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PELA INVENTIVIDADE NA INICIAÇÃO CIENTÍFICA: O GRUPO DE ESTUDO EM PSICOLOGIA HOSPITALAR GEPH

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AN AI S do II En contros Ac adê mi cos d a F ac uldad e Luc iano Feijão. S obra l-C E, nove mbro de 2017.

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SAMARA VASCONCELOS ALVES1

ROSIMARY FERREIRA DAMASCENO2

ADRIANA BRANDÃO DE PAULO3

Resumo: O presente trabalho tem o intuito de apresentar uma experiência de iniciação a pesquisa em um Grupo de

Estudos em Psicologia Hospitalar, oportunizado pelo PROIC da FLF, demarcando reflexões sobre a formação e o exercício da psicologia. Partimos de um lugar que ultrapassa as fronteiras da mera comunicação de artefatos conceituais, que aposta num lugar de responsabilidade. A metodologia utilizada nos encontros foi a associação livre de ideias, a partir dos textos escolhidos. Percebemos que para aprender algo da psicologia hospitalar é preciso colocar algo de si a cada texto lido, a cada desencontro com o estranho.

Palavras-chave: Ensino. Psicologia Hospitalar. Grupo de Estudos.

INTRODUÇÃO

No esforço de acompanhar a subjetividade de sua época, percebemos um crescente aumento de psicólogos construindo sua atuação em diversos espaços, principalmente em instituições de saúde, as quais recebem cada vez mais a exigência de responder aos mal-estares dos sujeitos e ofertar aquilo que o paciente se queixa ou demanda.

Nas instituições hospitalares, campo minado da tradição anátomo-fisiológica, que insiste em separar o corpo (soma) da mente (psíquico) e dos infindáveis desdobramentos cartesianos instaurados pelo discurso tecnológico, constatamos um movimento paradoxal: aparelhos tecnológicos cada vez mais especializados para aplacar as dores dos sujeitos e o aparecimento de impasses que fazem vacilar a ciência médica.

De acordo com Foucault (2008), a medicina moderna, criticando seu passado e para justificar sua originalidade, busca uma validação empírica se tornando científica através da anatomia patológica. Ao localizar na espessura do corpo a patologia, cuja investigação e

1 Docente do Curso de Psicologia da Faculdade Luciano Feijão (FLF). Professor-coordenador do Grupo de Estudos em

Psicologia Hospitalar – GEPH. E-mail: alves.sv@gmail.com

2 Discente do Curso de Psicologia da Faculdade Luciano Feijão (FLF), 6º semestre, membro do Grupo de Estudos em

Psicologia Hospitalar – GEPH. E-mail: rosimary-fd@hotmail.com

3 Psicóloga, graduada pela Faculdade Luciano Feijão (FLF), membro do Grupo de Estudos em Psicologia Hospitalar –

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observação poderiam justificar a veracidade da mesma, a medicina produziu novos dispositivos de verdades e passou a funcionar a partir dos pressupostos científicos.

Nessa empreitada de localização da doença no corpo, a medicina científica passa a considerar como verdadeiro tudo que os exames de imagem, o olhar, e a tecnologia revelam de forma clara e distinta. Ocupada em estabelecer relações de causalidade entre os sintomas e a doença para fornecer a cura, a ciência médica ao considerar o corpo como objeto ignora a existência de um sujeito doente e a palavra do paciente é tomada como algo sem valor.

É nesse campo do olhar que o sujeito é percebido pela ciência médica. Seguindo a uma lógica de dominação dos corpos e o princípio hipocrático da beneficência bonumfacere e da não maleficência primum non nocere é que a dimensão do sujeito é excluída do discurso anátomo-fisiológico.

Ao privilegiar a razão, a medicina se vê impossibilitada de prosseguir diante de pacientes que, por exemplo, sentem dores mesmo já tendo tomado inúmeras doses de remédio, passando a considerar o que foge a razão como “piti”, causando assim desordem na cena médica.

As primeiras inscrições de trabalho do psicólogo no espaço hospitalar são entrelaçadas ao saber médico, em meados do século XIX (CHIATTONE & SEBASTIANI, 1998). No Brasil, em 1954, Matilde Neder deu os primeiros passos na Clínica Ortopédica e Traumatológica da Universidade de São Paulo, atendendo pacientes cirúrgicos.

Assim, por lei ou por iniciativa própria de alguns profissionais, a Psicologia estava no hospital e expandia-se em outros estados do Brasil e delimitava que não existia uma prática de Psicologia Hospitalar, mas sim uma especificidade da Psicologia Clínica em hospital. (LAZZARETTI et al, 2007, p.24)

E o que a psicologia pode oferecer ali? Como podemos transformar o sofrimento em trabalho, as perdas e tantas dores em criação, a tristeza em sabedoria, a morte em vida? Como possibilitar políticas públicas de saúde feita “para todos” um lugar para um sujeito?

Desde a década de 60 o trabalho do psicólogo hospitalar vem sendo marcado por inúmeros desafios. Trama que nos convoca a um posicionamento e a interrogar essa atuação, nos conduzindo a situações que exigem reflexão, ação, ética, formalização teórica e constante debate sobre o lugar do psicólogo na equipe de saúde.

No campo da formação universitária, a Psicologia Hospitalar enquanto disciplina não obrigatoriamente integra o quadro das disciplinas obrigatórias. Já no curso de Psicologia da

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Faculdade Luciano Feijão – FLF, a disciplina é exigida para a formação de psicólogo e pré-requisito para cursar o Estágio Supervisionado em Psicologia Hospitalar.

É preciso destacar que a grande procura por esse estágio reverberou uma questão que nos instigou a ser pensada e falada com frequência, e que interessou a nossa investigação, diz respeito ao modo que os estudantes escolhiam realizar esse estágio e não outros: uma lógica discursiva médica emaranhada de ideais de cura, ou à deriva, sem implicações com os estudos teóricos, gerando impasses na entrada e na inserção no hospital.

Destacamos a importância de uma atuação que se faz consistente na sustentação com a teoria, especialmente pelo fato do exercício da psicologia no hospital produzir efeitos para a rede de relações, a saber, família-equipe-paciente.

Essa não é uma tarefa fácil. Para sustentação desse saber é sine qua non debruçar no campo da psicologia clínica hospitalar, desde seu surgimento até os seus efeitos, com investimento e aposta nos estudos teóricos, para construir um solo consistente e fundamentar uma práxis.

Assim, um trabalho se fez urgente: tornar público o conhecimento na contramão da égide do “tudo saber”, apostando assim no desejo de saber e demarcando, inspiradas pelo ensino freudiano, um lugar para não saber. Isso foi possível pelo viés de um Grupo de Estudos em Psicologia Hospitalar –, gestado e nascido pelo interesse e desejo de uma professora do curso e estudantes.

O GEPH foi promovido pelo Programa de Iniciação Científica – PROIC da FLF, com período de vigência de um ano, de março de 2017 a março de 2018, buscando traçar linhas de interlocução entre temas da Psicologia, Clínica, Saúde e os discursos enlaçados no hospital, através da revisitação a textos referências do campo, além de publicações atuais de autores que versam sobre o assunto.

Desse modo, as motivações singulares faziam cada um se debruçar sobre as temáticas de modo diferente, o movimento do grupo dependeu muito mais das relações estabelecidas entre estudante-conteúdo/ estudante-estudante/ estudante-coordenador, do que de um plano teórico a ser seguido. Portanto, o movimento novo e singular dos participantes frente ao mergulho que estavam praticando na área foi à mola propulsora para o fortalecimento do grupo, de um grupo vivo.

Destarte, este trabalho de escrita pretende relatar e discutir a experiência do referido grupo de estudo, demarcando reflexões sobre a formação e o exercício da psicologia hospitalar

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no ensino universitário, tendo como lente a impressões do docente coordenador do grupo e dos discentes.

Para tanto, discorreremos sobre várias temáticas tomando como base textos de autores referência, mas também surgiram conteúdos para além da teoria. O próprio interesse em participar do grupo já se diz de algo o que é muito mais do que cumprimentos de horas acadêmicas, diz também daquilo que se constitui em cada sujeito ao percorrer determinados caminhos dentro de um contexto acadêmico.

Os registros sistemáticos desses movimentos foram feitos no Diário de Campo, seguindo as perspectivas de Lourau (2004) que aponta seu uso para análise das implicações de três formas: para dar visibilidade a movimentos no campo de estudo, entrelaçando os registros com uma análise teórica; um sentido como levantamento e agrupamento de dados observados ou/e a observar; e o diário no campo das significações do pesquisador, seus afetamentos e percepções subjetivas.

As discussões que seguem giram em torno da metodologia usada para compor os encontros semanais, das experiências entre os membros do grupo com a teoria e, por fim, a construção de um saber sobre a responsabilidade da psicologia hospitalar.

Esse dito, escrito e falado, sobre as vicissitudes da nossa experiência é, para nós, uma maneira de publicizar nosso trabalho como também deixarmos de ser um pouco estranhos a nós mesmo.

“PÔR ALGO DE SI”: INVENÇÃO NA DÍADE ALUNO-PROFESSOR

Muito se tem questionado sobre a relação aluno-professor em sala de aula, nas disciplinas da grade curricular dos cursos de graduação. O modus operandi do espaço universitário, pautado no ensino do conteúdo e nas avaliações, deve proporcionar ao aluno assimilação do conhecimento que deve ser repetido e comprovado nas provas. Dito de outro modo: é preciso ensinar o aluno, se possível com metodologias ativas para facilitar a compreensão, porque eles não sabem.

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Partimos de um lugar que, apesar de estar dentro da universidade e submetido pelo discurso científico4, ultrapassa as fronteiras da mera comunicação de artefatos conceituais, que

aposta num lugar de palavra, de certo endereçamento e, sobretudo, de uma responsabilidade a respeito da sua formação. Como nos fala Estamira5, “vocês não aprendem na escola, vocês

copiam. Vocês aprendem com as ocorrências”.

O PROIC tem como intenção incentivar novos talentos potenciais entre estudantes e proporcionar e estimular o desenvolvimento do pensamento científico e da criatividade. No PROIC não há provas. O programa oferece uma certificação correspondente 60 horas, aqueles que cumprem as atividades do grupo, necessária para a tal habilitação profissional. É certo que, estamos emaranhados das exigências universitária, mas como ir além da premissa atual da universidade, “publico, logo existo”? Como superar a transmissão da lógica de saber?

Acreditamos com Lacan (1998, p.11), quando está às voltas com o ensino da psicanálise, que a possibilidade de circunscrever o ensino se dá pela expressão que cunhou em seus Escritos: “colocar algo de si”. Algo que só é possível com alguma presença do sujeito do inconsciente.

Sem a pretensão de indicar as minúcias de um ensino tão vasto, faz-se importante demarcar que em A Descoberta do inconsciente: do desejo ao sintoma Quinet (2000) demarca as diferenças entre sujeito cartesiano, senhor da razão, e o sujeito do inconsciente em dois pontos: de uma coisa pensante e unificada, a um sujeito que não tem substância, que surge de um nada e é estruturalmente dividido em relação a castração, que ele nega e ao mesmo tempo reconhece. Ora, é a partir de Freud que a lógica que equaciona o sujeito refere-se a uma divisão: do que eu sei e do que eu não sei. Essa divisão está na própria materialidade do que fundamenta o sujeito: a falta. Trata-se, portanto, de um saber incompleto, mais que isso: um sujeito vazio, estruturado como um falta-a-ser, falta constitutiva do desejo de reencontrar o objeto primordialmente perdido que jamais encontrará. Em O mal-estar na civilização (1930) Freud lançou o sujeito na condição de desamparo, afirmando que o sujeito se inscreve pela falta e por ela é estruturado, verdade do sujeito que é banida pela onipotência do discurso científico.

Deslizando para o meio acadêmico, podemos dizer que a universidade carrega o mantra de “tudo aprender e nada perder”. Cabe aqui uma consideração: não pretendemos abarcar toda a

4 Discurso que surge a partir de um corte discursivo entre mente e corpo operado por Descartes na episteme e que

opera como detentor do saber.

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psicologia hospitalar, abordando todos os temas. Afinal não se trata de um professor detentor de todo o saber, um professor ideal, um mestre. Muito menos de um professor que distribuí e outro que recebe conhecimento, de um professor que tem como limite a responsabilidade trazer a verdade das coisas, tarefa impossível.

Escars (2006) nos lembra que “não bastam as – boas – intenções do emissor”, já que o fundamental é a posição de quem se “apropria”. Em busca da escolha advertida, marcada pelo desejo, propomos a entrada no grupo através de uma carta de intenção e um momento de escuta, a fim de sublinhar algo da curiosidade pelo que não se sabe e assim deseja saber para além do acúmulo de técnicas e conceitos.

Partimos de uma atividade que possa produzir uma inventividade na parceria aluno-professor, na assertiva de que o saber é sempre incompleto, arriscando assim a perder certas noções e ideais. Acreditamos assim que com essa indisciplina do professor, o aluno possa aparecer não como um carente de saber, mas de invocar a responsabilidade dos que estão em jogo.

GEPH: PRA QUÊ TE QUERO?

No GEPH o saber é singular, nossa responsabilidade ultrapassa as fronteiras da depositação e acúmulo de saber. A questão que nos atravessa é como a psicologia hospitalar afeta cada membro, pela via da associação livre6 das ideias suscitadas nas leituras dos textos.

A metodologia utilizada, como já explicitado anteriormente, não há um mestre que tudo sabe, possibilitando a cada participante do grupo mobilizar seu desejo em direção ao conhecimento.

Nos primeiros encontros discutimos os aspectos históricos, conceituais e teóricos do nascimento do hospital e da Psicologia Hospitalar, numa revisitação contínua da história, na fronteira entre o passado e o presente, abrindo a janela para o futuro.

Nas discussões, cada membro tem a oportunidade de comentar os afetamentos7 com os

textos. As discussões seguiram de acordo com as interrogações surgidas no decorrer dos encontros, sendo acordada a temática do próximo estudo e o texto base a ser lido previamente.

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AN AI S do II En contros Ac adê mi cos d a F ac uldad e Luc iano Feijão. S obra l-C E, nove mbro de 2017.

As exposições dialogadas versaram sobre a Morte, Luto, Cuidados Paliativos, a entrada, inserção e as condições de impossibilidades do psicólogo no hospital, a experiência da clínica com Bebes, o fazer da Psicologia nas diversas especialidades médicas e os discursos produzidos na contemporaneidade. Nosso cronograma foi flexível, fazendo idas e vindas em textos já discutidos.

Saber algo mais sobre a responsabilidade nesse cenário foi à aposta dos nossos encontros, por maiores que sejam as dificuldades que se impõe a cada dia e que nos lança o desafio ético de interrogar “Qual a responsabilidade da Psicologia no cenário hospitalar? ”

Aliados aos textos-referências, refletimos sobre essa responsabilidade a partir de discussões de casos clínicos por meio das experiências dos alunos que cursam a disciplina de estágio supervisionado em Psicologia Hospitalar. Ademais, estudamos-analisamos criticamente materiais atuais produzidos em revistas de grande circulação, fotografias, poesias e crônicas.

Nesse compasso da arte, realizamos a leitura do livro Crônicas na UTI, o qual retrata emocionantes histórias narradas por Elias Knobel, médico cardiologistas e chefe-fundador do Centro de Terapia Intensiva do Hospital Israelita Albert Einstein, possibilitando os estudantes relatarem suas angústias e descontruírem ideais sobre a vida e a morte pela via do humor. Assistimos também ao filme “O Solitário Anônimo” produzido em 2007 como desencadeador dessas reflexões, principalmente no que tange à incidência do poder sobre a vida retratada na arenosa relação entre pacientes e profissionais na cena hospitalar quando se dispõe a cuidar e tratar. Apostamos assim, que o tratamento e cuidado no espaço hospitalar atravessam a barreira da correção e da cura, dando assim lugar para a subjetividade.

Além disso, foram realizadas visitas ao hospital, para reconhecimento da realidade hospitalar e participação dos alunos nas sessões clinicas. Nesse momento, os alunos visitaram os diversos setores do hospital, testemunharam atendimentos e discussões de casos clínicos.

Em pauta discursiva estava o trabalho enquanto clínica realizado pelo profissional psicólogo, espaço onde sua escuta é emprestada ao sujeito, pois não se trata de qualquer coisa, de uma conduta mediadora de conflitos, escuta compreensiva, ou uma “terapia do convencimento”, tampouco trabalha a serviço do discurso médico. Segundo Moretto (2002), trata-se de um lugar

7 Palavra aqui utilizada para nos referirmos ao movimento, do latim “afettare”, ir atrás.

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que se mostra pela presença, ao se ofertar como suposto saber, e pela ausência, ao se prestar como objeto causa de desejo, sendo, portanto, vazio, não sabido.

No decorrer dos encontros surgiram dúvidas, medos e incertezas, transformando-se em peças fundamentais para o desenrolar da ciranda em que ambos os participantes estavam envolvidos. Vale destacar, ainda, o esforço empreendido ao favorecer com que o acadêmico de psicologia se posicione frente a temáticas como a morte e a atuação em contextos hospitalares.

Trabalhamos, portanto, com a leitura dialogada tanto de textos clássicos de Angerami-Camon (1994), Moretto (2006), Kluber-Ross (1981-2008) e com autores que possibilitem a interlocução de um trabalho multidisciplinar. Com temas que versavam sobre o cotidiano dos profissionais de saúde em um hospital de ensino. Os textos proporcionaram além de análises críticas, diálogos mais consistentes e éticos frente os temas abordados nos encontros. Buscou-se refletir sobre o fazer da Psicologia nos dispositivos hospitalares.

O espaço era livre e pudemos discorrer sobre várias esferas do conhecimento, expondo experiências, dúvidas, anseios oriundos de nossas experiências. Os textos eram lidos por um facilitador – coordenador ou discente – e eram acompanhados pelos outros, sendo pausados para momentos de reflexão e compreensão daquilo posto ao grupo. Caminhávamos juntos!

Os textos funcionavam como passagens para a experimentação, ler e discutir era a porta de entrada para o desconhecido, o hospital tornou-se campo de apreciação, no qual uma parcela dos participantes, não tinham grandes contatos com a Psicologia Hospitalar, em vista que a disciplina é ofertada apenas no 7º semestre.

Faz-se importante pontuar aqui algo que nos foi primordial: o incentivo à pesquisa. Segundo Alberti (2010, p.119) não são poucas as advertências de Freud quanto ao “perigo de subordinarmos a clínica à pesquisa, a partir de propósitos científicos que poderiam criar expectativas de controle da experiência clínica. Na realidade, se tratamento e investigação coincidem, como propõe Freud, então a relação é exatamente inversa: a pesquisa é subordinada à clínica”.

Ademais, é valido fazer presente a reflexão da importância de romper com o mito do progresso, com a obrigatoriedade de se produzir uma escrita dita inovadora, já que o passado é significativo e norteador para a construção da contemporaneidade. Diante que a escrita está diretamente articulada com o desejo do estudante, por essa razão o desejo é concentrado em diversos espaços, inovadores ou não.

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Podemos afirmar que diante dos textos lidos e discutidos, há um enriquecimento de nossos conhecimentos sobre a atuação do psicólogo hospitalar no campo discutido. Entretanto, é pertinente desconstruir a ideia do saber por excelência, dando importância para o desaprender, abrindo espaço para que se possa criar reflexões sobre os processos acumulativos de conhecimento, tornando o sujeito um sugador de ideias, uma esponja grandiosa que só absorve e acumula conteúdo, fugindo do modelo mercantilista:

[...] Cada vez mais, são adotados instrumentos de gestão, com definições de padrões e modelos de avaliação, orientados pela razão do aluno-consumidor de acordo com a qual o professor passa a ser pautado pelo que dizem especialistas. Sob a pressão da lógica empresarial, que visa à maximização do lucro, assistimos a prevalência do ensino-mercadoria balizado por critérios de mercado. (CASTRO, 2006, p.133).

Os frutos do que produzimos pela escrita, foram resultados do livre desejo dos participantes em aventura sobre aquilo que era motivo de inquietude, ressentimento, prazeres e dúvidas. É pertinente ressaltar que foram apresentados trabalhos em encontros de saúde pública e jornadas multidisciplinares, tendo um dos trabalhos recebido menções honrosas.

Abrindo espaço para o “sem sentido” e o indizível: invenções da Psicologia a partir de um relato de experiência nas enfermarias de hospital de ensino sobralense.

A importância de oferecer o apoio para pacientes e acompanhantes durante a intervenção em uma enfermaria: relato de experiência.

As interfaces entre a família a equipe e o paciente em tratamento hemodialítico: o (não) lugar da psicologia. 8

Entre intercorrência uma mulher: uma experiência de estágio supervisionado em Psicologia. A Psicologia e o Hospital: os desafios do setting terapêutico de uma enfermaria em um hospital no interior do Ceará.

Uma experiência de iniciação à pesquisa e a formação de profissionais responsáveis em seu fazer: o Grupo de Estudos em Psicologia Hospitalar.

A morte como ofício: breves constatações nos corredores de um hospital.

O emergir de questões subjetivas do paciente com câncer: um relato de experiência sobre estratégias de enfrentamento.

(Fonte: tabela construída pelos autores

8 Menção Honrosa na XVII Jornada da Enfermagem da SCMS II Jornada Multiprofissional, Hospital Santa Casa de

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Tendo retomado esses caminhos da nossa experiência nos propomos a refletir sobre o que desconstruímos e seguimos apostando no âmbito da psicologia hospitalar e sua responsabilidade num lugar que lida com o não querer saber da verdade do desejo: o hospital.

CONSIDERAÇÕES SOBRE PSICOLOGIA HOSPITALAR: O QUE DES-CONSTRUÍMOS?

O hospital é um lugar marcado pelo predomínio de avanços tecnológicos e pela ordem médica que tenta responder a toda e qualquer falha no organismo. Mas como nos diz Freud e seus pacientes, algo do sofrimento do sujeito escapa as possibilidades das mais sofisticadas terapêuticas, fazendo vacilar as certezas médicas em meio a tantos aparelhos que, paradoxalmente, possibilitam o conhecimento do corpo biológico em profundidade e um “furo” no saber médico9. É esse furo que possibilita a inserção de um saber exterior ao campo da

medicina, o saber do campo psi na instituição hospitalar. A indagação que nos inquieta agora é qual o nosso lugar frente à cena médica que toma o corpo como resistência, e o sujeito como um mero objeto, excluindo-o de sua terapêutica? Moretto (2002) nos ensina que esse é um lugar que precisa ser construído de modo a que possamos operar. Pensamos, portanto, a inserção como um processo de construção desse lugar.

A atuação da psicologia nesse espaço se apresentou como construção junto à equipe multiprofissional de modo a proporcionar o reconhecimento das suas práxis em meio a vários saberes. Não se trata de transpor uma prática clínica exercida sob os moldes do setting clássico para outros espaços, mas de construir um lugar em que o psicólogo exerça sua função frente ao sujeito e a instituição.

Ora, é sabido que a prática clínica no hospital implica um lugar a ser construído para que o saber possa operar. Partindo desse mote, inspiradas por Moretto (Ibid.), sustentamos que esse processo de construção está relacionado com o modo pelo qual o psicólogo responde ao que lhe é demandado. Não se trata apenas de um cargo a ser ocupado, de um contrato a ser assinado.

Apostamos que esse lugar na equipe de saúde é, portanto, um lugar fruto do seu ato, e só pode ser sustentado pela via do desejo. Mas como sustentar esse lugar? Destacamos a

9 O uso desta expressão não está relacionado a um saber do médico, é da ordem de um discurso de mestria, discurso

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importância da formação acadêmica, com ênfase nos estudos teóricos para a sustentação desse lugar de suposto saber.

Desse modo, salientamos o particular de cada caso na instituição para que o trabalho do psicólogo caminhe não no sentido de adaptar os indivíduos à situação de adoecimento, mas, a partir dela, trabalhar com a lógica da transformação do sujeito em sua singularidade radical. E do lugar de não saber, saber não todo, continuamos nos inquietando, nos estranhando com esse campo para poder construir esse lugar vazio, que por faltoso, não ocupa espaço, mas abre espaço para a palavra circular.

MOMENTO DE CONCLUIR...

Com o percurso realizado, é chegado o momento de concluir. O GEPH nos proporcionou trocas de saberes, muito além da troca de saber com os autores, através das leituras de suas obras, mas uma troca entre parceiros.

O grupo sendo formado por estudantes de semestres variados do curso de Psicologia pode fomentar a práxis nas discussões e debates com alunos que já se encontravam no campo de estágio, rompendo com a dicotomia teoria e prática. Mostrou-se também com uma proposta metodológica que possibilita um maior envolvimento e atravessamento com a temática, a saber, associação livre das ideais e a arte. Assim, traçamos o nosso caminho.

Com base nessa experiência, sentimos na pele o valor desse espaço de interação entre aprendizes para uma formação que rejeite as premissas comuns e que seja intercalada pelo exercício ético-reflexivo.

O que desaprendemos? Não recuar é o desafio que a clínica no hospital nos instiga. Certamente, ao interrogarmos o lugar da psicologia numa instituição de saúde, deixamos em aberto muitas questões que tem relação com esse lugar. O fato é que não tínhamos a pretensão de esgotá-las, até porque seria impossível um saber totalizante quando o próprio sujeito não o é.

Como sujeito propenso ao resto, afinal diariamente saímos de um lugar imaginário e ideal para virarmos resto, algo continua restando aqui, não dito por nós, abrindo brechas para outras questões, outras angústias e novas criações.

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ALBERTI, S. Pesquisa e transmissão da psicanálise no contexto universitário. In: Pesquisa em Psicanálise:

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ANGERAMI-CAMON, V. (Org). O doente, a psicologia e o hospital. 2a ed. revisada. São Paulo: Pioneira, 1994. CASTRO, J. Para o que aponta a globalização do ensino universitário na atualidade. In: Freud não explica: a

psicanálise nas universidades. Lo Bianco, A. C. Rio de Janeiro: Contra Capa Livraria, p. 148. 2006.

CHIATTONE, H. B. C.; SEBASTIANI, R. W. Introdução à psicologia hospitalar. 6. ed. São Paulo: Nêmeton, 1998.

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explica: a psicanálise nas universidades. Lo Bianco, A. C. Rio de Janeiro: Contra Capa Livraria, p. 148. 2006.

FOUCAULT, M. O nascimento da Clínica. 6ª.ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2008.

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KUBLER-ROSS, Elizabeth. Sobre a Morte e o Morrer: o que os doentes terminais têm para ensinar a

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LACAN, J. (1998). Abertura desta coletânea. In J. Lacan, Escritos (V. Ribeiro, trad., pp. 9-12). Rio de Janeiro: Jorge Zahar. (Trabalho original publicado em 1966).

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_______________. O psicanalista num programa de transplante de fígado: a experiência do “outro em si”. Tese (Programa de Pós-Graduação em Psicologia. Área de Concentração: Psicologia Clínica) – Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo, 2006.

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