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MORFOLOGIA DA LÍNGUA PORTUGUESA Maria das Graças Carvalho Ribeiro

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MORFOLOGIA DA LÍNGUA PORTUGUESA

Maria das Graças Carvalho Ribeiro

APRESENTAÇÃO

Caros alunos,

A disciplina Morfologia da Língua Portuguesa tem como objeto de estudo a descrição do sistema formal do português. A morfologia, assim como a sintaxe, a fonologia e a semântica, constitui um dos níveis de descrição lingüística, voltando-se especificamente para a identificação e para a classificação das unidades formais de uma língua, tendo como objeto de descrição desde sua unidade mínima, o morfema, até a unidade maior, a palavra. Partindo dessa compreensão, nossa disciplina tem como objetivo trazer para vocês, alunos, o conhecimento da estrutura mórfica da língua portuguesa.

Orientando-nos por esse objetivo, organizamos o conteúdo dessa disciplina em três capítulos. No primeiro, introduzimos esse estudo situando a morfologia no campo da descrição lingüística, voltando-nos para a dupla articulação e para os eixos da linguagem. Apresentamos um breve histórico sobre os estudos da morfologia, ao longo dos estudos lingüísticos. Discutimos os diferentes conceitos de morfologia apresentados em nossas gramáticas normativas e em alguns manuais de lingüística, e ainda conceitos básicos que fundamentarão os estudos que serão desenvolvidos ao longo do curso. No segundo capítulo, tratamos da estrutura mórfica das palavras, dos princípios auxiliares da análise mórfica; e dos processos de formação de palavras. No terceiro e último capítulo, voltamos nossa atenção para a classificação das palavras. Tomamos como referência a classificação apresentada na tradição greco-latina, discutimos a posição da Norma Gramatical Brasileira (NGB), assim como algumas modernas propostas de classificação, encerrando com a classificação proposta por Câmara Junior (1975). Abordamos ainda nesse capítulo, a flexão nominal e verbal e seus mecanismos de expressão. Encerramos os capítulos sempre com atividades que deverão ser desenvolvidas por vocês alunos. Essas atividades têm como objetivo principal a aplicação do conhecimento teórico adquirido ao longo do curso.

Esperamos, desse modo, despertar-lhes o interesse para esse estudo, dada sua relevância para a compreensão da organização interna das unidades formais da língua, assim como para a análise dessas unidades e, principalmente, para o seu uso em situações concretas de comunicação.

MORFOLOGIA DA LÍNGUA PORTUGUESA

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UNIDADE I

INTRODUÇÃO À MORFOLOGIA

1 BREVE HISTÓRICO

Uma investigação mais ampla sobre esse assunto nos permite dizer que os estudos morfológicos têm sua origem na tradição gramatical hindu. Na gramática de Panini (séc VI a.C.), já se tratava da estrutura interna das palavras, identificando-se as unidades mínimas significativas como raízes e afixos. Com a descoberta do Sânscrito (séc. XVIII), pôde-se tomar conhecimento desses estudos que muito contribuíram para a investigação lingüística moderna na área da morfologia.

Na tradição greco-latina, os aspectos morfológicos faziam parte dos estudos gramaticais, que se subdividiam em três campos: o da flexão, o da derivação e o da sintaxe. À flexão correspondiam os estudos morfológicos, em oposição à sintaxe. Já a derivação era colocada em um plano secundário. O termo morfologia, surgido inicialmente no campo da biologia, passou a ser usado na lingüística a partir do século XIX, abrangendo os processos flexionais e derivacionais.

No âmbito da lingüística moderna, os estudos morfológicos tiveram grande desenvolvimento no estruturalismo americano, cujo representante maior é L. Bloomfield. Essa corrente voltou-se para o estudo e para a descrição das formas lingüísticas, privilegiando a identificação dos morfemas e de suas regras de combinação. Segundo essa perspectiva, é o conhecimento dos morfemas de uma língua que possibilita entender o significado das palavras ainda não ditas e a criar novas palavras nessa língua. No modelo estruturalista norte-americano, a análise lingüística se deteve no estabelecimento de unidades irredutíveis, organizadas linearmente, e na definição de padrões que regiam sua combinação. (ROSA, 2000, p. 38)

Com o desenvolvimento da teoria gerativa (N. Chomsky), que elegeu a sintaxe como seu objeto de estudo, a morfologia começa a ser enfocada dentro do componente fonológico. Morfologia e Fonologia passam, assim, a constituir a chamada Fonologia Lexical, defendendo que a sintaxe deveria ser cega à morfologia. Essa tese, entretanto, passou a ser desconsiderada, pelo menos no que diz respeito à morfologia flexional, reconquistando, assim, a morfologia seu espaço no âmbito dos estudos lingüísticos. Com isso foi retomada a oposição já estabelecida pelo gramático latino Varrão, subdividindo-se a morfologia em dois ramos: morfologia derivacional e morfologia flexional. Atualmente, essa subdivisão da morfologia vem sendo repensada por alguns estudiosos, a exemplo de Gonçalves (2005), que prefere falar em um continuum, entre a flexão e a derivação.

UNIDADE I

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Considerando o objetivo do nosso trabalho, não discutiremos aqui a noção de continuum, limitando-nos a apresentar os mecanismos lingüísticos (flexionais e derivacionais) que se enquadram no campo da morfologia. Procuramos situar a morfologia nos níveis de descrição lingüística. É o que veremos no próximo item.

2 SITUANDO A MORFOLOGIA

2.1 A DUPLA ARTICULAÇÃO DA LINGUAGEM

Situar a morfologia nos níveis de descrição da língua leva-nos a retomar uma das características da linguagem humana, a sua capacidade de ser duplamente articulada. Na primeira articulação, plano do conteúdo, articulam-se os elementos dotados de significação. Nessa articulação, situa-se a morfologia, que trata da articulação do vocábulo, e a sintaxe, que se volta para a articulação da proposição. Assim morfologia e sintaxe (morfossintaxe) situam-se no campo da significação lingüística. À segunda articulação pertencem os elementos do plano de expressão da língua, objeto de estudo da fonética e da fonologia.

Veja o esquema a seguir:

DUPLA ARTICULAÇÃO DA LINGUAGEM

1ª articulação 2ª articulação

análise plano do conteúdo análise plano da expressão

morfossintaxe fonética e fonologia

art. do voc. art. do disc. sons da fala sons da língua

MORFOLOGIA SINTAXE FONES FONEMAS

MORFEMA SINTAGMA

UNIDADES OPERACIONAIS:

UNIDADE OPERACIONAL DA FONOLOGIA: FONEMA UNIDADE OPERACIONAL DA MORFOLOGIA: MORFEMA UNIDADE OPERACIONAL DA SINTAXE: SINTAGMA

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3 CONCEITO, OBJETO E DIVISÃO DA MORFOLOGIA

O termo morfologia tem a sua origem na justaposição dos radicais gregos

morphê, (forma) e logos, (estudo), significando, assim, “estudo da forma”. Em sentido

amplo, a forma corresponde ao plano de expressão, o qual apresenta dois níveis de realização, o dos sons, que, embora sejam desprovidos de significação, passam a constituir as unidades significativas da língua, o morfema e o da palavra. Ao campo da morfologia pertencem, assim, os estudos sobre a estrutura interna dos vocábulos e sobre a classificação de palavras. Nesse contexto tem-se definido o vocábulo como um termo geral que abrange a própria palavra. É a palavra tratada na sua estrutura física, como um conjunto de fonemas, sem se levar em conta a significação ou a função. Já o termo palavra seria o vocábulo provido de significação externa. Há quem considere que a palavra é sempre uma forma livre. Esse termo tem sido definido levando-se em conta diferentes dimensões do estudo da linguagem. Segundo Rosa (2000, p. 74), o termo palavra, exceto o uso na escrita, pode ser entendido como: a) uma unidade fonológica; b) o elemento mínimo da estrutura sintática; c) um elemento do vocabulário da língua.

Com o avanço dos estudos lingüísticos, tem-se discutido a autonomia da morfologia em relação à sintaxe, resultando daí o uso do termo morfossintaxe. Compreende-se assim que, ao se estudar, por exemplo, a organização interna das palavras, em que se distinguem as categorias de gênero ou número como elementos determinantes, se está no âmbito da sintaxe. Pode-se perceber, por outro lado, que há determinados aspectos sintáticos, a exemplo da concordância, que se manifestam por meio de processos morfológicos flexionais. Dessa forma, não há como negar o ponto de convergência entre morfologia e sintaxe, o que, a nosso ver, entretanto, não permite defender a tese de que “a morfologia não tem um objeto real e autônomo” conforme defende Saussure (1957, p.157). Refutando o pensamento saussureano, Câmara Júnior (1972, p. 10) defende que é possível fazer uma descrição morfológica de uma forma lingüística sem se recorrer ao aspecto sintático. Tomando como exemplo a forma pronominal

ele, esse lingüista mostra que por meio da oposição dentro do paradigma é possível

identificar o valor desse pronome, ou seja, é possível dizer que o ele é uma forma masculina, singular e de terceira pessoa. Gleason Jr. (1961), em seus estudos sobre os constituintes imediatos e sobre a noção de construção, define a morfologia como “a gramática interna das palavras” e a sintaxe como o estudo de “sua gramática externa e das seqüências de palavras”, vale ressaltar, entretanto, que para esse autor, as noções que distinguem morfologia e sintaxe não são claras.

A nosso ver, o que se pode dizer é que morfologia e sintaxe constituem dois níveis de descrição lingüística que, apesar de suas especificidades, se complementam. É nesse

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sentido que o termo morfologia vem sendo definido no contexto da tradição gramatical e lingüística. Para Dubois J. et alli (1986, p.421- 422), no contexto da gramática tradicional, a morfologia é o estudo das formas das palavras (flexão e derivação),

em oposição ao estudo das funções ou sintaxe. Já no âmbito da lingüística, o termo

morfologia apresenta-se sob duas definições, como descrição das regras que regem a

estrutura interna das palavras isto é, as regras de combinação entre morfemas-raízes para construir palavras (regras de formação das palavras) e a descrição das formas que tomam essas palavras conforme a categoria de número, gênero, tempo, pessoa e, conforme o caso (flexão das palavras), em oposição à sintaxe que descreve as regras de combinação entre os morfemas léxicos (morfemas, raízes e palavras) para constituir frases; b) ou a morfologia é a descrição, ao mesmo tempo, das regras da estrutura interna das palavras e das regras de combinação dos sintagmas em frases. A morfologia se confunde, então, com a formação das palavras, a flexão e a sintaxe e opõe-se ao léxico e à fonologia. Nesse caso, diz-se, de preferência, morfo-sintaxe.

Segundo Santos (1981),a morfologia constitui uma parte da gramática, ao lado da sintaxe, da fonologia e da semântica. Para esse estudioso, em línguas casuais é difícil separar morfologia de sintaxe, pois formas e funções sintáticas estão intimamente relacionadas. Diz esse lingüista que em frases como pater filios amat, o nome pater é ao mesmo tempo nominativo*, sujeito e singular.

Segundo Cabral (1974, 129), se se considera a morfologia isolada da sintaxe, entendendo como unidade mínima o morfema e como unidade máxima a palavra, a morfologia é a parte da gramática que descreve as unidades mínimas de significado,

sua distribuição, e classificação, conforme as estruturas onde ocorrem, a ordem que ocupam, os processos na formação de palavras e suas classes.

Pelos conceitos apresentados, podemos identificar como objeto da morfologia o morfema e a palavra, para cujo estudo faz-se necessário conhecer os dois eixos da linguagem: o paradigmático e o sintagmático, assunto a que nos dedicaremos no item seguinte.

4 EIXOS DA LINGUAGEM

Segundo Saussure, (7ed. s/d p. 142), as relações e as diferenças entre termos

lingüísticos se desenvolvem em duas esferas distintas, cada uma das quais é geradora de certa ordem de valores; [...]. Essas ordens contribuem para que se compreenda

melhor a natureza de cada uma delas e correspondem a duas formas de nossa atividade mental, sendo ambas necessárias para a vida da língua.

De acordo com o pensamento desse lingüista, as unidades operacionais da (*) Caso do

la-tim que equiva-le à função de sujeito ou de predicativo.

Pelos conceitos apresentados, podemos identificar como objeto da morfologia o morfema e a palavra, para cujo estudo faz-se necessário conhecer os dois eixos da linguagem: o paradigmático e o sintagmático, assunto a que nos dedicaremos no item seguinte.

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morfologia (morfema) e da sintaxe (sintagma) relacionam-se em dois diferentes eixos

da linguagem, o paradigmático e o sintagmático. As relações paradigmáticas ocorrem no sistema morfológico e decorrem do fato de, em um dado contexto, uma unidade poder ocupar o lugar da outra, mas não simultaneamente, por estabelecer entre si relação de forma ou de sentido. Essas relações ocorrem com as unidades que não estão presentes no enunciado, são relações virtuais, mnemônicas, que ocorrem“in absentia”. O paradigma é constituído de unidades lingüísticas que são agrupadas a partir de um traço lingüístico permanente, que é denominador comum de todas essas unidades. Já no eixo sintagmático, as relações se dão com as unidades presentes no enunciado, são relações “in presentia” que resultam do caráter linear da linguagem humana, que exclui a possibilidade de pronunciar duas formas lingüísticas ao mesmo tempo. Numa frase do tipo: Os estudantes propõem novo calendário, as formas lingüísticas estabelecem relações entre si. O artigo definido “os” (termo determinante) se relaciona com o substantivo “estudantes” (termo determinado) na construção do sintagma nominal, este por sua vez já se relaciona com o sintagma verbal, propõem

mudanças no calendário, cujos constituintes se relacionam entre si.

No eixo paradigmático, as relações, como vimos, não se dão com os elementos presentes no texto, mas com os que estão na memória. Assim, o nome “estudantes”, poderia ser substituído, por exemplo, pelas formas: “aluno” e “discente” porque elas mantêm entre si uma relação de sentido, pertencendo essas formas, por isso, ao mesmo paradigma. Por outro lado, sob o ponto de vista formal, pertencem ao mesmo paradigma de “estudante” formas como: “participante”, “feirante”, “comerciante”, por apresentarem um elemento comum (o sufixo –nte) que as coloca num mesmo paradigma, a classe dos nomes. Pertencem ainda, sob o ponto de vista formal e semântico, ao mesmo paradigma as diversas formas do verbo estudar: estudarei,

estudamos, estudaríamos.

Essas noções estão resumidas no quadro a seguir. Veja.

QUADRO-RESUMO

EIXOS DA LINGUAGEM

PARADIGMÁTICO SINTAGMÁTICO

relações virtuais

relações “in absentia”

relações efetivas relações “in praesentia” SISTEMA MORFOLÓGICO SISTEMA SINTÁTICO SIGNIFICANTE NÃO-EXTENSO SIGNIFICANTE EXTENSO

(morfema e palavra) (sintagma)

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5 MORFOLOGIA DERIVACIONAL E MORFOLOGIA FLEXIONAL

Segundo Borba (1984, p. 160), “O conjunto dos morfemas de uma língua

mais seus processos combinatórios cumprem uma dupla finalidade: (i) estruturar e enriquecer o léxico e (ii) possibilitar a indicação de valores gramaticais. Daí se

poder dizer que há dois grandes setores no campo da morfologia, o da morfologia derivacional ou lexical e a morfologia flexional.

A distinção morfologia derivacional e morfologia flexional foi estabelecida pelo gramático latino Varrão (Apud Câmara 1996, p. 81). Esse gramático distinguia o processo de derivatio voluntaria, que dá origem a novas palavras e o processo de

derivatio naturalis, mediante o qual se indicam as modalidades específicas de uma

dada palavra. O mecanismo básico da primeira é a derivação, processo através do qual são formadas novas palavras, já o da segunda é a flexão, processo através do qual se indicam as categorias gramaticais.

Compete à morfologia derivacional o estudo da estrutura interna das palavras, os processos de formação das palavras e as relações entre paradigmas diferentes. À morfologia flexional compete estudar a variação de palavras que pertencem a um mesmo paradigma. O paradigma constitui-se de um grupo de formas que se relacionam flexionalmente a partir de um radical comum, conforme se pode perceber nos exemplos abaixo: MANDAR BELO mandava belo mandavas bela mandava belos mandávamos belas mandáveis

Desde a tradição latina, os estudos no campo da morfologia têm procurado enfatizar as diferenças desses dois processos: o derivacional e o flexional. Mais recentemente, alguns estudiosos têm seguido outra direção, ou seja, têm considerado que esses dois campos de estudo não se opõem, mas se complementam. Não obstante essa nova perspectiva, destacaremos aqui algumas características que são inerentes a cada processo.

A visão dicotômica desses dois processos morfológicos ainda é bastante discutida. Ora se defende uma rígida separação, ora se nega a existência de fronteiras entre esses processos, destacando-se semelhanças e diferenças. Segundo Câmara (1970, p. 40), “a

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gramática greco-latina não resolveu com nitidez e rigor o problema da decomposição mórfica do vocábulo, embora percebesse o processo da flexão casual, na declinação do nome, e o da criação de um vocábulo mais simples.”

Veja, a seguir, em que aspectos a morfologia derivacional se difere da morfologia flexional.

5.1 FLEXÃO E DERIVAÇÃO: CARACTERES EM OPOSIÇÃO

5.1.1 PROCESSO OBRIGATÓRIO / PROCESSO FACULTATIVO

a) FLEXÃO: processo obrigatório no sistema, que se impõe para o falante. Ex.: alun /o/ s estúdios /o / s

b) DERIVAÇÃO: processo facultativo, de caráter aleatório, que não se impõe

como obrigação.

Ex.: Ele comprou um casarão (casinha, casebre)

5.1.2 PROCESSO SISTEMÁTICO E COERENTE / PROCESSO NÃO SISTEMÁTICO

a) FLEXÃO: processo sistemático e coerente que impõe severas implicações sintáticas.

Ex.: A alun / a desafiou o mestre que a indagava.

b) DERIVAÇÃO: processo assistemático, não homogêneo, que não obedece a uma pauta sistemática para toda uma classe do léxico.

Ex.: cantar – cantarolar saltar – saltitar combater – combate falar – ? chorar – choramingar pontuar – pontuação gritar – ?

5.1.3 PROCESSO RIGOROSAMENTE GRAMATICAL / PROCESSO LEXICAL

a) FLEXÃO: processo que opera com categorias rigorosamente gramaticais, exclusivamente “intra” classe e que repercutem no sistema fechado da língua.

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b) DERIVAÇÃO: processo que opera com relações abertas, ou “inter” classe. Ex.: lei (substantivo)

legal (adjetivo) legalmente (advérbio)

5.1.4 PROCESSO EXAUSTIVO / PROCESSO NÃO EXAUSTIVO

a) FLEXÃO: processo de caráter exaustivo que opera com categorias gramaticais que constituem o sistema fechado da língua.

Ex.: alun / o alun / a alun /o/ s alun / a /s cant / a /va cant / a / sse

b) DERIVAÇÃO: processo não exaustivo, um modelo não exclui o outro. Ex.: lei a) legal – legalíssimo b) legítimo – legitimar legalmente legitimação legalizar legitimamente

Para se descrever os mecanismos morfológicos, sejam eles derivacionais ou flexionais, faz-se necessário retomarmos aqui os conceitos de vocábulo fonológico e de vocábulo formal. Veja a seguir.

6 VOCÁBULO FORMAL E VOCÁBULO FONOLÓGICO

A descrição do vocábulo formal nos remete ao conceito de vocábulo fonológico. Este vocábulo é definido a partir da presença do acento. No português, o acento tem uma dupla função: uma distintiva e uma demarcativa. A função distintiva é a que serve para distinguir palavras como fábrica (subs.) e fabrica (verbo); exército (subs.) e exercito (verbo) jaca (fruta) jacá (tipo de cesto), funcionando, assim, como um processo gramatical para distinguir padrões morfológicos. A função demarcativa é a que serve para marcar a existência de um vocábulo fonológico. No português do Brasil, há uma pauta acentual para cada vocábulo. As sílabas classificam-se de acordo com a posição do acento em tônicas e átonas, sendo essas subclassificadas em pretônicas e postônicas. De acordo com Câmara Júnior, as tônicas são marcadas com tonicidade 3, as pretônicas, com 1 e as postônicas, com 0. Isoladamente, os vocábulos apresentam essa pauta acentual. Tomemos como exemplo, os vocábulos(:) cadernos, novos e

cinco

a) Ca / der / nos

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b) no / vos 3 0 cin / co c) 3 0

Constituindo esses vocábulos um grupo de força, ou seja, uma seqüência de vocábulos sem pausa, conceito apresentado por Paul Passy (apud Câmara Júnior, 1975 p. 63), a pauta acentual desses vocábulos modifica-se, permanecendo apenas com tonicidade 3 o último vocábulo do grupo, passando as demais sílabas tônicas dos vocábulos precedentes à tonicidade 2.

Veja:

cin / co ca / der / nos no vos 2 0 1 2 0 3 0

três gran / des ho / mens 2 2 0 3 0

Faz-se necessário destacar que não existe coincidência absoluta entre o vocábulo fonológico e o vocábulo formal. Nas chamadas palavras compostas por justaposição, como por exemplo, em guarda-chuva, porco-espinho e passatempo, há dois vocábulos fonológicos e um só vocábulo formal. Há dois acentos em cada palavra, um acento de tonicidade 2 e outro de tonicidade 3, conforme podemos constatar na descrição abaixo.

guarda – chuva porco – espinho passatempo 2 0 3 0 2 0 1 3 0 2 0 3 0

Já nas formas verbais com pronome proclítico ou enclítico em que a forma dependente se junta a uma forma livre, como em se fala (fala-se) ou se comenta (comenta-se) por exemplo, tem-se um só vocábulo fonológico e dois vocábulos formais. Vejamos, a seguir, os conceitos de forma livre, forma presa e forma dependente.

7 FORMA LIVRE, FORMA PRESA E FORMA DEPENDENTE

Segundo Camara Júnior (1975, p.69), os vocábulos formais de uma língua classificam-se em formas livres, formas presas e formas dependentes. De acordo com esse lingüista, o vocábulo formal é a unidade a que se chega quando não é possível

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nova divisão em duas ou mais formas livres.

São formas livres as que podem funcionar isoladamente como comunicação suficiente, conforme o advérbio bem no exemplo: Como você está? Bem. A forma livre tem autonomia formal e autonomia fonológica, constituindo-se, assim, um vocábulo fonológico. As formas presas são as que só funcionam agregadas a outras formas lingüísticas. São exemplos de formas presas os morfemas flexionais e derivacionais como os destacados em: certeza, desleal, cantamos, estudava. As formas presas, ao contrário das formas livres, não possuem nem autonomia formal nem autonomia fonológica, não constituindo, assim, um vocábulo formal nem vocábulo fonológico. As formas dependentes, por sua vez, são definidas como as que não são livres, porque não podem funcionar isoladamente como comunicação suficiente, mas também não são presas, uma vez que entre esta e a forma livre com a qual ela constitui o vocábulo fonológico podem-se intercalar novas formas, é o que se pode constatar no exemplo:

encontrar um livro, em que se pode intercalar entre a forma dependente um e a forma

livre livro outras formas livres, como por exemplo, em: um bom e excelente livro. As formas dependentes apresentam autonomia formal, mas diferentemente da livre, não apresenta autonomia fonológica, não constituindo assim um vocábulo fonológico. Veja exemplos de formas livres, formas presas e de formas dependentes, na estrofe a seguir:

“E as vinte palavras recolhidas

nas águas salgadas do poeta e de que se servirá o poeta em sua máquina útil.”

(João Cabral de Melo Neto. Auto do Frade)

São exemplos de formas livres: palavras, recolhidas, águas, salgadas,

poetas, servirá, máquina e útil; de formas presas: -s, que marca o plural dos nomes

substantivos e adjetivos (morfema de plural nos nomes), e -a, vogal temática nominal nos nomes: poeta e máquina; e de formas dependentes: e, as, de, que, se, o.

QUADRO-RESUMO

autonomia formal

autonomia fonológica

Forma livre + + = vocábulo fonológico

Forma dependente + - = não voc. fonológico

Forma presa - - = não voc. fonológico

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QUADRO-RESUMO autonomia formal autonomia fonológica

Forma livre + + = vocábulo fonológico

Forma dependente + - = não voc. fonológico

Forma presa - - = não voc. fonológico

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Resta ainda observar que as formas livres, assim como as formas dependentes,

podem ser constituídas de um só elemento mórfico, sendo por isso indivisíveis (mar,

sol, fé) ou de mais de elemento mórfico (leal-dade, in-fiel, calm-a-ment-e), sendo,

portanto, passíveis de uma divisão em unidades significativas, ou seja, em morfemas. Os vocábulos formais da língua (formas livres, formas presas e formas dependentes) se distribuem em dois subsistemas: o sistema aberto e o sistema fechado.

8 SISTEMA ABERTO E SISTEMA FECHADO

Como vimos, os vocábulos formais, de que se constitui um idioma se distribuem em dois grupos, o sistema aberto e o sistema fechado.

O sistema aberto é assim definido pelo fato de seu número de palavras ser

ilimitado, podendo ser ampliado ao longo do tempo. A esse sistema pertencem as classes dos nomes (substantivo, adjetivo e advérbio) e dos verbos, em outras palavras, a classe dos lexemas, para Pottier ou dos semantemas para Vandryes. Esse sistema representa a quase totalidade do saber lingüístico, sendo impossível sua assimilação total e seu conhecimento dispensável para a identificação dos sintagmas em que ocorrem. São exemplos de palavras que pertencem ao sistema aberto as destacadas nos versos abaixo. Veja.

Eu não tinha este rosto de hoje,

assim calmo, assim triste, assim magro nem estes olhos tão vazios,

nem o lábio amargo.

(MEIRELES, Cecília. Retrato, In: ___. Os melhores poemas de Cecília Meireles. Seleção de Maria Fernanda. 11 ed. São Paulo: Global, 1999, p.13).

O sistema fechado é assim denominado por ter limitado seu número de

palavras, não podendo, assim, ser ampliado. Pertencem a esse sistema as classes dos pronomes, dos numerais, dos artigos, das preposições e das conjunções. São, na terminologia de Pottier, os gramemas, e na de Vandryes, os morfemas. É possível sua assimilação, uma vez que o número de palavras é relativamente pequeno, uma série de curtas listas de unidades da língua, cuja ocorrência se dá com maior repetição no texto. O conhecimento prévio das palavras desse sistema é indispensável para a identificação dos sintagmas em que ocorrem. São exemplos de palavras que pertencem ao sistema

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fechado as destacadas nos versos abaixo. Veja.

Eu não tinha estas mãos sem força, Tão paradas e frias e mortas Eu não tinha este coração Que nem se mostra.

(MEIRELES, Cecília. Retrato, In: ___. Os melhores poemas de Cecília Meireles. Seleção de Maria Fernanda. 11 ed. São Paulo: Global, 1999, p.13).

9 A UNIDADE OPERACIONAL MORFOLOGIA: MORFEMA / MORFE

No primeiro momento dos estudos estruturalistas, o morfema foi definido por Bloomfield (1933) como uma forma (significativa) recorrente que não pode, por

sua vez, ser analisada novamente em formas (significativas) recorrentes menores.

Em outras palavras, o morfema é considerado como uma unidade mínima dotada de significação, que apresenta o mesmo traço semântico. De acordo com essa concepção, o morfema apresenta três características básicas: a) ter um traço semântico recorrente e b) não poder ser dividida em formas significativas menores e c) não poder apresentar semelhança fonético-semântica com nenhuma outra forma.

Vejamos: cas /a / s cas / eiro cozinh / a/ s cozinh / eiro

Nesses exemplos, identificamos formas mínimas que apresentam o mesmo traço semântico em todas as ocorrências, -a vogal temática nominal; –s marca de plural dos nomes; eiro, sufixo formador de substantivo, significa agente ou profissão. Considerando os pares casa/caseiro; cozinha/cozinheiro, observa-se que os morfemas lexicais cas-, cozinh-, mantêm seu significado nas palavras derivadas.

Com o desenvolvimento dos estudos lingüísticos, mais exatamente com Lyons (1970) e Matheus (1974), o termo morfema passou a ser definido como uma abstração

que envolve significados e possibilidades combinatórias (CARONE, 1991, p.23). A

partir daí passou-se a fazer distinção entre morfema e morfe, definindo-se o morfe como segmento mínimo significativo recorrente que representa um dado morfema. (LAROCA, 1994, p.32). Segundo Lopes, (1995, p. 170). O morfe pode ser definido como cada realização concreta de um mesmo morfema, ou seja, cada interpretação

fonológica do mesmo conteúdo. Essa distinção contribuiu para a compreensão de

fenômenos como neutralização, alomorfia, cumulação, conforme veremos de modo mais detalhado no segundo capítulo.

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Os morfemas de uma língua são divididos em morfemas lexicais, que se situam

no léxico e em morfemas gramaticais, que se situam na gramática. Estes últimos se subdividem em: classificatórios, flexionais, derivacionais e relacionais.

Os morfemas classificatórios têm como função enquadrar os vocábulos nas classes dos nomes e dos verbos. São as vogais temáticas nominais (-a, -e, -o) e verbais (-a, -e, -i). Nos nomes terr-a, pent-e e livr-o, são as vogais átonas finais que classificam essas formas na classe dos nomes. Já as formas verbais cant-a-r, vend-e-r e part-i-r têm como elemento caracterizador da conjugação as vogais –a, -e, -i. As formas lingüísticas desprovidas desse elemento mórfico são chamadas de atemáticas. No caso dos nomes, são atemáticos os terminados por consoante (mar, fóssil, revolver) ou por vogal tônica (cajá, café, cipó). São exemplos de formas verbais atemáticas a primeira pessoa do presente indicativo (canto, vendo e parto), todas as pessoas do presente do subjuntivo (cante, cantes, cante, cantemos, canteis, cantem) entre outras formas.

Os morfemas flexionais traduzem as categorias gramaticais, de gênero e de número, nos nomes e alguns pronomes, e de modo tempo, número e pessoa, nos verbos. Os morfemas flexionais se subdividem em: aditivo, permutativo, subtrativo,

substitutivo e morfema-zero.

Morfema aditivo: o morfema que, sendo constituído por um ou mais fonema,

se acrescenta ao morfema lexical ou radical: professor / professora, diretor / diretora,

aluno/ alunos, luz / luzes etc.

Morfema permutativo: o morfema que se realiza por meio da troca de um

segmento fônico por outro, assinalando uma oposição: aluno / aluna, gostoso / gostosa,

belo / bela, cantava / cantasse, cantamos / cantais etc.

Morfema subtrativo: o morfema que opera por meio da supressão de algum

segmento fônico: irmão / irmã, órfão / órfã etc.

Morfema substitutivo: o morfema que se realiza por um processo de

substituição ou alternância de vogais: fiz / fez, tive / teve, pode / pôde etc.

Morfema-zero: o morfema que não se faz representar por nenhum morfe para

indicar uma categoria gramatical: bola – singular marcado por morfema-zero; cantor – masculino marcado por morfema-zero; falamos (pretérito perfeito) – modo e tempo marcados por morfema-zero.

Morfema supra-segmental: o morfema que resulta da variação de intensidade

que pode funcionar como elemento diferenciador: secretária / secretaria, fábrica / fabrica etc. Nesses casos, tem-se a oposição –á (tônico) / a (átono).

A alternância vocálica pode funcionar como traço secundário na distinção de gênero e de número, podendo ser considerada como uma alternância submorfêmica, uma vez que enfatiza a distinção que se estabelece entre duas formas por meio de morfemas, como ocorre nos pares famoso / famosa, em que a distinção de gênero se estabelece pela permuta dos morfemas -o por –a, sendo essa distinção acentuada

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pela alternância vocálica -ô e -ó; ou entre os pares porco / porcos, em que a distinção singular/plural é marcada pelo morfema de plural –s e acentuada pela alternância vocálica –ô / ó.

Veja mais alguns exemplos de morfemas flexionais:

a) aditivo: diretor/diretor-a; b) permutativo: alun-o/alun-a; c) subtrativo: órfão/órfã;

d) alternativo: gostoso/gostosa – ô/ó; e) morfema zero: cantas/canta-.

f) morfema supra-segmental: hóspede/hospede

Os morfemas derivacionais são os que criam novas palavras na língua. Tradicionalmente são denominados de afixos e classificados como prefixos e sufixos. São exemplos: reler, im-próprio, a-céfalo, livreiro, lealmente, famoso.

Os morfemas relacionais são os que ordenam as formas lingüísticas nas frases, sendo responsáveis pela organização dos morfemas lexicais entre si. São exemplos de morfemas relacionais as formas lingüísticas destacadas no seguinte enunciado:

Os mestres que se prepararam para o concurso foram aprovados. São morfemas

relacionais na língua portuguesa: preposições, conjunções e pronomes relativos.

ATIVIDADES

CAROS ALUNOS,

PONHAM EM PRÁTICA OS CONHECIMENTOS ADQUIRIDOS NESTA UNIDADE, RESOLVENDO AS ATIVIDADES PROPOSTAS A SEGUIR.

1) Com base nos estudos desenvolvidos, apresente um conceito para o termo

morfologia.

____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________

2) A partir das características apresentadas, estabeleça distinção entre morfologia

derivacional e morfologia flexional.

____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________

ATIVIDADES

CAROS ALUNOS,

PONHAM EM PRÁTICA OS CONHECIMENTOS ADQUIRIDOS NESTA UNIDADE, RESOLVENDO AS ATIVIDADES PROPOSTAS A SEGUIR.

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____________________________________________________________________

____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________

3) Após ler os versos abaixo, identifique, nos vocábulos destacados, fenômenos de

flexão e de derivação.

Na feira–livre do arrabaldezinho

Um homem loquaz apregoa balõezinhos de cor – O melhor divertimento para as crianças!

Em redor dele há um ajuntamento de menininhos pobres

Fitando com olhos muito redondos os grandes balõezinhos muito redondos.

(BANDEIRA, Manuel. Estrela da vida inteira. 2. ed. José Olympio, 1970, p. 98)

4. Identifique com V a(s) afirmativa(s) verdadeira(s) e com F, a(s) falsa(s).

4.1 ( ) A unidade operacional da morfologia é o morfema.

4.2 ( ) A morfologia trabalha com unidades pertencentes à primeira articulação da linguagem.

4.3 ( ) Compete à morfologia estudar a organização interna dos vocábulos e a classificação das palavras.

4.4 ( ) Forma livre e a forma dependente possuem autonomia formal e fonológica. 4.5 ( ) A forma presa e a forma dependente possuem apenas autonomia formal. 4.6 ( ) Só a forma livre possui autonomia formal e fonológica.

4.7 ( ) Só as unidades pertencentes ao sistema fechado da língua respondem com eficiência pela identificação do real sistema da língua.

4.8 ( ) O sistema aberto de uma língua pode ser sempre ampliado com a criação de novas palavras

4.9 ( ) Ao sistema aberto pertencem os lexemas, ou seja, as classes dos nomes e dos verbos.

4.10( ) Ao sistema fechado pertencem os gramemas, ou seja, as classes dos pronomes e dos vocábulos conectivos.

5) Classifique as formas destacadas nos versos a seguir em formas livres, formas presas e formas dependentes:

O poeta é um fingidor Finge tão completamente

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76

Que chega a fingir que é dor A dor que deveras sente.

(PESSOA, Fernando. Obra poética. Rio de Janeiro: Aguiar, 1969)

a) formas livres: __________________________________________________ b) formas presas: __________________________________________________ c) formas dependentes: ______________________________________________

6) As palavras destacadas nos versos abaixo pertencem ao sistema aberto e, ao

sistema fechado da língua, identifique-as.

Dizem que finjo ou minto Tudo que escrevo. Não. Eu simplesmente sinto Com a imaginação. Não uso o coração.

Tudo o que sonho ou passo,

O que me falha ou finda, É como que um terraço Sobre outra coisa ainda.

Essa coisa é que é linda.

(PESSOA, Fernando. Obra poética. Rio de Janeiro: Aguiar, 1969)

a) Sistema aberto: ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ b) Sistema fechado: __________________________________________________ __________________________________________________ __________________________________________________

7. Identifique com V a(s) afirmativa(s) verdadeira(s) e com F, a(s) falsa(s)

( ) O morfema lexical responde pela significação da palavra, servindo ao mesmo tempo como base para a formação de novas palavras.

( ) O morfema gramatical tem por função enquadrar o morfema lexical dentro de uma categoria da língua.

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( ) Os morfemas classificatórios formam os temas nominais e os temas verbais.

( ) Os morfemas flexionais indicam as categorias gramaticais de gênero e número dos nomes e as categorias gramaticais de: modo, tempo, número e pessoa dos verbos.

8. Classifique os morfemas destacados nos vocábulos a seguir, atentando para a distinção: morfemas lexicais e morfemas flexionais.

a) crianças b) garotinhas c) pobreza d) mundo e) belíssimo

9. Classifique os morfemas flexionais (aditivos, subtrativos, permutativos, alternativos) e classifique-os a) aluno / aluna b) diretor / diretora c) avô / avó d) irmão / irmã e) mestre / mestra

10. Dê exemplos de palavras que apresente, na sua estrutura mórfica, morfema-zero: a) _________________

b) _________________ c) _________________ d) _________________ e) _________________

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UNIDADE II

A ESTRUTURA DOS VOCÁBULOS E OS PROCESSOS DE

FORMAÇÃO DE PALAVRAS

1. ANÁLISE MÓRFICA: PRINCÍPIOS BÁSICOS E AUXILIARES

Análise mórfica consiste na depreensão das formas mínimas que constituem os vocábulos formais de uma língua. Segundo Camara Júnior (1975, p.72), é por meio desse processo que se procede à descrição rigorosa das formas de uma determinada língua.

O princípio básico da análise mórfica é a comutação, técnica que consiste, segundo esse autor, na substituição de uma invariante por outra, de que resulta novo

vocábulo formal. Para compreendermos melhor esse princípio, tomemos como exemplo

a forma verbal cantávamos, cujos elementos mórficos são: cant- (radical), -á- (vogal temática); -va- (sufixo modo temporal) e –mos (sufixo número pessoal). A substituição, por exemplo, do sufixo modo-temporal –va por outros do mesmo paradigma (-sse, -ra,

-ria), ou seja, a comutação desse morfema por outros terá como resultado, um vocábulo

formal diferente. Comparando-se as formas cantasse, cantara e cantaria, observamos que essas formas apresentam-se em tempos e modos diferentes, respectivamente, pretérito imperfeito do subjuntivo, mais-que-perfeito do indicativo e futuro do pretérito do indicativo. Por outro lado, se comutarmos a desinência número-pessoal –mos por

–s ou –is, tendo-se em razão disso, as formas cantaras e cantasses, observamos que

essas formas correspondem a pessoas gramaticais diferentes, respectivamente, 2ª do singular e 2ª do plural. Nesses casos, mantém-se apenas a significação lexical. Por outro lado, comutando-se, o morfema lexical cant-(cantava), por exemplo por and- (andar) e estud- (estudar), resultando daí as formas andava e estudava, mantêm-se o mesmo tempo e modo verbal, alterando-se a significação lexical.

Segundo (KOCH & SILVA, 2005, p.27), a comutação consiste em uma

operação contrastiva por meio de permuta de elementos para o qual são necessárias: a) a segmentação do vocábulo em subconjuntos e b) a pertinência paradigmática entre os subconjuntos que vão ser permutados.

Os princípios auxiliares da análise mórfica são: a alomorfia, a neutralização, e a cumulação. A alomorfia (állos/outro e morphé/forma) consiste no fato de um morfema poder ser representado por morfes diferentes, por configurações fonemáticas diferentes. Em outras palavras, um morfema não é representado obrigatoriamente por um segmento fônico imutável, sendo passível de variação. Pode-se verificar que nas formas verbais cantava / cantáveis, o morfema modo-temporal é representado por

UNIDADE II

A ESTRUTURA DOS VOCÁBULOS E OS PROCESSOS DE

FORMAÇÃO DE PALAVRAS

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mofes diferentes –va/-ve, sendo o morfe –ve alomorfe de –va. Na forma flores, a

marca de plural –s está representado pelo alomorfe –es.

A alomorfia pode ser de natureza a) mórfica, privativa da primeira articulação da linguagem, como a que se percebe em noite / noturno; trazer / trouxe; caber /coube; b) fonológica, em que se tem como exemplo a alomorfia da vogal temática dos verbos de 1ª conjugação, quando conjugados no pretérito perfeito do indicativo, a exemplo de andar / andei / andou; e ainda c) de natureza gramatical, como a que se dá com as formas do particípio de verbos abundantes, em que o uso de uma forma ou outra é determinado por uma regra da gramática. A regra gramatical determina que com os auxiliares ter e haver deve-se usar a forma do particípio regular, tinha expressado e com os auxiliares ser e estar a forma do particípio irregular, tendo-se a expressão foi

expresso.

Um outro princípio auxiliar da análise mórfica é o da neutralização ou homonímia. Tem-se aqui um processo inverso ao da alomorfia. Na neutralização, um único morfe representa dois ou mais morfemas diferentes, cujas oposições fonológicas foram eliminadas. Em outras palavras, os diferentes significados de dois morfemas se anulam no plano de expressão, mantendo-se a distinção no plano do conteúdo. É o que se pode perceber nos exemplos: a) menin –a –s e cant –a –s, em que os morfes –a e –s apresentam o mesmo plano de expressão, mas são diferentes no plano do conteúdo. Enquanto o –a de meninas representa o morfema de gênero e o –s, morfema de número plural, uma desinência (sufixo) nominal de número, em cantas, o –a é um morfema classificatório, uma vogal temática verbal, e o –s, uma desinência (sufixo) número pessoal que indica a 2ª pessoa do singular. A neutralização morfológica pode resultar de uma neutralização fonológica, em que se elimina a oposição entre dois fonemas, a exemplo do que ocorre com as formas verbais vende e parte, tornando indistinta a segunda e a terceira conjugações, fato que resulta da neutralização dos fonemas /ê/ e /i/, em posição átona final.

À guisa de conclusão podemos dizer que a neutralização consiste em fazer desaparecer a oposição fonológica entre dois morfes que representam morfemas distintos.

2 ESTRUTURA MÓRFICA DOS VOCÁBULOS

Como vimos na primeira unidade, os vocábulos formais são constituídos de diferentes elementos mórficos denominados de morfemas. No âmbito mais geral, esses morfemas são classificados em morfemas lexicais, os que dão conta da significação externa, e em morfemas gramáticas (flexionais, classificatórios e derivacionais), os que vão se reportar à significação interna ou gramatical. Analisando-se as estruturas nominais como: sol, terra, garotas, menininhas, beleza, desleal, deslealmente,

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81

casamento, podemos constatar que os nomes em português apresentam diferentes

estruturas mórficas, podendo ser constituídos, por exemplo, de:

1. morfema lexical: sol,

2. morfema lexical + morfema classificatório (vogal temática nominal - VTN): terr-a, 3. morfema lexical + morfemas flexionais (DNG +DNN): garot-a-s,

4. morfema lexical + morfema derivacional (sufixo derivacional) + morfemas flexionais: menin-inh-a-s

5. morfema lexical + morfema derivacional + morfema classificatório: bel-ez-a, 6. morfema derivacional (prefixo) + morfema lexical: des-leal

7. morfema derivacional + morfema lexical + morfema derivacional + morfema classificatório: des-leal-ment-e

8. morfema lexical + morfema classificatório + morfema derivacional + morfema classificatório: cas-a-ment-o

Considerando a estrutura mórfica das formas verbais no português, Câmara (1975, p. 104) apresenta uma fórmula geral, cuja representação é: T (R+VT) SF (SMT +SNP). O elemento mórfico T, que corresponde ao tema, é constituído de outros elementos, o morfema lexical – tradicionalmente definido como radical – e o morfema classificatório, neste caso, correspondendo à vogal temática verbal (VT). Ao tema (T) se agregam os morfemas flexionais (SF), tradicionalmente denominados de desinências modo-temporal e número-pessoal.

Analisando-se as formas verbais estudássemos e cantarias, observamos que a estrutura de cada uma dessas formas corresponde ao modelo apresentado por Câmara. Vejamos:

ESTUDÁSSEMOS

estud– R (radical, morfema lexical) –a– VT (vogal temática) estuda – T (tema)

–sse– SMT (sufixo modo-temporal / desinência modo-temporal) – mos SNP (sufixo número-pessoal / desinência número-pessoal)

CANTARIAS cant– R –a– VT canta– T –ria– SMT –s SNP

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Na análise de determinadas formas verbais, há, entretanto, a necessidade de se levar em conta fenômenos como o da alomorfia, da neutralização e do morfema zero, fato que veremos mais adiante ao tratarmos do mecanismo da flexão verbal.

3 PROCESSOS DE FORMAÇÃO DE PALAVRAS

Estudando-se o léxico da língua portuguesa, observamos que este se constitui, em sua grande maioria, de palavras herdadas do latim; de palavras que provêm de outras línguas, como por exemplo: inglês, francês, espanhol; e finalmente de palavras de formação vernácula. Este último recurso de enriquecimento do léxico conta basicamente de dois processos gerais de formação de palavras: a derivação e a composição. O estudo desses processos de formação parte de uma perspectiva sincrônica, considerando a existência de palavras simples e compostas. As simples podem ser primitivas e derivadas, sendo estas formadas a partir daquelas.

Vamos conhecer esses processos de formação de palavras.

A derivação pode ser definida como um processo de formação de palavras que consiste na junção de um afixo (prefixo ou sufixo) a um morfema lexical ou radical. A palavra derivada é constituída, assim, de um radical e um afixo. São exemplos de palavras derivadas: recontar, afônico, irreal, bebedouro, eufonia, ansioso, poluição etc.

A composição pode ser definida como um processo de formação de palavras que consiste na junção de dois ou mais radicais que se combinam. São exemplos de palavras compostas: guarda-roupa, amor-perfeito, pôr-do-sol, pé-de-meia etc.

São três basicamente os tipos de derivação:

prefixal,

a) que consiste na junção de um prefixo a um morfema lexical (radical): reler, ilegal, amoral, dispnéia etc.

sufixal,

b) que consiste na junção de um sufixo a um morfema lexical: surdez,

escrevente, suavizar, pureza etc. parassíntese,

c) que consiste na junção simultânea de prefixo e sufixo a um morfema lexical, é um processo por meio do qual se formam, basicamente, verbos: ajoelhar, esfarelar, engarrafar, embainhar etc.

Há dois outros tipos de formação de palavras que são considerados, no âmbito da gramática tradicional e da lingüística, como derivação: a derivação regressiva e a

derivação imprópria ou conversão. Esses processos, entretanto, fogem ao conceito

de derivação. No primeiro caso não há uma junção de um afixo a um radical, mas a subtração de um morfema. São exemplos desse tipo de derivação: combate (de combater), castigo (de castigar), caça (de caçar), luta (de lutar) etc. Já o segundo tipo

(25)

83

resulta da mudança da classe de palavra, como por exemplo, o uso de um adjetivo na

função de advérbio: falar alto, descer redondo, custa caro. Considerando a classificação de palavras proposta por Câmara Júnior (1975), torna-se sem sentido considerar as formas: alto, redondo e caro, nos exemplos dados, como um tipo de derivação. Na realidade, os nomes podem assumir as funções substantiva, adjetiva e adverbial, sendo essa função definida no contexto em que o nome está inserido. Retomaremos esse assunto na terceira unidade.

Alguns lingüistas, a exemplo da Câmara Júnior (1968, p.292) e Macambira (1978, p. 69), têm assumido uma postura diferente em relação à derivação prefixal. Esses autores consideram a prefixação no processo da composição. O argumento apresentado por esses estudiosos é o da independência vocabular, uma vez que alguns prefixos como com, (compor), contra (contrapor), entre, (entreabrir) passaram a funcionar como preposição, adquirindo assim autonomia formal. No âmbito da gramática tradicional, entretanto, impera a classificação da prefixação como um caso de derivação.

Diferentemente da derivação, a composição é um processo de formação de palavras que se dá por meio da junção de dois ou mais morfemas lexicais. Desse processo resulta quase sempre uma palavra nova com significado diferente do daquelas que lhe deram origem. O apagamento do significado das palavras que serviram de base para a composição pode ser parcial ou total, uma vez que o significado dessas palavras pode ou não apresentar uma relação de sentido com o todo, conforme exemplificam os compostos: amor-perfeito, ganha-pão, pé-de-meia, passa-tempo, saca-rolha,

papel-moeda.

Do ponto de vista fonológico, há dois tipos de composição: a justaposição e a aglutinação. Na composição por justaposição, tem-se a junção dos morfemas lexicais, mantendo esses elementos autonomia fonológico. Tem-se aqui, como vimos na 1ª unidade, a falta de coincidência entre vocábulo formal e vocábulo fonológico. No composto por justaposição, há um vocábulo formal e dois fonológicos. Veja os exemplos apresentados no parágrafo anterior.

Na composição por aglutinação, tem-se, igualmente, a junção de dois morfemas lexicais ocorrendo, entretanto, a perda da autonomia fonológica de um desses componentes, como ocorre em boquiaberto, pernalta, vinagre, por exemplo. Aqui há

um vocábulo formal e um vocábulo fonológico, havendo assim uma correspondência entre esses dois planos: o fonológico e o formal.

Além da derivação e da composição, existem outros processos de ampliação do léxico, dos quais os mais citados nas gramáticas tradicionais e nos manuais de lingüística são: hibridismo, siglas e abreviação vocabular.

Hibridismo é a denominação dada aos compostos ou derivados que resultam da junção de elementos de línguas diferentes: burocracia (francês / grego); sociologia

(26)

84

(latim/grego); goiabeira (tupi / português).

A sigla ou acrossemia, segundo Lemos, (1991, p. 174), consiste num processo de redução em que longos títulos ficam reduzidos às letras iniciais das palavras constitutivas desse título: UFPB, (Universidade Federal da Paraíba); UAB (Universidade Aberta do Brasil), EAD (Educação a Distância).

Lemos (1991, p. 174) denomina de braquissemia o processo de formação de palavras visto pela tradição gramatical como abreviação vocabular. Esse processo consiste no emprego de parte de um vocábulo pelo vocábulo. A parte subtraída pode ser inicial, (aférese), medial (síncope) ou final (apócope). São exemplos desse processo de formação de palavras: foto (fotografia), auto (automóvel), pólio (poliomielite), inox (inoxidável).

ATIVIDADES

CAROS ALUNOS,

PONHAM EM PRÁTICA OS CONHECIMENTOS ADQUIRIDOS NA NESSA UNIDADE, RESOLVENDO AS ATIVIDADES PROPOSTAS A SEGUIR.

Leia as estrofes a seguir e resolva as atividades propostas.

Na feira-livre do arrebaldizinho

Um homem loquaz apregoa balõezinhos de cor: – O melhor divertimento para as crianças!

Em redor dele há um ajuntamento de menininhos pobres,

Fitando com olhos muito redondos os grandes balõezinhos muito redondos.

No entanto a feira burburinha.

Vão chegando as burguesinhas pobres, E as criadas das burguesinhas ricas,

E as mulheres do povo, e as lavadeiras da redondeza.

(BANDEIRA, Manuel. Estrela da vida inteira. 2ed. São Paulo: J. Olympio, 1970, p. 98).

ATIVIDADES

CAROS ALUNOS,

PONHAM EM PRÁTICA OS CONHECIMENTOS ADQUIRIDOS NA NESSA UNIDADE, RESOLVENDO AS ATIVIDADES PROPOSTAS A SEGUIR.

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85

1. Faça a análise mórfica dos vocábulos abaixo:

a) crianças: __________________________________________________________ b) olhos: ____________________________________________________________ c) mulheres: _________________________________________________________ d) pobres: ___________________________________________________________ e) burburinhas________________________________________________________ f) ajuntamento: _______________________________________________________ h) balõezinhos: _______________________________________________________ i) redondos: _________________________________________________________ j) ricas: _____________________________________________________________ l) lavadeiras: ________________________________________________________

2. Segmente as formas verbais em seus elementos mórficos e, a seguir, classifique-os.

a) apregoa: ___________________________________________________________ b) fitando: ___________________________________________________________ c) criava: ____________________________________________________________ d) chegássemos: ______________________________________________________ e) divertiu: ___________________________________________________________ f) venderias: __________________________________________________________

3. Identifique o processo de formação das palavras abaixo:

a) divertimento: _______________________________________________________ b) ajuntamento: _______________________________________________________ c) lavadeiras: _________________________________________________________ d) empobrecer: _______________________________________________________ e) feira-livre: _________________________________________________________

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UNIDADE III

CLASSIFICAÇÃO DE PALAVRAS:

DA

TRADIÇÃO

GRAMATICAL

ÀS

MODERNAS

PROPOSTAS DE CLASSIFICAÇÃO

1. A CLASSIFICAÇÃO DE PALAVRAS NO CONTEXTO DA

TRADICIÇÃO GRAMATICAL

O estudo das classes de palavras remonta à tradição greco-latina. Em sua reflexão sobre a linguagem, Platão (apud, NEVES, 1987 ) identificou duas partes do discurso, ônoma (nome) e rhema (verbo), sendo assim a língua constituída de um sistema binário. Esse filósofo buscava descobrir a relação entre o homem e a linguagem, e entre a linguagem e o mundo, ou seja, como o homem fazendo uso da linguagem dizia o mundo. A preocupação deste filósofo não era, na realidade, a linguagem em si, mas a linguagem como forma de dizer o mundo.

A partir da reflexão platônica, Aristóteles (Apud, NEVES, 1987) chegou à noção de linguagem como representação do mundo. Para este filósofo, havia uma relação entre a organização do universo e a organização da linguagem. No universo havia substâncias, que sofriam acidentes e esses ocorriam em determinadas circunstâncias. Em correspondência a essa organização, havia, na linguagem, categorias que representavam as substâncias, chamadas de substantivos; outras que traduziam os acidentes, os adjetivos; e, ainda, havia as que expressavam as circunstâncias, os advérbios. Em sua teoria das partes do discurso, Aristóteles distingue termos categoremáticos e termos sincategoremáticos, os primeiros representam as categorias (substantivos, adjetivos, e advérbios) e os segundos têm por função estabelecer relação entre os termos categoremáticos.

As categorias aristotélicas foram redefinidas na Téchne grammatiké de Dionísio da Trácia. Segundo Dionísio, havia, no grego, oito partes do discurso: nome,

pronome, verbo, advérbio particípio, conjunção, preposição e artigo. Tomando base a

descrição gramatical dos gregos, a gramática latina apresenta, num primeiro momento, oito classes de palavras: nomes, pronomes verbos, advérbios, particípios conjunções e

interjeições. Comparando-se essas descrições, percebe-se que ao partir da gramática

grega, a gramática latina exclui a classe dos artigos e introduz a interjeição como uma classe de palavra. No período medieval, a classe dos nomes foi subdividida em duas outras classes, a dos substantivos e dos adjetivos, introduzindo-se, ainda, uma outra classe, a dos numerais. A classificação da gramática greco-latina foi retomada por muitas outras línguas, principalmente pelas neolatinas como o português, o espanhol,

UNIDADE III

CLASSIFICAÇÃO DE PALAVRAS:

DA

TRADIÇÃO

GRAMATICAL

ÀS

MODERNAS

PROPOSTAS DE CLASSIFICAÇÃO

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88

o francês, italiano etc.

Esse modelo de classificação vem, desde o século XIX, sendo objeto de críticas de muitos estudiosos da linguagem. Já em 1980, Hermann Paul referia-se a essa classificação como uma “taxionomia eclética”, pelo fato de ela se fundamentar em três diferentes aspectos: a) a significação; b) a função das palavras na organização da oração e c) a forma das palavras. Em outras palavras, esse estudioso chamava a atenção para a complexidade que resultou da junção dos critérios: semântico, sintático e mórfico. Ao estudarmos, porém, a proposta de classificação apresentada pelo lingüista Mattoso Câmara, podemos ver que, na realidade, ao o problema não é bem este. Para esse lingüista como para muitos outros, uma proposta de palavras precisa levar em conta o sentido, a forma e a função, cada um a seu tempo. A proposta de classificação de palavras desse lingüista será estudada neste capítulo.

Em seus estudos sobre “A estrutura morfo-sintática do português”, Macambira (1974, p.17)) diz que as palavras existentes em qualquer língua distribuem-se em

várias classes, conforme as formas que assumem ou as funções que desempenham , e para alguns autores conforme o sentido que expressam. (grifo do autor). Segundo

esse autor, a forma pode ser constituída de um ou mais fonema ao qual se junta um sentido. Assim, são exemplos de forma a conjunção e e o adjetivo só, que expressam, respectivamente, a idéia de adição e de solidão. Apesar de privilegiar o aspecto formal e de colocar o aspecto semântico como o último a ser considerado, esse estudioso não pôde deixar de chamar atenção para o aspecto semântico, retomando, para tanto, o pensamento saussureano de que na língua não se pode isolar o som da idéia, nem a

idéia do som.

Segundo Macambira, o critério básico para a classificação de palavras é o critério mórfico ou formal, considerando-se, assim, as oposições formais que as palavras podem assumir para indicar as categorias gramaticais (flexão) ou para criar novas palavras (derivação). Principalmente para línguas que apresentam uma abundância de formas como é o caso do português. Observa, entretanto, Macambira que há línguas em que as palavras são pobres sob o ponto de vista formal, o que torna inviável considerar esse critério como a base para a classificação das palavras.

Neste último caso, em que não se pode contar com o aspecto formal, deve-se partir então do critério funcional ou sintático. Neste caso, é a função que a palavra exerce em um grupo de palavras, a relação com outras formas lingüísticas que deve orientar a classificação. De acordo com esse estudioso, só em último caso deve-se considerar o critério semântico.

Ressalta, ainda, Macambira que a tradição gramatical greco-latina se fundamentou nos critérios mórfico, sintático e semântico, privilegiando ora um, ora outro critério, sem estabelecer, entretanto, uma hierarquia entre esses critérios. É, na realidade, o que se pode constatar ao se analisar a classificação de palavras apresentada

(31)

89

nas gramáticas normativas de língua portuguesa. Vejamos.

De acordo com a Nomenclatura Gramatical Brasileira (NGB), as palavras da língua portuguesa se dividiam em dois grandes grupos: a) o das palavras variáveis e b) o das palavras invariáveis. O primeiro grupo é constituído das classes dos substantivos, dos adjetivos, dos pronomes e dos verbos. O segundo, das classes dos advérbios, das

preposições, das conjunções e das interjeições. Em 1959, a NGB alterou a classificação

de palavras, subdividindo a classe dos pronomes, criou a classe dos artigos e dos numerais. O artigo era uma das classes de palavras da língua grega, mas não constava na lista de palavras da língua latina. No português, como, vimos, resultou de uma subdivisão dos pronomes.

Assim, de acordo com a NNGB (Nova Nomenclatura Gramatical Brasileira) são dez as classes de palavras em português, seis variáveis: substantivo, adjetivo, artigo,

numeral pronome e verbo; e quatro invariáveis: advérbio, preposição, conjunção e interjeição. O critério que fundamentou as duas propostas foi o mórfico, já que se

levou em conta a possibilidade de variação da estrutura formal da palavra.

Ao conceituar as chamadas classes de palavras, passou-se a considerar, aleatoriamente, ora o critério semântico, ora o critério mórfico, ora o critério sintático. É o que se pode constatar a partir da análise de alguns conceitos como o de substantivo e de advérbio apresentados nas gramáticas tradicionais da língua portuguesa. O substantivo é definido como “palavra variável que serve para nomear os seres em

geral”; e o advérbio como “palavra invariável que serve para determinar o verbo, o adjetivo ou outro advérbio”. No primeiro caso, os critérios privilegiados foram o

mórfico e o semântico, no segundo, o mórfico e o sintático. Ao se analisar os conceitos das demais classes de palavras, percebe-se que também nesse contexto, a exemplo da tradição greco-latina, não se estabeleceu uma hierarquia entre os critérios. Permanecem, assim, nas gramáticas normativas do português a mesma complexidade das gramáticas que lhe deram origem.

Situando os pontos mais nevrálgicos da questão, o lingüista Câmara Júnior (1975) apresenta uma nova proposta de classificação de palavras para o português. Antes de discuti-la, vejamos outras modernas propostas de classificação de palavras que, certamente, tiveram influência nos estudos de Câmara Júnior.

2. MODERNAS PROPOSTAS DE CLASSIFICAÇÃO DE PALAVRAS

Identificadas as deficiências do modelo tradicional, gramáticos e lingüísticas têm apresentado novas propostas de classificação de palavras. À guisa de exemplificação, comentaremos rapidamente as propostas apresentadas por Pottier, Vandryes, Jespersem e Hjelmslev (apud, BIDERMAM, 1978).

Referências

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