e falsas, entre aparência e realidade, entre o mero parecer e o ser. [...] Alguém que tem uma crença sobre o mundo – ou qualquer outra coisa – deve apreender o conceito de verdade objetiva, do que é o caso independente do que ele ou ela pensa. Nós devemos perguntar, portanto, pela fonte do conceito de verdade. (DAVIDSON, 1991, p.5)

Em relação a um agente epistêmico ter uma crença, seja ela em primeira ou terceira pessoa, acreditar em algo, por si só, não garante a verdade dela. Por exemplo, um agente pode acreditar que está chovendo ao ouvir o barulho do ar-condicionado. Ao tratar de verdade objetiva o interesse é, justamente, sair da subjetividade do indivíduo e poder ter critérios que deem conteúdo as atitudes proposicionais sem que, ao menos em parte, elas dependam das crenças individuais. É de se presumir que a fonte do conceito de verdade seja externa ao agente epistêmico , esse é um ponto que será abordado no subcapítulo seguinte e discutido no tópico sobre externismo. No momento, coube apenas os devidos esclarecimentos feitos a respeito de se ter uma crença. Se seguirá com os problemas gerados pela assimetria entre o conhecimento de primeira e terceira pessoa.

1.2.1 O Problema da assimetria

O ponto da assimetria é o tipo de acesso aos estados mentais, no caso da perspectiva de primeira pessoa, tem caráter imediato e intransponível. No caso do acesso à outras mentes, o acesso é baseado em observações comportamentais. Segue-se, portanto, que a crença de um agente epistêmico não possui o mesmo conteúdo proposicional da crença de outra pessoa. Além disso, o conhecimento do mundo é relativo às experiências sensoriais individuais, portanto, um agente epistêmico, a princípio, nunca estará certo se a relação entre sua crença e os fatos do mundo é verdadeira.

A consequência dessas duas afirmativas são dois modos de ceticismo. O primeiro modo é o ceticismo a respeito de outras mentes, no qual se afirma que é impossível conhecer estados mentais de outros indivíduos. O segundo modo é o

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ceticismo a respeito do mundo externo, no qual se afirma que é impossível conhecer o mundo para além das representações individuais. Evidentemente, o segundo caso infere o primeiro, pois, uma vez impossível se conhecer o mundo constituído por outras pessoas, logo, não se pode conhecer outras pessoas.

No primeiro caso, pode-se chegar a conclusão de que “existem realmente dois tipos de conceitos: conceitos mentais que se aplicam aos outros, e conceitos mentais que se aplicam a nós mesmos”. (DAVIDSON,1991, p. 3). Por exemplo, “Manga” é uma palavra que pode ser usada de maneiras diferentes, uma referente a fruta e outra referente a uma parte da camisa. Em cada caso “critérios de emprego da palavra” são diferentes e se tratam, de fato, de dois objetos diferentes. Analogamente “ter dores” pode ser entendido como tendo significados diferentes, um quando usado nos casos de primeira pessoa, o que não necessita de recurso a evidência e o outro “quando usando como critério a evidência fornecida pelo comportamento (no caso da terceira pessoa: "ele tem dores")” (SMITH, 2005, p. 139) A assimetria implica em conceitos distintos para estados mentais e estados físicos. Essa diferença cria uma barreira entre crenças em primeira pessoa e crenças em terceira pessoa. Sendo assim , para a comunicação ser reestabelecida é preciso esclarecer essas diferentes formas de se referir ao mundo. Apenas mostrar que há duas formas de acesso distinto não “garante de que se trata de um único conceito; ao contrário, o natural é supor que são dois conceitos distintos”; como no caso da manga fruta e a manga parte da camisa, “o natural é supor que são dois conceitos distintos” os conceitos que se aplica em casos de primeira pessoa e nos casos em terceira pessoa. (SMITH, 2005, p. 139-140)

No caso da independência lógica entre a crença e o mundo externo, Davidson (DAVIDSON, 1991) aponta ainda outra dificuldade, se por um lado o agente epistêmico não tem garantias que suas crenças contém algum valor efetivo no mundo “nenhuma quantidade de conhecimento sobre o mundo externo implica a verdade sobre os trabalhos de uma mente. Se há uma barreira lógica ou epistêmica entre mente e natureza, ela não apenas nos impede de ver para fora, ela também bloqueia uma visão de fora para dentro” (DAVIDSON, 1991, p. 2-3). A consequência do caso apresentado é um ceticismo generalizado, ou ceticismo global, “a tese segundo qual todas nossas crenças são falsas” (SILVA FILHO, 2005, p.156).

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Para Davidson, tanto o ceticismo sobre outras mentes, como o ceticismo sobre o mundo externo, tem a mesma origem e “separar os problemas tem o efeito indesejado de obscurecer o fato de que os dois problemas se apoiam em uma mesma suposição”(DAVIDSON, 1991, p. 2), a suposição a qual Davidson se refere é da independência lógica entre crença e mundo, essa suposição é originada, segundo Smith, na dicotomia entre os eventos mentais e os eventos físicos:

As questões céticas parecem originar-se na imagem que se tem da relação entre a mente e o mundo. No caso da assimetria, nota-se que, enquanto o emprego de um conceito mental na primeira pessoa remete a uma sensação, portanto alguma coisa naturalmente apta a estar na mente, o emprego de um conceito mental na terceira pessoa remete a um comportamento, portanto alguma coisa corporal ou física. Tanto o problema cético das outras mentes como o da própria mente parecem ter origem na ideia de que os conceitos mentais são ambíguos ou têm duplo significado, um que se refere à mente, independentemente do que ocorre no corpo, e o outro ao corpo, independentemente do que ocorre na mente. Uma vez mais, vemos que a raiz última do ceticismo está ligada à distinção entre a mente e o copo, a essa imagem de que a mente está fora do mundo. (SMITH, 2005, p.140-141)

A consideração final trazida na citação acima, “essa imagem de que a mente está fora do mundo”, de fato, mostra como se torna difícil ou intratável as questões céticas sobre outras mentes e sobre o mundo externo. No caso da assimetria também se nota que os casos em primeira e em terceira pessoas, a mente parece ocupar um lugar fora da natureza ou um lugar em comum entre os homens e o mundo. Contudo, a definição de crença, brevemente esboçada anteriormente, seguia numa direção que sugeria uma intersecção entre as diferentes mentes e o mundo exterior. O próximo subcapítulo apresentará as respostas dadas por Davidson para a assimetria, as outras mentes e o problema mente-corpo. Este último ainda de maneira provisória, pois envolve mais conceitos e argumentos que somente serão apresentados nos capítulos posteriores.

1.2.2 Entre conhecimento em primeira e terceira pessoa.

Até o momento foram apresentados os problemas e dificuldades que envolvem conhecer outras mentes. O principal deles e que, consequentemente, gera os outros é o ceticismo global. Foi visto que ao se apoiar na suposição de que “as crenças são logicamente independentes dos eventos do mundo”, a mente é

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separada do mundo físico. Desse modo, qualquer tentativa de conhecimento se torna inapreensível e culmina no ceticismo. A assimetria entre autoconhecimento e o conhecimento de outras mentes, por estar inserida nesse contexto, precisa de uma resposta ao ceticismo global e ao lugar que a mente ocupa no mundo. Respondendo essas questões se tornará possível afirmar se esses tipos de conhecimento são viáveis e quais são suas características distintivas.

Este subcapítulo apresentará as respostas oferecidas por Donald Davidson para o problema das outras mentes e o da assimetria entre o conhecimento da própria mente e a das outras pessoas. No que diz respeito ao ceticismo global e ao lugar que a mente ocupa no mundo, se esboçará a direção em que ele irá tratar esses problemas, no entanto, por questões conceituais e argumentativas, serão desenvolvidos posteriormente.

1.2.3 O argumento contra as linguagens privadas

Para Davidson (DAVIDSON, 1991), ter uma crença requer mais do que responder a diferentes estímulos, a crença exerce um desempenho na vida psíquica que permite o agente epistêmico atribuir verdade e falsidade independente do que ele pensa. Nesse ponto, o agente epistêmico é capaz de refletir sobre seu próprio pensamento, esse é um exercício que exige um critério para que ele possa saber os casos quando usa as palavras de modo adequando e quando não as usa. No tópico sobre crenças, no subcapítulo anterior, foi falado sobre verdade objetiva, cabe agora retornar a esse ponto.

A respeito dos critérios de verdade, Davidson (DAVIDSON,1991) afirma que somente a comunicação pode fornecer um padrão de verificação objetiva da verdade, para isso, inicialmente ele recorre ao argumento contra as linguagens privadas elaborado por Wittgenstein (DAVIDSON, 1991). Neste argumento, é mostrado que qualquer tentativa de definição ostensiva privada é ininteligível, ou seja, não há o que possa ser significado, à exemplo de como se concentrar em determinado estado mental privado, através da introspecção, e apontá-lo como se faz com um objeto empírico. Para Wittgenstein, de acordo com Hacker (1992), é inviável, pois ao tentar significar privadamente estados internos não se faz o uso de

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regras que determinem o uso apropriado de palavras para esses estados.

O caráter público da linguagem é o elemento que determina o conjunto de regras para o uso das palavras, Hacker afirma que “a definição ostensiva privada é uma noção inteligível ou não em função de haver ou não análogos (mentais) privados dos elementos constitutivos da definição ostensiva pública”, por exemplo:

Apontar para um tomate e dizer “Isto é vermelho”, por si mesmo, não determina mais o uso da palavra “vermelho” do que apontar para a lua e bramir determina o uso para a ocasião de um bramido. “Vermelho” é uma palavra para cor. E a categoria gramatical de cor fixa um conjunto de várias regras. A gramática do definiendum não flui a partir do objeto apontado. Concentrar-se em uma dor de dente e dizer “Isto é dor” não determina aquilo que isto é. Ter-se-ia de pressupor a gramática da palavra “sensação”, mas esta é uma palavra em nossa linguagem pública e não é definida por definição ostensiva privada. (HACKER, 1992, p. 368-374)

O argumento contra a linguagem privada mostra a ininteligibilidade de teorias baseadas em experiências privadas tomadas isoladamente, portanto, perde sentido falar em formas de ceticismo que tratam as crenças como logicamente independentes do mundo. A ideia de uma crença onde seu conteúdo proposicional foi formada pelas experiências privadas, com as considerações de Wittgenstein, apresentadas por Hacker, desloca como a fonte de verificação de crenças verdadeiras, a instrospecção, ou a concentração em determinado estado interno, para Hacker, Wittgenstein:

[...]insiste na distinção entre dor e comportamento de dor, e ele não sustenta que o interno seja uma ficção, mas antes que uma certa imagem filosófica do interno é uma ficção gramatical. Seus argumentos não se baseiam em uma forma de verificacionismo para refutar a suposição da inteligibilidade da definição ostensiva privada; antes, ele meramente nos lembra de que, se falarmos em uma regra para o uso de uma palavra, então deve haver uma distinção operativa entre a aplicação correta e a incorreta da regra. Ele não argumentou que o único refúgio contra o ceticismo a respeito da linguagem jaz no consenso (público) da comunidade (e assim que a linguagem fosse essencialmente social), mas, antes, que a ideia de uma regra (por exemplo, de gramática) que pode a princípio ser entendida apenas por uma pessoa é ininteligível (HACKER, 1992, p. 368-374).

Pensando desse modo é preciso levar em consideração que um comportamento não é uma manifestação aleatória, ou automata de uma simples reação a um estímulo sensorial e sim, “A alegria, a dor ou o deleite não são

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acompanhantes de “movimentos corporais simples” — como se fossem ocultos por detrás do comportamento (ou seja, na mente). Não são ocultos, mas sim manifestos; não acompanham o comportamento (como o trovão acompanha o raio), mas sim o infundem; não estão por detrás do comportamento (como o movimento de um relógio está atrás de seu indicador), mas sim visíveis nele (HACKER, 1992).

Davidson (DAVIDSON, 1991) se apoiará, justamente, na ênfase dada ao caráter público da ação comunicativa para que possa haver pensamento. Para ele a comunicação será o que possibilitará a conexão direta entre as mentes e o mundo e, somente desse modo, é possível que se pense em termos como verdade de forma objetiva, ou seja, independente das crenças individuais de um agente:

O argumento central contra linguagens privadas é que, a menos que uma linguagem seja compartilhada, não existe maneira de distinguir entre usar a linguagem corretamente e usá-la incorretamente; apenas a comunicação com um outro pode fornecer uma verificação objetiva. Se apenas a comunicação pode fornecer uma verificação do uso correto das palavras, apenas a comunicação pode prover um padrão de objetividade em outros domínios, pelo menos de acordo com como eu argumento. Nós não temos razões para atribuir a uma criatura com a capacidade de fazer a distinção entre o que é pensado como sendo o caso e o que é o caso, a menos que a criatura tenha o padrão fornecido pela linguagem compartilhada; e sem essa distinção não há nada que possa ser claramente chamado de pensamento. (DAVIDSON, 1991, p. 5-6)

Desse modo, a comunicação será para Davidson o elo entre os agente, em um ato comunicativo e o mundo empírico, durante o processo comunicativo cada agente terá no outro os parâmetros para saber se está usando a linguagem correta ou incorretamente em relação ao ambiente em comum e aos objetos que eles estão se referindo.

1.2.4 A comunicação como resposta aos problemas das outras mentes e o da assimetria

Apresentado o papel da comunicação para o pensamento, observou-se que o problema das outras mentes e o da assimetria entre o conhecimento da própria mente e o da mente de outras pessoas ficam sobre o escrutínio da dependência de uma avaliação pública que é fornecida pela linguagem. Nestes termos, a linguagem permite uma verificação objetiva do mundo. Davidson, pensando em um contexto

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comunicativo (DAVIDSON, 1991), evoca a imagem de dois falantes potencialmente capazes de se expressar verbalmente, radicaliza-o o referido contexto para uma situação onde os agentes epistêmicos falam línguas diferentes. Fazendo isso, pensa em uma situação legítima de comunicação onde um agente (intérprete) atribui significado as frases do seu interlocutor e, além disso, atribui intencionalidade ao seu comportamento verbal. “Perguntando como um intérprete competente (um com recursos conceituais adequados e com uma linguagem própria) poderia compreender o falante de uma língua estrangeira. Nesse caso, recorrendo a uma situação radical de comunicação, o modo a relação entre os agentes epistêmicos fornem critérios para uma verificação objetiva, pode tomar um outro direcionamento, “Uma resposta a esta pergunta deveria revelar algumas configurações importantes da comunicação, e jogar luz indireta sobre o que torna possível uma primeira entrada na linguagem”. (DAVIDSON, 1991, p.6)

A interpretação radical lida com as condições de possibilidade para a comunicação interpessoal, conferindo verdade objetiva aos enunciados dos falantes, o esforço de uma pessoa para expressar suas crenças sobre o mundo tem, como critério de correção, a perspectiva da outra pessoa como seu parâmetro. O mundo, entretanto, é o causador das crenças, atuando,de modo geral, como regulador e permitindo respostas frequentemente semelhantes entre os agentes epistêmicos. Falar em objetividade, nesse sentido, é poder traçar uma linha comum entre as frases enunciadas por um sujeito e seu interlocutor, a respeito do mundo, “São precisos dois pontos de vista para dar uma localização à causa de um pensamento e, portanto, para definir seu conteúdo” (DAVIDSON, 1991, p. 9). O fato que vigora na comunicação, para Davidson, é a intencionalidade, portanto, para ambos os falantes e parte crucial no discurso é a operação ativa do agente epistêmico com sua crença. Logo, fazer asserções sobre o mundo é reconhecer a si próprio como quem acredita e tem a intenção de anunciar sua crença a audiência, Davidson expõe essa perspectiva como pode ser visto na citação abaixo, retirada do artigo Conhecer à

própria mente:

Se um falante quer ser compreendido, ele tem que querer que as suas palavras sejam interpretadas de uma certa maneira e tem, logo, que querer fornecer à sua audiência as pistas de que ela necessita para chegar à interpretação almejada. Isto é válido tanto no caso de o ouvinte dominar o uso de uma língua que o falante sabe

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como no caso de o ouvinte ser um aprendente de uma língua materna. É o requisito da aprendabilidade, da interpretabilidade, que fornece o fator social irredutível e que mostra porque é que uma pessoa não pode querer dizer seja o que for com palavras que não possam ser corretamente decifradas por outra. (DAVIDSON, 1987, p.11)

Está sendo levado em consideração os pontos de vista de dois agentes epistêmicos, ambos desempenham papéis essenciais no discurso e por detrás dos seus enunciados estão a intenção de declarar suas crenças. Para Davidson (1987;1991) É crucial o desempenho ativo, tanto em primeira como em terceira pessoa eles sobre a tensão das suas respostas, traçam um ponto em comum com os eventos da natureza. Por exemplo," O interprete vê o falante dizer "gavagai" e vê que ele olha para um coelho; o próprio interprete olha para onde ele olha e vê um coelho. Assim a série causa que leva o falante a dizer "gavagai" e a série causal que leva o intérprete a pensar em um coelho se cruzam num certo objeto no mundo" (SMITH, 2005, p.148).

Um agente estando sobre o exame das declarações que profere, uma vez conhecendo as regras da linguagem, se torna apto a reconhecer-se a si próprio como quem tem crenças. Esse é um ponto determinante no pensamento de Davidson, pois, como será visto, os critérios de correção de palavras e enunciados, em geral, pressupõem a perspectiva da terceira pessoa para que, como parte das manifestações externas, possam se estabelecer as regras de uso comum e apropriados de uma língua. No entanto, Davidson, com o quadro intersubjetivo que está traçando, considera que um agente é capaz de acessar seus próprios pensamentos e, parte desse pressuposto, fornecerá as condições para que a comunicação se torne possível:

Com respeito a nossos próprios pensamentos, a diferença não é maior do que entre dizer assertivamente “a neve é branca” e dizer assertivamente “eu creio que a neve é branca” [..] Isto se dá porque qualquer um que compreende o discurso pode reconhecer asserções, e sabe que alguém que faz uma asserção representa a si mesmo como acreditando no que está dizendo. (DAVIDSON, 1991, p.6)

Nesse caso, fica claro que a condição de verdade para que uma pessoa enuncie que “a neve é branca” é sua crença de que “a neve é branca”, mesmo que o

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agente não represente o mundo precisamente, tal como ele é. Pode ocorrer equívocos, no entanto, as crenças individuais estão sobre o critério de uma avaliação pública, sendo assim, podem ser corrigidas. Com a crença no âmbito público ela volta a circundar a uma realidade em comum entre os agentes epistêmicos, o que permite uma resposta ao problema das outras mentes e ao da assimetria.

1.2.5 As consequências geradas pelo argumento da linguagem privada

O problema das outras mentes, enquanto o lugar que ocupava, numa realidade paralela a do agente epistêmico, desloca-se para o contexto sociolinguístico com o argumento contra as linguagens privadas. No caso do comportamento alheio se prestar como evidência para se atribuir crenças, o argumento da linguagem privada faz com que declarações de estados internos desocupe a perspectiva individualista e ocupe um lugar público, porque, neste âmbito em comum é possível haver usos claros de regras para as palavras. Davidson concorda com esse ponto de vista, no entanto, de acordo com o seu pensamento, imputando a crença para um âmbito exclusivamente público, em termos de significado das palavras e experiências internas, o agente epistêmico, em alguns casos, pode estar totalmente alheio sobre aquilo o que ele acredita e pensa num sentido interno. Se esse for o caso, se geraria um outro tipo de ceticismo, o ceticismo sobre o autoconhecimento.

Entretanto, o quadro esboçado a respeito da intersubjetividade, ainda que precise ser mais amplamente desenvolvido, responde o ceticismo sobre outras mentes e a assimetria entre conhecer a própria mente e as mentes alheias. As outras mentes, deslocam-se de um quadro metafísico para um quadro de uma ação comunicativa e assumem o papel de interlocutoras. Por suas crenças não poderem ser privadas, devido ao conteúdo delas dependerem da ostensividade pública, a mente de outros ocupa um âmbito em comum com a natureza e outros seres humanos. Na assimetria, para Davidson (1987;1991), o agente epistêmico tem autoridade sobre seus próprios pensamentos, no entanto, existem teses externistas que dizem ao contrário (Burge, 1979; Putnam, 1975). Sendo assim, enquanto os

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pontos de vista da primeira e terceira pessoa pertencem ao âmbito da comunicação a assimetria é dissolvida, por outro lado, é preciso esclarecer se o agente tem autoridade sobre seus próprios pensamentos ou não. Foi visto que o lugar ocupado pela mente na realidade e o ceticismo global fazem sentido sobre uma perspectiva subjetivista, entretanto, as teses externistas outorgam ao mundo o papel de causar as crenças nos agentes, mas o momento permitiu apenas um esboço.

O próximo capítulo intitulado A Autoridade da Primeira Pessoa, irá continuar a discussão sobre o lugar que declarações na primeira pessoa têm de relevante para o contexto comunicativo. Dentro disso, primeiramente, se tem como objetivo apresentar o papel que o agente em primeira pessoa tinha para a tradição. Em segundo lugar, expor as consequências negativas que a autoridade de primeira pessoa sofre com algumas teorias externistas e, por fim, mostrar as defesas que Davidson faz sobre a autoridade de primeira pessoa e a relevância dela para o seu sistema e para a epistemologia.

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CAPÍTULO 2

A AUTORIDADE DE PRIMEIRA PESSOA

2.1 O QUE SIGNIFICA A AUTORIDADE DE PRIMEIRA PESSOA

O capítulo anterior tratou das questões epistemológicas e metafísicas que envolvem as outras mentes. Decorrente disso, foi visto que tentar fundamentar uma teoria do conhecimento onde tenta assumir as crenças de um agente epistêmico sobre experiências privadas e internas, torna essas crenças inapreensíveis. Através do argumento das linguagens privadas mostra-se que somente a ostensividade pública fornece os critérios necessários para que as palavras, dentre elas as que são relativas a estados sensoriais individuais, adquiram uso nas práticas comunicativas. Portanto, a comunicação é determinante para o pensamento. A impossibilidade de conhecer outras mentes sobre alegações de que não temos maneiras efetivas de acessar o mundo, sem ser por nossos órgãos sensoriais, e por outras mentes pertencerem ao mundo externo a mente, também é contestada, uma vez que a natureza permite, durante uma situação comunicativa, sustentar as respostas dos falantes constantemente como semelhante. O erro apesar de inevitável não se apresenta como impeditivo para o conhecimento, uma vez que as respostas podem ser revistas e verificadas objetivamente sobre o escrutínio público.

Entretanto, para Davidson (DAVIDSON, 1987), o argumento da linguagem privada apesar de direcionar a crença para um âmbito público, em certa medida, faz com que o agente epistêmico seja alheio acerca de seus próprios pensamentos. Pois, ainda que não se possa atribuir conteúdo a crenças tomadas a um indivíduo isoladamente, não pode ser descartada a característica da subjetividade de que “Pensamentos são privados, no sentido óbvio, mas importante no que a propriedade de poder ser privado, ou seja, pertencem a uma pessoa” (DAVIDSON, 1988, p.52). Essa característica dos pensamentos de uma pessoa pertencerem a ela, é chamada de autoridade de primeira pessoa e é o centro da discussão desse capítulo.

É importante destacar que com a crença assumindo o âmbito público, surgiram teorias chamadas externistas. Essas teorias afirmam que o conteúdo dos

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enunciados de um agente epistêmico estão, ao menos em parte, no mundo externo. Essa é uma resposta a um certo modelo de mental que assumia as experiências privadas como fonte de evidência para o conhecimento do mundo.

Apresentado o quadro da problemática, esse capítulo tem como objetivo principal apresentar o papel da autoridade da primeira pessoa para Davidson. Isso se mostra relevante, pois se a pretensão é discutir a possibilidade de conhecer outras mentes e o papel do interlocutor para a comunicação, é razoável pensar que um agente epistêmico deve, ao menos parcialmente, saber aquilo o que pensa. Para isso, se fará, inicialmente uma apresentação do quadro de como a mente era concebida na concepção individualística. Após, serão apresentadas as críticas externistas para esse modelo de mental. Como foi dito anteriormente, o externismo apresentará, para Davidson, algumas dificuldades que dizem respeito a autoridade de primeira pessoa - serão apresentados quais são esses problemas. Por fim, se mostrará o externismo aos moldes de Davidson e o papel da autoridade da primeira pessoa para seu pensamento.

2.1.1 A Visão individualística clássica

No capítulo anterior foi visto que a crença, tomada como uma experiência mental privada, não tem critérios para que seja publicamente anunciável a uma audiência. O argumento contra as linguagens privadas além de mostrar a impossibilidade de uma teoria baseada nesses parâmetros, o alcance do argumento, como apresenta Hacker, no artigo “O argumento da linguagem privada” (1992), remonta uma grande parte da tradição filosófica. De acordo com o filósofo a linguagem privada não é uma espécie de “código privado” que de alguma pode ser traduzido ou decifrado por outras pessoas, antes disso, é uma linguagem onde as “palavras individuais” e seu conteúdo e significado dependem das “sensações imediatas” que somente o falante tem acesso através da sua experiência privada “ou, para usar o jargão empirista, às “ideias” de sua mente”. (HACKER, 1992, p.368-374)

A extensão desse argumento, reflete sobre uma concepção comumente difundida no período moderno, “[…] seja empirista, racionalista ou kantiana —, do

Referências

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