• Nenhum resultado encontrado

A Ação Controlada na Lei de Drogas e na Lei de Organização Criminosa. Um possível conflito de normas.

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "A Ação Controlada na Lei de Drogas e na Lei de Organização Criminosa. Um possível conflito de normas."

Copied!
6
0
0

Texto

(1)

1

A Ação Controlada na Lei de Drogas e na Lei de Organização

Criminosa. Um possível conflito de normas.

Gabriel Habib(*)

Também conhecida como flagrante retardado, flagrante diferido ou flagrante postergado, a ação controlada consiste em um permissivo legal para que Autoridade Policial deixe de efetuar a prisão em flagrante do agente, para concretizar tal prisão no momento mais eficaz do ponto de vista da formação de provas e fornecimento de informações.

Assim, embora o agente esteja em flagrante delito, a Autoridade Policial poderá esperar o momento mais oportuno para a efetivação da prisão em flagrante.

Não é de se confundir o instituto da ação controlada com o instituto do flagrante esperado. Com efeito, na ação controlada, o agente já está em flagrante da prática do crime. No flagrante esperado, o agente ainda não está em flagrante da prática do delito, e a Autoridade Policial fica na expectativa da sua ocorrência para efetivar a prisão.

Ação controlada Flagrante esperado

O agente já está em flagrante da prática do crime.

O agente ainda não está em flagrante da prática do delito. A Autoridade Policial fica na expectativa da sua ocorrência para efetivar a prisão.

Questão relevante versa sobre o possível conflito aparente de normas entre o instituto da ação controlada prevista na lei de drogas e na lei de Organização Criminosa. Explica-se.

(2)

2 controlada, permitindo a não-atuação policial em relação aos portadores de drogas, desde que haja autorização judicial, com a seguinte redação: “Art. 53. Em qualquer fase da persecução criminal relativa aos crimes previstos nesta Lei, são permitidos, além dos previstos em lei, mediante autorização judicial e ouvido o Ministério Público, os seguintes procedimentos investigatórios:..II - a não-atuação policial sobre os portadores de drogas, seus precursores químicos ou outros produtos utilizados em sua produção, que se encontrem no território brasileiro, com a finalidade de identificar e responsabilizar maior número de integrantes de operações de tráfico e distribuição, sem prejuízo da ação penal cabível. Parágrafo único. Na hipótese do inciso II deste artigo, a autorização será concedida desde que sejam conhecidos o itinerário provável e a identificação dos agentes do delito ou de colaboradores.”.

De outro giro, a lei de Organização Criminosa (lei 9.034/95) dispõe, no art. 2º, II, a ação controlada, permitindo a não-atuação policial, independentemente de autorização judicial, in verbis: “em qualquer fase de persecução criminal são permitidos, sem prejuízo dos já previstos em lei, os seguintes procedimentos de investigação e formação de provas II - a ação controlada, que consiste em retardar a interdição policial do que se supõe ação praticada por organizações criminosas ou a ela vinculado, desde que mantida sob observação e acompanhamento para que a medida legal se concretize no momento mais eficaz do ponto de vista da formação de provas e fornecimento de informações.”

Para uma melhor visualização comparativa, eis os dispositivos legais mencionados:

Lei de Drogas (lei 11.343/2006) Lei de Organização Criminosa (lei 9.034/95)

“Art. 53. Em qualquer fase da persecução criminal relativa aos crimes previstos nesta Lei, são permitidos, além dos previstos em lei, mediante autorização judicial e

“Art. 2º, II: “em qualquer fase de persecução criminal são permitidos, sem prejuízo dos já previstos em lei, os seguintes procedimentos de investigação e formação de provas II -

(3)

3 ouvido o Ministério Público, os

seguintes procedimentos investigatórios:..II - a não-atuação policial sobre os portadores de drogas, seus precursores químicos ou outros produtos utilizados em sua produção, que se encontrem no território brasileiro, com a finalidade de identificar e responsabilizar maior número de integrantes de operações de tráfico e distribuição, sem prejuízo da ação penal cabível. Parágrafo único. Na hipótese do inciso II deste artigo, a autorização será concedida desde que sejam conhecidos o itinerário provável e a identificação dos agentes do delito ou de colaboradores.”.

a ação controlada, que consiste em retardar a interdição policial do que se supõe ação praticada por organizações criminosas ou a ela vinculado, desde que mantida sob observação e acompanhamento para que a medida legal se concretize no momento mais eficaz do ponto de vista da formação de provas e fornecimento de informações.”

Como se pode deduzir da leitura dos dispositivos legais citados, a diferença existente entre a ação controlada na lei de crime organizado e na lei de drogas reside na necessidade de autorização judicial, exigida pela última.

A questão relevante a ser analisada é a influência da lei de drogas na lei de crime organizado, por se tratar de lei posterior. Em outras palavras, será que a lei de drogas, por prever a necessidade de autorização judicial para a efetivação da ação controlada, teria alterado a lei de crime organizado, passando, essa, a exigir, também, a autorização judicial?

A questão deve ser resolvida pelo princípio da especialidade, impondo-se a resposta negativa. Assim, a nosso juízo, a autorização judicial somente deve ser exigida na ação controlada para a investigação com base na

(4)

4 lei de drogas, uma vez que apenas essa lei exige a autorização judicial, não sendo ela, portanto, exigida, para a efetivação da ação controlada com base na lei de Organização Criminosa.

Ademais, deve ser também buscada a mens legislatoris, para saber qual foi a intenção do legislador ao criar o mencionado instituto. Com efeito, se o legislador não exigiu a autorização judicial para a ação controlada na lei de Organização Criminosa, foi porque entendeu que, nos crimes praticados nesses moldes, a Autoridade Policial tem a plena discricionariedade para determinar a ação controlada com instrumento investigatório, independentemente da intervenção do Poder Judiciário. Exigir um requisito que o legislador não exigiu seria flagrante violação à vontade do legislador.

A dúvida que se impõe, nesse momento, é a seguinte: e se se tratar de ação controlada com meio investigatório para se apurar a prática do delito de tráfico de drogas. Nessa hipótese, deverá prevalecer a lei de drogas – e aí, consequentemente, será exigida a autorização judicial – ou deverá prevalecer a lei de Organização Criminosa – não se exigindo a autorização judicial?

Em nossa opinião, a solução que mais se adéqua à dogmática penal é a prevalência da lei de drogas sobre a lei de Organização Criminosa, mais uma vez em homenagem ao princípio da especialidade, devendo ser, portanto, exigida, a autorização judicial.

Com efeito, a despeito desse meio investigatório estar positivado também na lei de Organização Criminosa, o delito a ser investigado está previsto na lei de drogas, na qual é exigida a autorização judicial. E nem poderia ser diferente, uma vez que o fim último da investigação é o delito de tráfico de drogas.

Ademais, a lei de Organização Criminosa não contém tipos penais, mas apenas estabelece meio investigatórios para a apuração de qualquer delito. Se a lei na qual o delito a ser investigado também não exigir a autorização judicial para a sua investigação, a ação controlada poderá ser efetivada independentemente dela. Entretanto, de forma diversa, se a lei em

(5)

5 que o delito a ser investigado estiver positivado exigir a autorização judicial – como é no delito de tráfico de drogas – a ação controlada somente se legitimará enquanto procedimento investigatório se for precedida de autorização judicial. Caso contrário, estar-se-ia negando vigência ao dispositivo legal contido a lei de drogas.

Entretanto, recentemente, o STJ, no informativo nº 409, ao julgar a ordem de habeas corpus nº 119.205, entendeu de forma contrária, ao decidir que mesmo que o delito investigado seja o tráfico de drogas, se a investigação for feita com base na lei de organização criminosa, é desnecessária a autorização judicial para a ação controlada, em razão da falta de exigência por parte dessa lei. Eis o julgado:

STJ. INFORMATIVO N˚ 409. Quinta Turma

AÇÃO POLICIAL CONTROLADA. MP.

Pretende-se afastar, por falta de prévia manifestação do MP, a decisão que deferiu a busca e apreensão em sede de investigação requerida pela autoridade policial, bem como reconhecer a ilegalidade do ato praticado pela polícia, que “acompanhou” o veículo utilizado para o transporte de quase meia tonelada de cocaína, retardando a abordagem. Quanto ao primeiro tema, vê-se que não dispositivo legal a determinar obrigatoriamente que aquela medida seja precedida da anuência do membro do Parquet. Ademais, a preterição de vista ao MP deu-se em razão da urgência da medida, bem como da ausência, naquele momento, do representante do MP designado para atuar na vara em questão. Já quanto à segunda questão, a ação policial controlada (art. 2º, II, da Lei n. 9.034/1995) não se condiciona à prévia permissão da autoridade judiciária, o que legitima o policial a retardar sua atuação com o fim de

(6)

6 buscar o momento mais eficaz para a formação de provas e fornecimento de informações. HC 119.205-MS, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 29/9/2009. (grifamos).

Permissa venia, não podemos concordar com a solução dada pelo STJ ao caso concreto. Conforme exposto acima, se o delito a ser investigado está previsto na lei de drogas e ela exige a autorização judicial para a efetivação da ação controlada, não pode o Judiciário fechar os olhos para a lei como se ela não existisse, violando a mens legislatoris, como se fosse absolutamente irrelevante a intenção do legislador ao para elaborar a lei.

Em face do exposto, em nossa opinião, se o delito a ser investigado está previsto na lei de drogas, com é o caso do tráfico, e ela exige a autorização judicial para a efetivação da ação controlada, deve tal procedimento investigatório ser obrigatoriamente precedido de autorização judicial, sob pena de negativa de vigência e violação da lei de drogas (lei 11.343/2006).

*Gabriel Habib é Defensor Público Federal no Rio de Janeiro.

Pós graduado pelo Instituto de Direito Penal Econômico e Europeu da Universidade de Coimbra. Professor e Coordenador do CURSO FORUM / RJ.

Professor e Coordenador do Curso IDEIA/RJ.

Professor do Curso CEJUS – Centro de Estudos Jurídicos de Salvador/BA. Professor da EMERJ – Escola da Magistratura do Rio de Janeiro.

Professor de FESUDEPERJ – Fundação Escola da Defensoria Pública do Rio de Janeiro. Professor do Curso CEJUSF/RJ.

Professor da pós graduação da Universidade Estácio de Sá. Professor do Curso Jurídico/PR.

Professor do Curso CEJJUF/MG.

Referências

Documentos relacionados

Os vários modelos analisados mostram consistência entre as diferenças de precipitação do experimento do século vinte e os experimentos com cenários futuros, no período de

Acreditamos que o estágio supervisionado na formação de professores é uma oportunidade de reflexão sobre a prática docente, pois os estudantes têm contato

Existem quatro armários na sala, um que serve para arrumar livros e materiais utilizados pela educadora, outros dois que servem de apoio aos adultos da sala e

Assim, cumpre referir que variáveis, como qualidade das reviews, confiança nos reviewers, facilidade de uso percebido das reviews, atitude em relação às reviews, utilidade

Desta forma, foram criadas as seguintes hipóteses de investigação: H1 – O compromisso organizacional e o engagement são diferentes para as categorias dos militares dos

Muitos desses fungos podem ser encontrados nos grãos de café durante todo o ciclo produtivo, porém sob algumas condições especificas podem causar perda de

Atualmente existem em todo o mundo 119 milhões de hectarS destinados a plantações florestais, dos quais 8,2 milhões na América do Sul. No Brasil, em 1997 havia cerca de 4,7 milhões

(IPO-Porto). Moreover, we attempted to understand how and in which patients sFLC can be used as a differential marker in early disease relapse. Despite the small cohort, and the