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JUSTIÇA TRIBUTÁRIA, PROGRESSIVIDADE E O SISTEMA PREVIDENCIÁRIO BRASILEIRO

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REPATS, Brasília, V.6, nº 2, p 31-55, Jul-Dez, 2019

JUSTIÇA TRIBUTÁRIA, PROGRESSIVIDADE E O SISTEMA

PREVIDENCIÁRIO BRASILEIRO

TAX JUSTICE, PROGRESSIVITY AND THE BRAZILIAN SOCIAL

SECURITY SYSTEM

Nothing shows so clearly the character of a society and of a civilization as does the fiscal policy its political sector adopts.1

Daniel Vicente Evaldt Silva

*

Marcos Aurélio Pereira Valadão

**

Cleucio Santos Nunes

***

Resumo: Este artigo analisa a matriz tributária brasileira no que concerne a aspectos do sistema previdenciário, à luz princípios da capacidade contributiva e da progressividade. Utiliza-se análise multidisciplinar e conclui-se que a progressividade de alíquotas previdenciárias constante da EC nº 103/2019 é um avanço na matriz tributária brasileira, mas que ainda há necessidade de avanços para se atingir a justiça tributária e a equidade neste tema.

Palavras-chave: Direito Tributário. Direito Previdenciário. Justiça Tributária. Equidade. Capacidade Contributiva. Progressividade.

Abstract: This article analyzes the Brazilian tax matrix with regard to aspects of the social security system, in the light of the principles of ability to pay and tax progressivity. The approach is a multidisciplinary analysis and the conclusion is that the progressiveness of social security tax rates introduced by Constitutional Amendement No. 103/2019 is an improvement in the Brazilian tax matrix, but that there is still a need for more improvement to achieve tax justice and equity in this matter.

Keywords: Tax law. Social Security Law. Tax Justice. Equity. Ability to Pay Taxes principle. Tax Progressivity

1 SCHUMPETER, J. A. History of Economic Analysis. New York: Oxford University Press,

1954, p. 769.

*Mestre em Direito Tributário (UCB, 2019). Especialista em Direito Financeiro (USal – ESP,

2015). Especialista em Finanças (FGV-DF, 2011); Professor do Curso de Direito da Universidade Católica de Brasília (UCB).

**Pós-Doutor em Direito (UnB, 2017); Doutor em Direito (SMU - EUA, 2005), Mestre em Direito

Público (UnB, 1999); MBA em Administração Financeira (IBMEC - DF, 1996); Professor e Pesquisador do Curso de Direito da Universidade Católica de Brasília (UCB).

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INTRODUÇÃO

O sistema previdenciário brasileiro tem sido um dos temas mais importantes e debatidos na sociedade brasileira atualmente, já que carrega enorme pressão na arrecadação de tributos, no nível de despesas do orçamento público e é forte instrumento de política econômica de rendas. Não sem razão, pode-se dizer que a seguridade social tem notável impacto no desenvolvimento de um país.

A seguridade social está, assim, adstrita ao Direito Tributário e ao Direito Financeiro, já que o sistema é mantido pelas espécies tributárias, contribuições sociais e impostos, e também é grande elemento de despesa de todos os entes da Federação. Este artigo analisa a matriz tributária brasileira no que concerne ao sistema previdenciário, à luz do princípio constitucional da capacidade contributiva. Conforme vem sendo debatido amplamente pela doutrina brasileira, a matriz tributária brasileira apresenta componentes de iniquidade. Em especial, quando se avalia o aspecto da capacidade contributiva no que toca ao tema de tributação e do sistema de seguridade social.

O que se apresenta é que a tributação brasileira é predominantemente regressiva, em violação ao primado da capacidade contributiva; insuficiente para lidar com a necessidade de serviços públicos por parte da população mais carente, não contribui para a redução da pobreza e da desigualdade, além de não favorecer o crescimento econômico e o desenvolvimento do país.

O objetivo deste artigo é, então, avaliar aspectos da formação da base contributiva do sistema previdenciário brasileiro, enquanto componente da matriz tributária, já que mantidos por contribuições e impostos. Sob esta ótica, perquirir-se-á se as alíquotas previdenciárias, que sustentam parte da seguridade social, atendem ao primado da progressividade, enquanto expressão do princípio da capacidade contributiva, verificando sua adequação constitucional e grau de equidade e justiça tributária. Por fim, avaliam-se alguns aspectos da reforma previdenciária instituída pela Emenda Constitucional nº 103/2019 e se houve avanços no sentido de maior justiça tributária no que concerne ao princípio da capacidade contributiva.

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1. VALORES E PRINCÍPIOS DO SISTEMA JURÍDICO TRIBUTÁRIO

O estudo do Direito Tributário pode ser realizado sob diversas óticas. Por exemplo, uma das mais relevantes trata da histórica defesa do cidadão que ao ser demandado pelo pagamento de tributos pode opor ao Estado certa resistência calcada nas garantias e direitos fundamentais que surgiram acompanhadas de ideais ligados sobretudo à liberdade individual2. Esta

perspectiva foi desenvolvida desde ao menos a Magna Carta de João Sem-Terra e hodiernamente parte dos estudos no tema de tributação tratam da defesa e proteção do contribuinte, seu estatuto, como define Humberto Ávila3.

Outra forma de apreender o fenômeno tributário trata do estudo do sistema normativo: o conjunto de dispositivos positivados na ordem jurídica, suas premissas, coerências e lacunas, objeto de grande parte do esforço da doutrina e da análise dogmática do Direito, que nos dizeres de Miguel Reale, é o "estudo sistemático das normas, ordenando-as segundo princípios e tendo em vista a sua aplicação"4.

Mas em nossos dias cada vez mais outro tema do campo do Direito Tributário ocupa o debate acadêmico e mesmo político. Trata-se do estudo da equidade do sistema tributário, já que tributar transforma a sociedade, para o bem e para o mal. Assim, o corte epistemológico avança sobre a zetética do Direito, que utiliza o método de inquirição, da investigação5 e sobre a análise

econômica do Direito, que busca aperfeiçoar o desenvolvimento das normas jurídicas, observando suas consequências, e assim propor a estruturação do sistema jurídico para alcançar maior bem-estar social.6

2 NABAIS. José Casalta. O dever fundamental de pagar impostos. Coimbra: Almedina, 1998,

p. 43.

3 ÁVILA, Humberto. Estatuto do Contribuinte: conteúdo e alcance. Revista Eletrônica de

Direito Administrativo Econômico, Salvador, Instituto Brasileiro de Direito Público, nº 12, novembro/dezembro/janeiro. 2008.

4 REALE, Miguel. Lições preliminares de Direito. 27ª Edição. 9ª Tiragem. São Paulo: Saraiva,

2002, p. 321.

5 GASSEN, Valcir. Matriz tributária brasileira: uma perspectiva para pensar o Estado, a

Constituição e a tributação no Brasil. Equidade e eficiência da matriz tributária brasileira:

diálogos sobre Estado, Constituição e Direito Tributário. Brasília: Consulex, 2012, p. 43. Nota de Rodapé.

6 GICO Jr., Ivo. Introdução ao Direito e Economia. In: Direito e Economia no Brasil. Luciano

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Essas três perspectivas do Direito são fundamentais para a compreensão, então, da justiça tributária. Embora esta expressão possa carregar certa vagueza e suscitar algum debate sobre a necessária conformação do que significaria justiça, preferimos exprimi-la sob a ótica dos valores e princípios que estão positivados em nosso texto constitucional. Esta positivação, aliás, decorre evidentemente da própria natureza da entidade política, afinal a declaração de um Estado Democrático de Direito já traz em si significado juspolítico.

Esta carga semântica, amparada no desenvolvimento da Teoria Geral do Estado e da Ciência Política orientam a conformação de todos os subsistemas jurídicos, aptos a permitir a construção de uma sociedade como almejada pelo poder constituinte. Em nossa sociedade, o desiderato constitucional foi elevado: construir uma sociedade livre, justa e solidária, desenvolvida e livre da pobreza e da marginalização. Como bem observado por Cleucio Santos Nunes, o Direito não deve ser um instrumento de acomodação ou de manutenção da realidade social, que nos afasta do bem-estar. Antes, tem um papel radical na transformação de nossas carências humanas e sociais.7

Nessa perspectiva, a tributação tem importância central na perseguição dos objetivos do Estado Moderno, cuja finalidade é o bem comum, que nas palavras de Dalmo Dallari, pode ser entendido como o conjunto de todas as condições de vida social que consistam e favoreçam o desenvolvimento integral da personalidade humana8, quer seja para assegurar liberdades individuais, quer

seja para garantir a justiça, fundamento do Estado Democrático de Direito. Nosso modelo de sociedade, então, é a conciliação do Estado Liberal com valores sociais, o que se alcunha de Estado Social, que não renuncia dos valores de uma sociedade livre e de mercado, mas que visa à redução das desigualdades sociais, que em certos patamares põe em risco a própria existência da sociedade9.

7 NUNES, Cleucio Santos. Justiça Tributária. Belo Horizonte: Forum, 2019, p. 39.

8 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. 32ª Edição. São Paulo:

Saraiva, 2013. Pág. 78ss.

9 BONAVIDES, Paulo. Do Estado Liberal ao Estado Social. São Paulo: Malheiros, 2009, p.

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Assim, é que o pensamento de Norberto Bobbio sintetiza bem o que tratamos até então: o Direito deve buscar a Justiça, entendida essa não como ideal de bem comum transcendente, mas se a norma jurídica é “apta ou não a realizar os valores histórico que inspiram certo ordenamento jurídico concreto”10.

Alfredo Augusto Becker aduz que o Direito Tributário não tem objetivo próprio (aliás, como todo o Direito Positivo), mas, antes, por ter natureza instrumental, sua razão de existir, seu objetivo, é ser um instrumento a serviço de uma política11. E essa política, se podemos tomar como verdade que goza de

eficácia nossa constituição, como preconiza Konrad Hesse12, é contribuir com a

construção de uma sociedade justa, solidária e livre da extrema desigualdade e da pobreza, sem escapar da proteção constitucional aos direitos individuais. Daí conclui Cleucio Nunes que a tributação é o suporte financeiro da ideia de justiça social ou de justiça distributiva no Estado Democrático de Direito.13

Adam Smith, o principal pensador liberal, deixou assente que nenhuma sociedade pode florescer e ser feliz se a maior parte de seus membros for pobre e miserável. Deu ele contribuição para a construção de princípios gerais da tributação que serviriam para assegurar justiça, por meio da equidade, certeza, conveniência e eficiência14. Portanto, é inegável que o sistema de tributação é

forte conformador da ideia de Justiça em uma sociedade ou perpetuador de injustiças e desigualdades e que a ideia de neutralidade tributária é um sofisma sem qualquer aplicação prática na sociedade contemporânea.

Valcir Gassen estabelece, ainda, que para melhor expressar as escolhas feitas em um determinado momento histórico no campo da ação social, no que diz respeito ao fenômeno tributário, deve-se utilizar a expressão 'matriz tributária', ao invés de 'sistema tributário', por ter esta última expressão menos

10 BOBBIO, Norberto. Teoria da Norma Jurídica. Tradução de Ariani Sudatti e Fernando

Baptista. 6ª ed. São Paulo: Edipro: 2016, p. 46.

11 Alfredo Augusto Becker. Teoria Geral do Direito Tributário. 3ª Edição. São Paulo: Lejus,

1998. p. 596.

12 HESSE, Konrad. A Força Normativa da Constituição. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris

Editor, 1991.

13 NUNES, Cleucio Santos. op. cit.p. 29.

14 CAMPOS, Carlos Alexandre de Azevedo. ADAM SMITH. In: Leituras Clássicas de Direito

Tributário. Carlos Alexandre de Azevedo Campos, Denise Lucena Cavalcante, Paulo Caliendo. Organizadores. Salvador: Editora Jus Podivm, 2018. Pág. 50-70.

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precisão no tema de justiça tributária. É que o fenômeno tributário é integrante de uma certa realidade social, mais ampla do que o fenômeno jurídico. Para ele, o estudo da matriz tributária é que revela o conjunto de normas regulando a relação entre tributante e contribuinte, escolha das bases de incidência, participação do total da arrecadação, questões dogmáticas pertinentes à obrigação tributária, escolhas no plano político sobre atendimento dos direitos fundamentais, espécies tributárias, estrutura do Estado a partir de suas condições materiais de existência, das condições de funcionamento do Estado ofertadas pela arrecadação de tributos15.

Portanto, a análise da matriz tributária revela como está organizada a distribuição da carga tributária em uma sociedade, bem como os benefícios advindos dela para a sociedade, em todos os estratos sociais. É com a tributação que se pode melhorar a distribuição de renda, quer seja melhorando a distribuição da carga de tributos entre os diferentes estratos sociais (renda), com o fim de torná-la mais justa, quer seja obtendo recursos para políticas públicas, em especial, programas de transferência de renda.16

Daí que se afirma que a construção do tributo deve ser permeada pelo princípio da capacidade contributiva, que é a própria aptidão econômica do sujeito para suportar o tributo, um binômio entre ter recursos à sua disposição para fazer frente ao ônus e à carência daqueles que não têm recursos.17

Assim, a distribuição da carga tributária é forte revelador da justiça da matriz tributária. E como regra, só pode estar construída de duas formas: pela regra do benefício ou da equivalência e pela regra do sacrifício comum. Deste último deriva a construção do princípio da capacidade contributiva, consagrado em nosso ordenamento e organizador de todos os sistemas tributários modernos.

15 GASSEN, Valcir. Matriz tributária brasileira: uma perspectiva para pensar o Estado, a

Constituição e a tributação no Brasil. Equidade e eficiência da matriz tributária brasileira: diálogos sobre Estado, Constituição e Direito Tributário. Brasília: Consulex, 2012, p. 32-33.

16 NUNES, Cleucio Santos. Justiça Tributária. Belo Horizonte: Forum, 2019, p. 184.

17 VALLE, Maurício Dalri Timm. Princípios Constitucionais e Regras-Matrizes de Incidência

Do Imposto Sobre Produtos Industrializados - IPI. 1ª edição. São Paulo: Noeses, 2016. p.

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Na teoria do benefício ou da equivalência, cada indivíduo paga pelos benefícios que recebe e a identificação do contribuinte e da cota de contribuição só poderá estar expressa na equivalência de mercado ou equivalências aos custos. Esse sistema organiza o sistema de cobrança de taxas públicas, por exemplo, que se assemelham a preços no mercado. Já de acordo com o princípio da capacidade contributiva a lógica é absolutamente diversa: cada indivíduo contribui com sua capacidade, independentemente de usufruir de bens ou serviços18. Portanto, a avaliação da capacidade contributiva, como expressão

do valor da igualdade material, determina o sacrifício feito pelo grupo em prol de todos. Mas há outro elemento importante, expresso pela matriz tributária: a externalidade do tributo.

Augusto Cesar de Carvalho Leal afirma que a ótica da externalidade na tributação é a revelação de todo o potencial do tributo para reduzir desigualdades regionais e sociais, proteger o meio ambiente, solucionar problemas econômicos, mitigar atividades danosas à saúde19. Aliás, Adolph Wagner pode

ser considerado um dos precursores de imputar ao tributo “a função de regulador do bem-estar social e alavanca das reformas sociais”, dando assim maior ênfase ao caráter político e social dos efeitos do tributo20.

Cumpre lembrar que a extrafiscalidade também pode ser compreendida como um mecanismo adicional e complementar para a concretização dos direitos fundamentais sociais, especialmente por substituir uma ação positiva direta do Estado por um instrumento indutor de comportamentos.21. Assim,

embora extrafiscalidade do tributo possa cumprir parte desta função da busca pela realização dos direitos sociais, no que diz respeito ao sistema previdenciário

18 LAGEMAN, Eugenio. Tributação: seu universo, condicionantes, objetivos, funções e princípios.

In: GASSEN, Valcir. Equidade e eficiência da matriz tributária brasileira: diálogos sobre Estado, constituição e direito tributário. Brasília: Consulex, 2012, p. 51-70.

19 LEAL, Augusto Cesar de Carvalho. (In)justiça social por meio dos tributos: a finalidade

redistributiva da tributação e a regressividade da matriz tributária brasileira. In: GASSEN, Valcir.

Equidade e eficiência da matiz tributária brasileira: diálogos sobre Estado, Constituição e

Direito Tributário. Brasília: Consulex, 2012. p. 149-191.

20 ADAMY, Pedro. Adolph Wagner. Leituras Clássicas de Direito Tributário. Carlos Alexandre

de Azevedo Campos, Denise Lucena Cavalcante, Paulo Caliendo (org.). Salvador: Editora Jus Podivm, 2018. p. 98.

21 CALIENDO, Paulo. A Extrafiscalidade como instrumento de Implementação dos Direitos

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deve-se concentrar esforços em analisar a equidade da matriz tributária brasileira: se ela é, portanto, expressão dos valores constitucionais positivados na nossa ordem jurídica, especialmente, no que tange à maneira que são formadas e arrecadadas as receitas para fazer face às despesa previdenciárias.

As ferramentas de análise econômica do Direito é que são o importante arsenal metodológico para aproximar esses campos. É bem verdade que a Análise Econômica da Tributação não goza de certo prestígio no Brasil, já que era fenômeno típico americano, em detrimento da doutrina alemã, ibérica e italiana, mais bem acolhida por nossa tradição. Mas os estudos de AED servem à análise do fenômeno tributário já que tributação é uma das mais fortes intrusões que o sistema jurídico tem o condão de fazer na esfera de autonomia privada. Logo, são potentes estímulos ao comportamento humano, já que alteram as escolhas dos cidadãos. Ora, "a Análise Econômica enfoca precipuamente os incentivos gerados aos indivíduos pelo sistema jurídico, bem como pelas consequências efetivas de tais estímulos"22.

2. A INIQUIDADE DA MATRIZ TRIBUTÁRIA

A matriz tributária brasileira vem sendo estudada por pesquisadores de várias correntes ideológicas e formações. Pessoas ligados ao mercado, portanto, mais afeitas a uma tributação que privilegie a eficiência, fazem severas críticas ao nosso sistema de tributação. Fala-se em 'manicômio tributário', pela burocracia e excesso de normas, além de destacarem ser nossa matriz tributária muito onerosa e desestimuladora da produtividade, do emprego e do consumo. Os pesquisadores mais ligados ao fenômeno social da tributação denunciam uma perversa regressividade em nossos sistemas, além de outros elementos graves ligados à má distribuição de recursos na Federação, falta de transparência e assimetria entre quem paga tributos e quem recebe bens públicos. Fala-se, assim, em ineficiência, injustiça e iniquidade de nossa matriz tributária, tudo ao mesmo tempo, no sentido de que a desigualdade não implica

22 Cristiano Carvalho. Análise Econômica da Tributação: In Direito e Economia no Brasil.

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necessariamente julgamento moral sobre as diferenças encontradas na realidade social, mas as iniquidades apontam um juízo de valor sobre desigualdades que não deveriam existir, pois são injustas, desnecessárias e evitáveis. Há duas questões postas: a quem interessa nossa matriz tributária tal como ela é? E se não interessa a ninguém, como deixamos ela se tornar instrumento de perversidade econômica e social?

A expressão iniquidade remete a Aristóteles, em Ética a Nicômaco, quando ele definiu seu oposto (equidade) em um ideal de aplicação de justiça, portanto, no caso concreto, para corrigir a lei, naquilo que ela é deficiente. No Direito, o elo entre Justiça e Direito possui raízes mais profundas e complexas, ora ligado ao Direito Natural, ora ligado à construção da teoria de direitos fundamentais, que são o concurso de condições sociais e históricas aceitos no momento para se elevar um direito ao status de Direito Fundamental, realizando assim a conexão entre direito e justiça.23

A se evitar juízos salomônicos, excesso de subjetivismos, solipsismo e o risco de uma teoria de decisão jurídica frágil24 e que negue o Estado de Direito,

os valores da segurança jurídica e o princípio do devido processo legal25,

deve-se tomar muito cuidado com o uso das expressões justiça e equidade. A própria história do positivismo, com todas as críticas que a ela se façam, não pode deixar de nos dar relevantes lições sobre o tema.

Por exemplo, no common law que se desenvolveu na Inglaterra, logo após a conquista da Normanda, surgiu a necessidade de se dar estabilidade às decisões judiciais, fortemente abaladas pela formação da Jurisdição do Chanceler, ou do tribunal de equity, já que sua venalidade e instabilidade não puderam mais ser tolerados. E o positivismo jurídico nascente na Europa demandou racionalidade no processo judicial, e revolucionou o sistema jurídico

23 MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito

Constitucional. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 226.

24 STRECK, Lenio Luiz. Compreender Direito: desvelando as obviedades do discurso jurídico.

São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013.

25 LEAL, Rosemiro Pereira. Processo como teoria da lei democrática. 2ª ed. Belo Horizonte:

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inglês quando, no século XIX, os Judicature Acts consolidaram a ideia de precedentes com a ideia de poder legislativo26.

É de bom alvitre ainda lembrar a tragédia do nacional-socialismo alemão, que como nos alerta Arnaldo Godoy instituiu um 'Tribunal do Povo' (Volksgerichhtof), carregado de valores supostamente democráticos e sociais, a perseguir a ‘justiça’. A história conta que o tribunal popular funcionou como um tribunal ideológico, agente de extermínio e de execução formal da decisão política do totalitarismo nazista

.

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Assim, as construções jurídicas ligadas ao tema da equidade e da justiça precisam ter âncora constitucional, possibilidade de controle, previsibilidade e profundo respeito aos poderes instituídos e aos direitos fundamentais.

Quando se alega que o sistema tributário brasileiro é injusto e não consagra os valores constitucionais deve-se ter em mente a significação de que a matriz tributária brasileira não tem a equidade como fundamento ou princípio orientador da atividade legislativa tributária.28 Portanto que o sistema tributário

não tem como vetor orientativo as normas constitucionais, em especial, os fundamentos da República Federativa do Brasil, elencados no artigo 1º de nossa carta magna ou os objetivo fundamentais expressos no artigo 3º.

Assim, inequivocamente, pode-se afirmar que a matriz tributária brasileira é regressiva, como se pode depreender dos Indicadores de Equidade do Sistema Tributário Nacional, realizado pelo Observatório da equidade em 2009. O relatório mostra que as pessoas que ganhavam até dois salários mínimos em 2004 gastaram 48,8% de sua renda no pagamento de tributos, já o peso da carga tributária para as famílias com renda superior a 30 salários mínimos correspondia a 26,3%.

Nada sugere que de lá para cá tenha havido alguma melhora no panorama. De acordo com o IPEA, em 2013 esses números são de 53,9% para

26 DAVID, René. Os Grandes Sistemas do Direito Contemporâneo. Tradução: Hermínio A.

Carvalho. 5º Edição. São Paulo, Martins Fontes: 2014, p. 354.

27 GODOY, Arnaldo Sampaio de Moraes. Processo Penal, Estado de Exceção e o Volksgerichthof: O Tribunal do Povo na Alemanha Nazista. In: Revista Brasileira de Ciências

Criminais. V. 127 (Jan/2017). 2017.

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famílias com até dois salários mínimos e de 29% para famílias que ganham até 30 salários mínimos. Uma das razões é que a tributação brasileira é focada no consumo, ao invés de o ser na renda29. Sobre este tema, Pedro D'Araújo

apresenta que isso se deve a uma predisposição histórica em estruturar o fenômeno tributário em torno de uma exacerbada incidência sobre o consumo enquanto base econômica30, embora, possa questionar-se se esse fenômeno

não se deve mais a uma consequência de um pacto federativo deficiente do que propriamente de uma estruturação propositada.

Cleucio Nunes, em ampla análise da matriz tributária brasileira, conclui na mesma linha: o sistema é regressivo e desta maneira, é iníquo ao colaborar para distorcer os valores consagrados no texto constitucional31.

O princípio da progressividade é entendido, modernamente, como a melhor expressão da capacidade contributiva e é um dos esteios do tributo enquanto mecanismo de igualdade e de solidariedade social.32 Como o sistema tributário é uma ferramenta importante de redistribuição de resultados, seria natural tributar mais os indivíduos que possuem uma maior capacidade de contribuição para a manutenção do Estado, que deve utilizar estes recursos para financiar programas de assistência aos menos favorecidos33. Analisemos

brevemente como essa perspectiva atinge o sistema previdenciário brasileiro.

3. A INIQUIDADE DO MODELO PREVIDENCIÁRIO BRASILEIRO

O tema da previdência também é multifacetado e pode ser analisado sob diversas óticas. No âmbito do Direito Constitucional, por exemplo, pode ser

29 BRASIL. Presidência da República. Observatório da equidade. Indicadores da equidade do

sistema tributário nacional. Brasília: Presidência da República. Observatório da equidade,

2009. Disponível em

<http://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/0906_Indicadores_de_Equidade_Sistema_TN_R elatorio_Observacao_01.pdf>, p. 21-41.

30 D´ARAÚJO, Pedro. A regressividade da matriz tributária brasileira: debatendo a tributação

a partir de nossa realidade econômica, política e social. Dissertação de Mestrado. Universidade de Brasília, 2015, p. 155.

31 NUNES, Cleucio Santos. Op. cit. p. 119-200.

32 Maurin Almeida Falcão. O mito da progressividade. Trabalho publicado nos Anais do XVII

Congresso Nacional do CONPEDI, realizado em Brasília – DF nos dias 20, 21 e 22 de novembro de 2008.

33 DWORKIN, Ronald. Is democracy possible here? principles for a new political debate. New

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objeto de estudos quanto à adequação do sistema aos valores e princípios constitucionais, em especial, sobre sua capacidade de responder às demandas sociais positivadas nas cartas constitucionais e nos projetos juspolíticos dos diversos arranjos estatais e institucionais.

No contexto do Direito Tributário, porém, o estudo é direcionado mais ao financiamento do sistema, já que a seguridade social, como um todo, é custeada por impostos e contribuições. Assim, pode-se abrir uma frente de estudos ligada aos direitos fundamentais dos contribuintes ou pode-se analisar a adequada destinação dos tributos à sua finalidade, já que prescritos pela norma tributária, em um tratamento acadêmico que por vezes se entrelaça com o Direito Financeiro.

Em nossos dias, o tema previdenciário toma o debate público porque a sociedade contemporânea tem experimentado, principalmente, no período pós-segunda guerra, grandes mudanças. Novos arranjos familiares, surgimento e desaparecimento de profissões, avanços tecnológicos, mobilidade de capitais e radicais mudanças no perfil demográfico provocam, em todo o mundo, debates sobre o papel do Estado nesta nova sociedade. Os modelos de seguridade social pensados na passagem do século XIX para o XX se mostram frágeis para lidar com tantas mudanças e o resultado é um intenso debate público sobre regimes previdenciários, que quase sempre desaguam em profundas reformas nos sistemas de seguridade social.34

Portanto, oportuno é debater o tema previdenciário já que inevitavelmente ele continuará a sofrer profundas reformas nos próximos anos para se adequar à realidade de sociedades que viram seus modelos sociais lograrem grande êxito no último século, em especial, com políticas de saúde efetivas, segurança alimentar, revoluções humanitárias, maior igualdade de gênero e um crescente processo de pacificação global35.

34 LEAL, Bruno Bianco. Previdência em Crise. Diagnóstico e Análise Econômica do Direito

Previdenciário. São Paulo: Thompson Reuters Brasil, 2018, p. 68.

35 PINKER, Steven. The Better Angels of our nature. Why violence has declined. New York,

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No Brasil, reformas previdenciárias praticamente monopolizaram a agenda nacional no período pós-constituinte, e, recentemente, o Congresso Nacional brasileiro fez nova e ampla reforma previdenciária, por meio da Emenda Constitucional nº 103/2019. Mas é provável que o tema volte ao debate já que Estados e Municípios ficaram de fora da maior partes das mudanças realizadas e por já haver órgãos e especialistas a alertar que embora profunda, a reforma pode não ter sido suficiente para lidar com as mudanças sociais que o Brasil está atravessando36. Ademais, o tema da justiça das reformas, bem como da

distribuição do ônus, continuará a ser debatido por setores da sociedade mais preocupados com a função social do sistema de seguridade social e sua capacidade de permitir melhoria de oportunidades.

Nossa questão, então, é saber se o sistema previdenciário brasileiro, enquanto elemento da matriz tributária, cumpre os vetores constitucionais da capacidade contributiva e da progressividade. Em outras palavras, se reproduz a equidade expressa nos diversos princípios, fundamentos e objetivos da República Federativa do Brasil.

A seguridade social é definida pelo artigo 194 da Constituição Federal como um conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social. E via de regra são mantidas, principalmente, por meio de contribuições sociais, e, subsidiariamente, pelas demais receitas derivadas.

Em que pese a discussão doutrinária sobre a natureza jurídica das contribuições sociais, Pittondo37 conclui que as contribuições para o sistema da seguridade social são tributos de natureza residual, vinculados ou não. Portanto, são espécies tributárias que derivam diretamente do texto magno e obrigam o Estado a garantir aos cidadãos proteções próprias de tributos, como inclusive já

36 SILVA, D. V. E. A adequação aos princípios constitucionais da previdência

complementar de servidores públicos. Dissertação em Direito Tributário. Universidade

Católica de Brasília, 2019, p. 43-50.

37 PITTONDO, M. S. Contribuições destinadas à seguridade social: competência residual.

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deixou assentado o Supremo Tribunal Federal em diversos julgados38

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Por este motivo, às contribuições previdenciárias devem ser aplicados todos os valores, princípios e garantias concedidas às demais espécies tributárias.

Assim, sob a perspectiva da receita, que é tributária, definir-se quanto dos recursos da sociedade serão destinados à manutenção do sistema de seguridade é questão central. E diz respeito à transformação desejada pela sociedade na busca de maior justiça social e desenvolvimento. Nesse ínterim se avaliam ainda fontes de financiamento, tempo e valor de contribuições de trabalhadores, progressividade de alíquotas, participação de empresas e do próprio Estado no financiamento do sistema. Pela despesa, de outro giro, diz-se quem tem direito e a quanto na fatia daqueles recursos, ou seja, quando e como cidadãos podem acessar benefícios de natureza previdenciária. Define-se aí as modalidades e valores de benefícios, com eventuais limitações a teto, e regras para acesso.39

Sob a ótica da despesa, há estudos que apontam dois graves problemas em nosso sistema previdenciário, que de acordo com a exposição de motivos da PEC nº 006/2019, motivaram e endereçaram a reforma produzida pela EC nº 103/2019: o volume de gastos previdenciários no país e certa perversidade em nosso sistema de previdência em manter e até produzir mais desigualdades. É bem verdade que há uma série de contestações aos cálculos que embasaram a reforma, embora importante e relevante, não é este aspecto que se analisa aqui. De toda sorte, a reforma tem um resultado perverso em termos de tempo de trabalho para atingir o direito à aposentadoria, dentre outros aspectos de iniquidade.

38 AI 739.715-AgR, Rel. Min. Eros Grau, julgamento em 26-5-2009, Segunda Turma, DJE de

19-6-2009. RE 556.664 e RE 559.882, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 12-6-2008, Plenário,DJE de 14-11-2008, com repercussão geral.) No mesmo sentido: RE 505.771-AgR, Rel. Min. Eros Grau, julgamento em 10-2-2009, Segunda Turma, DJE de 13-3-2009;RE 560.626, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 12-6-2008, Plenário, DJE de 5-12-2008, com repercussão geral; RE 559.943, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgamento em 12-6-2008, Plenário, DJE de 26-9-2008, com repercussão geral. Vide: RE 543.997-AgR, voto da Rel. Min. Ellen Gracie, julgamento em 22-6-2010, Segunda Turma, DJEde 6-8-2010.

39 SILVA, Daniel Vicente Evaldt da. A adequação aos princípios constitucionais da

previdência complementar de servidores públicos. Dissertação em Direito Tributário.

(15)

A Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado Federal40 sustenta que

a despesa previdenciária do país atingiu em 2017, espetaculares R$ 876,3 bilhões. O Brasil é um Estado pagador de pensões, explicando-se aí boa parte da falta de recursos que o Estado tem para investimentos e prestação de serviços públicos, essenciais para que os menos favorecidos possam obter oportunidades para melhoria de suas vidas. Já no pagamento de benefícios, há enorme disparidade entre o regime geral e os regimes próprios de previdência, administrados pelos entes da Federação para seus respectivos servidores públicos, além do sistema de inatividade remunerada de militares. Como mostra o referido relatório:

[...] tomando-se como referência 2016, para o qual o quantum de beneficiários é conhecido, o benefício médio concedido aos aposentados, reformados e pensionistas do RPPS federal foi de aproximadamente R$ 9.500 por mês, sendo: R$ 10.300 por mês no regime militar e R$ 9.000 por mês no civil. Isso implica que o benefício médio do RPPS federal (de R$ 9.500/mês) foi mais de sete vezes superior ao benefício médio do RGPS de 2016, de R$ 1.290 por mês41.

Ressalta-se que há diversas entidades, principalmente, ligadas a servidores públicos, que já se manifestaram no sentido de haver inconstitucionalidades em dispositivos do texto da emenda nº 103/201942.

Também há diversos questionamento quanto aos cálculos utilizados pelo governo, em especial para o cálculo do déficit atuarial, que resultou na extinção das aposentadorias por tempo de contribuição.43

40 SENADO FEDERAL. Instituição Fiscal Independente. Relatório de Acompanhamento

Fiscal. Especial Previdência. 11/03/2019. nº 26.

41 SENADO FEDERAL. Instituição Fiscal Independente. Relatório de Acompanhamento

Fiscal. Especial Previdência. 11/03/2019. nº 26, p. 35.

42 MIGALHAS. Entidades da magistratura e do MP contestam reforma da Previdência no STF, 13

de novembro de 2019. Disponível em:

<https://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI315179,61044-Entidades+da+magistratura+e+do+MP+contestam+reforma+da+Previdencia+no>. Acesso em 27 nov 2019.

43 CENTRO DE ESTUDOS DE CONJUNTURA E POLÍTICA ECONÔMICA - CECON -

IE/UNICAMP. A falsificação nas contas oficiais da Reforma da Previdência: o caso do

Regime Geral de Previdência Social. Nota do CECON, n. 8, setembro de 2019, disponível em

<<http://www.eco.unicamp.br/images/destaque/A-Falsificacao-nas-Contas-Oficiais-da-Reforma-da-Previdencia-Nota-CECON8.pdf

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É sabido, contudo, que os regimes de previdência são muito diferentes entre si, já que contam com premissas distintas e níveis de contribuição diferentes. Ademais, é importante lembrar que as regras do regime próprio cada vez mais se aproximam das regras do regime geral, em especial com a limitação do teto de benefícios previdenciários, em processo intenso de ampliação pelos entes da Federação para os seus respectivos regimes próprios.

O relatório do IFI aponta ainda iniquidades no que diz respeito ao tempo necessário de contribuição para se acessar benefícios e ainda o privilégio entre categorias do serviço público, quando cotejadas entre si. Não é preciso demonstrar o risco social que o país guarda para o futuro ao não endereçar adequadamente o tema da desigualdade social, principalmente, nas reproduzidas pelo próprio aparato estatal, que como alerta Thomas Piketty, cresce de modo preocupante em todo o globo44.

Outro aspecto que nos interessa diz respeito ao modo de financiamento do sistema e aos aspectos tributários subjacentes ao tema: o ônus que cada cidadão dispende com o sustento da seguridade social e sua conexão com o princípio da capacidade contributiva.

Ora, como já afirmado, o fato de o sistema ser mantido por meio de tributos, devem estes estar orientados aos vetores constitucionais tributários, do qual a progressividade surge como expressão do princípio da capacidade contributiva, que, por sua vez, decorre do valor da igualdade material, que é um dos princípios estruturantes do regime geral de direitos fundamentais45 e constitui o signo fundamental da democracia46

.

Como afirma Luís Eduardo Schoueri, o constituinte privilegiou a progressividade ao exigi-la para o imposto de renda (art. 153, § 2º, I), enquanto

44 PIKETTY, Thomas. O Capital no Século XXI. Trad. Monica Baumgarten de Bolle. Rio de

Janeiro: Intrínseca, 2014.

45 CANOTILHO, J. J. G. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7ª Ed. 16ª Reimp.

Coimbra: Almedina, 2003, p. 426.

46 SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. 32ª ed. São Paulo. Editora

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expressão de justiça distributiva, e o fez também, com certa polêmica, em matéria do imposto predial e territorial urbano (EC nº 29/2000)47.

Assim, se as contribuições previdenciárias são tributos e a capacidade contributiva deve ser marca de um sistema tributário justo, deveria, então, estar a progressividade insculpida na estruturação das alíquotas previdenciárias. Neste contexto, constatar-se-á iniquidade na matriz tributária brasileira se as alíquotas destas contribuições não atenderem ao postulado da progressividade, tanto nos tributos desta espécie cobrados de indivíduos, quanto de empresas e empregadores de modo geral.

Ora, até a Emenda Constitucional nº 103/2019 não havia progressividade nas alíquotas previdenciárias cobradas de servidores públicos pelos regimes próprios. Já no Regime Geral de Previdência Social, existia uma progressividade mínima, o que demonstrara violação ao primado do princípio da capacidade contributiva. Nos RPPS, a alíquota média fica entre 11% e 14%, sem qualquer progressividade. Já no RGPS, havia três percentuais de contribuição para o INSS de acordo com a renda do empregado da iniciativa privada: 8%, 9% e 11%, incidentes sobre o salário de: até R$ 1.751,81; de R$ 1.751,82 a R$ 2.919,72 e de R$ 2.919,73 até R$ 5.839,45, respectivamente, para o exercício de 201948. Repare-se que a progressividade ainda assim é mínima já que entre a menor alíquota e a maior havia apenas uma diferença de três pontos percentuais. Com a reforma da previdência de 2019 esses percentuais vão variar de 7,5% a 14% e já começam a expressar a preocupação do poder constituinte derivado com uma maior equidade também neste aspecto de nossa matriz tributária.

Já para os RPPS, a União mudou radicalmente o panorama. De acordo com o artigo 11 da EC nº 103/2019, a alíquota única de 11% acaba. Surgem então 8 faixas de alíquotas em um modelo de incidência idêntico ao utilizados para o cálculo do imposto de renda de pessoas físicas. As alíquotas vão de 7,5% até 22%. Esta última para faixas de remuneração superiores a 39 mil reais mensais. Os Estados e Municípios deverão decidir suas próprias alíquotas, ao

47 SCHOUERI, Luis Eduardo. Direito Tributário. 8ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2018, p. 398-406. 48 Disponível em

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menos, se não for concluída a votação da chamada PEC Paralela (PEC 133/2019), que se não for aprovada poderá ensejar grandes assimetrias entre os diversos regimes de previdências de servidores públicos.

Em relação às contribuições para a seguridade social cobradas de empresas e demais empregadores o cenário é mais desafiador. Isso porque o Brasil possui uma tipologia mais complexa desses tributos, expressas por um sem-fim número de contribuições, modos de incidência e bases de cálculos, como PIS/PASEP, COFINS, CIDE, CSLL, alíquotas previdenciárias sobre a folha, RAT/SAT, FAT, outras entidades etc.

O cenário primeiro que desafia o setor político e nossa federação neste aspecto é a simplificação do modelo, sem perda de receita, principalmente para Estados e Municípios, e, evidentemente, o fim da tredestinação das contribuições, já que a previdência brasileira vive uma dinamitação da sua base fiscal. Isso porque a União, para não ter que partilhar com Estados e Municípios receitas tributárias, fez uma proliferação de contribuições, em clara fraude à tipologia tributária, ao federalismo fiscal e descaso na elaboração e execução do orçamento49, desobrigando-se de destinar a receita das contribuições às

finalidades para as quais foram criadas, por meio de desvinculação de receitas e de contingenciamento do orçamento. Mascaram assim o resultado fiscal, o

déficit do sistema de seguridade e dinamitam o sistema tributário da federação.50

O sistema brasileiro de renúncias fiscais e incentivos a setores específicos do setor produtivo também há muito vem sendo denunciado e é motivo de preocupação por parte da doutrina os critérios utilizados por governantes e membros do poder legislativo para sua concessão51. Sem dúvida, outro modo de

dinamitar a base fiscal da seguridade social e muitas vezes sem a menor

49 DOMINGUES, José Marcos. O desvio de finalidade das contribuições e o seu controle

tributário e orçamentário no direito brasileiro. In: DOMINGUES, J. M. Direito Tributário e

Políticas Públicas. São Paulo. MP EDITORA LTDA. 2008.

50 GODOI, Marciano Seabra de. Contribuições sociais e de intervenção no domínio

econômico: a paulatina desconstrução de sua identidade constitucional. In Revista de

Direito Tributário da APET. Volume 15. Páginas 81-110. 2007. Ver também VALADÃO, Marcos

51 CORREIA NETO, Celso de Barros. O Avesso do Tributo. Incentivos e Renúncias Fiscais

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preocupação com a capacidade contributiva e com os benefícios concretos que advém de sua renúncia.

Ressalva-se, porém, que o Simples Nacional, instituído por meio da Lei Complementar nº 123/2006, foi um avanço na direção da equidade de nossa matriz tributária, já que institui alíquotas menores de diversos tributos para empresas enquadradas como Microempresas ou Empresas de Pequeno Porte, sem dúvida um largo passo no sentido de prestigiar-se a capacidade contributiva. Há grande quantidade de faixas de alíquotas para diversos tributos, dos quais destacamos alíquotas de 0% para contribuições para a seguridade social, como CSLL, COFINS, PIS e INSS, desde que as empresas tenham faturamento de até 180 mil/ano. Nas últimas faixas (acima de R$ 3 milhões podendo chegar a R$ 4,6 milhões), as alíquotas ainda são módicas (e.g.: 1,9%, 5,37%, e 8%, para o setor de comércio)52.

É bem verdade que o que se pode questionar aqui é o problema inverso. Empresas que faturam 4,6 milhões de reais por ano podem sustentar verdadeiras riquezas individuais. Assim, é bastante questionável se o sistema tem o calibre correto para permitir tamanho alívio em contribuições para o sustento da seguridade social, já que quando comparamos estas alíquotas com o regime tradicional de tributação encontramos alíquotas muito superiores àquelas.

CONCLUSÕES

Este artigo analisou aspectos da matriz tributária brasileira, apresentando princípios e vetores que devem organizar a estruturação do sistema tributário que estejam de acordo com os pressupostos constitucionais, em especial, na busca dos objetivos propagados pela carta política.

Por meio de análise doutrinária, identificamos certo consenso sobre a iniquidade que se apresenta em nosso fenômeno tributário, já que nossa

52 Ver também. VALADÃO, Marcos Aurélio Pereira. Comentários sobre as alterações

tributárias à Constituição de 1988. Ciência e Técnica Fiscal, Lisboa, Portugal, v. 413, p.

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tributação é, predominantemente, regressiva, insuficiente e ineficiente. Estas propriedades de nosso sistema contribuem para a falta de recursos para serviços públicos essenciais e mantém um patamar inaceitável de desigualdade social em nosso país.

Na sequência, apresentamos breves informações relativas à previdência social brasileira, atinentes à qualidade do gasto previdenciário, concluindo haver, notável iniquidade em nosso sistema, uma vez que ele não consagra valores constitucionais, além de ser elemento de concentração de renda.

Por fim, fizemos uma breve análise sobre as alterações provocadas pela reforma da previdência de 2019 e as alterações no regime de alíquotas previdenciárias para pessoas físicas. Observamos que o Brasil possuía dívida com o ideal de capacidade contributiva e sua expressão por meio da progressividade no sistema de contribuições previdenciárias, já que, praticamente, não havia escalonamento das referidas alíquotas.

Com a Emenda Constitucional nº 103/2019 notamos avanço no modo como as alíquotas previdenciárias passaram a ser tratadas no Brasil, quanto à cobrança tanto no Regime Geral, quanto nas previdências de servidores públicos, que caminharam para um forte escalonamento, que podem ser, sob nossa ótica, demonstração de maior equidade na matriz tributária brasileira, em especial no seu elo com o sistema de seguridade social e previdência social.

No entanto, o sistema para cobranças de contribuições para pessoas jurídicas ainda enfrenta desafios enormes para nosso sistema político, já que há grande tipologia no número de tributos e o sistema não parece privilegiar adequadamente o princípio da capacidade contributiva, em especial, no que concerne às contribuições para a seguridade social, embora o Simples Nacional esteja próximo de um ideal de progressividade.

O Brasil, assim, deve seguir no caminho da busca da justiça tributária e de maior equidade de nossa matriz tributário, incluindo o sistema previdenciário, para os vetores consagrados no sistema constitucional, em especial, a solidariedade, a capacidade contributiva, o sistema federativo e a igualdade material. Um sistema mais justo e eficiente precisa nascer, pois como disse o

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juiz da Suprema Corte dos EUA, Oliver Wendell Holmes, tributos são o preço que pagamos por uma sociedade civilizada.

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