CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS
UNIDADE ACADÊMICA DE DIREITO
CURSO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS
ARETHUZA LEITE PINTO
PRISÃO ILEGAL E RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO
SOUSA - PB
2004
ARETHUZA LEITE PINTO
PRISÃO ILEGAL E RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO
Monografia apresentada ao Curso de
Ciências Jurídicas e Sociais do CCJS
da Universidade Federal de Campina
Grande, como requisito parcial para
obtenção do título de Bacharela em
Ciências Jurídicas e Sociais.
Orientadora: Professora Ma. Giorggia Petruce Lacerda e Silva Abrantes.
SOUSA - PB
2004
PRISAO ILEGAL E R E S P O N S A B I L I D A D E CIVIL DO E S T A D O
B A N C A E X A M I N A D O R A
Prof1. M s1 .Giorggia Petrucce Lacerda e Silva A b r a n t e s (Orientadora)
Prof.
Prof.
S o u s a - P B d e z e m b r o / 2 0 0 4
Dedico A o s m e u s pais, por t e r e m m e p r o p o r c i o n a d o a conquista da c o n c l u s a o d e s t e curso de Direito. A J a n i o , q u e m e a p o i o u e m t o d o s os m o m e n t o s d a m i n h a vida.
A Giorggia, que tanto m e a j u d o u na o r i e n t a c a o d e s t e trabalho m o n o g r a f i c o .
galgar m a i s urn d e g r a u na b u s c a d a realizacao do g r a n d e s o n h o da m i n h a vida.
S U M A R I O
I N T R O D U Q A O 08
C A P i T U L O 1 - DA R E S P O N S A B I L I D A D E CIVIL D O E S T A D O 11
1.1. E s b o c o historico 11 1.2. C o n c e i t o e teorias a c e r c a do instituto d a r e s p o n s a b i l i d a d e civil 14
1.3. A responsabilidade civil do Estado no exercicio da atividade jurisdicional 21
C A P i T U L O 2 - D A S E S P E C I E S D E P R I S A O E A R E S P O N S A B I L I D A D E C I V I L
D O E S T A D O 2 5 2 . 1 . Prisao indevida e sua justificativa ante a reparagao estatal 2 6
2.2. Prisao ilegal 2 8 2.3. F u n d a m e n t a c a o da responsabilidade civil do Estado f r e n t e a prisao ilegal....32
C A P i T U L O 3 - DA O B R I G A Q A O DE I N D E N I Z A R 37 3 . 1 . O r e c o n h e c i m e n t o da ocorrencia de d a n o moral e material na prisao ilegal...37
3.2. A s p e c t o s proprios d a agao de indenizagao: previsao legal, c a b i m e n t o ,
c o m p e t e n c i a legitimidade 4 0 3 . 3 . 0 direito de agao regressiva conferido ao Estado 4 2
C O N S I D E R A Q O E S F I N A I S 4 5
A p r e s e n t e pesquisa cientifica pretende analisar a r e s p o n s a b i l i d a d e civil do Estado, o b s e r v a n d o a sua aplicabilidade frente as d u a s e s p e c i e s de prisao, a indevida e a ilegal e e x p l o r a n d o alguns p o n t o s referentes a restricao da Hberdade, c o m o t a m b e m abordar a s p e c t o s proprios d a a c a o de i n d e n i z a c a o , c u l m i n a n d o no estudo da a c a o regressiva proposta pelo Estado e m d e s f a v o r do magistrado que agiu c o m dolo ou culpa. Constata-se q u e a r e p a r a c a o estatal por indevida prisao e por erro judiciario e c l a r a m e n t e descrita no T e x t o Constitucional, m a i s p r e c i s a m e n t e no artigo 5°, inciso LXXV, p o r e m , ao tratar e s p e c i f i c a m e n t e de e n c a r c e r a m e n t o ilegal, os dispositivos normativos s a o o m i s s o s , d a n d o m a r g e m a varios p o s i c i o n a m e n t o s . O trabalho m o n o g r a f i c o intitula-se: Prisao Ilegal e R e s p o n s a b i l i d a d e Civil do E s t a d o . Diante do a n s e i o m a n i f e s t a d o na a c a d e m i a , no sentido de ver s o l u c i o n a d a esta lacuna, procura-se d e m o n s t r a r a o b r i g a t o r i e d a d e da responsabilizagao do Estado t a m b e m no caso de d e c r e t a g a o ilegal d a prisao, t e n d o c o m o respaldo j u r i d i c o o artigo 37, § 6° da Constituigao Federal dentre outros textos n o r m a t i v o s e principios n o r t e a d o r e s da Ciencia d o Direito. Para a concretizagao d e s t e trabalho a d o t o u - s e o m e t o d o bibliografico e de interpretagao juridica, aliados a tecnica de p e s q u i s a d o c u m e n t a l . A guisa d e resultados,
constata-se o s u r g i m e n t o de urn novo p o s i c i o n a m e n t o doutrinario e j u r i s p r u d e n t i a l , que s e g u e a orientagao de a b a n d o n o da teoria d a
irresponsabilidade do Poder Judiciario q u a n d o d a pratica de atos c o m i s s i v o s ou omissivos resultarem lesoes aos particulares, a s s i m c o m o a c o n t e c e no a m b i t o d a A d m i n i s t r a g a o Publica. T u d o isso confirma a p r o b l e m a t i z a g a o e l a b o r a d a , qual seja: A obrigagao estatal de indenizar, a d v i n d a d a prestagao jurisdicional i n a d e q u a d a , abarca t a m b e m a e s p e c i e de prisao ilegal? Bern c o m o a hipotese p r e v i a m e n t e e l a b o r a d a : S i m , haja vista que dispositivos legais j a existem a disciplinar a materia, o q u e reduz a c e l e u m a posta a u m a q u e s t a o q u e p o d e ser s o l u c i o n a d a e m s e d e de h e r m e n e u t i c a .
Palavras-chaves: liberdade, prisao ilegal, responsabilidade estatal,
ressarcimento, agao regressiva.
I N T R O D U Q A O
O ser h u m a n o e e s e n t e - s e , d e s d e a sua c o n c e p g a o , u m a criatura livre. No decorrer de sua trajetoria evolutiva, d e s d e os primordios ate o estagio hodierno de a p r i m o r a m e n t o d a h u m a n i d a d e , o individuo idealiza, a n s e i a , busca e tenta m a n t e r - s e e m Hberdade, ou seja, no livre exercicio de s u a s prerrogativas, v o n t a d e s , direitos e d o n s .
Destarte, a organizagao normativa d a vida e m s o c i e d a d e , p r o m o v i d a pelo Direito - e n q u a n t o m e c a n i s m o norteador d a s relagoes intersubjetivas - p e r p a s s a pela
inclusao, no bojo d o s m e l h o r e s textos legais, d a Hberdade c o m o valor, aspiragao, direito e garantia.
O Pacto F u n d a m e n t a l de 1988 c o n s a g r a , e m seu artigo 5°, caput, e s s a m e s m a Hberdade, c o m o s e n d o direito f u n d a m e n t a l conferido a brasileiros e estrangeiros, e s t a b e l e c e n d o , o u t r o s s i m , acerca de m e c a n i s m o s habeis a sua s a l v a g u a r d a e aquisigao.
A d e s p e i t o disso, n o r m a s existem a regular o exercicio d e s s e direito q u e , por v e z e s , t r a t a m d a s hipoteses de restrigao a s e r e m i m p o s t a s q u a n d o e s s e m e s m o e x e r c i c i o configure a b u s o , interferindo na esfera de direitos de outra p e s s o a .
A restrigao da Hberdade d e v e , pois, ser efetivada pelo Estado atraves do Poder Judiciario; e o q u e se d a no a m b i t o d o s p r o c e s s o s judiciais. E n t r e m e n t e s , se o E s t a d o -Juiz a b u s a na atividade de limitagao d a Hberdade, d e v e ressarcir a vitima d o e x c e s s o ou arbitrariedade, tal c o m o ocorre nas obrigagoes de indenizar d e c o r r e n t e s de atos praticados por particulares.
c o n t i n u a m e n t e a c e r c a do a s s u n t o , t a n t o na A c a d e m i a c o m o e m diversos outros s e g m e n t o s sociais, qual seja: A R e s p o n s a b i l i d a d e Civil do Estado por Prisao Ilegal. Portanto, os objetivos desta atividade de pesquisa sao: o e x a m e do instituto d a responsabilidade civil estatal; identificar as hipoteses d e reparabilidade patrimonial por parte do Estado frente as d u a s e s p e c i e s de prisao, quais s e j a m , a indevida e a ilegal; analisar alguns dos a s p e c t o s proprios d a a c a o de indenizacao. T u d o c o m o intuito de c o m p r o v a r a o b r i g a t o r i e d a d e que o Estado tern de arcar c o m o o n u s indenizatorio e m f a c e da prisao efetivada de f o r m a ilegal ou indevida, utilizando-se, para tanto, do devido
respaldo doutrinario e normativo.
No decorrer d a investigacao cientifica, o p t o u - s e pelo uso d o s m e t o d o s bibliograficos e exegetico-juridico, t r a b a l h a d o s atraves d a tecnica d e pesquisa d o c u m e n t a l .
O u t r o s s i m , o presente trabalho m o n o g r a f i c o o b e d e c e a estrutura seguinte: no primeiro capitulo versar-se-a a c e r c a d a responsabilidade civil d o Estado, m e d i a n t e a p r e c i a c a o do e s b o c o historico, do conceito e teorias f o r m u l a d a s sobre o instituto e d o e n q u a d r a m e n t o d a produgao jurisprudencial estatal nas hipoteses d e responsabilizagao; m a i s adiante, s e r a o e x p l o r a d o s alguns c o n t e u d o s referentes a restrigao d a Hberdade, ou seja, o capitulo s e g u n d o tratara d a s e s p e c i e s de prisao passiveis de reparagao - ilegal e indevida - e f u n d a m e n t o s j u r i d i c o s pelos quais se p o d e pleitear a indenizagao c a b i v e l ; f i n a l m e n t e , o ultimo capitulo d o trabalho destina-se a a b o r d a g e m d a s peculiaridades proprias do r e c o n h e c i m e n t o da ocorrencia do d a n o e a
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c o n s e q i i e n t e o b r i g a c a o de indenizar, p e r p a s s a n d o pelo estudo d a a c a o de i n d e n i z a c a o e do direito de regresso atribuido ao Estado.
V a l e salientar que t o d a a atividade d e s e n v o l v i d a t e n d e a c o n f i r m a g a o da seguinte p r o b l e m a t i z a g a o : A obrigagao estatal de indenizar, a d v i n d a da prestagao jurisdicional i n a d e q u a d a a b a r c a t a m b e m a e s p e c i e d e prisao ilegal? Para t a n t o e p o s s i v e l , de a n t e m a o , formular, c o m o hipotese: S i m , haja vista que dispositivos legais ja existem a disciplinar a materia, o que reduz a c e l e u m a posta a u m a q u e s t a o q u e p o d e ser s o l u c i o n a d a e m s e d e de h e r m e n e u t i c a .
CAPITULO 1 DA RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO
1.1 E s b o c o historico
A responsabilidade civil finca as s u a s raizes nos primordios d a civilizagao h u m a n a , o n d e p r e d o m i n a v a a vinganga coletiva, c a r a c t e r i z a n d o - s e pela reagao conjunta do grupo do ofendido contra o agressor da o f e n s a , c o n s o a n t e explicita Maria Helena Diniz (2000, p. 09).
Em sua dissertagao de m e s t r a d o , Lenilma Meirelles (2002, p. 19) afirma, e m outras palavras, que logo a p o s , surge a mais antiga codificagao de leis acerca do d a n o e de sua reparagao, que e o C o d i g o de U r - N a m m u . Tal diploma descrevia principios referentes a reparagao d o s d a n o s , c o m u m a larga utilizagao da pena pecuniaria, diferenciando-se d a pratica d a e p o c a , que era a vinganga privada.
A vinganga privada consistia n u m a f o r m a primitiva, por que nao dizer s e l v a g e m , de reparar o mal sofrido atraves do uso do proprio m a l . A Lei de Taliao era rigida, c o n h e c i d a por t o d o s na e x p r e s s a o "olho por olho, d e n t e por dente". O Poder Publico so ditava q u a n d o e c o m o a vitima poderia ter o direito de retaliagao, p r o d u z i n d o na pessoa do lesado d a n o identico ao que e x p e r i m e n t o u . Na Lei d a s XII T a b u a s ainda e e n c o n t r a d a r e f e r e n d a a este criterio: "si membrum rupsit ni eo pacit Talio est' (se a l g u e m fere a o u t r e m , que sofra a pena de Taliao, salvo se existiu acordo), e o que d e p r e e n d e d a s ligoes de J o s e Aguiar Dias (1995, p. 17)
Esse m e s m o autor esclarece q u e a e s s e p e r i o d o s u c e d e o d a c o m p o s i g a o . O prejudicado p e r c e b e que mais c o n v e n i e n t e do que cobrar a retaliagao seria entrar e m
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c o m p o s i c a o c o m o ofensor, h a v e n d o a reparagao do d a n o m e d i a n t e a prestagao da
poena. Tal m e t o d o a s s e m e l h a v a - s e a u m a e s p e c i e de c o m p r a do p e r d a o do o f e n d i d o .
E na Lei A q u i l i a , o u t r o s s i m , q u e surge u m principio geral regular d o d a n o , l e m b r a n d o o que, m a i s tarde, fara parte da c o n c e p g a o d a culpa aquiliana, que t o m o u d a Lei Aquilia a sua d e n o m i n a g a o ou n o m e n c l a t u r a .
P a r a f r a s e a n d o Maria Helena Diniz (2003, p. 10) p o d e - s e afirmar que a Lex
Aquilia de damno veio difundir a ideia de reparagao pecuniaria do d a n o , i m p o n d o que o
patrimonio do lesante s u p o r t a s s e o o n u s da reparagao e f u n d a n d o as bases da responsabilidade extracontratual. Esta lei introduziu a ideia de reparagao pecuniaria do d a n o , i m p o n d o q u e o patrimonio do lesante s u p o r t a s s e o o n u s d a reparagao, c o r r e s p o n d e n t e ao valor da res. Mais t a r d e , as sangoes previstas nessa m e s m a lei f o r a m aplicadas aos d a n o s c a u s a d o s por o m i s s a o ou verificados s e m o estrago fisico e material d a s coisas. O Estado, entao, p a s s o u a intervir nos conflitos privados, fixando o valor d o s prejuizos e o b r i g a n d o a vitima a aceitar a c o m p o s i g a o , renunciando a vinganga.
C o m o e n s i n a , e m outros t e r m o s , J o s e de A g u i a r Dias (1995, p. 2 0 ) , na Idade Media e x s u r g e a ideia de dolo e culpa, distinguindo-se a r e s p o n s a b i l i d a d e civil d a penal. C o m efeito, foi no C o d i g o Civil Frances q u e a legislagao m o d e r n a se inspirou, haja vista q u e , a p o s paulatino a p e r f e i g o a m e n t o d a s ideias r o m a n i c a s , o n d e t o d o d a n o c a u s a d o por fato doloso d e v e ser reparado, o Direito Frances e s t a b e l e c e u principio geral d a responsabilidade civil, s e g u i n d o estes p a r a m e t r o s .
O supracitado autor esclarece q u e o C o d i g o de N a p o l e a o a b s o r v e u as ligoes de D a m a t e Pothier, juristas f r a n c e s e s . A c o n c e p g a o de q u e a r e s p o n s a b i l i d a d e civil se f u n d a na culpa partiu d a i para inserir-se na legislagao de t o d o o m u n d o .
O u t r o s s i m , no q u e pertine a responsabilidade do E s t a d o , p o d e - s e questionar, a
priori, as diversas f u n c o e s nas quais se reparte o Poder Estatal, quais s e j a m : a
administrativa, a jurisdicional e a legislativa. Entretanto, c o m m a i o r f r e q u e n c i a da-se a incidencia da responsabilidade resultante de c o m p o r t a m e n t o da A d m i n i s t r a c a o Publica, visto q u e , c o m relacao aos P o d e r e s Legislativo e Judiciario, e s s a responsabilidade incide e m c a s o s e x c e p c i o n a i s .
T r a t a n d o - s e de d a n o resultante d e c o m p o r t a m e n t o do Poder Executivo, d o Legislativo ou do Judiciario, a r e s p o n s a b i l i d a d e e d o Estado, p e s s o a juridica. A legitimidade passiva e do Estado e d a s p e s s o a s j u r i d i c a s publicas ou privadas q u e o r e p r e s e n t a m no exercicio de u m a parcela das atribuigoes estatais. A responsabilidade e s e m p r e civil, c o m s a n c a o de o r d e m pecuniaria, c o n f o r m e se pode extrair do p e n s a m e n t o de Maria Sylvia Zanella di Pietro (2003, p. 5 2 3 ) .
Na m e s m a esteira de raciocinio, a autora c o m e n t a que a r e s p o n s a b i l i d a d e civil p o d e se originar de atos j u r i d i c o s , de atos ilicitos, d e c o m p o r t a m e n t o s materiais ou de o m i s s a o do Poder Publico. O necessario e q u e ocorra urn d a n o c a u s a d o a terceiros por c o m p o r t a m e n t o o m i s s i v o ou comissivo de a g e n t e d o Estado.
A s s i m , Maria Sylvia Zanella di Pietro ( 2 0 0 3 , p. 523) elucida q u e o Estado -e n q u a n t o p-essoa juridica - s -e r-esponsabiliza p a t r i m o n i a l m -e n t -e por atos praticados m e d i a n t e a atuagao de p e s s o a s fisicas q u e a j a m na condigao de s e u s a g e n t e s , d e s e m p e n h a n d o f u n g o e s relativas ao f u n c i o n a m e n t o da m a q u i n a estatal. Isso e assim porque o querer e o atuar do agente publico e o querer e o atuar do Estado, fato q u e i m p o e ao m e s m o a obrigagao de indenizar, a custa dos cofres publicos.
P e n s a m e n t o a s s e n t e na doutrina civilista e que a r e s p o n s a b i l i d a d e d o Estado surge c o m o d e c o r r e n c i a logica da nogao de Estado de Direito q u e , por sua vez, preve a
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igualdade na repartigao d o s e n c a r g o s sociais sujeitando t o d o s , p e s s o a fisica e juridica, de Direito Publico ou Privado ao o r d e n a m e n t o j u r i d i c o vigente, i m p o n d o o d e v e r de indenizar por ato q u e v e n h a a c a u s a r prejuizo a o u t r e m .
M a s , e preciso observar que a responsabilidade publica e precedida por n o r m a s de direito publico, e s p e c i f i c a m e n t e de Direito Administrative, c o m alguns pontos c o n v e r g e n t e s a o s principios q u e r e g e m a r e s p o n s a b i l i d a d e no a m b i t o do direito privado, m a i s p r e c i s a m e n t e no Direito Civil.
C o n t u d o , Maria Sylvia Zanella di Pietro ( 2 0 0 3 , p. 523) salienta que divergencia ha no sentido de q u e , no direito privado, a r e s p o n s a b i l i d a d e exige s e m p r e a p r e c e d e n c i a de urn ato ilicito; a contrario sensu, no direito publico, e e m particular no c a m p o administrativo, ela p o d e decorrer de a t o s o u c o m p o r t a m e n t o q u e , e m b o r a licitos, c a u s e m a p e s s o a s d e t e r m i n a d a s o n u s superior a q u e l e ao restante d a s o c i e d a d e .
Faz-se necessario salientar q u e , neste topico, ha r e f e r e n d a a responsabilidade extracontratual do Estado, r e g u l a m e n t a d a pela Constituicao Federal de 1988 e m s e u artigo 37, § 6°, a qual nao se c o n f u n d e c o m a r e s p o n s a b i l i d a d e contratual, q u e p o s s u i f u n d a m e n t o s e principios proprios e d i f e r e n c i a d o s .
1.2 C o n c e i t o e teorias acerca do instituto d a r e s p o n s a b i l i d a d e civil do Estado
A leitura d a obra de Maria Sylvia Zanella di Pietro (2003, p. 524) faculta o e n t e n d i m e n t o de q u e a r e s p o n s a b i l i d a d e extracontratual do Estado esta d i r e t a m e n t e ligada a obrigagao de reparar d a n o s c a u s a d o s a terceiros e m c o n s e q u e n c i a de
c o m p o r t a m e n t o s c o m i s s i v o s ou o m i s s i v o s , materiais ou j u r i d i c o s , licitos ou ilicitos, praticados pelos a g e n t e s publicos.
M a r c e l o A l e x a n d r i n o e V i c e n t e Paulo (2002, p. 4 2 4 ) c o m u n g a m do m e s m o e n t e n d i m e n t o , sintetizado na s e g u i n t e definicao:
A responsabilidade civil da Administragao Publica evidencia-se na obrigacao que tern o Estado de indenizar os danos patrimoniais ou morais que seus agentes, atuando em seu nome, ou seja, na qualidade de agentes publicos, causem a esfera juridicamente tutelada dos particulares. Traduz-se, pois, na obrigagao de reparar economicamente danos patrimoniais, e com tal reparagao se exaure.
C o m o se v e , dentre os c a s o s a b a r c a d o s pela incidencia da r e s p o n s a b i l i d a d e objetiva, e s t e e o q u e m e l h o r e d e l i n e a d o pela legislagao patria. E n t r e m e n t e s , n e m s e m p r e foi a s s i m , pois ate se c h e g a r a e s s e patamar, h o u v e gradativa evolugao historica a c o m p a n h a d a , o b v i a m e n t e , do d e s e n v o l v i m e n t o d a s o c i e d a d e m o d e r n a .
C o n s o a n t e preleciona Maria Sylvia Zanella di Pietro (2003, p. 524) as teorias q u e p a s s a r a o a ser a n a l i s a d a s f o r a m a d o t a d a s , principalmente, no s i s t e m a e u r o p e u -continental, isto p o r q u e o C o n s e l h o de Estado Frances e l a b o r o u m a i o r q u a n t i d a d e de t r a b a l h o s jurisprudenciais s o b r e o t e m a . O u t r o s s i s t e m a s , c o m o o a n g l o - s a x a o , s e g u i r a m outras linhas de raciocinio, as quais nao influenciaram o Brasil, e por isso, p o d e - s e te-las c o m o a s s u n t o de s o m e n o s importancia.
Maria Sylvia Zanella di Pietro (2003, p. 525) c o m e n t a , ainda, que a primeira teoria foi a a d o t a d a na e p o c a d o s Estados absolutistas, f u n d a m e n t a d a na soberania e x a r c e b a d a do p e r i o d o ; era a teoria da irresponsabilidade. O Estado detinha u m a a u t o r i d a d e inquestionavel, o sudito nada podia contra o rei e quern sofresse a l g u m a lesao teria q u e suporta-la s e m reclamar. A l g u m a s e x p r e s s o e s d a e p o c a p o d e m retratar
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o grau de s u p e r i o r i d a d e do m o n a r c a , c o m o por e x e m p l o : "o rei nao erra", "aquilo que a g r a d a o principe tern forca de lei".
Lenilma Meirelles (2002, p. 21) e m sua dissertacao d e m e s t r a d o , ressalta que neste m o m e n t o o lesado tinha a p e n a s agao contra o proprio funcionario c a u s a d o r do d a n o , o Estado e o funcionario c o n s t i t u i a m sujeitos a u t o n o m o s , o primeiro p o s s u i n d o s u p r e m a c i a e agindo de f o r m a ilimitada.
Nao d e m o r o u muito para e s s a teoria c o m e g a r a ser c o m b a t i d a . Se o Estado d e v e tutelar o direito, nao p o d e deixar de pratica-lo, d e v e t a m b e m r e s p o n d e r q u a n d o causar d a n o s a terceiros p o r q u e , s e n d o pessoa juridica, e igualmente titular de direitos e obrigagoes.
A professora s u p r a m e n c i o n a d a ainda t e c e c o m e n t a r i o s a c e r c a da teoria s u b s e q u e n t e c h a m a d a de civilista por e m b a s a r - s e e m principios que regram o Direito Civil. Nessa f a s e e possivel identificar dois m o m e n t o s distintos: primeiro, ha u m a distingao entre atos de imperio e atos de g e s t a o , s e n d o classificados c o m o atos de imperio a q u e l e s praticados pela administragao c o m as regalias e p r i v i l e g e s d e autoridade e ditados coercitivamente ao particular, nao s e n d o necessaria n e n h u m a autorizagao judicial e m e d i a n t e previsao legal e s p e c i f i c a ; j a os atos de gestao seriam aqueles exercidos pela A d m i n i s t r a g a o , e m pe de igualdade c o m os particulares, para a c o n s e r v a g a o e d e s e n v o l v i m e n t o do patrimonio publico e pelo b o m d e s e m p e n h o d o s servigos, aqui o direito a p l i c a n d o - s e de m o d o c o m u m a a m b o s , A d m i n i s t r a g a o e particular.
A diferenga entre atos de imperio e atos de gestao veio a m e n i z a r a aplicagao d a teoria d a irresponsabilidade. Sobre isso Maria Sylvia Zanella di Pietro (2003, p. 525) afirma q u e :
Os primeiros seriam os praticados pela Administragao com todas as prerrogativas e privileges de autoridade e impostos unilateral e coercitivamente ao particular independentemente de autorizagao judicial, sendo regidos por urn direito especial, exorbitante do direito
comum, porque os particulars nao podem praticar atos semelhantes; os segundos seriam praticados pela Administragao em situagao de igualdade com os particulars, para a conservagao e desenvolvimento do patrimonio publico e para a gestao de seus servigos;
A maior oposigao a e s s a teoria fez-se p a u t a d a t a n t o na impossibilidade de s e p a r a g a o da personalidade do Estado c o m o na dificuldade de enquadrar, c o m o ato de g e s t a o , t o d o s aqueles exercidos pelo Estado na administragao publica e na prestagao de servigos. Entretanto, varios autores, ainda a p e g a d o s a doutrina civilista, p a s s a r a m a admitir a responsabilidade do Estado c o m f u n d a m e n t o na culpa d o funcionario. Nasce a teoria da culpa civil ou da responsabilidade subjetiva.
Essa teoria so teria aplicagao, s e g u n d o Maria Sylvia Zanella di Pietro (2003, p. 5 2 6 ) , q u a n d o o d a n o c a u s a d o ao particular f o s s e derivado de u m a c o n d u t a culposa a s s u m i d a pelo a g e n t e publico. Destarte, a p e n a s as c o n d u t a s classificadas c o m o i m p r u d e n t e s , negligentes e imperitas por parte d o servidor e que g e r a v a m para o Estado a obrigagao de c o m p o r o d a n o , p e r m a n e c e n d o na responsabilidade pessoal do servidor as d e c o r r e n c i a s de c o n d u t a s dolosas.
A doutrina civilista v e m p e r d e n d o e s p a g o a c a d a m o m e n t o no a m b i t o juridico, pelo que p a s s a m a p r e d o m i n a r as teorias publicistas. U m a g r a n d e contribuigao nesse sentido adveio da d e c i s a o prolatada pela corte f r a n c e s a no f a m o s o caso Blanco, ocorrido e m 1873 e citado por Maria Sylvia Zanella di Pietro (2003, p. 5 2 6 ) :
a menina Agnes Blanco, ao atravessar uma rua da cidade de Bordeaux, foi colhida por uma vagonete da Cia. Nacional de Manufatura do Fumo; seu pai promoveu agao civil de indenizagao, com base no principio de
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que o Estado e civilmente responsavel por prejuizos causados a terceiros, em decorrencia de agao danosa de seus agentes.
A autora, explica, ainda, que surgiu conflito a c e r c a da c o m p e t e n c i a ser d a jurisdigao c o m u m ou d a c o n t e n c i o s a administrativa para processar e julgar tais litigios;
p o r e m , o Tribunal de Conflitos decidiu q u e c o m p e t i a ao Tribunal A d m i n i s t r a t i v o resolver a querela, pois se tratava de analisar a responsabilidade d e c o r r e n t e do f u n c i o n a m e n t o do servigo publico. Foi a partir d e s s a d e c i s a o q u e se construiu urn p o s i c i o n a m e n t o jurisprudencial no sentido de imputar ao Estado a responsabilidade, nao e m virtude de
n o r m a s proprias do direito civil, m a s d e c o r r e n t e s do Direito Publico.
Posteriormente, a d v i e r a m as teorias publicistas d a responsabilidade estatal: a teoria d a culpa administrativa e a teoria d o risco, p o d e n d o esta ultima ser d e s d o b r a d a , ainda, e m teoria do risco administrativo e teoria do risco integral.
D e s e n v o l v e n d o a ideia e x p o s t a por Marcelo A l e x a n d r i n o e V i c e n t e Paulo (2002, p. 426) conclui-se que a teoria da culpa administrativa procura desvincular a r e s p o n s a b i l i d a d e do Estado d a possibilidade de culpa do funcionario. A culpa pessoal do funcionario publico, perante a qual ele m e s m o r e s p o n d e , era diferente d a culpa do servigo publico, caracterizada q u a n d o o servigo nao f u n c i o n o u , f u n c i o n o u mal ou atrasado. Na realizagao de qualquer d e s s a s tres faltas c o n f i r m a v a - s e a responsabilidade do Estado, i n d e p e n d e n t e m e n t e de q u a l q u e r analise de culpa do funcionario.
J u n t a m e n t e c o m e s s a teoria a Franga p a s s o u a adotar, e m a l g u m a s hipoteses, a teoria do risco administrativo, que serve de b a s e a responsabilidade objetiva e f u n d a m e n t a - s e no principio d a igualdade d o s o n u s e e n c a r g o s social, s e g u n d o professa Maria Sylvia Zanella di Pietro (2003, p. 527). A d e m a i s , e s s a teoria
d e s c o n s i d e r a a culpa d a A d m i n i s t r a g a o ou de s e u s f u n c i o n a r i o s , p r i m a n d o pela d e m o n s t r a g a o , por parte d a vitima, de que ocorreu urn fato d a n o s o e injusto o c a s i o n a d o por agao ou o m i s s a o d o P o d e r Publico. A s s i m , a nogao de culpa e substituida pela ideia de nexo de c a u s a l i d a d e , a ser e s t a b e l e c i d o entre o f u n c i o n a m e n t o do servigo publico e o prejuizo sofrido pela vitima.
S e g u n d o Hely Lopes Meirelles (2002, p. 619) e possivel diferenciar a teoria do risco administrativo d a teoria do risco integral, posto que a primeira a d m i t e as c a u s a s e x c l u d e n t e s da responsabilidade do E s t a d o , a saber: culpa d a vitima, culpa de terceiros e forga maior; ja a s e g u n d a prescreve q u e a A d m i n i s t r a g a o ficaria obrigada a indenizar t o d o e qualquer d a n o sofrido por terceiros, ainda que resultante de culpa ou dolo d a vitima.
M e d i a n t e e s t u d o c o m p a r a t i v o a c e r c a da incidencia d e s s a s teorias no direito positivo brasileiro v e - s e q u e , e m n e n h u m m o m e n t o , m e s m o na a u s e n c i a de leis escritas, os tribunals ou d o u t r i n a d o r e s a c o l h e r a m a teoria da irresponsabilidade estatal.
Nas primeiras Constituigoes brasileiras nao c o n s t a v a n e n h u m a r e f e r e n d a a r e s p o n s a b i l i d a d e do Estado, existia a p e n a s u m a previsao da responsabilidade do funcionario e m d e c o r r e n c i a de a b u s o o u o m i s s a o na pratica d a s s u a s f u n g o e s . No entanto, e possivel encontrar neste p e r i o d o leis ordinarias p r e v e n d o a responsabilidade estatal, j a posta pela jurisprudencia c o m o solidaria c o m os f u n c i o n a r i o s . T a i s leis m e n c i o n a v a m e x p r e s s a m e n t e c a s o s de acidentes e m linhas telegraficas e pelos servigos de correios.
O C o d i g o Civil p r o m u l g a d o e m 1916 t r o u x e u m a c e l e u m a e m s e u artigo 15, q u e rezava:
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Art. 15: As pessoas juridicas de direito publico sao civilmente responsaveis por atos de seus representantes que nessa qualidade causem danos a terceiros, procedendo de modo contrario ao direito ou faltando a dever prescrito por lei, salvo direito regressivo contra os causadores do dano.
E que a r e d a c a o d a v a a e n t e n d e r q u e o d i p l o m a teria a d o t a d o a teoria civilista d a responsabilidade subjetiva, entretanto, c o m a posterior analise e correta e x e g e s e f i r m o u - s e a c o m p r e e n s a o de q u e o texto p r o p u g n a v a o e n t e n d i m e n t o voltado a d e m o n s t r a g a o de culpa do funcionario c o m o p r e s s u p o s t o da responsabilidade estatal. E m virtude do e x p o s t o e que alguns a u t o r e s d e f e n d e r a m a a d o g a o d a r e s p o n s a b i l i d a d e objetiva na vigencia d e s s a lei civil.
A Constituigao Federal de 1934 a d o t o u , e m s e u artigo 1 7 1 , o principio d a responsabilidade solidaria. O s f u n c i o n a r i o s seriam e n t a o r e s p o n s a v e i s s o l i d a r i a m e n t e c o m a F a z e n d a Nacional, Estadual ou Municipal, por q u a i s q u e r d a n o s p r o v o c a d o s por negligencias, o m i s s o e s ou a b u s o s no e x e r c i c i o de s e u s cargos. Da m e s m a f o r m a prescrevia o artigo 158 d a Lei Maior de 1937, c o m o a p r e g o a Maria Sylvia Zanella di Pietro (2003, p. 5 2 9 ) .
A autora t a m b e m afirma que o texto Constitucional de 1946 d e u guarida a teoria da responsabilidade objetiva do Estado e m s e u artigo 194, a b r a g a n d o , no paragrafo unico, a possibilidade de agao regressiva contra os f u n c i o n a r i o s c a u s a d o r e s d o d a n o e q u e a Carta M a g n a de 1967 repete a n o r m a e m s e u artigo 105 a c r e s c e n d o , no paragrafo unico do m e s m o artigo, que a agao regressiva c a b e r a nos c a s o s de culpa e dolo. C o m a e m e n d a n°. 01 de 1969, h o u v e u m a m u d a n g a a p e n a s na posigao d o artigo, que p a s s o u a n u m e r a g a o 107. Ja Constituigao Federal de 1988, e m s e u artigo
37, § 6°, c o m p o r t a d u a s regras: a da responsabilidade objetiva do Estado e a da responsabilidade subjetiva do funcionario. Determina o artigo q u e :
Art. 37 omissis. (...)
§ 6° - as pessoas juridicas de direito publico e as de direito privado prestadoras de servigos publicos responderao pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsavel nos casos de dolo ou culpa
1.3 A r e s p o n s a b i l i d a d e civil do Estado no exercicio da atividade jurisdicional
A s s i m c o m o p e n s a d o por Aristoteles e divulgado por M o n t e s q u i e u , a Constituigao Federal hodierna estruturou o Estado e dividiu-o e m p o d e r e s a u t o n o m o s , p o r e m h a r m o n i c o s entre si, a o s quais e n t r e g o u f u n g o e s basicas e distintas: a legislativa, a executiva e a judiciaria. Esse e o triduo q u e da sustentaculo ao Estado, q u e exerce o poder d e s e m p e n h a n d o s u a s f u n g o e s .
Destarte, p o d e - s e afirmar q u e as f u n g o e s legislativa, executiva e judiciaria se d e s t i n a m a concretizagao de atividades proprias, v i s a n d o o fim a que o Estado se p r o p o e , qual seja, o b e m c o m u m .
Diante de tais circunstancias, Lenilma Meirelles (2002, p. 23) conclui q u e a responsabilidade do Estado d e c o r r e , n e c e s s a r i a m e n t e , de d a n o s c a u s a d o s ao particular m e d i a n t e exercicio de s u a s f u n g o e s . T e n h a - s e e m conta q u e o preceito constitucional de regencia, inserto no artigo 37, § 6°, nao c o n c e d e u qualquer privilegio ao Poder Judiciario. A nogao de servigo publico nao se restringe a p e n a s a atividade administrativa, j a q u e a atividade judiciaria e propria e m o n o p o l i z a d a pelo Estado,
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p r i m a n d o pelo zelo e presteza para atingir a finalidade a que se p r o p o e e sujeitando-se, portanto, a responsabilizagao pelos d a n o s c a u s a d o s por sua indevida a t u a c a o .
A autora supracitada c o m e n t a que o servigo judiciario d e v e ser e n t e n d i d o c o m o m o d a l i d a d e do servigo publico, e exteriorizagao do exercicio do poder do Estado, razao pela qual se sujeita a m e s m a obrigagao e responsabilizagao atribuida as d e m a i s atividades exercidas pelos dois outros poderes, na hipotese e m q u e q u a i s q u e r d e l e s , atraves de seus a g e n t e s , c a u s e m d a n o s a terceiros.
Y u s s e f Said Cahali (apud S T O C O , 1999) afirma que "a irresponsabilidade dos d a n o s c a u s a d o s pelos atos judiciais, s e m e m b a r g o d a c o n c e s s a o feita a reparabilidade dos d a n o s resultantes do erro judiciario, constitui o ultimo reduto d a teoria da irresponsabilidade civil do Estado".
A s s i m , c o m o preleciona Lenilma Meirelles ( 2 0 0 2 , p. 2 4 ) , a teoria f o r m u l a d a sobre a irresponsabilidade do Estado na esfera judiciaria e s t a p a u t a d a nos seguintes a r g u m e n t o s :
I) S o b e r a n i a do Poder Judiciario: este orgao do Estado e x e r c e parcela do poder s u p r e m o e e, portanto, s o b e r a n o , nao c o m p o r t a n d o q u e s t i o n a m e n t o a l g u m o carater absoluto que encerra s u a s d e c i s o e s ;
II) I n d e p e n d e n c i a d o s m a g i s t r a d o s no d e s e m p e n h o de s u a s f u n g o e s : a possibilidade de que d a s s u a s d e c i s o e s possa surgir r e s p o n s a b i l i d a d e para o Estado p o d e influencia-las de maneira negativa;
III) O dispositivo constitucional p r e s e n t e no artigo 37, § 6 ° faz m e n g a o a d a n o s praticados por funcionario publico, todavia, os m a g i s t r a d o s nao sao a s s i m c o n s i d e r a d o s , e sim c o m o a g e n t e s politicos, nao se p o d e n d o invocar tal artigo para responsabilizar o Estado por atos jurisdicionais;
IV) Impossibilidade de se refutar a coisa j u l g a d a (a regra d a imutabilidade d a s d e c i s o e s proferidas): pelo q u e estar-se-ia, entao, violando tal principio.
E m q u e pese a autoridade contida na a r g u m e n t a c a o e x p o s t a , e de ver-se que o primeiro a r g u m e n t o ressalta a s o b e r a n i a , m a s a s o b e r a n i a e d o Estado, o que significa a inexistencia de outro poder a c i m a dele, do Estado. O s tres p o d e r e s - Executivo, Legislativo e Judiciario - nao sao s o b e r a n o s , pois d e v e m respeito a Lei Maior do Estado q u e e a Constituigao Federal. C o n f o r m e ensina Lenilma Meirelles (2002, p. 24) se e s s e q u e s t i o n a m e n t o for aceito e n t a o o Estado nao p o d e r a , d e v e r a s , se responsabilizar pelos d a n o s praticados no a m b i t o do P o d e r Executivo, o n d e estes sao postos de m a n e i r a incontestavel.
No que t a n g e ao s e g u n d o a r g u m e n t o , c u m p r e realgar que entre a i n d e p e n d e n c i a d o Judiciario, prevista no artigo 95 d a Constituigao Federal de 1988, e a responsabilidade do Estado nao ha qualquer incompatibilidade. A responsabilidade nao fere a hberdade de julgar ou restringe o d e s e m p e n h o do magistrado.
A classificagao do m a g i s t r a d o c o m o s e n d o funcionario publico e arguigao j a insustentavel, na visao de Maria Sylvia Zanella di Pietro ( 2 0 0 3 , p. 5 3 4 ) , u m a vez que a Carta M a g n a , e m s e u artigo 37, § 6°, utiliza a e x p r e s s a o "agente", e nao m a i s "funcionario publico", c o m o fez a Constituigao d e 1967. No direito patrio, o juiz o c u p a cargo publico criado por lei e se e n q u a d r a no conceito legal d e s s a categoria f u n c i o n a l , d e s e m p e n h a n d o u m a fungao e m n o m e do poder publico, m e d i a n t e r e m u n e r a g a o .
C o r r o b o r a n d o da ideia da citada autora, t e m - s e q u e a tese de que a admissibilidade d a responsabilidade do Estado por ato jurisdicional acarretaria ofensa a coisa j u l g a d a nao e suficiente para justificar a irresponsabilidade estatal. No direito positivo brasileiro, a forga d a coisa j u l g a d a e restringida pela a d m i s s a o d a agao
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rescisoria, no a m b i t o processual civil, e pela revisao criminal, na esfera p r o c e s s u a l p e n a l .
Na seara d a revisao criminal, a autora ainda c o m e n t a q u e , n a o restam d u v i d a s q u a n t o a r e s p o n s a b i l i d a d e do Estado, u m a vez q u e o artigo 6 3 0 do C o d i g o P r o c e s s u a l P e n a l , c o m o t a m b e m o artigo 5°, LXXV, da Constituigao Federal i m p o e m o dever de indenizar. Duvidas p o d e m surgir, ainda, e m s e d e de agao rescisoria, mais p r e c i s a m e n t e q u a n d o a d e c i s a o proferida nao soluciona o assunto, seja p o r q u e julga i m p r o c e d e n t e o pedido, d e c r e t a a prescrigao o u s i m p l e s m e n t e p o r q u e se tornou imutavel.
A aceitabilidade de indenizagao por d a n o d e c o r r e n t e da s e n t e n g a estaria infringindo a regra d a imutabilidade da coisa j u l g a d a , e m cuja esfera ha p r e s u n g a o de v e r d a d e q u e nao a d m i t e c o n t e s t a g a o . Este e, realmente, o a r g u m e n t o m a i s forte a favor d a a d m i s s i b i l i d a d e da irresponsabilidade estatal.
A legislagao infraconstitucional brasileira e a c a n h a d a e insuficiente para a solugao d a s q u e s t o e s que se a p r e s e n t a m no cotidiano. A j u r i s p r u d e n c i a , e m s u a imensa maioria, nao aceita a responsabilidade d o Estado por a t o s jurisdicionais. E estarrecedor constatar que a teoria da irresponsabilidade ha muito s u p e r a d a , ainda se aplica n u m pais cuja Lei Maior nao a recepciona.
O a r g u m e n t o de q u e os m a g i s t r a d o s , pela garantia da i n d e p e n d e n c i a que os cerca, e n c o n t r a m - s e i m u n e s ao erro, s e n d o s u a s d e c i s o e s intangiveis e infaliveis, e interpretagao que v e m liberando o Estado d a r e s p o n s a b i l i d a d e pelos d a n o s injustos, c a u s a d o s a o s que p r o c u r a m o Poder Judiciario j u s t a m e n t e para a realizagao d a justiga.
C A P I T U L O
2 DAS ESPECIES DE PRISAO E A RESPONSABILIDADE
CIVIL DO E S T A D O
Prisao, assim c o m o se Ihe c o n h e c e , e a privagao da liberdade individual e m c o n s e q u e n c i a do c o m e t i m e n t o de a l g u m a pratica delituosa q u e seja m e r e c e d o r a de punigao estatal, s e n d o esta a conceituagao, e m outras palavras, de A r n a l d o Quirino (1999, p. 21). A i n d a para e s s e autor, a prisao, por fazer cessar a liberdade, q u e e urn direito u n i v e r s a l m e n t e garantido, s o m e n t e p o d e ser feita e m o b e d i e n c i a d a o r d e m legal ou e m a n a d a de autoridade c o m p e t e n t e , e e m respeito ao principio do d e v i d o p r o c e s s o legal.
O citado doutrinador p r o s s e g u e a n o t a n d o q u e no e s t a d o de direito e m que se vive, a liberdade pessoal d e v e ser p l e n a m e n t e respeitada e a prisao, antes do transito e m j u l g a d o , s o m e n t e pode ocorrer por razoes de n e c e s s i d a d e , para se m a n t e r a o r d e m e seguranga da s o c i e d a d e , c o m o fito de efetivar o p r o c e s s o penal.
Na Constituigao Federal brasileira e n c o n t r a - s e varios dispositivos q u e d e f e n d e m a liberdade individual contra as praticas arbitrarias e m relagao a prisao. Ja o C o d i g o de P r o c e s s o Penal trata da prisao a partir do artigo 2 8 2 , ressaltando os c a s o s e m q u e o e n c a r c e r a m e n t o pode se realizar e as n o r m a s q u e d e v e m ser respeitadas.
P e r c e b e - s e , portanto, que a legislagao patria, e s p e c i a l m e n t e a Carta Maior, privilegiou o principio d a legalidade, pelo qual o jus libertatis d o c i d a d a o d e v e ser
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respeitado, nao se permitindo violagao, u m a vez que a regra e a liberdade, e x c e p c i o n a l m e n t e e nos c a s o s legalmente previstos e que tal principio d e v e ser m a c u l a d o .
2.1 Prisao indevida e sua justificativa ante a reparagao estatal
No capitulo anterior suscitou-se acerca d a possibilidade da responsabilidade civil do Estado d e c o r r e n t e de atos d a n o s o s praticados por s e u s a g e n t e s , m o r m e n t e a q u e l e s d e c o r r e n t e s do Poder Judiciario. H o u v e , entao, a o p o r t u n i d a d e de d e m o n s t r a r q u e agoes praticadas pelo Poder Judiciario sao suscetiveis de produzir c o n s e q u e n c i a s e que a t u a g o e s d e r i v a d a s de s e u s a g e n t e s p o d e m c a u s a r d a n o s a p a r t i c u l a r s . C o m b a s e nesse e n t e n d i m e n t o , conclui-se q u e o Estado-Juiz tern o dever, a s s i m c o m o os d e m a i s s e g u i m e n t o s , de indenizar o prejudicado.
A Constituigao Federal de 1988, e m s e u art. 37, § 6 ° , e clara na afirmagao que as p e s s o a s juridicas de direito publico e as de direito privado prestadoras de servigos publicos r e s p o n d e r a o pelos d a n o s q u e s e u s a g e n t e s , n e s s a q u a l i d a d e , c a u s a r e m a terceiros. Imaginar que o Poder Judiciario f o g e a e s s a regra e sujeita-lo a urn o r d e n a m e n t o especial que o posicione a m a r g e m d a r e s p o n s a b i l i d a d e por d a n o s c a u s a d o s , o q u e se perfaz t o t a l m e n t e d e s c a b i d o .
O u t r o s s i m , e l e n c a d o s alguns p o n t o s e m q u e se baseia a doutrina para a d e f e s a d a irresponsabilidade estatal do Poder Judiciario, os quais f o r a m d e v i d a m e n t e c o m b a t i d o s , ve-se q u e , a d e s p e i t o d a responsabilidade conferida aos a g e n t e s e m geral, no texto constitucional surge urn novo, por isso ainda a c a n h a d o , p o s i c i o n a m e n t o no sentido de impor ao Estado a obrigagao de r e c o m p o r o d a n o c a u s a d o a terceiro e m
decorrencia d a atuagao d o s magistrados, nao s o m e n t e q u a n d o se trata do erro judiciario, m a s t a m b e m e m q u a l q u e r c a s o de restrigao indevida ao direito de liberdade.
Leia-se, portanto, o q u e diz o artigo 5°, inciso LXXV, d a Constituigao Federal de 1988, in verbis: "O Estado indenizara o c o n d e n a d o por erro judiciario, assim c o m o o que ficar preso a l e m do t e m p o fixado na sentenga". Da leitura e possivel a p r e e n d e r q u e , logo na primeira parte, o dispositivo constitucional a s s e g u r a a indenizagao, limitando-a a efetiva c o n d e n a g a o do a c u s a d o pelo Poder Judiciario. A s e g u n d a parte do artigo restringe a r e s p o n s a b i l i d a d e do Estado e a c o n s e q u e n t e indenizagao aos c a s o s e m q u e a prisao imposta m e d i a n t e s e n t e n g a c o n d e n a t o r i a , e x c e d e o prazo de duragao.
Rui Stoco (1999, p. 541) explicita que o erro judiciario a d v e m de ato jurisdicional o n d e ocorre e q u i v o c a d a apreciagao d o s fatos ou do direito aplicavel. Pode, pois, ser corrigido por outro j u l g a d o superior, por meio de u m a m e d i d a especifica - prevista no art. 621 do C o d i g o de P r o c e s s o Penal - qual seja, a Revisao Criminal, q u e no direito imperial recebera o n o m e de "recurso de revista". E preciso salientar q u e , corrigir o erro atraves da revisao, nao significa o m e s m o q u e reparar e erro, pelo m e n o s no a m b i t o civil.
Ja o e x c e s s o de prisao ocorre, s e g u n d o Lenilma Meirelles ( 2 0 0 2 , p. 27), no p e r i o d o d a e x e c u g a o da p e n a , q u a n d o o c o n d e n a d o , por d e s i d i a ou erro, nao e liberado do presidio a p o s regular c u m p r i m e n t o da pena fixada e m sentenga c o n d e n a t o r i a .
A m e s m a autora relata que a possibilidade de erro a b a r c a a atividade jurisdicional comissiva, resultante da d e c r e t a g a o de prisao ditada pelo juiz no exercicio de sua f u n g a o jurisdicional, c o m o c o n s e q u e n c i a de verdadeiro erro de j u l g a m e n t o . E m
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se t r a t a n d o de e x c e s s o de prisao c o m p o r t a , a l e m da agao, a o m i s s a o de qualquer a g e n t e publico na c o n c e s s a o de liberagao do preso depois de c u m p r i d a pena i m p o s t a .
D a n d o c o n t i n u i d a d e ao raciocinio, Lenilma Meirelles (2002, p. 28) d e m o n s t r a a n e c e s s i d a d e de se observar, ainda, a hipotese d e prisao indevida d e c o r r e n t e de erro p r o v o c a d o por atitude dolosa do preso, que induz o juiz e m erro pela utilizagao de d o c u m e n t o s falsos. N e s s a s situagoes, e m que o proprio preso da c a u s a a sua prisao m e d i a n t e c o n d u t a s anti-juridicas, exclui-se a r e s p o n s a b i l i d a d e civil estatal por prisao indevida.
De a c o r d o c o m o p o s i c i o n a m e n t o m a j o r a n t e na doutrina, a prisao indevida constitui u m g e n e r o do qual as prisoes a d v i n d a s do erro judiciario e a q u e l a q u e e x c e d e o t e m p o de c u m p r i m e n t o de pena e s t a b e l e c i d a e m sentenga c o n d e n a t o r i a s a o e s p e c i e s . Entretanto, ha p e n s a m e n t o diverso, c o m o por e x e m p l o , o de Luiz A n t o n i o S o a r e s Hentz (apud L E N I L M A M E I R E L L E S , 2 0 0 2 ) , q u e d e f e n d e ser a prisao indevida diferente do erro judiciario, e m b o r a a m b o s os institutos e s t e j a m previstos no m e s m o dispositivo constitucional e g e r a n d o c o n s e q u e n c i a s j u r i d i c a s iguais, ou seja, a imposigao ao Estado de indenizar o prejudicado pelos d a n o s sofridos.
E necessario esclarecer que a obrigatoriedade de indenizagao ora e m c o m e n t o conserva o carater de direito f u n d a m e n t a l , u m a vez insita no artigo 5°, inciso L X X V d a Constituigao Federal. E, nessa qualidade, nao pode ser modificada ou abolida do o r d e n a m e n t o juridico, posto q u e a propria Carta M a g n a , e m seu artigo 60, § 4 ° , exclui a possibilidade de e s s e s direitos virem a ser objeto de deliberagao m e d i a n t e proposta de e m e n d a t e n d e n t e a expurga-los.
Diante da problematica que e n v o l v e a pratica de prisao ilegal no Brasil, muitos sao os c a s o s v e r i d i c o s q u e v e m a t o n a , e s p e c i f i c a m e n t e e m se t r a t a n d o de m e d i d a s cautelares, motivo pelo q u a l , a t u a l m e n t e , se tern q u e s t i o n a d o muito s o b r e a responsabilidade civil do Estado diante d o s varios tipos de prisoes processuais, q u a n d o d e t e r m i n a d a s s e m a o b s e r v a n c i a d o s requisitos exigidos para sua efetivagao.
Lenilma Meirelles ( 2 0 0 2 , p. 14) argui q u e as prisoes provisorias objetivam garantir a imediata tutela de urn b e m j u r i d i c o para evitar-lhe as c o n s e q u e n c i a s d o
periculum in mora, ligando-se a garantia de u m a provavel e futura e x e c u c a o d e
sentenga c o n d e n a t o r i a .
A professora a c i m a citada t a m b e m t e c e c o m e n t a r i o s s o b r e as e s p e c i e s d e prisoes cautelares r e c e p c i o n a d a s pelo C o d i g o de P r o c e s s o P e n a l : a que resulta de flagrante delito ou de d e t e r m i n a g a o judicial - e m virtude d a p e r s e c u g a o ou do proprio p r o c e s s o penal - tais c o m o : a prisao preventiva, a resultante de sentenga de p r o n u n c i a , e a d e c r e t a d a na prolagao de s e n t e n g a nao transitada e m j u l g a d o .
A s regras gerais disciplinadoras das prisoes p r o c e s s u a i s , inscritas no artigo 2 8 2 e seguintes d e t e r m i n a m q u e , salvo e m caso de flagrante delito, a prisao so se efetiva c o n s o a n t e m a n d a d o escrito da a u t o r i d a d e judicial c o m p e t e n t e , c o m o t a m b e m na presenga d e t o d o s o s requisitos e s t a b e l e c i d o s no art. 285 do C o d i g o de P r o c e s s o P e n a l .
D e a c o r d o c o m o artigo 302, incisos I, II, III, e IV do C o d i g o de P r o c e s s o Penal, c o n s i d e r a - s e e m flagrante quern esta c o m e t e n d o a infragao penal; a c a b a d e c o m e t e - l a ; e p e r s e g u i d o , logo a p o s , pela a u t o r i d a d e , pelo o f e n d i d o ou por q u a l q u e r p e s s o a , e m situagao q u e faga presumir ser autor d a infragao ou e e n c o n t r a d o , logo d e p o i s , c o m
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instrumentos, a r m a s , objetos ou papeis que f a g a m presumir ser ele o autor da infragao. A s s i m , o flagrante e c o n s i d e r a d o c o m o urn ato d e natureza administrativa, realizado de a c o r d o c o m o poder de coergao do Estado e nao o c o r r e n d o , n e c e s s a r i a m e n t e , por o r d e m da autoridade judiciaria. E, pois, a unica e x c e g a o a regra de q u e t o d a prisao d e v e ser d e t e r m i n a d a por lei e m e d i a n t e o r d e m escrita d a autoridade c o m p e t e n t e .
F e r n a n d o da Costa T o u r i n h o Filho ( 2 0 0 1 , p. 526) e s c r e v e , e m outros t e r m o s , que a prisao preventiva constitui m e d i d a restritiva d e liberdade, ditada pelo m a g i s t r a d o e m qualquer f a s e do p r o c e d i m e n t o inquisitorial ou d a instrugao criminal, c o m o m e d i d a cautelar apta a garantir e v e n t u a l e x e c u g a o d a pena e para preservar a o r d e m publica, e c o n o m i c a , ou por c o n v e n i e n c i a d a instrugao criminal.
No artigo 3 1 2 do C o d i g o de P r o c e s s o Penal e n c o n t r a m - s e tanto os p r e s s u p o s t o s q u a n t o os f u n d a m e n t o s que d a o respaldo a custodia preventiva. A q u e l e s se c o n s t i t u e m na existencia do c r i m e e nos indicios suficientes d a autoria; j a os f u n d a m e n t o s c o n s i s t e m na garantia da o r d e m publica, d a o r d e m e c o n o m i c a , na q u e s t a o da c o n v e n i e n c i a da instrugao criminal ou para a s s e g u r a r a aplicagao d a lei.
E m s u a dissertagao de m e s t r a d o , Lenilma Meirelles ( 2 0 0 2 , p. 16) ainda analisa u m a outra m o d a l i d a d e de custodia provisoria, que e a prisao d e c o r r e n t e de sentenga de p r o n u n c i a . A p r e s e n t a c o m o f u n d a m e n t o , e claro, a s e n t e n g a d e pronuncia, proferida por o c a s i a o do e n c e r r a m e n t o d a primeira f a s e do p r o c e d i m e n t o proprio d o s crimes d o l o s o s - judicium accusationis. C o s t u m a - s e justificar o c a b i m e n t o d a prisao m e d i a n t e a alegagao de q u e a f a s e preliminar d o p r o c e d i m e n t o e x p e r i m e n t a r a os rigores d o contraditorio - c o m presenga de a c u s a d o r e d e f e s a - resultando e m u m a definigao d a culpa i m p u t a d a ao reu.
Outro a r g u m e n t o a favor d a m a n u t e n c a o d e s s e tipo de prisao e o q u e se f u n d a na impossibilidade de sua a d m i s s a o inaudita altera pars, pelo q u e o f e r e c e maior s e g u r a n c a ao julgador, na probabilidade de culpa do agente. N a o o b s t a n t e e s s a s c o n s i d e r a g o e s , presentes na doutrina classica, e s s e tipo de prisao deixou de ser r e c o m e n d a d a , c h e g a n d o a cair e m d e s u s o e nao s e n d o mais a u t o m a t i c a a sua decretagao.
A p e s a r de a Constituigao Federal hodierna ter trazido no s e u texto a possibilidade de indenizagao para os c a s o s de erro judiciario e prisao indevida, o q u e se ve c o m m a i s f r e q u e n c i a e a incidencia de prisao ilegal, configurada atraves da d e c r e t a g a o das prisoes cautelares a c i m a c o m e n t a d a s .
O fato de a Lei Maior explicitar a previsao d e indenizagao para os dois c a s o s j a analisados nao exclui a possibilidade de cobertura perante outras hipoteses. A intengao do legislador foi clara, no sentido de d e m o n s t r a r os c a s o s e m que a indenizagao tern q u e se dar, p o r e m o referido permissivo legal nao retira a c h a n c e de o Estado vir a ressarcir o particular por ilegalidade d a prisao.
Se aquele que e c o n d e n a d o e p a s s a m a i s t e m p o na prisao d o q u e o necessario tern direito a receber indenizagao, e n t a o por q u e o individuo que s e q u e r foi c o n d e n a d o , p r o c e s s a d o ou indiciado, se preso ilegalmente, nao m e r e c e igual protegao por parte do E s t a d o ?
^ A Carta M a g n a a p r e s e n t a lacuna n e s s a q u e s t a o , pois deveria esmiugar as hipoteses de indenizagao por parte do Estado diante d a ilegalidade d a prisao, para nao permitir o risco d e que e s s e dispositivo seja interpretado e aplicado s o m e n t e q u a n d o a restrigao d a liberdade pessoal se f u n d a r no erro judiciario ou no c a s o de prisao que e x c e d a o prazo m a x i m o de sua duragao.
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R e t o m a n d o o raciocinio outrora f o r m u l a d o , t e m - s e q u e o principal f u n d a m e n t o para e x p u r g a r a c o n c e s s a o da indenizagao e s t a b e l e c e que o E s t a d o , q u a n d o efetua prisoes processuais, o faz e m n o m e d a m a n u t e n g a o da o r d e m e d a pacificagao social, exercitando urn p o d e r - d e v e r que Ihe e inerente: o jus puniendi, por m e i o do qual se d e s e n v o l v e atividade tipica na perseguigao do crime.
— T o d a v i a , e n t e n d e - s e q u e e s s e c o m b a t e ao crime d e v e a c o n t e c e r de maneira o
mais criteriosa p o s s i v e l , o b s e r v a n d o os principios c o n s t i t u c i o n a l m e n t e a s s e g u r a d o s a t o d o s os c i d a d a o s , o inestimavel direito da liberdade e s e m e s q u e c e r da garantia q u e esta contida no artigo 5°, L X I , d a Constituigao Federal de 1988, de q u e n i n g u e m sera c o n s i d e r a d o c u l p a d o ate o transito e m j u l g a d o de sentenga penal c o n d e n a t o r i a , q u e c o n s a g r a o principio do e s t a d o de inocencia.
A d e m a i s , se a prisao nao for d e c r e t a d a de a c o r d o c o m circunstancias de real n e c e s s i d a d e , o particular p o d e r a ingressar c o m o r e q u e r i m e n t o para c o n c e s s a o de m e d i d a s cabiveis, c o m o o r e l a x a m e n t o , habeas corpus e liberdade provisoria, a l e m de pleitear indenizagao pelos d a n o s o c a s i o n a d o s .
2.3 F u n d a m e n t o s da responsabilidade civil do Estado frente a prisao ilegal
S a b e - s e q u e a Constituigao Federal garantiu o direito a liberdade de l o c o m o g a o , c o m o corolario d a liberdade p e s s o a l , e previu a obrigagao do Estado indenizar a q u e l e c o n d e n a d o por erro judiciario ou o que ficou preso a l e m do t e m p o fixado na sentenga -prisao indevida. Resta tratar, ainda, d a responsabilidade civil do Estado diante dos varios tipos de prisao provisoria.
" A principal justificativa para a indenizagao d e c o r r e n t e d a prisao ilegal esta e m b a s a d a e m alguns dispositivos constitucionais, c o m o e o caso do proprio artigo 5°, LXXV, bastante e s t u d a d o e m topicos anteriores. M a s , para Lenilma Meirelles (2002, p. 36) nao se d e v e aplicar u m a interpretagao u n i c a m e n t e literal a e s s e artigo, pelo que se c h e g a a c o n c l u s a o de que a indenizagao por parte do E s t a d o nao e s o m e n t e devida q u a n d o se tratar de prisao advinda de erro judiciario ou e m virtude de prisao que e x c e d e o t e m p o de pena fixada e m s e n t e n g a c o n d e n a t o r i a , m a s t a m b e m na hipotese de prisao ilegal. O s que atribuem valor absoluto a letra d a lei, afirma a professora, i n d e p e n d e n t e m e n t e d o s e u significado contextual e d o s resultados decorrentes da realidade, c o m e t e m urn g r a n d e p e c a d o .
Deve-se, pois, extrair d a Constituigao Federal a m a x i m a eficacia possivel, inclusive q u a n d o se trata de p r o b l e m a concreto a ser s o l u c i o n a d o . A n o r m a constitucional nao d e v e ser apreciada i s o l a d a m e n t e , m a s na totalidade do contexto e m que esta inserida, e v i t a n d o contradigoes. E preciso se ater a razao q u e levou o legislador a formular tal n o r m a p o r q u e , e m s e d e de responsabilizagao estatal, nao ha b a s e para excluir a prisao ilegal, pois se ha indenizagao e m virtude de erro na prolagao de sentenga c o n d e n a t o r i a , persistira o direito, t a m b e m , e m c o n s e q u e n c i a de prisao ilegal.
— Outro artigo constitucional que da sustento a responsabilizagao civil do Estado por efetivagao de prisao ilegal e o 37, § 6 ° q u e , repita-se, e n u n c i a s e r e m as p e s s o a s j u r i d i c a s de direito publico e as de direito privado prestadoras d e servigo publico
r e s p o n s a v e i s pelos d a n o s que s e u s a g e n t e s , n e s s a q u a l i d a d e , c a u s a r e m a terceiros. Da m e s m a f o r m a que se suscitou, a n t e r i o r m e n t e , a possibilidade de u m a interpretagao c o n f o r m e a realidade, igualmente p r o p o e - s e , agora, u m a interpretagao feita e m
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c o n j u n t o c o m outros artigos, ou seja, r e l a c i o n a n d o - s e o artigo 37, § 6 ° c o m o artigo 5°, L X X V do Pacto F u n d a m e n t a l de 1988, haja vista q u e a m b o s c o n s e r v a m a natureza de direito f u n d a m e n t a l e c o n s t i t u e m dever do Estado e garantia d o cidadao.
N e s s e d i a p a s a o , a maioria d o s d o u t r i n a d o r e s patrios v e m c o n s i d e r a n d o , c o m a m p a r o na Lei Maior, que qualquer violacao aos direitos d a p e r s o n a l i d a d e i m p o e ao ofensor a obrigagao d e indenizar o prejudicado por d a n o s m o r a i s , m e s m o nao c o n s t a t a d a a existencia de d a n o s materiais. C o m relacao ao Estado nao poderia ser diferente: a f u n d a m e n t a c a o se d a c o m a a p l i c a c a o do artigo 5°, LXXV, da Constituigao Federal, q u e tutela o direito a liberdade individual e n q u a n t o direito d a personalidade -e c o m a obrigagao imposta ao Estado d -e ind-enizar os d a n o s m o r a i s -e patrimoniais a d v i n d o s d a prisao ilegal.
Lenilma Meirelles ( 2 0 0 2 , p. 34) a r g u m e n t a q u e a l e m do f u n d a m e n t o constitucional, a reparagao por parte d o Estado frente a prisao civil e t e m a d e v e r a s c o n s t a n t e d o s pactos internacionais r e c e p c i o n a d o s pelo Brasil, m o r m e n t e o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Politicos e o Pacto de San J o s e d a Costa Rica.
O u t r o s s i m , a Carta M a g n a acolhe a teoria m o n i s t a nacionalista, aplicavel aos tratados internacionais, p r e s c r e v e n d o no artigo 5°, § 2 ° q u e "os direitos e garantias e x p r e s s o s nesta Constituigao nao e x c l u e m outros d e c o r r e n t e s d o regime e d o s principios por ela a d o t a d o s , ou d o s tratados internacionais e m q u e a Republica Federativa do Brasil seja parte" e ressalvando q u e as n o r m a s d i t a d a s n e s s e s tratados nao d e v e m ir de e n c o n t r o as proprias n o r m a s c o n s t i t u t i o n a l s .
A p r o v a d o pelo Decreto Legislativo n°. 2 6 6 , d e 1 2 . 1 2 . 9 1 , e p r o m u l g a d o pelo Presidente d a Republica atraves d o Decreto n°. 5 9 2 , d e 0 6 . 0 7 . 9 2 , de a c o r d o c o m Lenilma Meirelles ( 2 0 0 2 , p. 34) o Pacto Internacional s o b r e Direitos Civis e Politicos faz
muitas referencias ao status libertatis do c i d a d a o , b e m c o m o a sua restrigao e a d e c r e t a g a o de prisao. S e n a o , veja-se:
Art. 9°: omissis.
1. Toda pessoa tern direito a liberdade e a seguranga pessoais. Ninguem podera ser preso ou encarcerado arbitrariamente. Ninguem podera ser privado de sua liberdade, salvo pelos motivos previstos em lei e em conformidade com os procedimentos nela estabelecidos.
2. omissis.
3. (...) A prisao preventiva de pessoas que aguardam julgamento nao devera constituir a regra geral, mas a soltura podera estar condicionada a garantias que assegurem o comparecimento da pessoa em questao a audiencia, a todos os atos do processo e, se necessario for, para a execugao da sentenga.
4. omissis.
5. Qualquer pessoa vitima de prisao ou encarceramento ilegal tera direito a reparagao.
6 a 13. omissis.
14. Se uma sentenga condenatoria passada em julgado for posteriormente anulada ou quando urn indulto for concedido, pela ocorrencia ou descoberta de faros novos que provem cabalmente a existencia de erro judiciario, a pessoa que sofreu a pena decorrente dessa condenagao devera ser indenizada, de acordo com a lei, a menos que fique provado que se Ihe pode imputar, total ou parcialmente, a nao-revelagao do fato desconhecido em tempo util.
P e r c e b e - s e q u e o Pacto Internacional de Direitos Civis e Politicos traz no s e u bojo disposigoes d e g r a n d e importancia para o Direito P r o c e s s u a l P e n a l , s e n d o r e c e p c i o n a d o pela atual Constituigao F e d e r a l . I m p o e , d e v e r a s , interpretagao m a i s a m p l a d o s dispositivos constitucionais, a e x e m p l o d o art. 5°, LXXV, b e m c o m o o q u e s t i o n a m e n t o e a releitura de varios preceitos e n c o n t r a d o s na legislagao patria.
S e g u n d o e n s i n a m e n t o d a professora Lenilma Meirelles (2002, p. 35) o Pacto de S a n J o s e da Costa Rica, a p r o v a d o pelo C o n g r e s s o Nacional pelo Decreto Legislativo n°. 27, de 2 5 . 0 9 . 9 2 , t e n d o o Brasil d e p o s i t a d o s u a carta de a d e s a o e m 2 5 . 0 9 . 9 2 e d e t e r m i n a d o o s e u fiel c u m p r i m e n t o por via do Decreto n° 6 7 8 , de 0 6 . 1 1 . 9 2 , recepciona t a m b e m , i n u m e r o s preceitos r e l a c i o n a d o s ao direito de liberdade.
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Entretanto, e s s e d i p l o m a internacional foi m e n o s o u s a d o q u e o Pacto s o b r e Direitos Civis e Politicos, ja que nao fez m e n g a o a indenizagao por prisao ilegal, enfatizando a p e n a s o repudio as prisoes arbitrarias.
Destarte, e facil concluir que a violagao de liberdade, ocorrida mais p r e c i s a m e n t e na decretagao de prisoes ilegais, a c a b a por provocar d a n o s na esfera de direitos do individuo, fato que obriga o Estado civilmente, ou seja, i m p o e o d e v e r de indenizar.
C A P I T U L O
3 DA OBRIGAQAO DE INDENIZAR
Diante de t u d o o q u e ja se m e n c i o n o u , e m capitulos anteriores, acerca d a obrigatoriedade d a indenizagao por parte do Estado, c u m p r e realgar, neste ponto, o s a s p e c t o s proprios d o s m e c a n i s m o s existentes para s e r e m utilizados c o m o f o r m a de pleitear a v e r s a d a reparagao.
3.1 O r e c o n h e c i m e n t o da ocorrencia do d a n o moral e material na prisao ilegal
Pela d e m o n s t r a g a o feita nos c a p i t u l o s a n t e c e d e n t e s , p o d e - s e constatar que a prisao ilegal viola a Constituigao F e d e r a l , u m a v e z que esta g a r a n t e a d i g n i d a d e da p e s s o a h u m a n a e s t a b e l e c e n d o , no caput do artigo 5°, que "todos s a o iguais perante a lei, s e m distingao de qualquer natureza, g a r a n t i n d o - s e a o s brasileiros e a o s estrangeiros residentes no Pais a inviolabilidade do direito a vida, a liberdade, a igualdade, a seguranga e a p r o p r i e d a d e " (grifo nosso) e, ainda, e m seu inciso X que "sao inviolaveis a intimidade, a vida privada, a honra e a i m a g e m das p e s s o a s a s s e g u r a n d o o direito a indenizagao pelo d a n o material ou moral d e c o r r e n t e de sua violagao".
Materializada a responsabilidade do Estado e o c o r r e s p o n d e n t e dever de indenizar, faz-se necessario, neste m o m e n t o , tecer alguns c o m e n t a r i o s a c e r c a d o d a n o . Indenizagao s e m d a n o caracteriza e n r i q u e c i m e n t o ilicito para a quern r e c e b e , e p e n a imposta, injustamente, para quern paga.
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A reparagao surge, e n t a o , c o m o meio habil a reconstituir o b e m juridico lesado e coloca-lo nas m e s m a s c o n d i c o e s e m que se e n c o n t r a v a a n t e s do d a n o . Essa reconstituicao pode ocorrer atraves da troca do b e m por outro d a m e s m a e s p e c i e o u m e d i a n t e indenizagao e m dinheiro.
A legislagao patria, c o m o outrora ressaltado, a b a r c a d u a s f o r m a s de reparagao, referentes a incidencia de d a n o s patrimoniais e d a n o s extrapatrimoniais ou morais.
Ja constitui p e n s a m e n t o a s s e n t e na doutrina civilista e jurisprudencia patrias a hipotese d e c u m u l a g a o d a s indenizagoes por d a n o material e m o r a l originados do m e s m o fato, c o n f o r m e esta e s t a t u i d o na S u m u l a 37 do S u p r e m o Tribunal Federal.
E m se tratando de d a n o material, Lenilma Meirelles (2002, p. 41) considera-o c o m o s e n d o a q u e l e e m se que p r e s s u p o e u m a o f e n s a ou diminuigao de d e t e r m i n a d o s valores m o n e t a r i o s , urn verdadeiro estrago feito no patrimonio presente e futuro, ou seja, a titulo de d a n o e m e r g e n t e - c o m a efetiva redugao do q u e j a existia; ou lucro c e s s a n t e - c o m a privagao de valores que s e r i a m i n c o r p o r a d o s se a agao d e outrem nao h o u v e s s e i m p e d i d o o g a n h o .
W i l s o n Melo d a Silva (apud R O D R I G U E S , 2 0 0 2 ) , d e s c r e v e os d a n o s morais c o m o s e n d o as "lesoes sofridas pelo sujeito flsico ou p e s s o a natural d e direito e m s e u patrimonio ideal, e n t e n d e n d o - s e por patrimonio ideal, e m contraposigao a patrimonio material, o c o n j u n t o de tudo aquilo q u e nao seja suscetivel de valor e c o n o m i c o " .
Estabelecido o liame entre o d a n o patrimonial e a prisao ilegal, v e - s e que e preciso analisar o c a s o concreto para, entao, constatar a real existencia do prejuizo sofrido e fixar o quantum indenizatorio.
Relativamente a o s d a n o s morais, e s s e s s a o os que mais i n t e r e s s a m , pois a violagao ao direito de liberdade pessoal c a u s a graves d a n o s a d i g n i d a d e da p e s s o a ,
c a u s a n d o - l h e dor, tristeza e h u m i l h a c a o , haja vista q u e , c o m o e cedico, as celas t o r n a r a m - s e j a u l a s perigosas, sujeitando os p r e s o s a c o n s t r a n g i m e n t o s varios, inclusive de o r d e m sexual.
Rudi L o e w e n k r o n , D e s e m b a r g a d o r do Tribunal de Justica do Estado do Rio de J a n e i r o , ao m a n i f e s t a r seu v o t o e m j u l g a m e n t o d e A p e l a c a o Civel n.° 9 8 . 0 0 1 9 . 6 4 0
-1 4a C a m a r a C i v e l , salientou q u e :
No tocante ao dano moral isto e o sentimento de constrangimento e/ou humilhagoes, embora algumas testemunhas que depuseram nao o tenham declarado, o certo e que o ofendido nao se sentiu bem com a coisa toda, mostrando-se constrangido por ter que entrar pela primeira vez em uma delegacia e pelo temporario carceramento do seu ir e vir. Alias a detengao feita por policiais fardados em plena rua mais o temporario carceramento da liberdade em uma Delegacia, ainda que nao dentro de uma cela e fato que humilha e constrange quern tern algum grau de sensibilidade. Nao e mero contratempo. Por isso aceitavel que o A. tenha se sentido humilhado e diminuido.
C o n t u d o , q u e s t a o de dificil resolugao e a fixagao do quantum indenizatorio d e c o r r e n t e do d a n o m o r a l . S o b r e o t e m a , Lenilma Meirelles (2002, p. 43) e s c l a r e c e q u e a jurisprudencia nacional o f e r e c e a l g u m a s regras ou criterios que p o d e m ser utilizados para se aferir o m o n t a n t e c o r r e s p o n d e n t e a reparagao, a saber: a g r a v i d a d e e r e p e r c u s s a o do ato d a n o s o , a intensidade do s o f r i m e n t o imposto a vitima, a c a p a c i d a d e e c o n o m i c a do o f e n s o r e a posigao social e politica do o f e n d i d o .
Entretanto, a citada autora s e g u e p r e l e c i o n a n d o q u e o q u e se c o n s t a t a e m t e r m o s praticos e a incidencia d e certa p a r c i m o n i a aplicada aos valores fixados a titulo de indenizagao por d a n o s morais, os quais nao r e c o m p e n s a m a vitima de m a n e i r a satisfatoria, d e f o r m a que a s a n g a o imposta pelo Estado nao logra inibir a pratica de tais atos.