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PLANEJAMENTO URBANO E AMBIENTE DIGITAL

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Vol. 16, Nº. 23, Ano 2012

Christiano Piccioni Toralles

Universidade Federal de Pelotas - UFPel kicotoralles@gmail.com

Carlos Alexandre Michaello Marques

Faculdade Anhanguera de Rio Grande prof.alexandre@mmpadvogados.com

RESUMO

O fenômeno de intensa urbanização percebido em qualquer parte do mundo, em especial no Estado brasileiro, reforça o papel das cidades enquanto local de oportunidades e também marca o espaço urbano por diversos problemas, instigando a ciência urbana e os profissionais responsáveis pelo planejamento e gestão das cidades. Com o desenvolvimento da computação, o uso da tecnologia como instrumental para aplicação de teorias e modelos permitiu avanços nas técnicas de modelagem urbana e simulação, possibilitando que esses instrumentos possam ser incorporados ao processo de planejamento urbano, em sistemas de suporte à decisão, aliando base técnica e científica consistente ao conhecimento empírico e imaginação. Sendo assim, o presente artigo aborda a temática do urbanismo contemporâneo e da modelagem urbana, trazendo paradigmas, conceitos e técnicas (com destaque para a Teoria de Grafos e Autômatos Celulares), como também apresentando os modelos implementados nos softwares Medidas Urbanas® e SACI® e discutindo a operacionalidade. Palavras-Chave: modelagem urbana; planejamento urbano; sistemas urbanos.

ABSTRACT

The phenomenon of urban growth, perceived anywhere in the world, reinforces the role of cities as a place of opportunities, but also marks the urban space by a lot of problems, leading researchers, managers and urban planners to think about this reality and seek solutions. With the computing development, the use of technology as instrumental to theories and models application, has enabled advances in the techniques of urban modeling and simulation, enabling these tools to be incorporated into decision support systems and urban planning process, combining technical and consistent scientific basis with empirical knowledge and imagination. Therefore, this article addresses the issue of contemporaneous urbanism and urban modeling, bringing paradigms, concepts and techniques (with emphasis on Graph Theory and Cellular Automata), as well as presenting the models implemented in softwares Medidas Urbanas® and SACI® and discussing the operation.

Keywords: Urban modeling; Urban planning; Urban systems; GIS; Geosimulation; Decision support.

Anhanguera Educacional Ltda. Correspondência/Contato

Alameda Maria Tereza, 4266 Valinhos, São Paulo CEP 13.278-181 rc.ipade@anhanguera.com Coordenação

Instituto de Pesquisas Aplicadas e Desenvolvimento Educacional - IPADE Artigo Original

Recebido em: 16/09/2011 Avaliado em: 12/05/2012

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1. INTRODUÇÃO

Ao longo, principalmente, do século XX e início de XXI, o processo da urbanização – ou seja, de conversão de solo natural ou rural em solo urbano e de concentração cada vez maior de pessoas vivendo em cidades – tem sido percebido como um fenômeno contínuo, crescente e de escala mundial. Mesmo com o advento da Internet, que tem possibilitado à humanidade entrar em um novo paradigma, referente às redes virtuais – as quais permitem que se possa, sem sair da própria casa, fazer compras e aplicações financeiras, manter contatos sociais e profissionais, visitar museus e bibliotecas, etc. –, ainda assim, as estruturas reais das cidades seguem atrativas à vida humana. Se em 1900 as cidades concentravam menos de 15% da população mundial, o número atual já superou os 50% e estimativas apontam que o percentual seguirá aumentando, principalmente em países

subdesenvolvidos ou em desenvolvimento (BRAKARZ, 2002; SOUZA, 2003; UN-HABITAT,

2008). Em alguns países, esses percentuais já apresentam valores altos, tais como o Brasil, onde a quantidade de população que vive em meio urbano se aproxima de 85% (IBGE, 2010).

Esse cenário de urbanização reforça o papel das cidades enquanto lócus de oportunidades de mercado, trabalho, oferta de serviços, relações sociais; de centro de gestão e poder; de diversidade cultural, tipológica, de arranjos produtivos, etc. Por outro lado, a produção do espaço urbano tem sido marcada pela segregação espacial (étnica e/ou socioeconômica), rarefação de facilidades (serviços, equipamentos, infraestrutura), poluição (do ar, hídrica, visual, sonora), violência, retenção especulativa e déficit habitacional, entre outros problemas. A atração e o crescimento das cidades instigam pensadores, pesquisadores, planejadores e gestores, os quais buscam tecer reflexões sobre o espaço e as forças que o constroem e reconstroem, bem como propor formas de solucionar os problemas inerentes às urbes.

Desde, principalmente, o início do último século, vários autores têm traçado modelos e teorias sobre questões sócio-espaciais do espaço urbano, de modo a representar e interpretar a lógica dos processos intrínsecos à dinâmica e à configuração das cidades. Aproximadamente a partir da metade do século XX, com o desenvolvimento da tecnologia computacional e a crescente ampliação de sua capacidade de armazenamento e processamento de dados, abre-se o campo para a modelagem urbana, permitindo explorar teorias e, com base nelas, simular cenários (normalmente de futuro).

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alternativas; consideração de limites, restrições, potencialidades, [...] prejuízos e benefícios; possibilidade de diferentes cursos de ação”. Ainda que siga esses elementos, a atividade de planejamento muitas vezes pressupõe um caráter simplesmente intuitivo, baseado na experiência empírica adquirida, e utiliza, no caso do Brasil, instrumentos tradicionalmente normativos (códigos de posturas, planos diretores, etc.). São instrumentos pautados em regras fixas de uso e ocupação do solo (zoneamentos, índices, gabaritos, etc.) que, conforme alerta Krafta (2008, p. 2), se fossem rigorosamente respeitados, levariam às transformações da cidade a um quadro já pré-estabelecido, sem necessidade de monitoramento, o que não condiz com a realidade inerente à complexidade das urbes e, segundo Peres (2010, p. 16) são ineficientes para estabelecer uma política social justa e combater a degradação ambiental.

O planejamento urbano, conjuntamente à gestão, necessita assimilar uma postura crítica e, enquanto atividade técnica e científica, não pode prescindir de razão instrumental (SOUZA, 2001). O uso de instrumentos tecnológicos, como a modelagem urbana, podem se constituir como um método alternativo de planejamento, sendo incorporados em sistemas gerenciais de suporte à decisão, propiciando a agregação qualitativa de uma postura técnica analítica e científica ao processo. Por exemplo, a modelagem urbana permite a verificação das relações de causa-efeito entre as ações propostas pontualmente e localmente e suas possíveis reações na totalidade do sistema, simulando cenários de futuro. Evitando incorrer no erro da crença em resultados rigidamente e verdadeiramente preditivos, a construção de cenários alternativos fornece prognósticos para avaliação crítica, aliando-se à experiência empírica, intuição e imaginação (SOUZA, 2002), através de base consistente de fundamentação técnica e científica.

Sendo assim, em um momento de intensa urbanização, o presente artigo objetiva abordar a temática da modelagem enquanto instrumental tecnológico passível de ser utilizada para o planejamento das cidades e, consequentemente, a gestão do espaço urbano. Inicialmente são apresentados alguns paradigmas contemporâneos da ciência urbana, os quais estão presentes na lógica de construção dos modelos urbanos. Na sequência, a definição do que são modelos – e, mais especificamente, modelos urbanos – busca auxiliar a compreensão do leitor para, logo após, introduzir à modelagem urbana, apresentando duas técnicas usadas – grafos e autômatos celulares – e modelos implantados em softwares brasileiros – o Medidas Urbanas® e o Simulador do Ambiente da Cidade® (SACI) – e discutindo sobre a integração de modelos ao ambiente de sistemas de informações geográficas (SIG). Por fim, abre-se espaço para discussão sobre a

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operacionalidade dos modelos urbanos, apresentando dificuldades, limitações, possibilidades e continuidades.

2. PARADIGMAS URBANOS CONTEMPORÂNEOS

Segundo Peres (2010, p. 20-21), o entendimento das cidades (e outras estruturas e sociedades complexas) funcionando como máquinas, planejadas sob regras ditadas por um poder maior, de cima para baixo (top-down), perdurou até a metade do século XX, ignorando a aleatoriedade e as decisões individuais que surgem dos múltiplos agentes. Atualmente, a abordagem da cidade como um organismo tem seus estudos direcionados para novos paradigmas, relacionados à teoria de sistemas, complexidade, emergência e auto-organização (POLIDORI, 2004).

Entende-se como sistema o “conjunto de objetos con relaciones internas entre los

proprios objetos e sus atributos”, e seu entorno é formado pelos objetos externos ao sistema

“cuyas alteraciones modifican el sistema” ou “cuyos atributos son modificados por el

funcionamiento del sistema” (HALL, 1968 apud REIF, 1978, p. 31-33). O sistema urbano é o

modo de representar a cidade real (REIF, 1978) através da rede complexa de relações entre seus componentes, articulando interações entre as partes [e também com o entorno natural e tensões exógenas] e estabelecendo uma dinâmica de relações delas com o todo, onde qualquer mudança em um dos componentes pode gerar uma nova rede de relações que partem do nível micro e geram reflexo no nível macro (CONSTANTINOU, 2007; KRAFTA, 2008).

Johnson (2003, p. 28) alerta que a expressão complexidade, costumeiramente relacionada às características das cidades, pode ser interpretada por dois significados, podendo estar relacionada a uma “sobrecarga sensorial”, como também a um sistema de auto-organização.

A cidade é complexa porque surpreende, sim, mas também porque tem uma personalidade coerente, uma personalidade que se auto-organiza a partir de milhões de decisões individuais, de uma ordem global construída a partir de interações locais. (JOHNSON, 2003, p. 29)

Portanto, conforme Johnson (2003, p. 14-17), a complexidade está naqueles sistemas que se adaptam através de um comportamento emergente. Ou seja, quando um sistema tem múltiplos agentes interagindo de diversas formas dinamicamente, seguindo regras locais e sem se perceber nenhuma instrução de nível mais alto, tem-se então um

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uma ordem de nível mais alto, ou seja, gerando um sistema que emana de baixo para cima (bottom-up). Técnicas de modelagem urbana tais como autômatos celulares, têm incluído o comportamento bottom-up dos sistemas urbanos em modelos de representação e simulação dos processos referentes às cidades (MAHANY; GHOLAMALIFARD, 2007).

Esses novos paradigmas da ciência urbana, de certa forma, contrariam o senso comum de sociedades regidas pela administração e liderança de um poder determinista. Por outro lado, fornecem um quadro mais realista dos processos urbanos, que podem ser modelados e, assim, simular cenários com possíveis reflexos de induções e direcionamentos de ações de planejamento, balizando a gestão do espaço com mais eficiência.

3. MODELOS

El hombre ha venido utilizado modelos em todos los períodos de la historia, y podemos decir que el modelo es em sí la herramienta intelectual más antigua de la humanidad. Uma imagem mental utilizada por el pensamiento es un modelo. Los juguetes, los dibujos, las películas y las palabras son otros tantos tipos de modelos. (REIF, 1978, p. 107)

Modelos são representações da realidade, de forma simplificada e compreensível, relevantes para auxiliar o melhor entendimento do objeto que se está estudando (ECHENIQUE, 1975; REIF, 1978). Nas ciências, a simplificação da realidade na forma de modelos tem sido usada por pensadores e pesquisadores, possibilitando desde a interpretação das invisíveis estruturas subatômicas até a explicação do intangível Universo como um todo, passando por modelos que representam as forças que atuam na estrutura de vigas e pilares ou os fenômenos intrínsecos a uma cidade, entre tantos outros. Quanto à tipologia, segundo Echenique (1975, p. 24) e Reif (1978, p. 112-114), os modelos podem ser físicos, quando a realidade é representada por si mesma ou por analogias, ou conceituais, cuja representação se dá através de símbolos. Os modelos físicos se dividem em: icônicos, aqueles cuja simplificação acontece por simples mudança de escala, como fotografias, projetos arquitetônicos e maquetes; e analógicos, que transformam propriedades da realidade para facilitar representá-la, necessitando de legenda, como o caso de mapas temáticos, gráficos, etc. Já os modelos conceituais são divididos em: verbais, aqueles cuja descrição da realidade se dá através do uso da lógica por meio oral ou textual; e simbólicos (ou matemáticos), que abstraem a realidade através de algoritmos e equações matemáticas.

Quanto ao uso, os modelos podem ser classificados como (ECHENIQUE, 1975, p. 21-22; ALMEIDA; MONTEIRO; CÂMARA, 2007, p. 256):

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 Descritivos: têm o objetivo de ser simplesmente explicativos, porém são essenciais, pois, para explorar ou planejar, é necessária uma descrição da realidade.

 Exploratórios: são variações nos elementos constituintes e parâmetros de modelos descritivos, permitindo vislumbrar outras realidades possíveis segundo testes de e se (what if).

 Preditivos: incorporam a variável tempo e visam explorar imagens de futuro, baseados na suposição de que o modelo consegue representar a maneira como a realidade se altera.

 Operacionais: permitem interferência externa do modelador, introduzindo fatores exógenos ao modelo, alterando o comportamento do sistema, visando atingir um estado ótimo.

Modelos urbanos

A interpretação da cidade, dentro da teoria urbana, pode ser feita a partir de sua forma ou das formas que a compõe, ou seja, de sua morfologia. Segundo Moudon (1997, p. 7), a análise morfológica é baseada em três princípios, correspondendo à forma física, escala de

resolução (ou abrangência espacial) e evolução no tempo. Respectivamente:

 A forma urbana é definida por três elementos físicos: as construções (e suas relações com espaços abertos), os lotes e as vias.

 A forma urbana pode ser captada em diferentes níveis de resolução, sendo comuns quatro escalas: edificação/lote (escala edilícia), via/quarteirão (escala de bairro), cidade e região.

 A forma urbana entendida historicamente a partir da evolução temporal dos elementos que a compõe, os quais continuamente são substituídos ou transformados.

Com base em literatura sobre a ciência urbana, dentro de uma abordagem evolutiva, é possível encontrar referências a vários autores que, desde o século XIX, através de relações geográficas, econômicas e sociais da cidade, traçaram teorias e modelos descritivos, visando representar a lógica da configuração e da forma urbana. São exemplos os modelos concêntricos de Von Thünen (1826), Burgees (1925), Christaller (1933) e Alonso (1964); as adaptações setoriais de Hoyt (1939); os núcleos múltiplos de Ullman (1945); as adaptações para as cidades latino-americanas e sua fragmentação de Bähr (1981), Borsdorf (1982) e Janoschka (2002) (BUZAI, 2003; ALMEIDA; MONTEIRO; CÂMARA, 2007; CONSTANTINOU, 2007; PERES, 2010).

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a b c d

e

Fonte: Buzai, 2003; Peres, 2010 Figura 1 – Modelos urbanos descritivos (): a) Burgess, 1925; b) Christaller, 1933; c) Hoyt, 1939;

d) Alonso, 1964; e) evolução latino-americana de Janoschka, 2002.

A partir do final da década de 1950, com os avanços alcançados na área da computação, foi possível o desenvolvimento do campo da modelagem urbana, principalmente nos Estados Unidos e Canadá, inicialmente destinada à simulação de sistemas de transportes – incorporando leis da Física, como a Lei da Gravitação de Newton, à lógica urbana –, alocação de uso do solo e demografia, visando auxiliar na atividade de planejamento das cidades (ALMEIDA; MONTEIRO; CÂMARA, 2007).

4. MODELAGEM URBANA

A modelagem urbana consiste no processo de tradução de teorias urbanas em modelos matemáticos, testados através de experimentações e simulações em ambiente computacional, o qual funciona como laboratório (BATTY, 2009). Tentativas iniciais de modelagem, surgidas a partir da década de 1950, talvez devido à ambição na quantidade de variáveis e no processamento de dados necessário, bem como seu caráter estático, receberam várias críticas e conduziram à superação dos primeiros modelos (ALMEIDA; MONTEIRO; CÂMARA, 2007). Douglas Lee (1973, apud WEGENER, 1994, p. 17), apontou

“sete pecados” encontrados em modelos de larga escala: eram muito abrangentes; eram

muito precários para ser usados por tomadores de decisão; requeriam grande quantidade de dados; eram construídos com pouca estrutura teórica; eram complicados; eram mecânicos; e eram caros.

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Devido à resolução de muitos dos pecados apontados por Lee, ao aumento do poder de uso de computadores pessoais e ao desenvolvimento de ferramentas de SIG, a confiança e dedicação aos modelos foi retomada na década de 1990 (GHENO, 2009). Como contribuições para a evolução dos modelos, a partir daquela década, Wegener (1994) cita a atenção às questões de equidade e sustentabilidade urbanas e a efetiva relação com os sistemas de informações geográficas.

Benenson e Torrens (2004, p. 88), citando o mesmo Douglas Lee, ensinam que o objetivo a que o modelo se destina é que deve conduzir à escolha da metodologia apropriada para sua construção, não vice-versa. Sendo assim, dependendo do objetivo, os modelos podem ter tipos de representação, sistemas descritivos e abordagens técnicas diferenciadas. Uma simplificação utilizada para representar os elementos físicos da forma urbana é o uso de elementos básicos da geometria euclidiana (pontos, retas e planos), descrevendo vetorialmente os espaços construídos e os espaços abertos, mantendo suas relações de conectividades e adjacências. Esse tipo de representação possibilita o uso da Teoria de Grafos aplicada à morfologia, representando a cidade como um sistema estruturado na forma de redes.

Outra forma de representar do espaço é através de grids celulares, que são representações da superfície em matrizes ou malhas de pontos espaçados regularmente (SILVA et al., 2004) , favorecendo as relações contextuais de vizinhança. A conversão dos elementos físicos em grids, podendo integrar a abordagem euclidiana com a leibniziana (POLIDORI; KRAFTA, 2005), é um recurso que permite trabalhar dados complexos de modo espacialmente homogêneo. Esse tipo de representação espacial é uma das características fundamentais de modelos construídos sob a técnica de Autômatos Celulares.

A seguir são apresentadas duas técnicas de modelagem urbana e dois modelos que, respectivamente, usam cada uma delas. A primeira é baseada em grafos, articulando o sistema urbano na forma de rede, propícia para extração de medidas de diferenciação espacial, podendo contribuir para a questão da equidade do espaço urbano; já a segunda é pautada em Autômatos Celulares, que possuem caráter dinâmico e permitem a verificação de processos de mudança do espaço pautados em paradigmas de complexidade, emergência e auto-organização e a integração do meio urbano ao ambiente natural, podendo contribuir para a questão da sustentabilidade.

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Teoria de grafos e medidas urbanas

A representação da cidade a partir de sua malha viária, como um sistema que se estrutura na forma de rede, possibilita a incorporação de propriedades da Teoria de Grafos – um ramo teórico da matemática que provém da topologia e estuda as relações entre os elementos de um conjunto (Figura 2) – em modelos urbanos, de forma a extrair medidas que tenham significado interpretativo. São comumente usadas representações por mapas axiais (Figura 3) – consideradas as mais convenientes para estudos de grandes sistemas, como a morfologia urbana (KRAFTA, 1996; MEDEIROS, 2006) –, os quais são definidos como representações vetoriais lineares do sistema viário, através das maiores retas possíveis de ser traçadas para descrever os acessos diretos através da trama urbana (MEDEIROS, 2006). Representações por espaços convexos, trechos e pontos também são usadas em modelos que aplicam grafos.

Fonte: Gheno, 2009 Figura 2 – Tipos de representação vetorial de um sistema configuracional urbano.

Figura 3 – Exemplo de mapa axial, com recorte para o centro da cidade do Rio Grande, RS,graficado sobre imagem Google Earth.

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Existem variados trabalhos que têm feito uso de medidas urbanas, extraídas de da estrutura morfológica de uma cidade, como variáveis indicadoras de diferenciação espacial – utilizadas, por exemplo, em conjuntos de indicadores de desempenho e qualidade urbana –, tais como as medidas de: acessibilidade, centralidade, conectividade, convergência, oportunidade, distributividade, permeabilidade, integração, sinergia, inteligibilidade, etc., como em Krafta (1996), Mondo (2002), França (2004), Medeiros (2006), Gheno (2009) e Ribeiro (2009), entre outros.

Baseado na Teoria da Lógica Social do Espaço, idealizada por Bill Hillier na década de 1970, o modelo de Sintaxe Espacial é considerado um dos pioneiros entre os modelos configuracionais urbanos que trabalham com grafos. Essa teoria entende o espaço como um elemento ativo, sendo sua configuração espacial capaz de “construir lugares” (FIGUEIREDO, 2004; MEDEIROS, 2006; HOLANDA, 2010).

A configuração da malha viária pode promover a concentração de movimento em certo trecho urbano. Essa concentração de movimento é entendida como o efeito primário da configuração sobre o movimento. Naturalmente o movimento existente atrai certos empreendimentos que naturalmente se beneficiam desses fluxos. Estes novos empreendimentos são interpretados como atratores que, por sua vez, atraem outros empreendimentos e outros fluxos e movimentos, o que seria então um efeito secundário e também multiplicador. (MEDEIROS, 2006)

A Sintaxe Espacial, até os dias de hoje, vem recebendo contribuições e atualizações, que permitem a extração de novas medidas e a programação de novos softwares, tais como o Mindwalk, idealizado por Figueiredo (2005).

Modelo de Centralidade: medida planar e carregamentos

A medida de centralidade “Freeman-Krafta”, proposta por Rômulo Krafta, é extraída com o

Modelo de Centralidade. Essa medida é entendida como a capacidade que um elemento do

sistema tem de participar dos caminhos mínimos entre pares de outros elementos (SABOYA, 2001; FARIA, 2010) e é calculada de forma topológica e, portanto, é mais central o elemento que é mais vezes acessado (Figura 4). Conforme Polidori e Polidori (2006, p. 3), a medida de centralidade é utilizada como indicadora de qualidade locacional, podendo ter correlação com presença de pedestres, fluxo de veículos e concentração de atividades comerciais; e seus valores mínimos podem estar associados a áreas segregadas tanto de baixa quanto de alta renda.

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Figura 4 – Mapa de Centralidade, planar, para a península do Rio Grande, RS, com 3 classes, apresentando em vermelho os maiores valores, em roxo os intermediários e em azul os menores.

A medida pode ser calculada de maneira planar, na qual todos os elementos do sistema são entendidos como detentores de mesmas características, de maneira semelhante à Sintaxe Espacial e, assim, a configuração da malha gera como resposta a organização das atividades no espaço urbano. Todavia, a medida também pode reproduzir a lógica de alteração urbana (MONDO, 2002) quando é calculada com seus elementos tendo recebido “carregamentos”, correspondentes às características particulares do trecho viário (tipo de pavimentação, gabarito viário, rota de transporte coletivo, concentração de atividades, etc., conforme a intenção da análise) ou do grau de atratividade das formas construídas (equipamentos comunitários, shopping centers, etc., chamados por Krafta de BFU (Built Form Unit) (KRAFTA, 1996, SABOYA, 2001; FRANÇA, 2004).

O modelo encontra-se implantado no software Medidas Urbanas1 (POLIDORI; GRANERO; KRAFTA, 2001), o qual opera como um SIG simplificado e que, além do cálculo de medidas urbanas, gera a visualização gráfica dos resultados e tabela com os valores, podendo essa ser exportada para leitura em outros programas de SIG mais avançados. O modelo de Centralidade, assim como outros modelos baseados em grafos, é considerado sistêmico – ou seja, qualquer alteração em uma das partes interfere no resultado do todo – e tem largo potencial para uso exploratório em planos e projetos urbanos, possibilitando testar impactos positivos ou negativos de, por exemplo, aberturas de novas vias, prolongamentos, interrupções de conexões, etc.

1 No software Medidas Urbanas também estão implantados outros modelos baseados em grafos, usados para cálculo das

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Autômatos celulares para simulação de processos urbanos

Autômatos celulares (cellular automata – CA) são objetos de um universo computacional celular que existem no tempo e no espaço, cujas características mudam a partir de regras simples, em função das características dos objetos vizinhos (PORTUGALI, 2000; BATTY, 2005). Técnicas de CA simulam processos onde ações locais geram reflexos de ordem global, ou seja, esses reflexos emergem como consequência de aplicações ou regras que incorporam processos locais. Ainda que modelos sejam simplificações, a possibilidade de simular processos sistêmicos permite incorporar a complexidade na modelagem (BATTY, 2005). Modelos de CA são considerados flexíveis, podendo operar com processos dinâmicos e teorias tanto do campo da complexidade (emergência, auto-organização, caos, fractais, etc.), quanto da Inteligência Artificial (redes neurais artificiais, sistemas especialistas, aprendizagem evolucionária) (ALMEIDA; MONTEIRO; CÂMARA, 2007).

CA podem ser definidos por suas 5 características básicas (Figura 5): grid celular; estado; vizinhança; regras de transição; tempo (TORRENS, 2000; BATTY, 2005). Todavia, Polidori (2004, p. 22) acrescenta que, para representar a cidade, são necessárias adaptações. Essas 5 características podem ser definidas e adaptadas para a representação urbana da seguinte maneira:

 Grid celular: compreende o espaço onde existe o CA. É n-dimensional. Para representação do espaço geográfico (e urbano), comumente se usa CA bidimensionais, não contínuos e células com tamanho ajustado à escala do espaço.

 Estado: cada célula possui 1 estado em cada tempo, dentro de um grupo de estados de saída. São as descrições dos atributos espaciais do ambiente urbano.

 Vizinhança: o estado de cada célula depende do estado e da configuração das células adjacentes a ela. Para a representação da cidade, a vizinhança não se restringe a 4 ou 8 células adjacentes, podendo ser regulada com raios de abrangência.

 Regras de transição: ditam as mudanças no comportamento de cada célula, no espaço de tempo e em função do que existe nela e do que acontece em sua vizinhança; traduzem como um sistema real funciona. Para simulação urbana, as regras tentam replicar processos reais que ocorrem na cidade.

 Tempo: é discreto, não contínuo, que procede em passos iterativos e, através da calibração de variáveis envolvidas nos cálculos, pode conduzir a abstrações de intervalos de tempo reais (meses, anos, décadas, etc.).

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a

b

Fonte: adaptado de Batty (2005).

Figura 5 – Características do CA: a) grid bidimensional com 13x13 células, sendo as células mais escuras possuidoras de estado diferenciado das demais (TORRENS, 2000); b) alguns tipos de vizinhanças comuns

A Equação (1) apresenta a notação básica da representação matemática de um CA, sendo: Celi = célula i; (t+1) = unidade de tempo seguinte; CelViz S = células da vizinhança; t = tempo atual, anterior a (t+1); RegraViz = regra de transformação vinculada à vizinhança.

)}

(Re

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(1)

A utilização de modelos de CA, a partir do final da década de 1980, contribuiu para que fossem feitos avanços efetivos na representação espacial em modelos urbanos, tais como a incorporação das dimensões ambientais, socioeconômicas e políticas (ALMEIDA; MONTEIRO; CÂMARA, 2007).

São exemplos de modelos urbanos que utilizam CA para simulações de mudança de uso do solo intra-urbano: o Dinamica EGO, desenvolvido pelo Centro de Sensoriamento Remoto da Universidade Federal de Minas Gerais; e o Metronamica, desenvolvido por pesquisadores holandeses do RIKS (Research Institute for Knowledge Systems) (FURTADO; VAN DELDEN, 2011). Como exemplo de modelo para simulação de crescimento urbano, pode-se citar: o SLEUTH (Slope, land use, excluded land, urban extend, transportation and hillshading), desenvolvido pelo USGS (US Geological Survey’s Urban Dynamics Research Program); o DUEM (Dynamic Urban Evolution Modeling), elaborado pelo pesquisador Yichun Xie; o SACI (Simulador do Ambiente da Cidade), elaborado pelo pesquisador Maurício Polidori (POLIDORI, 2004); e o Peripherization Model, dedicado à simulação da formação de núcleos de baixa renda na expansão da cidade, elaborado pela pesquisadora Joana Barros (BARROS, 2004).

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Simulador do Ambiente da Cidade (SACI)

O planejamento do espaço urbano, segundo Polidori (2004, p. 11-16), tem tradicionalmente trabalhado com meios isotrópicos, separando cidade e natureza. Enquanto muitos modelos urbanos preocupam-se em representar a cidade apenas por sua área efetivamente urbanizada, os modelos ecológicos têm dificuldades para incluir a influência das cidades, tratadas muitas vezes de forma estática e determinística. Reconhecendo a necessidade de superar as abordagens isotrópicas para estudar a expansão de cidades, foi construído o Simulador do Ambiente da Cidade (SACI), um software que aplica técnicas de CA - integradas à teoria de grafos (Figura 6) - em ambiente de SIG2, a partir de um modelo urbano dinâmico, que considera atributos naturais, urbanos e institucionais através de medidas de centralidade e potencial, considerando resistências à urbanização acumuladas.

a b c

Fonte: Polidori, 2004.

Figura 6 – Teoria de grafos integrada à técnica de autômato celular (a) representação vetorial de pontos interligados em um grafo; b) atribuição de pontos para cada célula de um CA; c) integração entre grafo e CA.

Entende-se como atributos os elementos componentes do sistema heterotrópico, que são vinculados às células e podem gerar tensões de atração ou de resistência à urbanização, relevantes para simular a dinâmica de mudança da realidade. Atributos naturais são aqueles que descrevem o ambiente não urbanizado, tais como cursos d’água, praias, banhados, nascentes, matas nativas, afloramentos rochosos, solos agrícolas, solos erodidos, declividades, etc., bem como relações de proximidades com os esses entes naturais. Atributos urbanos descrevem o ambiente urbanizado, tais como comércios, indústrias, áreas residenciais, equipamentos comunitários, praças e parques, hierarquia viária, densidade demográfica, custo do solo, indicadores socioeconômicos, etc., como também as relações de proximidade. Por fim, os atributos institucionais são aqueles que representam planos e políticas públicas que sejam capazes de intervir no processo de crescimento urbano, tais como impostos diferenciados (IPTU, ISQN, etc.), TO e IA, áreas de valor cultural, zonas de conservação natural, etc.

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entendimento que, a centralidade é capaz de descrever o potencial de mudança do espaço urbano, podendo ser considerada uma indicadora de desequilíbrio locacional no sistema da cidade. Altos valores de centralidade denotam áreas de convergência de interesse, movimento e valor urbano, enquanto baixos valores denotam o oposto. O potencial para mudança se concentra na interface detentora da maior diferença entre os maiores e menores valores de centralidade entre um local e sua vizinhança, pois essa área alia vantagens locacionais com menor custo do solo, maximizando renda do empreendimento. Como essas oportunidades locacionais são logo descobertas e assimiladas pelos concorrentes, o estado inicial do sistema é alterado e o processo se torna iterativo, permanente e complexo (GRANERO; POLIDORI, 2002).

O SACI possui 3 regras de transição (POLIDORI, 2004), sendo que a regra padrão é o potencial de crescimento com limiar (threshold potential), dedicada à produção e crescimento de células urbanas conforme a lógica de centralidade-potencial. A expressão “limiar” se refere à existência de um limite de crescimento que, quando superado, indica possibilidade de problemas ambientais intra-urbanos que passam a necessitar esforços para ser solucionados em novas iterações do processo. Embora pouco explorada, destaca-se também a regra de percolação, que é complementar ao modelo e dedicada à produção e crescimento de células com atributos naturais.

A morfologia do crescimento urbano é reproduzida no modelo com base na distribuição de 5 diferentes tipos de tensões (POLIDORI, 2004; PERES, 2010) (Figura 7):

 Axial: ao longo de caminhos/eixos.

 Axial de buffer: ao redor dos caminhos/eixos.

 Polar: de forma concêntrica, ao redor de um núcleo.

 Difusa 1: distribuídas de forma aleatória, diretamente proporcional a altas centralidades e baixas resistências ambientais.

 Difusa 2: distribuídas de forma aleatória, diretamente proporcional a baixas centralidades e altas resistências ambientais.

a b c d e

Fonte: Polidori, 2004. Figura 7 – Diagramas em formato de CA, representando os tipos de tensões a) axial; b) axial de buffer; c)

polar; d) difusa 1; e) difusa 2.

O SACI possibilita 3 tipos de produtos finais (outputs) para as simulações (POLIDORI, 2004): mapas de resultados na forma de grids, para diversas medidas

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calculadas pelo modelo, tais como, presença de células urbanas (CellType), carregamento urbano (LoadU), natural (LoadE) e institucional (LoadI), resistências naturais (ResistE), urbanas (ResistU) e institucionais (ResistI), centralidade absoluta, centralidades relativas, potencial, etc.; tabelas, que sintetizam os registros de cada iteração; gráficos, como correlações lineares bivariadas e histogramas. A Figura 8 mostra alguns dos produtos finais na forma de mapas de grids, exemplificados a partir da simulação de crescimento exploratória executada para a cidade de Arroio Grande, RS.

a

b

c

d

e

Figura 8 – Exemplos de produtos finais do modelo (cores mais escuras representam os valores maiores), que simula o crescimento urbano da cidade de Arroio Grande, RS, com células de 200x200 metros e 40 iterações (respectivamente as iterações 1, 13, 26 e 40), correspondendo a aproximadamente 40 anos cada: a) fenótipo de células urbanas (CellType); b) carregamentos urbanos (LoadU); c) centralidade relativa tipo 2 (CentR2);

d) potencial; e) resistências naturais (ResistE).

Integração de modelos e SIG

Os sistemas de informações geográficas (SIGs) são ferramentas digitais que possibilitam gerenciar de forma eficiente informações espaciais, armazenando a geometria e os

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raster, próprio para CAs. O uso de geocomputação permite avançar nos recursos de SIG, agregando programação, estatística e análises espaciais (POLIDORI, 2004).

Batty (2007, p. 8) alega que SIGs são plataformas essenciais mínimas para um processo de planejamento efetivo, ainda que não vinculados a nenhum modelo. Todavia, modelos podem complementar os SIGs e, de acordo com Buzai e Robinson (2010, p. 24), avanços na operacionalidade de análises espaciais em ambiente SIG têm sido possibilitados através da vinculação de técnicas de modelagem. Isso vai ao encontro do que diz Torrens (2009), que afirma haver um paradigma de mudança para um novo estilo de SIG, cuja nova geração será guiada por modelos, que representam a evolução da tecnologia existente e, estimuladas por inteligência artificial, conduzem as operações tradicionais dos SIGs para o mundo da dinâmica, com computação proativa (antecipação interativa de necessidades) na Internet, interligando dados a agentes de softwares inteligentes.

5. DISCUSSÕES ACERCA DA OPERACIONALIDADE DE MODELOS URBANOS

Conforme visto nos itens anteriores, o desenvolvimento da modelagem urbana guarda uma relação muito próxima com a evolução da computação, muito embora não siga o mesmo ritmo de crescimento exponencial – no que se refere, principalmente, à capacidade de processamento e de armazenamento de dados – da tecnologia computacional. Peres (2010, p. 124) expõe dificuldades que cientistas sócio-espaciais (arquitetos, urbanistas, geógrafos, sociólogos, etc.), principais responsáveis por estudar as cidades e formular os modelos urbanos, têm com as lógicas de algoritmos e linguagem de programação computacional, que são matérias não presentes na formação acadêmica tradicional dessas profissões.

Também pode contribuir para o desenvolvimento mais lento da produção de modelos a necessidade de seguir alguns procedimentos básicos metodológicos para validação da modelagem, tais como a parametrização e calibração. A calibração do SACI, por exemplo, indicada por Polidori (2004, p. 96-133), é feita por eleição de estados passados, simulação a partir deles e comparação com o estado presente. Carência e imprecisão de dados do passado, presença de externalidades e não linearidade (mudança de intensidade de determinados eventos durante a série temporal) são obstáculos que podem dificultar o processo de calibração. Existe também o dilema na relação entre o tamanho das células do grid e o tempo de processamento: células maiores geram menor tempo de processamento, mas menor a precisão dos resultados; células menores geram maior precisão dos resultados, mas também demandam maior tempo de processamento.

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Além das dificuldades técnicas encontradas no processo de modelagem, existem também outras críticas que interferem na aceitação desse instrumental para o planejamento urbano. Críticos citam a existência de um limite tênue entre a aceitabilidade teórica e a viabilidade prática dos modelos. Enquanto uns focam a crítica nas dificuldades técnicas e metodológicas para implementação computacional aprofundada de determinadas abordagens teóricas, outros apontam que os pesquisadores têm se dedicado muito mais à aprendizagem das técnicas de modelagem e menos à discussão de uma base teórica urbana do mundo real a que se pretende modelar (SOUZA, 2002; ALMEIDA; MONTEIRO; CÂMARA, 2007).

Dos softwares Medidas Urbanas e SACI, aqui apresentados, é sabido que têm sido usados em atividades acadêmicas de ensino e pesquisa, principalmente na Universidade Federal de Pelotas, bem como em projetos de extensão com municípios e em atividades de consultoria, tanto no Brasil, quanto no exterior. Destacam-se as aplicações do Medidas Urbanas no planejamento viário de Matinhos, PR (POLIDORI; POLIDORI, 2006), e do SACI na simulação do crescimento para a cidade de Balcarce, na Argentina, e na pesquisa para doutorado de Mehdi Gholamalifard, no Irã (PERES; POLIDORI, 2009). Ainda assim, é importante destacar as limitações que esses softwares possuem.

O SACI foi construído para funcionar como um aplicativo que roda internamente ao ArcView, um popular software de SIG, porém esse foi tornado obsoleto pela sua fabricante, em razões de atualização para uma nova versão, chamada ArcGIS. Além disso, as versões do ArcView não são compatíveis com os novos sistemas operacionais de Windows de 64 bits, dificultando a aceitação (PERES; POLIDORI, 2009; SARAIVA; POLIDORI, 2009). Conquanto, esforços estão sendo realizados atualmente para a construção de um software independente para o modelo simulador de crescimento da cidade em ambiente celular, chamado CityCell, com pacote de SIG próprio, melhorias na performance de processamento e inclusão de novas regras de transição, como, por exemplo, a regra proposta por Peres (2010, p. 54) para a simulação da influência dos cursos d’água no crescimento urbano, chamada de fator rh.

Incompatibilidade com novos sistemas operacionais é uma limitação que também é encontrada no Medidas Urbanas. Recentemente foi lançada uma nova versão, que se encontra ainda em teste, chamada Morphometrics, com atualizações e inclusão de novos modelos e medidas possíveis de ser extraídas.

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6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A maioria dos modelos urbanos, como os aqui apresentados, surge de experiências acadêmicas, necessitando percorrer um longo caminho de evolução na modelagem, quanto à entrada de dados, calibração, etc., até tornarem-se modelos operacionais. Todavia, o caminho já vem sendo trilhado há décadas, inclusive no Brasil, podendo os planejadores propor estudos exploratórios com os modelos existentes e, assim, auxiliar para que, no futuro, se possa fazer uso deles como instrumentos imprescindíveis para o planejamento e gestão urbana.

De modo oposto às dificuldades e limitações que possam ser encontradas, os modelos de simulação oferecem um vasto campo de potencialidades de aplicação como suporte ao planejamento urbano, tais como:

[...] avaliar impactos ocasionados por transformações na estrutura espacial da cidade; identificar tendências de desenvolvimento; avaliar consequências de mudanças nos regulamentos urbanísticos; testar efeitos diversos de decisões de planejamento; projetar as repercussões sobre o sistema viário, comércio, serviços, habitação, etc.; definir mudanças nos padrões de fluxos; antecipar demandas por infra-estrutura e serviços urbanos; identificar resistências ao crescimento espacial, entre outras. (SOUZA, 2002, p. 32)

Apesar das críticas feitas à tradição de planejamento normativo brasileiro, Krafta (2008, p. 2-3) enxerga na figura do Estudo de Impacto de Vizinhança (EIV), um dos instrumentos de política urbana presentes no Estatuto da Cidade (Lei nº 10.257/2001), uma oportunidade para um planejamento alternativo. Para o autor, o EIV é uma porta que se abre para o desenvolvimento do planejamento urbano do ponto de vista técnico e científico no Brasil.

É importante salientar que os modelos não são capazes de fornecer todas as respostas aos fenômenos urbanos, posto que muitos dos fenômenos ainda estão em estudo. Conforme cita Saboya (2001, p. 8), a finalidade dos modelos não é substituir o planejador e o gestor, mas sim dar suporte ao entendimento dos problemas urbanos, construindo e testando alternativas para sua resolução. Souza (2002, p. 34) ainda acrescenta que é importante reconhecer que sempre haverá a necessidade de uma segunda etapa de análise, complementando os resultados produzidos pelos modelos.

Portanto, norteados por paradigmas contemporâneos de entendimento dos processos que constroem e reconstroem as cidades, os modelos são ferramentas com embasamento teórico e científico, que se constituem em instrumental tecnológico para se incluir no processo de planejamento das cidades como um meio de aliar a racionalidade à subjetividade, ofertando subsídio para qualificar análises e balizar ações dos planejadores e gestores do espaço.

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Christiano Piccioni Toralles

Graduação em Arquitetura e Urbanismo (UFPel, 2008), Especialista em Administração Pública e Gestão de Cidades (Faculdade Anhanguera do Rio Grande,2011), Curso Técnico em Edificações (ETFPel, 1998) e Técnico em Geomática (CTI-FURG, 2001).

Carlos Alexandre Michaello Marques

Advogado. Especialista em Gestão Ambiental em Municípios - FURG e, em Didática e Metodologia do Ensino Superior e MBA em Gestão de Pessoas pela - UNIDERP. Coordenador Pedagógico e Professor da Graduação e Pós-Graduação da Faculdade Anhanguera do Rio Grande. Professor da Faculdade de Direito - FADIR da Universidade Federal do Rio Grande - FURG. Pesquisador do Grupo Transdisciplinar de Pesquisa Jurídica para

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