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Processo 27/19.9GGPTG.E1 Data do documento 14 de julho de 2020 Relator Berguete Coelho

TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA | PENAL

Acórdão

DESCRITORES

Insuficiência para a decisão da matéria de facto > Relatório social > Prisão efectiva

SUMÁRIO

1 - A sentença padece do vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, previsto na alínea a) do n.º 2 do art. 410.º do CPP, se os aspectos de âmbito pessoal não foram levados à matéria de facto, uma vez que, nessa vertente, o Tribunal nada fez constar, certamente motivado pela circunstância de que o ora recorrente não tivesse comparecido à audiência de julgamento, que, por isso, teve lugar na sua ausência (art. 333.º do CPP).

2 - No entanto, apesar dessa ausência, entende-se que se imporia ao Tribunal, tanto quanto possível, apurar de elementos pertinentes às condições pessoais, à vivência anterior e actual e à personalidade do aqui recorrente, com vista a uma rigorosa e completa apreciação, por maioria de razão estando em causa a aplicação de prisão com carácter efectivo.

3 - Tanto mais quando tendo o recorrente sido regularmente notificado e sendo a sua residência conhecida, não se deparando, assim, inviabilidade na obtenção daqueles elementos, pelo menos mediante a elaboração de relatório social nos termos do art. 370.º do CPP.

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4 - Sem prejuízo de que a opção pela pena de prisão com carácter efectivo se possa apresentar tendencialmente como correcta, a sua aplicação tem de merecer um acrescido cuidado do julgador, no sentido que não subsista lacuna de valoração em matéria tão importante.

TEXTO INTEGRAL

Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora

*

1. RELATÓRIO

Nos autos em referência, de processo sumário, que correu termos no Juízo Local Criminal de Elvas do Tribunal Judicial da Comarca de Portalegre, realizado o julgamento e proferida sentença, o arguido (...) foi condenado, pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelo art. 292.º, n.º 1, do Código Penal (CP), na pena de 6 (seis) meses de prisão

efectiva e na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor pelo período de 24 (vinte e quatro) meses, ao abrigo do disposto no art.

69.º, n.º 1, alínea a), do CP.

Inconformado com tal decisão, o arguido interpôs recurso, formulando as

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1. O arguido foi condenado, pelo Tribunal a quo na pena de 6 meses de prisão efectiva, pela prática do crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p.p. no art 292.º, n.º 1, 69.º, n.º 1, al. a) do C. Penal.

2. Não se vislumbra por parte do Tribunal a quo, a convicção de que, o arguido deverá cumprir pena em regime de permanência na habitação,

3. Até porque, salvo melhor opinião,

4. Realiza de forma adequada as finalidades da punição.

5. Verdade é que, no caso em apreço, encontram-se preenchidos os requisitos exigidos pelo art. 43.º, n.º 1 do C. Penal.

6. Ou seja, a execução da pena em regime de permanência na habitação.

7. Com a devida vénia, e salvo devido respeito, a decisão do Tribunal a quo é manifestamente desajustada em relação às suas circunstâncias pessoais, económicas e sociais, justificando a substituição da pena de prisão efectiva por outra medida alternativa que seja objecto de aplicação de pulseira electrónica, como se sublinha mais uma vez,

8. A medida de permanência na habitação.

9. Acontece que, o arguido está inserido socialmente, trabalha como manobrador de máquinas agrícolas, auferindo o rendimento de € 750,00 (setecentos e cinquenta euros), reside com a sua companheira e dois filhos menores.

10. Ora, sendo o arguido condenado a cumprir pena de prisão efectiva, terá de ser a sua companheira a obter rendimentos para o agregado familiar, uma vez que, o agregado familiar é de parcos rendimentos.

11. Assim, a permanência na habitação daria ao arguido a oportunidade de acompanhar e cuidar dos filhos menores.

12. Não se concebe porque o Tribunal a quo determina que o arguido volte a cumprir pena de prisão em estabelecimento prisional, até porque,

13. “Com o regime de permanência na habitação evitam-se as consequências perversas da prisão continuada, não deixando de, com sentido pedagógico,

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constituir forte sinal de reprovação para o crime em causa. Trata-se de regime que tem justamente por finalidade limitar o mais possível os efeitos criminógenos da privação total da liberdade, evitando ou, pelo menos, atenuando os efeitos perniciosos de uma curta detenção de cumprimento continuado, nos casos em que não é possível renunciar à ideia de prevenção geral.” (Vide Acórdão Tribunal da Relação do Porto, Proc. n.º 570/17.9GBVFR-A.P1, de 07/03/2018)

14. A acrescer, o arguido está inserido no meio laboral, tem estabilidade familiar, não deverá ser reintroduzido em ambiente prisional para cumprimento de pena de 6 meses de prisão efectiva imposta pela prática de crime de condução em estado de embriaguez.

15. Até porque, tal facto constitui um retrocesso no esforço de reintegração social do condenado.

16.“Com as alterações introduzidas pela Lei n.º 94/2017 de 23/8 o regime de permanência na habitação previsto no art. 43.º do C. Penal passou a constituir não só uma pena de substituição em sentido impróprio, mas também uma forma de execução ou cumprimento da pena de prisão.” (Vide Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, Proc. n.º Proc. n.º 570/17.9GBVFR-A.P1, de 07/03/2018)

17. Ou seja,

18. “A nova Lei traduz o entendimento generalizado de que as penas curtas de prisão devem ser evitadas por não contribuírem necessariamente para a ressocialização efetiva do condenado.” (Vide Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, Proc. n.º 14/11.5PEVIS.C1, de 13/06/2018)

19. Pelo exposto, e por se encontrarem reunidos os requisitos do art. 43.º, n.º 1 do C. Penal, deverá substituir-se o cumprimento da pena de 6 meses de prisão efectiva pelo regime de permanência na habitação.

Nestes termos e nos melhores de direito, deve o presente recurso ser julgado procedente e a sentença recorrida revogada e substituída por outra que aplique

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o regime de permanência na habitação ao arguido, assim se fazendo JUSTIÇA!

O recurso foi admitido.

O Ministério Público apresentou resposta, concluindo:

1 - O arguido (...) interpôs recurso da sentença que o condenou, pela prática, como autor material, de 1 (um) crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punido pelo artigo 292º, n.º 1 e art. 69º, n.º 1, al. a) do Código Penal, na pena de 6 (seis) meses de prisão efectiva.

2 - Veio o arguido recorrer da sentença condenatória, insurgindo-se contra o cumprimento da pena em que foi condenado, militando que a pena de prisão aplicada seja cumprida em regime de permanência na habitação, nos termos do art. 43º do Código Penal;

3 - A determinação da medida concreta da pena faz-se em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, tendo em conta todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, deponham a favor ou contra o arguido – cfr. art. 71º, nº 1 do Código Penal. São considerações de prevenção especial – de ressocialização e integração do agente -, que dentro daqueles limites e, num último momento, acabam por determinar a pena concreta a aplicar;

4 - No caso em apreço, são elevadas as exigências de prevenção geral, na medida em que a conduta do arguido é merecedora de um intenso juízo de censurabilidade atendendo aos elevados índices de crimes desta natureza e às consequências nefastas que provocam a nível de sinistralidade rodoviária. É, pois, elevada a necessidade de garantir e demonstrar à Sociedade quais as consequências da assunção deste tipo de condutas;

5 - As exigências de prevenção especial são também elas acrescidas, porquanto o arguido agiu com dolo directo e tem 6 (seis) antecedentes criminais pela prática do mesmo crime, sendo uma dessas condenações em pena de prisão cuja execução ficou suspensa e outra delas em prisão efectiva;

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6 - As sucessivas condenações em pena de multa, as condenações em pena de prisão suspensa na sua execução e a pena de prisão efectiva afastam totalmente a possibilidade do arguido ser aqui condenado em pena privativa de liberdade em cumprimento em regime de permanência na habitação;

7 - A pena de prisão efectiva, tal como o Tribunal a quo a aplicou, só pode ter lugar quando já anteriormente se tenha considerado que a execução da prisão é exigida pela necessidade de prevenir a prática de futuros crimes, razão pela qual a pena aplicada ao arguido, mesmo de medida não superior a um ano, não deve ser substituída por multa ou por qualquer outra não privativa de liberdade, como seja a de prestação de trabalho a favor da comunidade – o que é o caso; 8 - Em conclusão, porque a sentença recorrida não padece de qualquer vício e por inexistir fundamento legal para a condenação do arguido em pena de prisão a cumprir em regime de permanência na habitação, o recurso deve ser julgado totalmente improcedente, confirmando-se a decisão recorrida.

Neste Tribunal da Relação, o Digno Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer, fundamentado, no sentido da improcedência do recurso.

Observado o disposto no n.º 2 do art. 417.º do Código de Processo Penal (CPP), arguido nada veio acrescentar.

Colhidos os vistos legais e tendo os autos ido à conferência, cumpre apreciar e decidir.

*

2. FUNDAMENTAÇÃO

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motivação, como decorre do art. 412.º, n.º 1, do CPP, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, como sejam, as previstas nos arts. 379.º, n.º 1, e 410.º, n.ºs 2 e 3, do CPP, designadamente de acordo com a jurisprudência fixada pelo acórdão do Plenário da Secção Criminal do STJ n.º 7/95, de 19.10, in D.R. I-A Série de 28.12.1995.

Assim, versando unicamente matéria de direito, reside em apreciar da escolha da pena (principal), pugnando, o recorrente, pela aplicação, em substituição da prisão, do regime de permanência na habitação.

*

No que ora releva, consta da sentença recorrida:

Factos provados:

Da instrução e discussão da causa e com interesse para a boa decisão da mesma resultaram provados os seguintes factos:

1. No dia 07/06/2019, pelas 23H42, na Estrada (…), o arguido conduziu o veículo, ligeiro de passageiros, com a matrícula (…), sendo portador de uma TAS de 2,116g/l (após dedução do EMA ao valor de 2,30g/l).

2. O arguido sabia que tinha ingerido bebidas alcoólicas em quantidades suscetíveis de alcançar o limite legal de teor de álcool de 1,2 g/l, e ainda assim quis conduzir o veículo ligeiro em causa, na via pública, com a mencionada taxa de álcool no sangue, apesar de saber que tal facto era proibido e punido por lei, mas apesar de o saber quis atuar da forma descrita, e conduzir o mesmo nas condições em que o fez.

3. Atuou livre, deliberada e conscientemente, bem sabendo de que incorria na

prática de crime. Mais se provou que:

4. O arguido tem os seguintes antecedentes criminais registados:

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o n.º (…) no 1º Juízo do Tribunal da Comarca de Portalegre, pela prática do crime de desobediência, por factos praticados em 09.08.2002, na pena de 50 dias;

- foi condenado nos autos de processo sumário que correram os seus termos sob o n.º (…) do 1º Juízo do Tribunal Judicial de Elvas, pela prática do crime de condução em estado de embriaguez, por factos praticados em 10.10.2004, na pena de 80 dias de multa.

- foi condenado nos autos de processo sumário que correram os seus termos sob o n.º (…) do 1º Juízo do Tribunal Judicial de Elvas, pela prática do crime de violação de proibições ou interdições, por factos praticados em 23.02.2005, na pena de 190 dias de multa.

- foi condenado nos autos de processo abreviado que correu os seus termos sob o n.º (…) do Tribunal Judicial de Portalegre, pela prática de um crime de furto qualificado, por factos praticados em 07.06.2003, na pena de 2 anos e 2 meses de prisão, suspensa na sua execução por 2 anos.

- foi condenado nos autos de processo sumaríssimo que correu os seus termos sob o n.º (…) do 2º Juízo do Tribunal Judicial de Elvas, pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, por factos praticados em 24.12.2007, na pena de 6 meses de prisão, suspensa na sua execução por um ano, subordinada ao cumprimento de obrigações.

- foi condenado nos autos de processo comum singular que correu os seus termos sob o n.º (…), no Tribunal Judicial de Elvas, pela prática de um crime de desobediência, por factos praticados em 2008, na pena de 120 dias de multa. - foi condenado nos autos de processo sumário que correu os seus termos sob o n.º (…) no Tribunal Judicial de Elvas, pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, por factos praticados em 01.10.2011, na pena 30 períodos de prisão por dias livres.

- foi condenado no Juízo de Instruccion n.º 4 de Badajoz, pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, por factos praticados

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em 19.02.2012, na pena de multa.

- foi condenado, por sentença proferida a 14.11.2014, nos autos de processo sumário que correu os seus termos sob o n.º (…) no Tribunal Judicial da Comarca de Portalegre, pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, por factos praticados em 08.11.2014, na pena 7 meses de prisão efectiva e na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados por 24 meses.

- foi condenado, por sentença proferida a 27.03.2017, nos autos de processo sumário que correu os seus termos sob o n.º (…) no Tribunal Judicial da Comarca de Portalegre, pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, por factos praticados em 27.02.2016, na pena 1 ano de prisão suspensa na sua execução subordinada à frequência de programa de tratamento da alcoolémia, pelo período de 1 ano e na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados por 24 meses.

Escolha da Pena:

Resulta da conjugação do disposto no art.º 292.º, n.º 1 do Código Penal, com os limites fixados nos artºs 41.º, n.º 1 e 47.º, nº 1 e 2 do Código Penal, a prática do crime de condução de veículo em estado de embriaguez, é abstractamente punida com pena de 1 mês a 1 ano de prisão ou com multa de 10 a 120 dias, à taxa diária de €5 a €500.

Tendo em conta o carácter alternativo das penas de prisão e multa previstas, impõe-se proceder, em primeiro lugar, à escolha da pena que, concretamente, irá ser aplicada.

Nesta operação iremos necessariamente orientarmo-nos pelo princípio politico-criminal da preferência pelas reacções penais não detentivas ínsito no art.º 70.º do Código Penal, de acordo com o qual, “se ao crime forem aplicáveis, em alternativa, pena privativa e pena não privativa da liberdade, o tribunal dá preferência à segunda sempre que esta realizar de forme adequada e suficiente

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as finalidades da punição”.

Este preceito traduz o pensamento do legislador no sentido de reagir contra penas institucionalizadas ou detentivas face ao seu carácter nocivo, sempre que os fins das penas se possam atingir por outra via.

No caso dos autos, as exigências de prevenção geral são elevadíssimas porquanto o tipo de ilícito em questão é recorrentemente cometido e com elevados índices de reiteração da sua prática por parte do mesmo agente.

Não são, igualmente, de desprezar as nefastas consequências que acarretam para a segurança rodoviária a condução sob o efeito de álcool.

Justifica-se, por isso, a afirmação da norma jurídica infringida.

O mesmo acontecendo com as exigências de prevenção especial, pois as mesmas são também muito elevadas, considerando o facto, do arguido já ter sido condenado várias vezes pela prática deste crime, tendo já sido condenado em penas de prisão efectiva, as quais não o inibiram minimamente de voltar a praticar estes crimes.

Assim sendo, considera-se que a aplicação de uma pena de multa não é de todo suficiente para satisfazer as necessidades de prevenção que o caso requer. Na verdade, nem a condenação em penas de prisão efectiva, impediram o arguido de voltar a praticar ilícitos criminais de idêntica natureza, razão pela qual se opta pela aplicação de uma pena de prisão.

Determinação da Medida Concreta da Pena:

Da Pena Principal

Seleccionado o tipo de pena a aplicar, cumpre determinar a medida concreta da pena a aplicar ao arguido.

Para a sua determinação recorre-se ao critério global previsto no n.º 1 do artigo 71.º do Código Penal, que dispõe que a determinação da medida da pena se fará em função da culpa do agente, tendo ainda em conta as exigências de prevenção de futuros crimes, atendendo o tribunal a todas as circunstâncias

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que, não fazendo parte do tipo de crime, deponham a favor do agente ou contra ele, nomeadamente as previstas nas diversas alíneas do n.º 2 do mesmo preceito legal.

Assim, no caso em apreço, atentos os mencionados critérios constantes do artigo 71.º do Código Penal, salienta-se que, no caso vertente, militam em desfavor do arguido:

- o dolo do arguido, na sua forma mais intensa (dolo directo);

- a circunstância de ter vários antecedentes criminais registados pela prática de vários crimes, e por crimes de idêntica natureza.

- O grau de ilicitude, que é elevado, tendo o arguido apresentado uma TAS de

2,116g/l.

Tudo visto e ponderado, e tendo em conta os limites mínimo e máximo abstractamente aplicáveis ao crime de que vem acusado, entende-se como justa, adequada e proporcional à culpa do arguido e às exigências de prevenção, a punição da sua conduta com uma pena que se fixa em 6 (seis) meses de prisão.

*

Suspensão da pena de prisão:

Determina o artigo 50.º, n.º1, do Código Penal que “o tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a cinco anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”.

No caso dos autos foi decidida a aplicação, em concreto, de uma pena de prisão pelo período de 6 (seis) meses.

A suspensão da execução da pena de prisão tem subjacente um juízo de prognose favorável relativamente ao comportamento do agente, considerando

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a sua personalidade e as circunstâncias do facto.

No caso dos autos o arguido possui inúmeros antecedentes criminais remontando o início do respectivo iter criminis ao ano de 2002 e prolongando-se até à actualidade.

O arguido já foi por diversas vezes condenado a penas de multa e de prisão, umas suspensas, por dias livres e outras efectivas e tal circunstância não o desmotivou de voltar a delinquir, sendo que, volta a praticar o mesmo crime apenas três meses após ter sido declarada extinta a pena acessória de proibição de conduzir veículos que lhe foi aplicada na última sentença.

Estamos, pois, perante um percurso criminoso revelador de uma prática recorrente destes ilícitos, entre os quais se inclui um delito de natureza estradal com o qual o dos presentes autos está relacionado, que urge inverter.

Pelo exposto, entende o tribunal que, in casu, a ameaça da pena de prisão efectiva e a censura do facto não se mostram suficientes para prevenir o futuro cometimento destes ilícitos criminais, pelo que não há lugar à suspensão da execução da pena de prisão aplicada.

*

Apreciando:

O recorrente, discordando da aplicação da pena de prisão com carácter efectivo, que lhe foi cominada, invoca, no essencial, que se encontram preenchidos os requisitos exigidos pelo artigo 43º, n° 1 do C. Penal para cumprimento da pena de prisão (…), em regime de permanência da habitação e este meio realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da execução da pena de prisão, concretizando que trabalha como manobrador de máquinas agrícolas, auferindo um vencimento médio mensal de € 750,00 (setecentos e cinquenta euros) e reside com a sua companheira, e dois filhos menores, a sua companheira é empregada de limpeza e os dois filhos menores frequentam o

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ensino escolar, o agregado familiar é de parcos rendimentos, tem demonstrado que interiorizou a gravidade das suas anteriores condutas, adotando uma nova postura mais responsável, demonstrando um comportamento social responsável, encontrando-se socialmente inserido e o regresso (…) ao estabelecimento prisional, certamente que lhe trará sentimentos de desmotivação para refazer a sua vida, colocando assim em risco as necessidades de prevenção especial positiva.

Não discutindo a medida concreta fixada pelo Tribunal (6 meses de prisão), preconiza, pois, que deva beneficiar que a mesma seja substituída e cumprida em regime de permanência na habitação (RPH), ao abrigo do art. 43.º do CP, atentando em que a medida formalmente o permite e, na sua perspectiva, substancialmente consentânea com as finalidades punitivas em presença.

Constata-se que o Tribunal, se bem que tendo fundamentado a aplicação da prisão e o afastamento da suspensão da sua execução (art. 50.º do CP), não se pronunciou, expressamente, quanto à eventualidade daquele RPH.

Todavia, se os factos e a fundamentação disponíveis se revelassem suficientes, nada obstaria e, ao invés, imporia, que essa omissão viesse a ser agora suprida. Assim não é, porém.

Com efeito, decorrem da sentença como explicitados os factores atinentes às exigências preventivas, ao grau da ilicitude dos factos, à intensidade do dolo e aos antecedentes criminais, que consubstanciam, entre outras, circunstâncias previstas no art. 71.º, n.º 2, do CP, que o recorrente não põe propriamente em causa, apelando, sim, em abono da sua posição, para objectivos da sua ressocialização, concernentes a aspectos de âmbito pessoal.

Estes aspectos não foram, contudo, levados à matéria de facto, uma vez que, nessa vertente, o Tribunal nada fez constar, certamente motivado pela circunstância de que o ora recorrente não tivesse comparecido à audiência de julgamento, que, por isso, teve lugar na sua ausência (art. 333.º do CPP).

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tanto quanto possível, apurar de elementos pertinentes às condições pessoais, à vivência anterior e actual e à personalidade do aqui recorrente, com vista a uma rigorosa e completa apreciação, por maioria de razão estando em causa a aplicação de prisão com carácter efectivo.

Tanto mais quando o recorrente havia sido regularmente notificado, sendo a sua residência conhecida e, assim, sem que se depare com inviabilidade na obtenção daqueles elementos, pelo menos mediante a elaboração de relatório social nos termos do art. 370.º do CPP, ainda que o julgamento se restringisse, dada a sua forma sumária, ao mínimo indispensável ao conhecimento e boa decisão da causa (art. 386.º, n.º 2, do CPP), mas sem descurar que qualquer pedido assumiria carácter urgente (art. 387.º, n.º 8, do CPP).

Sem prejuízo de que a opção pela pena de prisão com carácter efectivo se possa apresentar tendencialmente como correcta, a sua aplicação tem de merecer um acrescido cuidado do julgador, no sentido que não subsista lacuna de valoração em matéria tão importante.

Na verdade, ao momento da determinação da medida da pena, o regime processual penal consagra a devida dignidade, erigindo-a como operação autónoma e específica nos termos do art. 369.º do CPP, em sintonia com as garantias de defesa e a mínima restrição de direitos fundamentais constitucionalmente relevantes (arts. 18.º, n.º 2, e 32º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa), por forma a assegurar-se a necessidade, a proporcionalidade e a adequação da pena para realização das finalidades aludidas no art. 40.º, n.º 1, do CP.

Mais se justifica que se usem dos meios para atingir tais desideratos quando o leque e o âmbito das medidas substitutivas da prisão vem sendo alargado pelo legislador, inevitavelmente com o sentido da sujeição a prisão como ultima ratio.

Deste modo, a sentença recorrida padece do vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, previsto na alínea a) do n.º 2 do art. 410.º

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do CPP, implicando que expressamente se apurem factos relativos, como referido, às condições pessoais, à situação económica, à conduta anterior e posterior aos factos, à personalidade do aqui recorrente, mediante as diligências que o Tribunal entenda por pertinentes.

Tal vício ocorre quando a matéria de facto provada é insuficiente para fundamentar solução de direito ou, nas palavras de Germano Marques da Silva, in ”Curso de Processo Penal”, Editorial Verbo, 1994, vol. III, pág. 325, é necessário que a matéria de facto se apresente como insuficiente para a decisão proferida por se verificar lacuna no apuramento da matéria de facto necessária para uma decisão de direito, ou seja, quando o tribunal deixou de apurar matéria de facto que lhe cabia apurar, dentro do objecto do processo, tal como este está enformado pela acusação e pela defesa, sem prejuízo do mais que a prova produzida em audiência justifique.

Mais expressivamente, de acordo com a dimensão interpretativa que aqui se coloca, assinalou-se no acórdão do STJ de 20.04.2006, no proc. n.º 06P363, in www.dgsi.pt, que significa que os factos apurados são insuficientes para a decisão de direito, do ponto de vista das várias soluções que se perfilem -absolvição, condenação, existência de causa de exclusão da ilicitude, da culpa ou da pena, circunstâncias relevantes para a determinação desta última, etc. - e isto porque o tribunal deixou de apurar ou de se pronunciar sobre factos relevantes alegados pela acusação ou pela defesa ou resultantes da discussão da causa, ou ainda porque não investigou factos que deviam ter sido apurados na audiência, vista à sua importância para a decisão, por exemplo, para a escolha ou determinação da pena.

Prende-se com as exigências da descoberta da verdade material e da boa decisão da causa (art. 340.º do CPP), através do necessário apuramento de factos, não só relevantes para a culpabilidade (art. 368º do CPP), como, também, para a determinação da sanção (referido art. 369.º.

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julgamento e nessa parte (art. 426.º, n.º 1, do CPP), a realizar pelo tribunal recorrido (art. 426.º-A do CPP), mediante as pertinentes diligências, seguidas da prolação de nova sentença.

*

3. DECISÃO

Em face do exposto, decide-se:

- ordenar o reenvio do processo para novo julgamento, pelo tribunal recorrido, em razão de insuficiência para a decisão da matéria de facto

provada, relativamente ao apuramento de factos relativos às condições pessoais, à situação económica, à conduta anterior e posterior aos factos, à personalidade do arguido, importantes para a determinação da pena a aplicar.

Sem tributação.

*

Processado e revisto pelo relator. 14.Julho.2020

Carlos Jorge Berguete João Gomes de Sousa

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