(1) Interna de Formação Específica de Medicina Física e de Reabilitação, CMRRC-RP, Tocha Portugal (2) Interno de Formação Específica de Otorrinolaringologia, CHUC, Coimbra, Portugal
(3) Assistente Hospitalar Graduado de MFR, CMRRC-RP, Tocha Portugal
(4) Assistente Hospitalar Graduado de Otorrinolaringologia, CHUC, Coimbra, Portugal (5) Assistente Hospitalar Graduado de MFR, CMRRC-RP, Tocha Portugal
E-mail: m.ribeirodacunha@gmail.com Data de receção - Julho/2012
Data de aprovação para publicação - Novembro/2012
Protocolo de Encerramento de Traqueotomia
em Internamento em Reabilitação
Tracheotomy Closure Protocol in a Rehabilitation Institution
Maria Cunha
(1) IJoão Barosa
(2) IPaulo Margalho
(3) IPedro Tomé
(4) IJorge Laíns
(5)Resumo:
Objetivos: A traqueotomia e um procedimento frequente no tratamento de insuficiência respiratória do trato
respiratório alto, por patologias neurológicas, traumáticas, oncológicas. Apresenta desvantagens como: dismorfia cervical, necessidade de limpeza e troca da cânula, dificuldades de comunicação oral, alimentação, ausência de função nasal e risco de traqueomalácia. Assim, o encerramento da traqueotomia é premente no processo de reabilitação do doente.
A remoção da cânula apenas deve ser considerada se a obstrução da via aérea superior estiver resolvida, as secreções respiratórias se apresentarem em quantidade mínima e não houver necessidade de ventilação mecânica.
Preditores de sucesso: capacidade de produzir tosse eficaz e ausência de fenómeno de aspiração.
Este procedimento requer cuidado, particularmente se uso prolongado e deverá encontrar-se padronizado sob a forma de protocolo para otimizar execução e minimizar riscos.
A MFR, em parceria com outras especialidades (ORL) e técnicos de saúde (enfermeiros, terapeutas da fala), tem um papel fundamental no encerramento de traqueotomia.
Através deste trabalho, apresenta-se o protocolo elaborado para uma instituição com internamento em MFR.
Material e métodos: Pesquisa bibliográfica acerca do manuseamento e protocolos de encerramento de
traqueotomia.
Resultados: Protocolo resumido (passos a seguir):
- Desinsuflar cuff da cânula de traqueotomia - Trocar por cânula sem cuff de diâmetro inferior - Encerramento parcial da cânula
- Encerramento completo
- Remoção da cânula e encerramento do estoma Notas importantes:
- Definir médico responsável
- Confirmar condições necessárias e avaliar a necessidade de adaptar o protocolo em reunião de equipa pluriprofissional.
- Informar o doente sobre vantagens/inconvenientes e recolha do consentimento informado - Ensino do doente e cuidadores sobre como atuar se dispneia súbita
- Monitorizar saturação de O2 e vigilância próxima do doente - Cada passo do processo com duração mínima de 12 horas
Conclusões: As competências e conhecimentos da equipa de MFR são essenciais na abordagem abrangente do
Abstract:
Purpose: Tracheotomy is a temporary or permanent procedure for treatment of upper respiratory tract failure,
neurologic pathology, and trauma. It also presents some disadvantages: cervical dysmorphia, need for cannula cleaning/replacement, oral communication difficulties, absence of nasal function and tracheomalacia risk. Accordingly, as soon as possible, tracheotomy closure is needed in patient´s rehabilitation.
Cannula removal should only be considered if upper airway obstruction has solved, respiratory secretions are minimal and there is no need for mechanical ventilation.
Predictors of success: ability to produce cough and absence of aspiration phenomena.
Cannula withdrawal requires care, particularly after prolonged use. A standardized protocol optimizes performance and minimizes risks.
PMR, in partnership with other specialties and health professionals, has a key role to play in this procedure. We present the protocol used in tracheotomy closure in our PMR institution.
Material and methods: Literature search about tracheotomy management and closure protocols Results: Protocol (steps to follow-resume):
- Deflate the cuff
- Change to an uncuffed tracheostomy tube with smaller diameter - Partial cannula closure
- Complete tube closure
- Cannula removal and stoma closure Important remarks:
- Set responsible physician
- Evaluate the need of protocol adaptation with nursing team - Inform the patient and collect consent
- Teach patient/caregivers how to act in case of sudden dyspnea - Monitor O2 saturation/patient surveillance
- Each step must last a minimum of 12 hours.
Conclusions: The PMR team skills and knowledge are essential in the tracheotomy closure comprehensive
approach. A protocol improves its management.
Scientific information is scarce and valid studies are needed in this field. PMR should contribute to improve the services provided to these patients. Keywords: Tracheotomy/rehabilitation; Airway Management.
Introdução
A traqueotomia e um procedimento, temporário ou definitivo, frequente a nível hospitalar2,3 no
tratamento de insuficiência respiratória do trato respiratório alto de diversas causas,3 incluindo
obstrução/ impossibilidade de proteção das vias aéreas de diferentes etiologias (neurológica, traumática, oncológica) e falência de desmame ventilatório
mecânico.4 Aproximadamente 10 a 24% dos doentes
são incapazes de fazer o desmame da entubação endotraqueal e requerem a reimplementação de uma traqueotomia.5
A sua execução de forma precoce foi associada a diminuição da mortalidade, da incidência de pneumonias nosocomiais, da extubação não programada, e do traumatismo oral e laríngeo, e a Após retirada da ventilação mecânica, o procedimento pode ser executado adequadamente por esta equipa. O recurso a um protocolo é uma mais-valia na sua realização.
A informação com valor científico nesta área é escassa e estudos válidos são fundamentais para a definição de normas orientadoras para a sua uniformização.
A MFR deverá contribuir para a melhoria da qualidade dos serviços prestados aos doentes portadores de traqueotomia.
mais curta duração de ventilação mecânica e do internamento em Unidades de Cuidados Intensivos (UCI).2,6 Está assim recomendada em doentes com
necessidade prevista de ventilação mecânica superior a 10 dias, logo que a mesma seja constatada.2
Pelo aumento da frequência da sua execução em doentes críticos,6 (é provavelmente o procedimento
cirúrgico mais frequente nestes indivíduos),7é também
maior o número de doentes a quem é dada alta das UCI com cânulas de traqueotomia in situ6 e que são
posteriormente admitidos em instituições com internamento em Medicina Física e de Reabilitação (MFR). É por isso cada vez mais requerido que os profissionais que trabalham nestas enfermarias, com variados níveis de experiência, saibam lidar com os cuidados a ter com a traqueotomia6e decidir se e/ou
quando proceder à retirada de uma cânula.7
A presença do tubo de traqueotomia pode causar complicações8como a estenose traqueal, hemorragia,
infeção, pneumonia de aspiração, formação de fístula entre a traqueia e esófago ou a artéria inominada, e persistência do estoma traqueal (se mais de 3 meses após retirada da cânula).2,4
Apresenta outras desvantagens óbvias para o doente e para os seus cuidadores, como: alteração da tosse (por ausência de passagem do ar pela laringe),9dificuldades
de alimentação, ausência de função nasal (aquecimento e filtragem de ar inspirado, sentido de olfato e paladar), dismorfia cervical, risco de traqueomalácia (destruição e necrose da cartilagem de suporte)2 por abuso da insuflação do cuff da cânula,
estenose traqueal,7e necessidade de limpeza e troca
da cânula.
Muito relevantes são também as acrescidas dificuldades de comunicação oral e as implicações psicológicas inerentes. A afonia constitui uma barreira à participação do doente nos seus cuidados e, em conjunto com a diminuída perceção de imagem corporal e satisfação pessoal, pode levar a sentimentos de isolamento, frustração, ansiedade e depressão.7,9
Por todo este impacto negativo, o encerramento da traqueotomia é premente no processo de recuperação e reabilitação do doente,4,7,9 contribuindo de forma
significativa para a melhoria da sua qualidade de vida.4
A descanulação é o processo de remoção da cânula de traqueotomia, permitindo aos doentes respirar usando a sua própria via aérea.10Apenas deve ser considerada
se a obstrução da via aérea superior estiver resolvida, as secreções respiratórias se apresentarem em quantidade mínima e se o doente estiver apirético e sem necessidade de ventilação mecânica.2,7,9
Este procedimento deve envolver uma equipa pluriprofissional que engloba o Fisiatra responsável
pelo internamento, o Otorrinolaringologista (ORL), a equipa de Enfermagem, o Terapeuta da Fala e o Fisioterapeuta ou Enfermeiro de Reabilitação. A descanulação inicia-se no momento em que se desinsufla o cuff da cânula de traqueotomia, seguindo-se a troca por cânula sem cuff de diâmetro inferior, terminando na retirada da cânula de traqueotomia e encerramento do estoma.3
O estoma geralmente encerra ao final de alguns dias, principalmente se a técnica usada foi a percutânea; apenas em casos raros, de utilização prolongada de cânula de traqueotomia, existe crescimento circunferencial da pele e epitelização nos bordos mucosos, o que impede que o mesmo feche e exige encerramento cirúrgico.11
Os preditores de sucesso deste procedimento incluem a capacidade de produzir tosse eficaz, a ausência de fenómenos de aspiração6,9e de secreções,10 ou seja, a
via aérea superior deverá estar restaurada para a passagem de adequado fluxo aéreo.30 valor do peak cough flow durante a tosse induzida também parece
aumentar de forma independente a previsibilidade de uma descanulação bem-sucedida.10
A retirada da cânula requer cuidado, particularmente em situações de uso prolongado, não sendo tão simples como a remoção da cânula após resolução de uma obstrução aguda das vias aéreas superiores, e podendo estar associadas complicações devidas à traqueostomia9e ao ato de remoção per se, como por
exemplo uma hemorragia maciça ou o deslocamento da cânula com perda de via aérea.2,6
Em determinados quadros clínicos, a descanulação tem de ser adaptada de forma ainda mais individualizada4
e noutros, este procedimento pode nem sequer estar aconselhado, podendo induzir situações de elevado risco de vida, requerendo consequentemente reinserção emergente da cânula de traqueotomia.9
O teste com azul de metileno é um método simples para detetar fenómenos de aspiração a que se pode recorrer.5Neste teste solicita-se ao doente que degluta
uma solução de azul de metileno e verifica-se se há entrada da solução na coluna aérea.
Poderá ainda ser importante avaliar o gag reflex antes da descanulação, no entanto, cerca de 20% das pessoas saudáveis podem não o ter.9 A ausência deste
reflexo não determina de forma fiável, alterações da deglutição, de modo que uma avaliação formal da mesma deverá ser considerada, nomeadamente em casos de uso prolongado de traqueostomia e se existir elevado risco de aspiração,9 podendo utilizar-se a
videofluoroscopia.8
aérea ou fístula traqueoesofágica, alguns autores aconselham a avaliação endoscópica por rotina (através de rinolaringoscópio flexível) e, noutros casos, são necessárias intervenções médicas ou cirúrgicas antes de avançar com este procedimento.4,9 Um modo
prático de efetuar uma primeira triagem à cabeceira do doente será, após colocação de monitorização e desinsuflação do cuff, colocar um dedo de luva a ocluir a saída do tubo de traqueotomia e verificar se o doente respira pela boca e nariz. Deve-se então observar se existem ou não sinais de dificuldade respiratória e solicitar fonação.4,9
Se se confirmar obstrução das vias aéreas, retirar oclusão, colocar oxigénio suplementar ou ventilação mecânica e requisitar avaliação endoscópica.4,9
Apesar dos possíveis riscos associados, existem claros benefícios na remoção da cânula de traqueotomia uma vez que se trata de um corpo estranho que pode causar aumento da produção de secreções e da tosse, assim como prejudicar a normal elevação da laringe durante a deglutição.9
Independentemente do número de vezes que um determinado processo é realizado, este deverá estar definido numa abordagem prática, simples e direta.9
Normas orientadoras baseadas na evidência científica confirmaram o benefício dos protocolos de desmame ventilatório,9no entanto, a escassez de guidelines para
a descanulação torna difícil predizer a altura adequada7e os resultados deste tipo de desmame para
cada doente.4,12 Assim, ao tentar padronizar-se este
procedimento, frequentemente dependente da instituição em que se realiza,2 poderemos também
otimizar a sua execução,12diminuir o tempo de uso e
de desmame da traqueotomia e minimizar os riscos que dele podem advir.4,3,7,9
A MFR, em parceria com outras especialidades e técnicos de saúde, tem um papel fundamental a desempenhar na descanulação,3 tendo sido
inclusivamente reportada como a especialidade que mais recomenda este procedimento após a alta de um “hospital de agudos”.7
O objetivo deste trabalho é apresentar o protocolo de atuação pluriprofissional no encerramento de traqueotomia e a sua aplicabilidade numa instituição com internamento em Medicina Física e de Reabilitação.
Material e métodos
Pesquisa bibliográfica computorizada na base de dados MEDLINE, usando os termos MeSH “tracheotomy”, “tracheostomy” e a palavra em texto
livre “decannulation”, restringindo-se a população a humanos, adultos, a escrita em inglês e a data de publicação aos últimos 10 anos, e utilizando referências adicionais a partir da bibliografia dos artigos encontrados.
Resultados
Os autores desenvolveram um protocolo baseado nos dados da literatura encontrada e adaptado à sua realidade clínica.
Protocolo de encerramento de traqueotomia A - Critérios necessários (Tabela 1)
1. Estabilidade hemodinâmica 2. Ausência de ventilação assistida
3. Saturação de O2 estável há >24h (>95% com ar ambiente)
4. Gasimetria arterial dentro de valores normais (PaCO2 <45mmHg)
5. Ausência de delírio ou perturbação psiquiátrica
6. Controlo de ansiedade
7. Ausência de infeção respiratória ativa a) Apirexia há >48h
b) Radiografia do tórax sem alterações c) Ausência de secreções respiratórias
purulentas abundantes (necessidade de aspiração ≤3x/dia)
8. Tosse eficaz/capacidade de expetorar ou capacidade para usar aparelho para tosse assistida
9. Deglutição adequada
10. Avaliação endoscópica normal ou revelando lesão ocupando <30% da via aérea
Tabela 1 - Critérios para encerramento de
traqueotomia.
B - Passos prévios (Tabela 2)
1. Definir médico e enfermeiro responsáveis pelo procedimento
2. Confirmação dos critérios necessários em reunião entre médico e enfermeiro responsáveis
3. Obtenção de parecer positivo
a) MFR – confirmação de parâmetros de ventilação adequados (gasimetria – PCO2 <45 mmHg, peak cough flow >160l/min, PEM ≥40cmH2O) e avaliação da força muscular b) Terapia da Fala – confirmação da capacidade
de deglutição
c) ORL – confirmação endoscópica de permeabilidade da via aérea, estudo de deglutição (exclusão de aspiração) e caracterização da função fonatória
4. Informar doente e família e obtenção de consentimento informado assinado, clarificando que
a) Colaboração do doente é fundamental
b) Sensação de dispneia inicial é inevitável c) Reversibilidade do encerramento em caso de
necessidade
5. Agendar o procedimento para um dia de manhã, entre 2ª e 5ª feira
C - Material necessário
1. Medidor de nível de saturação de O2 2. Fita de nastro
3. Luvas de proteção 4. Óculos de proteção 5. Máscaras de proteção
6. Seringa de 10cc para desinsuflação do cuff 7. 2 cânulas de traqueotomia sem cuff, 1 diâmetro
inferior ao do doente
8. 2 cânulas de traqueotomia sem cuff, 2 diâmetros inferiores ao do doente
9. Gel lubrificante esterilizado
10. Obturador de cânula de traqueotomia
Tabela 2 - Funções a desempenhar pela equipa pluriprofissional. Funções a desempenhar pela equipa pluriprofissional
Fisiatra
• Líder da equipa
• Coordena as atividades da equipa • Responsável pela visita à enfermaria
• Realiza trocas e remoção das cânulas de traqueotomia com assistência por enfermeiro
Otorrinolaringologista
• Verifica permeabilidade da via aérea (em caso de dúvida) • Estudo da deglutição e fonação
Fisioterapeuta / Enfermeiro de Reabilitação
• Verifica condições da cânula e sua manutenção, assim como do sistema de suplementação de oxigénio • Realiza ensino aos restantes elementos da equipa de enfermagem, doente e família dos cuidados a ter
com a traqueotomia • Avalia capacidade de tosse
• Realiza tratamentos de cinesiterapia respiratória
Terapeuta da Fala
• Avaliação fonológica, da deglutição e da capacidade de proteção da via aérea • Determina recomendações relativas a meios aumentativos de comunicação
Enfermeiro
• Colabora no planeamento da alta • Ensino aos cuidadores
11. Compressas
12. Kit de penso (mínimo 1 pinça de dissecção) 13. Adesivo
14. Soro fisiológico (ampola de 100cc) 15. Saco para material contaminado
16. Máscara facial ou óculos nasais para oxigenoterapia
17. Aspiração ligada com respetivo material 18. Ambu
19. Dilatador de traqueia
20. Carro de emergência a menos de 90 cm do doente
21. Sinalizador de alarme do doente em funcionamento e a menos de 30 cm do doente
D - Procedimento
Notas prévias ao procedimento (imediatamente antes) 1. Confirmação de presença dos critérios necessários
para encerramento
2. Doente com 4 a 6 horas de jejum 3. Confirmação do material necessário 4. Informar o doente e família sobre
a) Passos do procedimento
b) Desobstrução da cânula e chamada de auxílio em caso de dispneia forte
Passos do procedimento (Fig. 1)
1. Posicionar doente de forma confortável, em supino, semissentado e com pescoço em ligeira extensão
2. Aspirar secreções traqueais
3. Desinsuflar cuff da cânula de traqueotomia 4. Colocar um dedo de luva a ocluir a saída da
cânula e observar eventual aparecimento de sinais de dificuldade respiratória
5. Trocar por cânula de traqueotomia sem cuff de diâmetro inferior (1ª troca sempre executada por
Figura 1 - Fluxograma do procedimento de encerramento de traqueotomia.
Desinsuflar cuff Cânula permanente Oclusão parcial Oclusão do estoma com penso simples Ocluir saida de cânula com dedo de luva
(presença de sinais de dificuldade respiratória?)
Cânula larga? Interromper
procedimento
Trocar por cânula de diâmetro inferior e reiniciar processo >12h >12h >12h >12h Não Sim Sim Não
Retroceder processo Trocar por cânula dediâmetro inferior
(repetir, se necessário) Colocar válvula unidireccional para fonação (facultativo) Realizar avaliação endoscópica (obstrução?) Remoção da cânula Oclusão completa
médico) (Fig. 2), inspecionando estoma, traqueia, espaço subglótico e cordas vocais
6. Trocar por nova cânula de traqueotomia sem cuff de diâmetro inferior ao anterior (facultativo) 7. Colocação de válvula para fonação (Passy-Muir®)
por períodos gradualmente progressivos (facultativo)
8. Encerramento parcial da cânula 9. Encerramento completo da cânula
10. Remoção da cânula e encerramento do estoma (Fig. 3) com penso simples com gaze esterilizada e aproximação dos bordos
Notas durante e pós-procedimento
1. Monitorização de saturação de oxigénio e sinais vitais durante todo o processo e até 24 horas depois
2. O procedimento deve ser revisto de modo inverso em caso de intercorrência, nomeadamente se
a) Dificuldade ventilatória (dispneia forte, níveis de saturação <95%)
b) Dificuldade de deglutição (aspiração) C) Surgimento de infeção respiratória (febre,
secreções respiratórias abundantes)
3. Cada passo do procedimento de 4. a 10. (exceto 5. e 8.) deverá ter a duração mínima de 12 horas, exceto em caso de presença física de médico ORL, situação em que poderá ter menor duração 4. Registar todos os passos do procedimento,
nomeadamente a data, tamanho e tipo de cânula, e complicações caso ocorram
5. Após encerramento, deverá ser pedido novo parecer à Terapia da Fala para avaliação da necessidade de treino de deglutição e/ou fonação
6. Mudança de penso diária ou quando repassado até cicatrização (por segunda intenção, em 7-10 dias na maioria dos casos)
Discussão
Mesmo entre profissionais com experiência no manuseamento de traqueotomias, existe uma grande variabilidade de opiniões no que concerne o tempo adequado para a retirada da cânula e isto deve-se em parte ao facto de não existirem guidelines a este respeito.6
Poucos estudos avaliaram os efeitos fisiológicos da descanulação em doentes traqueotomizados 9 e não existem relatos na literatura dos valores preditivos de sucesso, exceto para doentes neuromusculares.3
O protocolo apresentado não foi ainda formalmente testado no que concerne a sua reproductibilidade e validade e deverá ser interpretado num contexto de algumas limitações.
A proposta elaborada não tem em conta as cânulas fenestradas (com o propósito de simplificação máxima do fluxograma) e não particulariza certos casos que requerem maior atenção, como os lesionados medulares, por exemplo.8
Além disso poderá ter de se adaptar a outros casos específicos em que será útil usar dispositivos como o Minitrach®, o botão traqueal ou ventilação mecânica
não-invasiva, que servirão como pontes de ligação até ao encerramento da traqueotomia para minimizar o risco de fracasso do procedimento.7
Figura 2 - Doente com cânula de traqueotomia sem
cuff.
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Conclusões
O intuito do protocolo aqui apresentado é, aliando conhecimento científico e consensos de peritos,12
sistematizar de forma prática e exequível um procedimento com que nos deparamos cada vez com mais frequência nas enfermarias de MFR e que nos é exigido saber executar de forma segura e capaz, de maneira a colmatar a falha de informação específica nesta área e prestar um melhor serviço aos nossos doentes.
De referir, no entanto, que alguns doentes (com secreções orotraqueais persistentes ou com risco de aspiração) podem beneficiar com a persistência de uma cânula de traqueotomia de longa duração para manter uma via para a clearance da via aérea.4Mesmo
nestes casos ou quando falha a descanulação, é necessária uma abordagem em equipa pluriprofissional para otimizar a função respiratória,4 onde a MFR
poderá ter um papel fundamental.
A constituição de uma equipa responsável pelos cuidados com traqueotomias cria o grupo de trabalho exigido para que se possam desenvolver normas de prática clínica para uma determinada instituição, baseadas na evidência atual disponível, assim como investigação científica neste campo.6
Apenas algumas instituições aplicaram ocasionalmente este tipo de metodologia para aumentar a qualidade dos cuidados e melhorar processo de desmame da cânula de traqueotomia.12
As competências e conhecimentos da equipa multiprofissional de MFR são essenciais na abordagem
abrangente do manuseamento das vias aéreas, no que diz respeito ao encerramento de traqueotomia.9
Através de um protocolo, quando Intensivistas e Otorinolaringologistas não estão disponíveis de forma regular na enfermaria, podemos ter o seu conhecimento e perícia disponíveis permanentemente.12
O recurso a um protocolo é assim uma mais-valia na realização do encerramento de traqueotomia, ajudando a identificar fatores de insucesso,4
aumentando a segurança, minimizando os riscos de complicações e refletindo economia de tempo, de material e de mão-de-obra especializada.3Após
retirada da ventilação mecânica, este procedimento pode ser executado adequadamente por esta equipa, sendo geralmente bem tolerado4,7 e, em doentes que
já percorreram um longo caminho na sua recuperação, não devemos descurar a última fase do seu tratamento, tão importante como o restante percurso.12
A informação com valor científico nesta área é escassa e estudos científicos válidos são fundamentais para a definição de normas orientadoras para a sua uniformização,7 assim como para estabelecer pontos
de corte de valores como o de peak cough flow como preditores de sucesso para a descanulação em doentes com as patologias específicas mais frequentes em internamento de Reabilitação.3
A MFR deverá dar o seu contributo neste campo, de forma a melhorar a qualidade dos serviços prestados aos doentes portadores de traqueotomia. Foi esse o fundamento da elaboração deste trabalho.