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ECLI:PT:TRL:2011: TBCLD.L1.1

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ECLI:PT:TRL:2011:1522.07.8TBCLD.L1.1

http://jurisprudencia.csm.org.pt/ecli/ECLI:PT:TRL:2011:1522.07.8TBCLD.L1.1

Relator Nº do Documento

António Santos rl

Apenso Data do Acordão

20/09/2011

Data de decisão sumária Votação

maioria com * dec vot e * vot venc

Tribunal de recurso Processo de recurso

Data Recurso

Referência de processo de recurso Nivel de acesso

Público

Meio Processual Decisão

Apelação procedente

Indicações eventuais Área Temática

Referencias Internacionais Jurisprudência Nacional Legislação Comunitária Legislação Estrangeira Descritores

acção de divórcio; divórcio litigioso; separação de facto; vida em comum dos cônjuges; causa de pedir; deveres conjugais;

(2)

Sumário:

I - A separação de facto por três anos consecutivos , é fundamento de divórcio litigioso, entendendo-se que existe entendendo-separação de facto, para o efeito referido ,quando não existe comunhão de vida entre os cônjuges e há da parte de ambos, ou de um deles, o propósito de não a restabelecer ( cfr. artº 1781º, alínea a), e 1781º, alínea a), ambos do CC ).

II- A separação de facto (causa objectiva do divórcio), verifica-se quando não existe comunhão de vida entre os cônjuges, ou seja, quando v.g. existe separação do leito, mesa e habitação,

acrescendo ao referido elemento objectivo um outro , subjectivo , e traduzido na intenção de ambos os cônjuges, ou de um deles, de romper com a vida em comum.

III- Sendo inquestionável que o facto de dois cônjuges viverem na mesma casa tal não quer dizer, obrigatoriamente, que partilhem o mesmo leito e mesa ( os muros, ainda que invisíveis, podem construir-se e passar a separar - de facto - os cônjuges a residir numa mesma casa , deixando entre ambos de existir efectiva comunhão de vida, ainda que vivendo debaixo do mesmo tecto), do mesmo modo a circunstância de dois cônjuges habitarem uma mesma localidade, mas em casas diferentes, não equivale outrossim, necessariamente, que tenham deixado de manter entre os dois uma comunhão de vida ( v.g. de amizade, convívio, partilha, mesa e leito - ainda que de quando em vez ).

IV- Destarte, provando-se apenas que em 30/04/2005 o A. saiu da casa que foi morada de família e foi viver para o apartamento onde hoje reside , e não se provando que desde há mais de três anos, autor e ré não dormem na mesma cama e não têm qualquer tipo de vida em comum , não pode decretar-se o divórcio com base em separação de facto por três anos consecutivos.

V- O referido em IV mais se justifica quando a separação de facto por três anos consecutivos não integra, sequer, a causa de pedir enunciada na petição inicial como fundamento do divórcio. ( Da responsabilidade do Relator )

Decisão Integral:

Acordam os Juízes na 1ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa *

*

1.Relatório.

A , residente em …., intentou acção de divórcio litigioso contra B , residente também em …. , pedindo que fosse decretado o divórcio entre ambos, com culpa exclusiva da ré, sua mulher.

Para tanto, invocou que há mais de três anos que A e Ré estão separados de facto, a que acresce que, tendo esta última com o seu comportamento incorrido em violação grave e culposa dos

deveres de respeito e cooperação que deveria ter para consigo, tudo comprometeu em definitivo a possibilidade de vida em comum.

Frustrada a conciliação a que alude o art. 1407° do Código de Processo Civil, veio a Ré contestar a acção, e , elaborado o despacho saneador e fixada a matéria de facto relevante ( assente e controvertida ) , teve finalmente lugar a audiência de discussão e julgamento da causa , tendo no seu final sido proferido despacho que fixou quais os factos provados e não provados.

De seguida, foi então proferida decisão/sentença pelo tribunal a quo, sendo o respectivo comando/segmento decisório do seguinte teor :

“ IV -Decisão

(3)

- Decretar a dissolução, por divórcio, do casamento celebrado entre o A….., e a R. …….. ; - Condenar a R. no pagamento das custas da acção (art. 446° do CPC).

Valor para efeitos de custas: o mínimo legal, a calcular nos termos dos arts. 6°, a!. a) e 10°, n" 2 do C.C.J.

Oportunamente, dê cumprimento ao disposto no art. 78° do Código de Registo Civil. Notifique e registe. “

Inconformada com tal sentença, dela apelou então a Ré B….., apresentando na respectiva peça recursória as seguintes conclusões:

A) - Na douta sentença em crise, foram dados como provados, com relevância para os presente recurso, que ( 1. Em 30/04/2005 o A. saiu da casa que foi morada de família, 3. E foi viver para o apartamento onde hoje reside, 6. O A. continua a ir à garagem da casa de morada de família.) B) - Na despacho de resposta à matéria de facto, a Meritíssima Juiz a quo, deu como não provado os factos constantes dos artigos 1. e 2. da Base Instrutória ( 1. - Desde há mais de três anos autor e ré não dormem na mesma cama?, 2. - não têm qualquer tipo de vida em comum? )

C) - Do cotejo dos factos provados e não provados retira-se que, o A., ora recorrido, apesar de residir num outro apartamento, continua a frequentar a casa de morada de família.

D) - O recorrido apenas requereu o divórcio com fundamento na violação grave e culposa, pela Ré, dos deveres conjugais de respeito e cooperação, não com fundamento na separação de facto. E) Em momento algum da lide, alegou a separação de facto por um período superior a três anos. F) - Apesar disso, a Meretíssima Juiz a quo, na sua douta sentença, concluiu não assistir ao A. o direito de ver decretado o divórcio com os fundamentos que invocou de violação dos deveres conjugais de respeito e cooperação, decidindo, porém, que no caso existia uma separação de facto desde 30/04/2005.

G) - Salvo o devido respeito, tão decisão colide com toda a jurisprudência dos Tribunais Superiores e doutrina pacífica e assente.

H) A separação de facto por 3 anos consecutivos é um elemento constitutivo do direito potestativo ao divórcio, ou seja, requisito de natureza substancial e não perante um prazo meramente

processual.

I) - Por se tratar de um prazo de carácter substantivo, tem que se verificar, pelo menos, à data do pedido - nesse sentido (cfr. Ac. do S.T.J de 12.7.77, BMJ n.º 269/156 e Ac. do S.T.J. de 1.3.79, B.M.J. n.º 285/324, Ac. R.E. de 3.7.80, BMJ n.º 302/336.)

J) - Por isso, o tribunal não pode recorrer ao disposto no artigo 663 n.º1 do C.P.C. para ter em consideração o eventual decurso do prazo da separação de facto até ao encerramento da discussão em primeira instância

K)- A Meretíssima Juiz a quo fundamentou a sua decisão na atendibilidade dos factos supervenientes prevista no art.º 663 do cpc.

L) - A aplicação do art.º 663-.º do CPC, com base numa eventual separação de facto não alegada em momento algum, traduz uma alteração da causa de pedir - o fundamento da acção é a violação culposa dos deveres conjugais e na douta sentença em crise, o mesmo foi decretado com base art.º 1781 do CCiv, ou seja, o divórcio ruptura ou divórcio separação pelo decurso do prazo de separação.

M)- o art.º 663.º do CPC começa por ressalvar as "restrições estabelecidas noutras disposições legais, nomeadamente quanto às condições em que pode ser alterada a causa de pedir".

N) - A primeira das quais refere-se à sua compatibilização com a delimitação da causa de pedir. O) - Em segundo lugar, tratando-se de factos essenciais à procedência do pedido, e não de factos

(4)

meramente instrumentais, não podem ser conhecidos oficiosamente pelo tribunal (arts. 264.º, n.º 2, e 664.º do Código de Processo Civil).

P) - A atendibilidade dos factos supervenientes, como excepção ao julgamento de acordo com a situação existente à data da propositura da acção, surge adjectivamente regulada com a figura do articulado superveniente (artigos 506.º e 507.º do Código de Processo Civil).

Q) - Ou seja, para que sejam considerados têm que ser alegados pela respectiva parte interessada, em articulado superveniente, o que, no caso concreto não aconteceu.

R) - Em terceiro lugar, mesmo que o tribunal pudesse servir-se oficiosamente desses factos novos, nunca o poderia fazer sem que fossem ouvidas as respectivas partes em contraditório, como impõem os preceitos do n.º 2 e 3 do art. 3.º do Código de Processo Civil.

5) - Nos termos do art. 664.º do CPC o juiz está impedido de alterar a causa de pedir,

T) - Nos termos do art. 661.º, n.º 1, do CPC, está impedido de decidir sobre objecto diverso do pedido.

U) - Às restrições de ordem processual a que o divórcio pudesse ser decretado com fundamento na separação de facto, acresce a falta de requisitos de ordem substantiva.

W) - É que, no que respeita à separação de facto como fundamento do divórcio, dispõe o art. 1781.º, als. a) e b), do Código Civil, na redacção dada pela Lei n.º 47/98 de 10/08, que são

fundamento do divórcio litigioso "a separação de facto por três anos consecutivos" ou "a separação de facto por um ano se o divórcio for requerido por um dos cônjuges sem oposição do outro". X) -Sobre o conceito de separação de facto que releva para efeitos de divórcio, à luz do dispositivo do n.º 1 do art. 1782.º do Código Civil entende-se, que só há separação de facto, quando não existe comunhão de vida entre os cônjuges e há, da parte de ambos, ou de um deles, o propósito de não a restabelecer.

Y) - Dos factos dados como provados apenas se retira que o recorrido está a residir, desde 30/04/2005 num outro local, continuando a ir à garagem da casa de morada de família.

Z) - O facto de viverem em locais distintos não significa que não mantenham, entre si, contactos regulares e frequentes, ou que não continuem a manter entre si interesses comuns típicos do matrimónio (económicos, afectivos, etc).

AA) - Decidindo como decidiu, na sua douta sentença a Meretíssima Juiz a quo violou,

grosseiramente, os artigos 663.º, 664.º, 661.º, 272.º, 273.º, S06.º e 3.º do CPC e, ainda, os art.º 1781.º e 1782.º do CC.

AB) - Devendo, por isso, ser concedido provimento ao recurso e, em consequência ser revogada a decisão sob recurso, por outra que considere improcedente, por não provado, o pedido do A., ora recorrido.

Assim se fazendo JUSTIÇA

A apelada, não apresentou contra-alegações. *

Thema decidendum

1.1. - Colhidos os vistos, cumpre decidir, sendo que , estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões ( daí que as questões de mérito julgadas que não sejam levadas às conclusões da alegação da instância recursória , delas não constando, têm de se considerar decididas e arrumadas, não podendo delas conhecer o tribunal ad quem) das alegações do recorrente (cfr. artºs. 684º nº 3 e 685º-A, nº 1, ambos do Código de Processo Civil ), as questões a apreciar e a decidir são as seguintes :

(5)

cônjuges pelo período de três anos, pois que, da factualidade provada não resulta sequer a separação de facto entre ambos, entendendo-se como tal a não existência de comunhão de vida entre os cônjuges , acrescida do propósito de ambos, ou de um deles, de não voltar a restabelecê-la.

b) Se deve a sentença apelada ser também revogada porque nela valorou o tribunal a quo

factualidade que o apelante não alegou como causa de pedir do pedido que formulou no sentido de ser decretado o divórcio entre apelada e apelante ;

c) Se o tribunal a quo não podia , sequer , decretar o divórcio com fundamento na separação de facto dos cônjuges pelo período de três anos consecutivos ,pois que, tal pressuposto não se verificava, como se impunha, à data da instauração da acção;

*

2.Motivação de Facto.

Pelo tribunal a quo foram considerados provados os seguintes factos :

2.1.- O Autor e a Ré casaram civilmente e sem convenção antenupcial no dia 3 de Abril de 1976. 2.2.- Em 30/04/2005 o A. saiu da casa que foi morada de família.

2.3.- E foi viver para o apartamento onde hoje reside.

2.4.- O A. saiu de casa na sequência de uma discussão com a R., no decurso da qual esta o acusou de ter uma amante.

2.5.- À data da saída do A. de casa, a mãe do A. tinha sofrido um acidente vascular cerebral, do qual veio a recuperar.

2.6.- O Autor continua a ir à garagem da casa de morada de família. *

3.Motivação de direito.

3.1. Se da factualidade provada resulta a separação de facto entre apelante e apelada, nos termos do disposto no artº 1782, do Código Civil.

Para justificar a procedência do pedido do autor no sentido de ser decretado o divórcio entre Autor e Ré, discreteou-se na sentença apelada e em parte, do seguinte modo :

“ (…)

Não assiste, pois, ao A. o direito de ver decretado o divórcio com os fundamentos que invocou. Porém, o que é certo é que no caso em apreço existe uma separação de facto desde 30/04/2005. Atento o princípio previsto no art. 664° do Código de Processo Civil, que dá ao juiz liberdade plena de "indagação, interpretação e aplicação das regras de direito", há que ponderar, atenta a

separação de facto existente, se se verificam os demais requisitos necessários para o

decretamento do divórcio, nos termos do art. 1781°, al. a), do Código Civil (Acs. STJ de 03/11/2005 e de 06/03/2007, disponíveis em www.dgsi.pt).

Ora, é certo que se verifica a falta de comunhão de vida entre os cônjuges, verificando-se, também, o propósito, por banda do cônjuge A., de não restabelecer a comunhão da vida matrimonial, atento o divórcio peticionado nos presentes autos, sendo que tal separação perdura já há três anos

consecutivos. Não obstante tal prazo apenas se ter completado no decurso da acção, adere-se ao referido no já citado Ac. do STJ de 3/11/2005 que decidiu ser de lançar mão do artigo 663° do Código de Processo Civil, por sobre o "marco de referência temporal" prevalecer "o princípio da actualidade da decisão", sendo, assim, tal prazo atendível.

O art. 1782°, n° 2, do Código Civil, dispõe que, na acção de divórcio com fundamento em

separação de facto, o Juiz deve declarar a culpa dos cônjuges, quando a haja, nos termos do art. 1787°.

(6)

Atenta a factual idade apurada e supra enunciada não se pode concluir pela culpa de qualquer um dos cônjuges na dissolução do casamento. “

Considera todavia a apelante que a factualidade assente não aponta ,com rigor , para que entre os cônjuges tenha existido um statu quo equivalente a separação de facto, para efeitos do disposto no artº 1781, alínea a), do Código Civil.

Vejamos.

O artº 1781º, alínea a), do CC (com a redacção anterior à Lei n.º 61/2008 de 31 de Outubro ) , dispõe que “ a separação de facto por três anos consecutivos“, é fundamento de divórcio litigioso. Por sua vez, esclarece o artº 1782, nº1, do mesmo diploma legal, que “ Entende-se que há

separação de facto, para os efeitos da alínea a) do artigo anterior, quando não existe comunhão de vida entre os cônjuges e há da parte de ambos, ou de um deles, o propósito de não a restabelecer “.

No âmbito das disposições legais referidas, acolhe o legislador o divórcio-remédio (1), porque pressupõe ele um casamento em si mesmo já destruído, ou seja, uma situação de crise do matrimónio, um estado de vida conjugal intolerável, sendo ele o remédio para um tal estado ou situação (2).

A separação de facto ( causa objectiva do divórcio ), como o diz o nº 1, do artº 1782º citado, verifica-se quando não existe comunhão de vida entre os cônjuges, ou seja, quando v.g. existe separação do leito, mesa e habitação, acrescendo ao referido elemento objectivo um outro , subjectivo , e traduzido na intenção de ambos os cônjuges, ou de um deles, de romper com a vida em comum.(3)

Podendo todavia ocorrer que a separação de habitação , de mesa e de leito, não represente necessariamente uma inexistência de comunhão de vida ( v.g. quando na origem da separação estão razões de saúde de um deles ou de ambos, de prisão de um dos cônjuges, ou de

trabalho/missão no estrangeiro) , sustenta Ferreira Pinto (4) que, para caracterizar a inexistência duma comunhão de vida , necessário é que “ os cônjuges não vivam como habitualmente - tendo em atenção as suas idades, os seus estados de saúde, os anos que decorreram desde o

casamento, o meio em que se integram, as suas condições sócio-culturais – vivem marido e mulher , se juntos, têm relações, contactos ou intimidades que não são normais entre dois indivíduos de sexo diferente não casados ou amantisados que vivam sob o mesmo tecto e que, se separados, se comportam como se essa separação lhes seja imposta pelas circunstâncias da vida, sem as quais viveriam juntos, tendo aquelas relações, contactos ou intimidades”.

Dizendo/exigindo a lei que a separação de facto de facto se verifique por três anos consecutivos, necessário é que durante tal período a separação não seja interrompida por reconciliações que, (5) como sucede em matéria de prescrições com os factos que a interrompem, terão como

consequência inutilizar todo o tempo decorrido anteriormente, voltando a correr novo prazo de três anos se se vier a iniciar novo período de separação de facto.

Dito isto e descendo aos factos provados , vemos que , tendo o Autor e a Ré casado civilmente e sem convenção antenupcial no dia 3 de Abril de 1976, em 30/04/2005 o A. saiu da casa que foi morada de família e foi viver para o apartamento onde hoje reside.

Mais se provou que, em 30/04/2005 , o autor saiu de casa na sequência de uma discussão com a Ré/apelante , no decurso da qual esta o acusou de ter uma amante e, na referida data da saída, a mãe do A. tinha sofrido um acidente vascular cerebral, do qual veio a recuperar.

Finalmente, provou-se também que o Autor continua a ir à garagem da casa de morada de família ( de resto, como resulta do cabeçalho da petição, residem ambos em ... ).

(7)

Por outro lado, não obstante quesitado, já não logrou provar-se :

Se “Desde há mais de três anos, autor e ré não dormem na mesma cama ? “ - quesito 1º ; E “ não têm qualquer tipo de vida em comum ?- quesito 2º .

Em face do quando fáctico acabado de pintar, parece-nos, com o devido respeito, que a conclusão a que chegou o tribunal a quo , no sentido de que no caso em apreço existe uma separação de facto desde 30/04/2005, mostra-se de alguma forma assente em factualidade insuficiente e

escassa , pois que, como bem refere a apelante, a circunstância de apelante e apelado viverem em locais distintos de uma mesma cidade, tal não quer dizer, necessariamente, que tenham cortado entre ambos qualquer tipo ( seja económica, de mera amizade, ou até afectiva) de ligação . De resto, se é inquestionável que o facto de dois cônjuges viverem na mesma casa tal não quer dizer , obrigatoriamente, que partilhem o mesmo leito e mesa ( os muros, ainda que invisíveis, podem construir-se e passar a separar - de facto - os cônjuges a residir numa mesma casa , deixando entre ambos de existir efectiva comunhão de vida, ainda que vivendo debaixo do mesmo tecto), do mesmo modo a circunstância de dois cônjuges habitarem uma mesma localidade, mas em casas diferentes, não equivale outrossim, necessariamente, que tenham deixado de manter entre os dois uma comunhão de vida ( v.g. de amizade, convívio, partilha, mesa e leito - ainda que de quando em vez ).

Seja como for, ainda que da factualidade assente pudesse retirar-se a conclusão ( o que é difícil como vimos ) a que chegou o tribunal a quo que no caso em apreço existe uma separação de facto desde 30/04/2005, o certo é que não decorre dela, também, o que se exige como vimos para

efeitos do disposto no artº 1781º, alínea a), do CC, que tal separação verificou-se desde 30/04/2005 , de forma consecutiva e pelo período de três anos ( prazo - de direito substantivo - já completado no decurso da acção ).

É que, se os quesitos ( não provados ) 1º e 2º , tal como formulados ( DESDE HÁ MAIS DE ….) e uma vez provados, permitiam as respectivas respostas concluir estar-se na presença de algo que vinha sucedendo de um modo consecutivo, já o simples facto de, em 30/04/2005 o A. ter saído da casa que foi morada de família e ido viver para o apartamento onde hoje reside, não permite, de todo , concluir por si só que desde então passou a existir e consecutivamente nos três anos

seguintes, uma efectiva separação de facto entre apelante e apelado.

Em face do exposto, e mais considerações não se justificam, procedem portanto as conclusões da apelação nesta parte, a saber, a falta de requisitos de ordem substantiva no que respeita à

separação de facto como fundamento do divórcio e nos termos do disposto no art. 1781.º, als. a) e b), do Código Civil, na redacção dada pela Lei n.º 47/98 de 10/08.

Em consequência, procedendo assim na referida parte os fundamentos do recurso, e conduzindo eles, necessariamente, e por si só, à revogação da sentença recorrida , importa decretar a

absolvição da ré do pedido de divórcio.

Finalmente, a conclusão que antecede, inevitavelmente ,implica que se consideram prejudicadas as demais questões suscitadas na presente apelação ( supra indicadas sob as alíneas b) e c), do item 1.1. do presente Acórdão ), razão porque delas não se impõe aqui e agora conhecer ( cfr. artº 660º, nº 2, e 713º, nº 2 , do CPC ).

Sempre se dirá, todavia, que analisando a petição inicial, tem igualmente razão a apelante quando aduz na apelação que a sentença apelada atende em sede de decisão determinada factualidade que o apelado não alegou/invocou como causa de pedir do pedido que formulou no sentido de ser decretado o divórcio entre apelada e apelante .

(8)

reiteradamente, na sua óptica, terão violado reiteradamente os deveres conjugais de respeito e cooperação.

Ora, como ensina Manuel de Andrade (6), a nossa lei adjectiva, independentemente da natureza do direito deduzido em juízo, exige que a parte declare/identifique , relativamente ao direito invocado “ (…) qual o acto ou facto jurídico donde provenha, e a sentença apenas tomará em conta tal acto ou facto”, o que equivale a dizer, acrescenta, que “ vale entre nós a chamada teoria da substanciação, que exige sempre a indicação do título (acto ou facto jurídico) em que se funda o direito afirmado pelo Autor”.

Conclui assim Manuel de Andrade , que “o objecto da acção - e com ele o objecto da decisão e a extensão objectiva da autoridade do caso julgado que lhe corresponde – se identifica através do pedido e da causa de pedir (arts. 497.º e 498.º)” .

Inequívoco é assim que a causa de pedir exerce uma função individualizadora do objecto do

processo, conformando-o, razão porque, forçosamente, o tribunal tem de a considerar ao apreciar o pedido e não pode basear a sentença de mérito em causa de pedir não invocada pelo autor, sob pena de nulidade da sentença – cfr. artigos 660.º, n.º 2 e 668.º, n.º 1, alínea d), ambos do CPC. Acresce que, não obstante a regra que emerge do disposto no artigo 664.º do CPC, segundo o qual “ O juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito; mas só pode servir-se dos factos articulados pelas partes, sem prejuízo do disposto no artigo 264.º”, tem como pressuposto que tal livre actuação do julgador se encontra balizada pela causa de pedir enunciada na petição inicial .

É que, como ensina A. dos Reis (7), não basta que haja coincidência ou identidade entre o pedido e o julgado; é necessário, além disso, que haja identidade entre a causa de pedir ( causa petendi ) e a causa de julgar ( causa judicandi ).

Na sequência do referido, vedado estava outrossim ao tribunal a quo, em sede de sentença, de oficiosamente decretar o divórcio com fundamento na separação de facto dos cônjuges pelo

período de três anos consecutivos, sendo parte dele ocorrido já na pendência da acção, nos termos da alínea a), do nº 1, do art. 1781.° do Código Civil.

No sentido apontado, assim decidiram dois recentes Arestos do Tribunal da Relação do Porto (8) , além de também o STJ, em decisões nos primeiros citadas e para os quais se remete brevitatis causa, todos eles perfilhando outrossim o entendimento de que a separação de facto pelo período de um ano/três anos consecutivos (9) , para fundamentar o divórcio sem o consentimento do outro cônjuge, a que alude a al. a) do art. 1781.° do Código Civil, terá que se verificar na data da

instauração da acção.

Em suma, a apelação só pode proceder. ***

4- Sumário

4.1.- A separação de facto por três anos consecutivos , é fundamento de divórcio litigioso,

entendendo-se que existe separação de facto, para o efeito referido ,quando não existe comunhão de vida entre os cônjuges e há da parte de ambos, ou de um deles, o propósito de não a

restabelecer ( cfr. artº 1781º, alínea a), e 1781º, alínea a), ambos do CC ).

4.2.- A separação de facto ( causa objectiva do divórcio ), verifica-se quando não existe comunhão de vida entre os cônjuges, ou seja, quando v.g. existe separação do leito, mesa e habitação, acrescendo ao referido elemento objectivo um outro , subjectivo , e traduzido na intenção de ambos os cônjuges, ou de um deles, de romper com a vida em comum.

(9)

obrigatoriamente, que partilhem o mesmo leito e mesa ( os muros, ainda que invisíveis, podem construir-se e passar a separar - de facto - os cônjuges a residir numa mesma casa , deixando entre ambos de existir efectiva comunhão de vida, ainda que vivendo debaixo do mesmo tecto), do mesmo modo a circunstância de dois cônjuges habitarem uma mesma localidade, mas em casas diferentes, não equivale outrossim, necessariamente, que tenham deixado de manter entre os dois uma comunhão de vida ( v.g. de amizade, convívio, partilha, mesa e leito - ainda que de quando em vez ).

4.4.- Destarte, provando-se apenas que em 30/04/2005 o A. saiu da casa que foi morada de família e foi viver para o apartamento onde hoje reside , e não se provando que desde há mais de três anos, autor e ré não dormem na mesma cama e não têm qualquer tipo de vida em comum , não pode decretar-se o divórcio com base em separação de facto por três anos consecutivos.

4.5.- O referido em 4.4., mais se justifica quando a separação de facto por três anos consecutivos não integra sequer a causa de pedir enunciada na petição inicial como fundamento do divórcio.

* 5. Decisão.

Em face do supra exposto, acordam os Juízes na 1ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa , em , concedendo provimento ao recurso de apelação apresentado pela Ré :

5.1.- Revogar a sentença recorrida, julgando-se a acção improcedente e em consequência , absolve-se a ré/apelante do pedido.

Custas da acção e da apelação pelo autor/apelado (art. 446.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil).

***

(1)Cfr. João de Castro Mendes , in Direito da Família, 78/79, pág. 193.

(2)Cfr. Fernando Brandão Ferreira Pinto, in Causas do Divórcio, Almedina 1980, pág. 15, citado Pereira Coelho .

(3)Cfr. Antunes Varela, in Direito da Família, 1982, pág. 411. (4)Ibidem, pág. 121.

(5)Cfr. Fernando Brandão Ferreira Pinto, ibidem pág. 122

(6) Cfr. Prof. Manuel Domingues de Andrade, in Noções Elementares de Processo Civil, 1979, pág. 319 e segs..

(7) In Código de Proc. Civil, Anotado, Vol. 3º, pág. 353.

(8) De 15/3/2011 e de 29/3/2011, ambos disponíveis in www.dgsi.pt. (9) Cfr. redacção anterior ou posterior à Lei nº 61/2008, de 31/10. ***

Lisboa, 20 de Setembro de 2011 António Santos (Relator)

Eurico José Marques dos Reis ( 1º Adjunto) * Ana Maria Fernandes Grácio ( 2º Adjunto)

(*) Vencido : entendo que efectivamente a sentença é nula como invocado pelo recorrente ; por outro lado, embora sufrague a tese que fez vencimento quanto à necessidade da invocação dos

(10)

factos novos em articulado superveniente, entendo que a matéria provada é suficiente para decretar o divórcio por violação do dever de respeito .

Eurico José Marques dos Reis .

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