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Desenvolvimento de um questionário de rastreio de fatores de risco para o desenvolvimento do luto complicado

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UNIVERSIDADE DE LISBOA

FACULDADE DE PSICOLOGIA

DESENVOLVIMENTO DE UM QUESTIONÁRIO

DE RASTREIO DE FATORES DE RISCO PARA O

DESENVOLVIMENTO DO LUTO COMPLICADO

Ana Catarina Pereira Goulart

MESTRADO INTEGRADO EM PSICOLOGIA

Área de especialização em Psicologia Clínica e da Saúde/ Núcleo de Psicoterapia Cognitiva-Comportamental e Integrativa

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UNIVERSIDADE DE LISBOA

FACULDADE DE PSICOLOGIA

DESENVOLVIMENTO DE UM QUESTIONÁRIO

DE RASTREIO DE FATORES DE RISCO PARA O

DESENVOLVIMENTO DO LUTO COMPLICADO

Ana Catarina Pereira Goulart

Dissertação orientada pelo Professor Doutor João Manuel Moreira

MESTRADO INTEGRADO EM PSICOLOGIA

Área de especialização em Psicologia Clínica e da Saúde/ Núcleo de Psicoterapia Cognitiva-Comportamental e Integrativa

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Agradecimentos

Agradeço ao meu orientador, Professor Doutor João Moreira, pelos seus ensinamentos e motivação para com o projeto desenvolvido.

Agradeço de forma muito especial, a todos os que participaram na minha investigação, tornando este estudo possível.

A todos os meus colegas da Licenciatura que acompanharam o início do meu percurso académico e que contribuíram para que longe de casa, me sentisse acompanhada e aconchegada.

Às minhas colegas de mestrado, que me acolheram de braços abertos, que sempre me apoiaram e me confortaram com suas palavras, Andreia Paiva, Marta Tomás, Marta Zany, Ana Marques, Inês Conceição.

À minha queria amiga Salomé por todo o apoio que me deu, por acreditar em mim e por se disponibilizar para me ajudar em tudo o que eu precisasse.

Aos meus amigos em geral, que estiveram presentes na minha vida durante este percurso por todo o apoio que me deram.

À minha família por me apoiar e incentivar a seguir os meus sonhos e objetivos, acreditando nas minhas capacidades.

Ao meu namorado, que além de me apoiar, sempre me incentivou a lutar pela minha vocação, a acreditar em mim e a evoluir.

Por fim, dedico este meu trabalho ao Miguel, criança dócil, pura, ternurenta, especial, muito especial, que partiu cedo demais e que deixou uma saudade imensa a todos os que o amam. Agradeço à sua mãe, por me autorizar a utilizar nesta dissertação um poema por ela feito ao seu filho, com tanto amor e tanto significado.

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“Se eu chegar ao céu... Ai se eu chegar ao céu! Vou correr pelo manto verde colorido de flores, vou procurar o meu colibri,

Vou correr com tanta força meu amor, Vou perguntar por ti aos anjos e eles a sorrir vão indiciar me uma direção, Vou correr ... correr com tanta força até sentir o teu perfume. Vou encontrar-te junto a Fonte do céu junto da água mais pura e cristalina, Vais sorrir para mim meu amor e dizer ‘vem ter comigo mamã’ Se eu chegar ao céu... Vais segurar a minha mão e nunca mais a deixes nunca mais... Vou abraçar-te tanto ! Se eu chegar ao céu vou entender o porquê da vida e o sentido da morte, Se eu chegar ao céu vou dar-te tantos mas tantos beijinhos meu amor Meu anjo de todos o mais lindo, Meu amor eterno. Um dia te encontrarei lindo e cheio de luz, Se eu chegar ao céu ...” M.F.L

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Resumo

A maioria das pessoas, em algum momento das suas vidas, é confrontada com perdas por morte de pessoas próximas. A vivência destas perdas pode trazer consequências negativas para a saúde mental e física, podendo ocorrer um processo de luto normal, ou um processo de luto complicado (LC). Várias teorias propõem diferentes fatores de risco que contribuem para o desenvolvimento do LC. Neste sentido, foi elaborado um instrumento de rastreio do LC, a partir de 55 itens representativos das várias variáveis que poderão contribuir para o desenvolvimento do LC, designado Questionário de Risco para o Luto Complicado (QRLC). O questionário foi dividido em blocos, incluindo sucessivamente variáveis demográficas, da perda (responsabilidade/inevitabilidade, morte como alívio para o sofrimento/perda natural, sofrimento ao morrer, experiência de perdas anteriores), da situação presente (isolamento social, depressão, neuroticismo, trauma), da reação à perda (profundidade da relação, coping de evitamento, consumo de substâncias) e da relação prévia (qualidade da relação). A amostra foi composta por pessoas em processo de luto (N = 50), sendo a recolha efetuada pelo método “bola de neve”. As correlações entre as do QRLC e variáveis do Trauma e da Dor-Ansiedade (PG-13) mostram que os fatores mais preditores do desenvolvimento de LC são a idade do falecido, o tempo desde a perda, a idade do enlutado, o neuroticismo, a depressão, a qualidade da relação prévia e a perda vista como natural. As correlações entre as escalas e Laços Continuados Desadaptativos (QAVCAL) mostram que os fatores mais preditores são a idade do falecido, neuroticismo, responsabilidade/evitamento, depressão, coping evitante e perda inesperada. Assim, os resultados encorajam a prosseguir o estudo deste questionário, a fim de disponibilizar um instrumento válido e útil, quer para a avaliação clínica quer para a investigação sobre os fatores de risco que contribuem para o desenvolvimento de LC.

Palavras-chave: Processo de luto, Luto Complicado, Fatores de risco, Avaliação Psicológica.

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Abstract

Most people, at some point in their lives, are confronted with the loss of close other by death. The experience of these losses can have negative consequences for mental and physical health, and may involve a normal grieving process or complicated grief. Several theories propose different risk factors that contribute to the development of complicated grief (CG). Following this, a CG screening instrument was elaborated, with 55 items representing the various variables that may contribute to the development of CG, designated as the Complicated Grief Risk Questionnaire (QRLC). The questionnaire was divided into blocks, including successively demographic, loss-related (responsibility / inevitability, death as relief for suffering / natural loss, suffering at death and experience of previous losses), present situation (social isolation / lack of social support, depression, neuroticism and trauma), reaction to loss (relationship depth, avoidance coping, substance use) and previous relationship (relationship quality) variables. The sample consisted of people in the process of grieving (N = 50), and the collection was carried out through the “snowball” method. Correlations between QRLC scores and Trauma and Pain-Anxiety scales and variables (PG-13) show that the most predictive factors for the development of CG are the age of the deceased, the time since loss, the age of the bereaved, neuroticism, depression, relationship quality and loss natural. Correlations with Maladaptive Continuing Bonds (QAVCAL) show that the most predictive factors are the age of the deceased, neuroticism, responsibility / inevitability, depression, avoidant coping, and unexpected loss. The results encourage further study of this questionnaire, in order to provide a valid and useful tool for both clinical assessment and research on risk factors contributing to the development of CG.

Keywords: Mourning Process, Complicated Grief, Risk Factors, Psychological Assessment.

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Índice Introdução...6 Método...18 Resultados...21 Discussão...30 Referências………...36

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Introdução

A maioria das pessoas, em algum momento das suas vidas, é confrontada com perdas ou eventos potencialmente traumáticos e nem todas lidam com essas situações da mesma forma. Um grande número consegue viver esta experiência de perda sem que a mesma afete o seu funcionamento no trabalho ou nas suas relações próximas, enquanto outras experienciam um sofrimento agudo, do qual não se recuperam (Bonanno, 2004). Nas últimas décadas, a investigação sobre o luto tem aumentado, levando a uma mudança na conceptualização do luto, de um processo gradual e universal para uma experiência idiossincrática que varia de pessoa para pessoa (Crunk, Burke & Robinson, 2017). É importante continuar a investigar a temática do luto, principalmente no que concerne ao aperfeiçoamento de instrumentos de avaliação já existentes e à criação de instrumentos que incluam áreas ainda não avaliadas, sendo esse o objetivo deste projeto de investigação: criar um questionário de rastreio que permita avaliar a presença de fatores de risco para o desenvolvimento de Luto Complicado (LC) e para auxiliar na prática clínica.

Em seguimento à ideia expressa anteriormente, a perda de alguém de quem gostamos é algo inevitável à condição humana, seja uma perda simbólica ou uma perda real, perda esta que a pessoa tem de elaborar, passando por um processo de luto. A perda real, ou seja, através da morte, de um ente querido, é uma experiência que está associada a um sofrimento, seja psicológico ou até físico, por parte da pessoa enlutada. Segundo Parkes (1998), o luto é definido como um conjunto de reações emocionais, físicas, comportamentais e sociais que surgem como resposta a uma perda, sendo a perda um processo de mudança que implica, para as pessoas enlutadas, uma adaptação das suas conceções sobre o mundo e sobre si próprias.

Bowlby (1985) descreve o processo do luto por fases da seguinte forma: a primeira fase é a fase do choque, que pode durar apenas horas ou mesmo semanas, com sentimentos de raiva, desespero, na qual a pessoa está em estado de choque, podendo parecer por vezes desligada do que a rodeia. A segunda fase é a fase do desejo, em que pode existir um desejo da presença e procura da pessoa perdida, levando a que na mesma fase existam dois processos de certo modo contraditórios, pois por um lado existe a realidade da perda que leva a inquietação e desespero, e por outro lado existe uma esperança de reencontro, com uma ilusão de que nada daquilo aconteceu, fantasiando o regresso da pessoa perdida. A terceira fase é a da busca pela pessoa perdida, que vai de encontro ao último ponto mencionado na fase anterior. Esta fase pode ter uma duração

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indeterminada, podendo dar origem a uma fase de desespero e desorganização. Por último, a fase de maior organização, que leva a uma maior aceitação da perda e ao pensamento de que é necessário começar uma nova vida. As fases do luto, descritas anteriormente, representam apenas um ponto de partida para se entender a perda e o luto, não sendo fixas nem sendo expectável que se manifestem nessa ordem ou da mesma forma em todas as pessoas enlutadas.

Sentimentos de saudade e tristeza poderão aparecer durante todo este processo e inclusive após o mesmo, sendo que o processo de luto é gradual e em alguns casos não é “concluído”, temática que abordarei de seguida. De qualquer das formas, é natural que, com o passar do tempo, ao lembrar-se do ente querido que partiu, a pessoa sinta tristeza, desespero e até desânimo, mesmo que estes sentimentos sejam sentidos com uma menor frequência ou intensidade.

Parece-me pertinente clarificar de que o luto não é visto como uma perturbação psiquiátrica ou médica, mas sim como uma reação normal a uma situação que naturalmente provoca angústia ou stress. A duração desta reação parece depender do êxito do “trabalho de luto” da pessoa, como a readaptação ao ambiente à sua volta, onde o falecido já não está presente, e o desenvolvimento de novas relações (Lindemann, 1944).

O desenvolvimento do estudo presente teve como objetivo possibilitar a identificação de pessoas em risco de desenvolver LC, permitindo um rastreio e intervenção precoce, ainda antes de a pessoa estar em processo de luto. Para tal, foi necessário identificar quais os fatores de risco, que, em investigações até então, se tem verificado terem um contributo no desenvolvimento do LC. Passo então, de seguida, a fundamentar e elaborar sobre o LC e os fatores de risco que foram englobados no instrumento desenvolvido neste estudo.

Luto Complicado

Ao longo dos anos, têm existido algumas dificuldades na definição do LC, nomeadamente quanto à terminologia utilizada. Os mesmos fenómenos de tristeza e luto foram descritos por vários autores como “patológicos”, “desadaptativos”, “não resolvidos”, “disfuncionais”, “anormais” e essa falta de concordância tem criado dificuldade na comunicação entre os profissionais (Rando, 1993).

Rando (1993) explica o porquê de utilizar o termo “luto complicado”, dizendo que esse termo sugere que o LC é um conjunto de processos que de alguma forma se

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complicaram e que o que se complicou, pode ser descomplicado, evitando também a suposição de que as complicações foram originadas pelo próprio enlutado. Tendo em conta a perspetiva deste autor, e por me fazer sentido, será esta a terminologia que irei adotar: Luto Complicado (LC).

Um dos maiores obstáculos para que o processo de luto ocorra de forma adaptativa é o facto de algumas pessoas tentarem evitar a angústia sentida face à perda e também evitar expressar emoções que são dolorosas, mas que são necessárias para que esse processo se dê (Lindemann, 1944). O LC, também conhecido como Perturbação do Luto Prolongado ou Perturbação do Luto Persistente Complexo (American Psychiatric Association [APA], 2013), é uma resposta prolongada, debilitante e às vezes ameaçadora ao luto.

De acordo com Prigerson (2004), a maioria das pessoas em processo de luto sentem-se muito tristes e angustiadas com a perda, sentindo falta da pessoa que perderam. Uma distinção importante entre LC e luto descomplicado é que, no luto descomplicado, as pessoas são capazes de seguir em frente com as suas vidas, geralmente seis meses após a perda, havendo uma melhoria na sua capacidade de se concentrar em outras coisas e viver para além da perda. Em contraste, as pessoas em LC estão preocupadas com a sua tristeza, sentem arrependimentos relativos à perda, têm pensamentos ruminativos e incapacidade de se concentrarem em outras coisas, podendo também haver um afastamento das pessoas com quem eram próximas antes da perda, levando a um maior isolamento.

Frequentemente, as reações ao luto após a perda de uma pessoa significativa estão associadas a um comprometimento psicológico e funcional (Kersting et al., 2011). Assim como a cicatrização de uma ferida pode ser complicada, o luto pode ser complicado, havendo uma intensificação dos sintomas e uma duração prolongada. O luto poderá desencadear o aparecimento de perturbações físicas ou mentais, pelo que é importante uma avaliação cuidadosa, para assim possibilitar uma intervenção adequada. As complicações do processo de luto incluem sintomas que persistem por pelo menos 6 meses, como a ocorrência frequente de pensamentos ou imagens mentais da pessoa falecida, sentimentos intensos de solidão ou vazio, e o sentir que a vida deixou de ter significado sem a presença desta pessoa. Também poderão surgir pensamentos disfuncionais, comportamentos desadaptativos, raiva sobre a morte, evitamento de lembranças da perda, entre outras (Shear et al., 2011).

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Normalmente, a situação de luto, designada como luto agudo, não precisa de intervenção clínica. Contudo, por vezes, o luto agudo pode tornar-se numa condição debilitante (o LC) e por esse motivo algumas pessoas em processo de luto precisam ser avaliadas e ter um acompanhamento psicológico. O luto agudo é a resposta inicial ao luto, por vezes intensa e disruptiva, enquanto que o LC é uma forma de luto agudo prolongado. Para a maioria das pessoas, o luto agudo evolui, de uma forma natural, para um estado de luto integrado, onde a pessoa em processo de luto é capaz de se envolver em atividades quotidianas e encontrar interesse ou prazer nas mesmas. No entanto, no LC tal não acontece e os sintomas de luto permanecem graves e comprometedores (Shear, Ghesquiere & Glickman, 2013).

É necessário ter em consideração fatores culturais e religiosos na avaliação do LC, pois estes podem desempenhar um papel importante na determinação dos critérios do luto normal, para uma pessoa que funcione dentro de um contexto cultural e religioso particular. No entanto, vários estudos realizados sugerem que o LC ocorre mesmo em culturas que têm diferentes visões da morte e diferentes rituais de luto (Shear et al. 2011). Fatores de Risco Geral

Como já referi anteriormente, o luto é um processo pelo qual todas as pessoas em algum momento da sua vida irão passar, e por esse motivo o foco da investigação dos fatores de risco associados ao luto tem recaído sobre a incidência de dificuldades ou disfunções associadas a esta experiência universal. Os fatores de risco raramente atuam isoladamente, o que faz com que seja possível e até provável a existência de interações complexas entre fatores de risco (Piper, Ogrodniczuk, Joyce & Weideman, 2011).

Alguns dos fatores apontados como associados ao LC são: género feminino, baixa escolaridade, idade do enlutado, baixo nível socioeconómico, baixo apoio social, morte em circunstâncias traumáticas, historial de perturbações de ansiedade ou depressão antes da morte e múltiplas perdas ou traumas. O LC tem uma maior tendência a ocorrer após uma perda de alguém com a qual a pessoa tinha um relacionamento muito forte, como por exemplo a perda de um cônjuge ou a perda de uma criança, sendo que esta última constitui um risco especialmente alto (Shear, Ghesquiere & Glickman, 2013).

Stroebe, Folkman, Hansson & Schut (2006) propuseram uma estrutura integrativa dos fatores de risco para possibilitar uma melhor compreensão das diferenças individuais na adaptação ao luto e aumentar a capacidade de prever o resultado do processo de luto. Estes autores definem um fator de risco como uma variável que, estando presente,

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aumenta a probabilidade de resultados desfavoráveis, e consideram fundamental haver estudos que incluam vários fatores de risco e não apenas um isoladamente. Acrescentam ainda que a análise das diferenças individuais na adaptação ao luto é essencial para a prática clínica em termos de intervenção, e também é essencial a nível teórico, por ter um papel fundamental no desenvolvimento de explicações teóricas do impacto do luto na saúde. Isto aplica-se às diferentes categorias de fatores, sejam estas situacionais (e.g., a forma como a pessoa morreu), pessoais (e.g., características de personalidade) e interpessoais (e.g., apoio social).

Farei de seguida uma breve descrição de cada tipo de fator de risco para o desenvolvimento do LC, que foi contemplado no instrumento desenvolvido neste estudo. Grau de Parentesco

Apesar do efeito desta variável no desenvolvimento do luto ter sido pouco estudada, a perda de um cônjuge ou filho parece ter maior impacto do que a perda de pais ou irmãos, sendo este impacto traduzido num maior sofrimento ou um sofrimento mais persistente (Piper et al., 2011). Tal pode estar relacionado com o fato de ser mais difícil aceitar a morte de um jovem, podendo por vezes ser sentida como uma injustiça do destino, sendo mais difícil recuperar da mesma. Este ponto constitui por si um fator de risco para o desenvolvimento do LC e que será explicado de forma mais detalhada posteriormente (Gana & K'Delant, 2011).

Tempo desde a perda

Evidência empírica sugere que quanto maior o tempo desde a perda do ente querido, mais persistente é a dor, sendo esta persistência preditiva de desenvolvimento de LC. Na dor prolongada, a passagem do tempo parece não ter função de alívio, permanecendo forte muito após a morte, ao contrário do luto normal, onde existe um alívio e integração da dor. (Gana & K’Delant, 2011).

Idade do falecido e idade do enlutado

Quanto mais jovem o falecido for, mais complicada será a dor, uma vez que é mais difícil aceitar a morte de um jovem e mais difícil recuperar de tal perda, podendo por vezes ser sentida como uma injustiça do destino (Gana & K'Delant, 2011). Por exemplo, a perda de uma criança pode envolver outros fatores de risco como a perda repentina e trauma. O fato de esta perda ser percecionada como uma contradição ao ciclo natural da vida, não sendo expetável que tal aconteça, significa que teoricamente os pais

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não possuem formas de lidar com esta perda, podendo senti-la como perda múltipla, por perderem um filho, as suas idealizações para o mesmo e como se uma parte deles tivesse morrido (Piper et al., 2011).

Quanto à idade do enlutado, enlutados mais jovens normalmente sofrem de mais problemas de saúde e também relatam problemas psicológicos mais frequentes, enquanto enlutados mais velhos apresentam maior sintomatologia física, podendo mais tarde apresentar problemas emocionais devido ao isolamento e solidão (Piper et al., 2011). Contudo, idades mais avançadas do enlutado parecem constituir um fator de proteção. Talvez por já terem experienciado um maior número de eventos stressantes, conseguem de forma mais eficiente dar sentido à perda e como tal parecem experienciar menos LC (Rozalski, Holland & Neimeyer, 2017).

Género do enlutado

O género é um fator de risco geral para alguns problemas de saúde física e mental, parecendo existir uma maior incidência de perturbações psiquiátricas no género feminino, como depressão, ansiedade e somatização. Todavia, a literatura é inconsistente quanto aos efeitos específicos do género no desenvolvimento do luto, uma vez que grande parte da literatura sobre esse fator aborda o impacto da perda do cônjuge, tendo como amostra cônjuges enlutados. Assim, é difícil discriminar o efeito geral do género como fator de risco para o luto. No entanto, o efeito deste fator poderá incidir nas diferentes formas como homens e mulheres expressam o seu pesar (Stroebe, 1998; Piper et al., 2011). Morte inesperada

A morte súbita, repentina e inesperada, geralmente contribui para um pior ajustamento e um maior risco de fragilidades mentais e físicas durante o processo de luto, uma vez que o choque de uma perda inesperada pode inibir ou prolongar o processo de luto, tendo assim um impacto negativo no mesmo. No entanto, existem outros fatores que parecem contribuir para o desenvolvimento do LC em conjunto com este, como por exemplo a falta de apoio social e o tipo de relação com o falecido. Também é importante referir as mortes por acidente que, além de serem vistas como inesperadas, também são vistas como evitáveis. Isso poderá repercutir-se em diversos fatores de risco para o desenvolvimento do LC, pois é um tipo de morte que geralmente atinge grupos etários mais jovens, podendo envolver a perda de um filho, também já mencionado anteriormente como um fator de risco para o LC (Piper et al., 2011).

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Outro aspeto a ter em conta são as mortes vistas como não naturais, pois as mesmas exigem uma adaptação psicológica mais profunda, uma vez que podem ser percecionadas pelos enlutados como uma perda que poderia ser evitada (Piper et al., 2011). Nesta sequência de ideias, e segundo Currier, Holland e Neimeyer (2006), a morte violenta, que envolve suicídio, homicídio ou acidentes, é mais preditiva de sintomas mais severos de LC, pela incapacidade por parte dos enlutados de dar sentido à perda.

Saúde Mental e Saúde Física

Apesar de algumas inconsistências, a investigação parece sugerir que a doença mental prévia à perda do ente querido é um fator de risco para desfechos desfavoráveis do luto, assim como o são os problemas de saúde física (Piper et al., 2011). Durante várias décadas, investigações longitudinais, comparando enlutados e não enlutados, tentaram perceber se a morte de um ente querido aumentava o risco de mortalidade da pessoa enlutada e os resultados apontam para uma maior ocorrência de queixas físicas em pessoas enlutadas, em comparação com as pessoas que não estavam em processo de luto, envolvendo uma maior variedade de sintomas físicos, maior uso de recursos médicos e de medicamentos (Stroebe M., Schut & Stroebe W., 2007).

Estilo de Vinculação

Um construto fortemente relacionado com o LC é o estilo de vinculação, o comportamento característico das pessoas nos seus relacionamentos, que cumprem funções importantes na emoção e autorregulação. Pressupõe-se que o estilo de vinculação derive de experiências ocorridas com os cuidadores precoces e que a qualidade destas experiências seja um fator determinante do comportamento da pessoa nos seus relacionamentos significativos seguintes (Piper et al., 2011).

Mikulincer (2008) descreve estratégias de vinculação secundárias, denominando-as de hiperativação (na vinculação ansiosa) e desativação (na vinculação evitante). Segundo este autor, as estratégias de hiperativação motivam as pessoas a fazer o que for necessário para obter atenção e o cuidado da figura de vinculação. Face a esta dependência da relação com a figura de vinculação, após a perda dessa figura, as estratégias de hiperativação intensificam-se, tornando a pessoa mais vulnerável ao desenvolvimento de luto e depressão crónicos. Em contraste, a desativação do sistema de vinculação, após a perda da figura de vinculação, pode fazer com que a pessoa não entre em contato com os seus sentimentos relacionados à perda e evite fazer o ajustamento

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mental necessário para a resolução do luto. Embora tudo isso possa resultar em reações de luto desorganizadas, é necessário algum grau de hiperativação e desativação para a resolução do luto,: a primeira proporciona a exploração do significado da perda e o encontro de novas formas de reorganizar a vida sem a pessoa falecida e a segunda permite desvincular-se dos pensamentos sobre o falecido e contribuir também assim para a reorganização após a morte, por suprimir pensamentos e sentimentos dolorosos (Mikulincer, 2008; Stroebe, 1998).

Em sequência do que foi expresso anteriormente, indivíduos com vinculação inseguro-evitante, negam a necessidade de manter um laço com o falecido, evitando pensamentos e lembranças do mesmo, enquanto que os indivíduos com estilo de vinculação ansioso-ambivalente mantêm um laço disfuncional, sentindo ansiedade e culpa, e sendo mais propensos a demonstrar padrões de LC (Stroebe, Schut, & Boerner, 2010; Piper et al., 2011; Wayment & Vierthaler, 2002). Segundo Moreira (2006), é pouco provável que os esquemas relacionais que estão na base do estilo de vinculação, sejam transversais indiferentemente a todas as relações íntimas, sugerindo que as manifestações seriam em função da especificidade de cada relação. Torna-se por isso importante não só ter em conta o estilo de vinculação em geral, mas também o estilo de vinculação específico à pessoa perdida, pois estes irão ter diferentes tipos de influência no processo de luto (Wayment & Vierthaler, 2002).

Várias evidências empíricas apoiam a ideia que existe de fato uma relação entre o estilo de vinculação, o LC e os mecanismos de defesa no luto, nomeadamente pessoas com estilo de vinculação inseguro, pelas caraterísticas mencionadas anteriormente e pessoas com vinculação evitante, que têm padrões de evitamento associados a maiores dificuldades na adaptação à perda do ente querido (Schenck, Eberle & Rings, 2016; Fraley & Bonanno, 2004).

Qualidade de Relação com o falecido

Os aspetos referentes à qualidade de relação que têm sido apontados como fatores de risco para o LC são a intimidade e proximidade, ambivalência (presença constante de sentimentos positivos e negativos contraditórios acerca do relacionamento) e dependência. Sendo a maioria destes estudos relativos a casais, os resultados apontam que a existência de ambivalência no relacionamento conjugal está relacionada com piores resultados de luto e a dependência, estando também associada a outros fatores de risco para o LC, como as perdas na primeira infância (Piper et al., 2011).

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De acordo com Mikulincer (2008), os indivíduos em processo de luto que não procuravam proximidade ou estavam emocionalmente distantes do parceiro, têm menos probabilidade de sentirem um sofrimento intenso, seja na recordação de memórias ou presença de pensamentos quando lembrados da perda.

Laços Continuados

Após a perda efetiva de um ente querido, o laço afetivo continua a existir, na representação interna da pessoa falecida. No entanto, este processo, denominado por laços continuados, para que seja saudável, requer que o enlutado aceite a realidade de já não existir vinculação física, diferenciando claramente entre a situação antes e depois da perda. A ausência dessa diferenciação irá traduzir-se em laços continuados mal-adaptativos, que poderão dificultar o processo de luto (Field, 2006; Semedo, 2017).

Estudos demonstram que pessoas que mantêm ligação com a pessoa perdida, seja através de pensamentos, sonhos, ou pertences guardados da pessoa falecida, manifestam um luto adaptativo, o que poderá indicar que a manutenção da ligação com a pessoa perdida pode ser um facilitador na vivência da transição do passado para o presente e o futuro (Canavarro, 2004). Quando o laço entre a pessoa enlutada e a pessoa perdida se mantém ao longo do tempo, ainda que apenas internamente, irá permitir a manutenção da vinculação. Essa permanência de vínculo não só permite a manutenção de laços como também ajuda a dar apoio à identidade da pessoa enlutada, tendo uma função de acomodação (Field, 2006).

Field & Filanosky (2009) relacionam expressões externalizadas de laços continuados, que envolvem ilusões (como ver alguém na rua fisicamente parecido com o falecido) e alucinações com o falecido, assim como expressões internalizadas de laços continuados que envolvem o uso de representação mental do falecido, com o LC. Porém, enquanto as externalizadas parecem indicar uma perda não resolvida, estando também relacionadas com os sintomas de LC, as internalizadas parecem facilitar a integração da perda, estando associadas a um pesar mais severo.

Estilo de Coping

O coping refere-se aos processos e estratégias para lidar com a situação em que o enlutado se encontra. É necessário confrontar a experiência do luto para evitar consequências prejudiciais à saúde do enlutado (Stroebe & Schut, 2010) e por isso

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torna-se importante enriquecer nossa compreensão relativamente à influência do estilo de coping no processo de luto.

As estratégias de coping vs. evitamento podem ser eficazes em distintas fases do processo de luto. A ruminação, que se caracteriza pelo foco frequente nos aspetos negativos da perda, tem sido correlacionada com uma influência negativa na recuperação do luto (Piper et al., 2011; Stroebe & Schut, 2001). Relativamente ao evitamento como sintoma do LC, Shear et al. (2007) levantam a hipótese de que o evitamento de lembranças relacionadas à perda pode complicar o processo de luto e impedir que a pessoa em processo de luto incorpore a perda no seu modelo de trabalho de luto, sendo este evitamento um impedimento para o ajuste e um contribuinte para o comprometimento funcional. A interligação de coping ruminativo com processos de evitamento tem sido associada a resultados negativos no luto, aumentando e mantendo os sintomas de psicopatologia (Eisma et al., 2013).

Quando os recursos cognitivos estão sobrecarregados ou esgotados, as estratégias de evitamento podem ser adequadas e adaptativas (Piper et al., 2011). No entanto, o modelo cognitivo-comportamental do LC conceptualiza o evitamento como uma das maiores complicações do processo de luto, na medida que reforça as crenças e interpretações negativas relacionadas com as reações de luto e contribui para uma integração insuficiente da perda. Investigações confirmam que entre as pessoas com LC, o evitamento é comum e contribui significativamente para o comprometimento (Baker, et al., 2016).

Segundo o Modelo do Processo Dual de Coping proposto por Stroebe e Schut, (1999), existem dois tipos de coping envolvidos no processo de luto saudável, sendo um deles o orientado para a perda que, tendo como foco algum aspeto concreto da experiência da perda, envolve ruminação sobre o falecido ou circunstâncias da perda, tristeza, ou recordar vendo fotos antigas. Em simultâneo, existe também o coping orientado para a restauração (“restoration-oriented”), pois perante a perda de uma figura significativa é preciso, para além de chorar a perda, existir adaptação às mudanças que ocorreram no mundo externo e às consequências secundárias da mesma, como, por exemplo, vender a casa. O componente central deste modelo é a oscilação entre estes dois processos, de uma forma dinâmica, isto é, existe uma alternância entre o coping orientado para a perda e o coping orientado para a restauração. A oscilação é um processo cognitivo que desempenha uma função de regulação, sendo crucial para um bom ajustamento à perda ao longo do tempo. Contudo, sabe-se que, no início do processo de luto, o coping é mais

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orientado para a perda, enquanto posteriormente domina a orientação para a restauração (Schut, 1999; Stroebe & Schut, 1999).

Tendo em conta o que foi dito anteriormente, estratégias de coping adaptativas são aquelas que levam a uma diminuição das consequências negativas do luto, ou diminuição da sua intensidade, permitindo uma procura de significado e integração em estruturas amplas de significado positivo, pois se a pessoa em processo de luto não conseguir explorar e articular a sua reconstrução contínua do relacionamento com o falecido, não irá conseguir adaptar-se. Ainda assim, diferentes estratégias de coping podem ser eficazes em diferentes momentos do processo de luto (Stroebe & Schut, 2001; Piper et al., 2011).

Apoio Social

Outro fator que está fortemente relacionado com o processo de luto é o apoio social, sendo que a disponibilidade de apoio social está associada positivamente à saúde das pessoas enlutadas. Porém, têm existido algumas questões conceptuais referentes à melhor forma de medir o apoio social, se deverá ser feita pela quantidade de pessoas que constituem a rede social, se pela perceção do enlutado de que está a receber apoio social ou ainda se pela satisfação com o apoio social recebido (Piper et al., 2011).

Ghesquiere et al. (2017) avaliaram o impacto do apoio social tangível nos sintomas de LC, comparativamente com outros tipos de apoio social. Caraterizam o apoio social tangível como ajuda em atividades específicas, desde reparar um carro, obter um empréstimo financeiro, mudar para uma casa nova, entre outros. Provavelmente por este tipo de apoio ser tão específico da situação de perda, parece ser mais estável e menos influenciado pela sintomatologia do LC do que outros tipos de apoio social.

Além da presença ou não de apoio social, também têm sido investigados os mecanismos que determinam quando e como os possíveis apoiantes respondem ao luto. Neste sentido, os dados apontam que as pessoas seriam mais propensas a fornecer apoio social se tivessem um histórico de luto pessoal e tivessem tido pouco apoio social (Logan, Thornton, Kane, & Breen, 2018). Porém, segundo o estudo de Logan, Thornton e Breen (2017), embora as pessoas que tenham tido experiência de luto indiquem uma maior empatia e aceitação das pessoas enlutadas, podem não estar preparadas para oferecer apoio, comparativamente a pessoas que não tenham tido esta experiência.

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Personalidade

Fatores de personalidade podem também afetar o risco de complicações no processo de luto e influenciar a expressão do luto ao longo do tempo. Embora a evidência empírica não seja muito conclusiva acerca desta relação (entre fatores de personalidade e LC), parece razoável que pessoas com personalidades estáveis e um maior ajustamento psicológico tenham uma maior capacidade de lidar com o impacto de uma perda significativa, contrariamente às pessoas com personalidades mais instáveis e mal ajustadas psicologicamente. Baixa autoestima, maior neuroticismo e locus de controle mais externo, um estilo de defesa imaturo e a relação próxima com o falecido têm sido associados a resultados mais fracos de luto e são preditivos positivamente da gravidade do luto, demonstrando deste modo a importância de integrar vários fatores de risco na compreensão do LC (Gana & K'Delant, 2011; Piper et al., 2011).

Pertinência do presente estudo

Após esta revisão da literatura sobre os fatores de risco que contribuem para desenvolvimento do LC, este trabalho teve o propósito de construir um instrumento breve, mas que avaliasse o maior número possível desses fatores, para constituir um instrumento prático de rastreio, que se pudesse aplicar mesmo antes da perda ocorrer, permitindo deste modo uma intervenção psicológica precoce, no sentido de prevenção do desenvolvimento do LC. Pretende-se também que seja um instrumento abrangente, que identifique fatores que careçam de uma avaliação mais específica e consequentemente intervenção mais especializada. Além do carater preventivo que se pretende, o mesmo instrumento poderá ser aplicado a pessoas que já estejam em processo de luto, pois dará informação específica útil para a intervenção.

Apesar de se pretender, que este instrumento possa ser aplicado antes da perda ocorrer (e.g., cuidados paliativos), por questões de validação, o mesmo, neste presente estudo, teve de ser aplicado em população em processo de luto, para assim aferir a sua validade.

Os fatores de risco incluídos neste instrumento foram divididos em blocos: 1º variáveis sociodemográficas (idade do/a participante, género, tempo desde a perda, idade do/a falecido/a, grau de parentesco); 2º variáveis da perda (responsabilidade pela perda/evitabilidade da perda, morte como alívio para o sofrimento/perda vista como natural, sofrimento ao morrer e experiência de perdas anteriores); 3º variáveis de personalidade e outras da situação presente da pessoa enlutada (falta de apoio

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social/isolamento social, depressão, neuroticismo, trauma); 4º variáveis de reação à perda (profundidade da relação, coping evitante, consumo de substâncias); 5º qualidade da relação com a pessoa falecida.

Método Participantes

A amostra deste estudo foi composta por 50 indivíduos em processo de luto, 37 do sexo feminino (74%) e 13 do sexo masculino (26%), com idades compreendidas entre os 18 e os 61 anos (M = 36,48, DP = 12,578). O critério de inclusão dos participantes foi a idade ser maior de 18 anos e de a perda ter sido num período de há 2 meses até há 2 anos. Quanto aos falecidos, tinham idades compreendidas entre os 22 e os 94 anos (M = 67,62, DP = 15,455).

Quanto à ligação dos participantes com o falecido, para 30% da amostra era pai, seguido de 20% mãe, irmão 8%, avó 8%, avô 8%, tia 6%, amigo 4%, sogro 4%, marido 4%, madrinha 2%, prima 2%, sogra 2% e tia avó 2%. Em relação ao tempo desde a perda, 34% menos de 6 meses, 34% 1 ano e 6 meses, 9% entre 6 meses e 1 ano, e 7% 2 anos. Instrumentos

1. Questionário de Risco para o Luto Complicado (QRLC): foi desenvolvido no âmbito deste estudo, com o objetivo de colmatar a falta de instrumentos de rastreio que contemplem uma variedade de fatores de risco para o desenvolvimento do LC. Na versão que foi utilizada neste estudo, o questionário é composto por seis partes, sendo que a primeira parte (5 itens), engloba questões de carácter sociodemográfico, incluindo dados sobre o falecido; a segunda parte (7 itens) engloba questões relativamente às circunstâncias da morte; a terceira parte (1 item) questão acerca da saúde física do enlutado; a quarta parte (26 itens) é relativa à situação atual da pessoa, avaliando sete domínios (saúde mental, Sensibilidade Interpessoal, Apoio Social, Vinculação, Neuroticismo e Experiência de Trauma); a quinta parte (10 itens) é relativa à perda e à relação com a pessoa perdida, avaliando dois domínios (Coping, e Profundidade da relação com o falecido); a sexta e última parte (11 itens) é relativa à sua forma de se relacionar com o falecido quando este era vivo, avaliando as dimensões de Qualidade da relação com o falecido, Evitamento e Preocupação. Uma vez que o instrumento é o foco deste estudo, a análise psicométrica irá ser descrita na secção de Resultados.

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2. Questionário de Avaliação de Processos e Reações face ao Luto (Semedo, 2017) - é composto por 9 itens agrupados em 3 domínios (laços continuados adaptativos, laços continuados desadaptativos e o evitamento), avaliados numa escala que vai de 1 (Discordo Fortemente) até 4 (Concordo Fortemente). Na presente investigação o alfa de Cronbach do domínio laços continuados adaptativos corresponde a .61, laços continuados desadaptativos é de .54 e do evitamento .38. 3. O Instrumento de Avaliação do Luto Prolongado (Prigerson et al., traduzido e adaptado por Delalibera, Coelho, & Barbosa, 2011): é composto por 13 itens descritivos de um conjunto de sintomas que devem persistir por um período mínimo de 6 meses e que estão necessariamente associados a um significativo distúrbio funcional. A primeira parte do questionário é constituída por 2 itens que avaliam a frequência do sentimento de ansiedade de separação. O terceiro item refere-se à duração deste sintoma. A segunda parte é composta por 9 itens descritivos de sintomas cognitivos, emocionais e comportamentais. A última questão é relativa à incapacidade funcional nas áreas social e ocupacional. A análise fatorial da escala na versão portuguesa revelou a presença de dois fatores: o primeiro associado ao trauma inerente à experiência do luto e o segundo refere-se aos refere-sentimentos de dor emocional e ansiedade de refere-separação pelo falecido. Na presente investigação o alfa de Cronbach do fator trauma corresponde a .826 e do fator associado à dor-ansiedade é de .93.

Procedimentos

O procedimento de obtenção da amostra foi através de “bola de neve”, ou seja, foram selecionados alguns indivíduos, estes deram a conhecer o questionário a outros, e a amostra foi crescendo. As pessoas que participaram fizeram-no de forma voluntária, tendo sido informadas antes da sua participação sobre a temática dos questionários, a duração prevista, questões de confidencialidade dos dados e critérios de inclusão, nomeadamente ter mais de 18 anos de idade e a perda ter sido num período entre 2 meses e 2 anos antes. Deste modo, foi-lhes explicado que, ao assinarem o consentimento informado, davam o seu consentimento e garantiam que preenchiam esses mesmos requisitos.

Podendo haver um risco de desconforto ou mesmo dano psicológico para o participante, pelo carater sensível dos questionários, as questões de confidencialidade assumiram uma grande importância. Deste modo, foi garantido que as respostas aos

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questionários seriam abrangidas pela confidencialidade, assim como o seu anonimato, não existindo forma de relacionar a identidade do participante com as respostas por ele dadas. Parece-me também pertinente indicar que devido ao fato a população do referente estudo ser considerada de risco tornou-se necessário a recolha de dados presencialmente, não tendo sido possível a recolha através da internet por ser requerido consentimento informado assinado, o que influenciou o tamanho da amostra recolhida, que ficou aquém do que inicialmente havia sido idealizado. A presente investigação foi aprovada pela Comissão de Deontologia da Faculdade de Psicologia da Universidade de Lisboa.

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Resultados Análise Fatorial

Inicialmente realizou-se uma análise fatorial do Questionário Risco do Luto Complicado (QRLC) utilizando a técnica da análise em componentes principais para a extração de fatores e o scree plot como forma de estimar o número de fatores a extrair (Moreira, 2004). De forma a tornar a análise mais clara, decidiu-se fazê-la separadamente para os diversos blocos em que o questionário havia sido dividido. Assim, para as variáveis da perda, foram identificados quatro fatores. Foram selecionados para a escala final os itens com saturações superiores a .50, em cada fator, com o cuidado de não incluir itens que apresentassem saturações importantes nos outros fatores. Para a interpretação dos fatores, atendeu-se à matriz de saturações, após uma rotação do tipo Varimax (os mesmos procedimentos foram seguidos para os fatores subsequentes). O primeiro fator das variáveis da perda corresponde à morte vista como alívio para o sofrimento/perda e como natural, constituído por dois itens (item 3 – “A morte para esta pessoa foi um alívio para o sofrimento que ela já estava a sentir há algum tempo?”, e 7 – “Esta perda é vista por si como uma perda natural?”), sendo que o alfa de Cronbach obtido foi de .58. O segundo fator corresponde a alguém ser responsável pela perda/perda ser evitável, constituído por dois itens (item 2 – “Acha que alguém foi responsável por esta morte/perda?” e item 6 – “Até que ponto considera que esta morte poderia ter sido evitada?”), sendo que o alfa de Cronbach obtido foi de .80. O terceiro fator corresponde ao sofrimento ao morrer, composto pelo item 4 “Acha que a pessoa sofreu ao morrer?” e o quarto fator à existência de perdas anteriores, constituído pelo item 5 “Já experienciou perdas anteriores de pessoas que o/a tenham abalado bastante?”. Um item adicional foi desconsiderado na análise destes fatores por não revelar significância estatística com nenhum deles, entrando posteriormente na análise de regressão como item isolado.

Para as variáveis da situação presente, que incluem aspetos não diretamente ligados com a perda e que podem estar presentes antes de a pessoa estar em processo de luto, foram identificados quatro fatores. O primeiro fator é o Isolamento social/Falta de apoio social, constituída por dez itens, sendo que o alfa de Cronbach obtido foi de .88. O segundo fator identificado foi a Depressão, constituído inicialmente por sete itens, tendo posteriormente o item 5 (“Tenho mudanças de humor frequentes”) sido excluído por forma de aumentar o alfa de Cronbach, sendo que o alfa de Cronbach obtido foi de .87. O terceiro fator identificado foi o Neuroticismo, constituído inicialmente por cinco itens,

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sendo um deles invertido (item 10: “Acho que sou uma pessoa calma e lido bem com o stress”), posteriormente foi excluído o item 24 (“Evito situações que me possam recordar uma situação traumática que vivenciei”) por forma de aumentar o alfa de Cronbach, sendo que o alfa obtido foi de .77. Por fim, o quarto fator identificado foi a Experiência anterior de trauma, inicialmente constituído por cinco itens, tendo sido excluídos os itens 1 (“Estou sem apetite, não me apetece comer”), 7 (“Sinto-me deprimido/a.”) e 24 (“Evito situações que me possam recordar uma situação traumática que vivenciei”), por terem saturações em mais do que um fator e por forma a aumentar o alfa de Cronbach. Esse fator fica, deste modo, constituído por dois itens (item 6 – “Com frequência revivo um acontecimento traumático que me aconteceu” e item 14 – “Às vezes, dou por mim a reviver aflitivamente um acontecimento negativo que me marcou”), com valor de alfa de Cronbach de .72.

Relativamente às variáveis de reação face à perda, incluídas na V parte do questionário, foram identificados inicialmente quatro fatores. O primeiro fator é a Profundidade da relação, constituído pelos itens 3 (“Sinto falta dessa pessoa na minha vida” e 9 (“A minha relação com esta pessoa era/é importante na minha vida”), tendo o item 6 (“Esta pessoa desempenhou um papel positivo na minha vida”) sido excluído por forma a aumentar o valor de alfa de Cronbach, sendo este de .89. O segundo fator identificado foi o Coping evitante, constituído pelos itens 5 (“Por vezes dou por mim a pensar como se a pessoa não tivesse realmente falecido”) e 8 (“Tenho pensado que isto não pode ser verdade”), tendo o item 1 (“Penso muitas vezes que gostava de ter mudado o que aconteceu ou a forma como me senti”) sido excluído por forma a aumentar o valor de alfa de Cronbach, sendo este de .80. O terceiro fator é o Consumo de substâncias, constituído pelo item 2 (“Desde que a pessoa faleceu tenho consumido mais medicamentos, álcool ou outras drogas”) e pelo item 10 (“Recorro ao álcool, medicamentos ou outras drogas para me ajudar a ultrapassar os problemas”), sendo o alfa de Cronbach de .89. Por último, o quarto fator de Culpa/autocrítica, que seria constituído pelos itens 4 (“Acho que sou culpado/a pelo que aconteceu”) e 7 (“Critico-me muito por causa de coisas que faço ou fiz no passado”), mas este fator foi desconsiderado por o seu alfa de Cronbach ser de .16, tendo estes itens sido analisados posteriormente como itens isolados Deste modo, este domínio das reações face à perda ficou constituído pelos três fatores descritos anteriormente.

A última variável medida pelo instrumento desenvolvido é a Qualidade da relação prévia com a pessoa falecida, composta por apenas um fator. Esta variável era constituída

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inicialmente por 11 itens (e.g., item 11 - Quando a pessoa era viva Eu... Preocupava-me o facto desta pessoa não me valorizar tanto como eu a valorizava”). Após a análise fatorial, o item 5 (“Quando a pessoa era viva Eu... Sentia-me à vontade para pedir conforto, conselhos ou ajuda a esta pessoa”) foi eliminado, por forma de aumentar o alfa de Cronbach, sendo este de .83, com esta variável constituída por 10 itens.

Após a análise fatorial das diferentes variáveis, importa acrescentar que nas análises de regressão, que se seguem, os itens “Até que ponto esta perda foi inesperada?”, “Acha que a pessoa sofreu ao morrer?”, “Já experienciou perdas anteriores de pessoas que o/a tenham abalado bastante?”, “Acho que sou culpado pelo que aconteceu”, “Critico-me muito por causa de coisas que faço ou fiz no passado” foram analisados como itens isolados, assim como a variável de saúde física, que também era composta apenas por um item (“De um modo geral a sua saúde física é: 1-Tenho uma doença grave que me prejudica seriamente a minha vida e é uma preocupação constante; 2 – Tenho uma ou mais doenças ou problemas de saúde grave e que interfere com a minha vida; 3 – Tenho uma ou mais doenças ou sintomas que me preocupam; 4 – Tem dias melhores e outros piores, mas nada de grave; 5 – Excelente, não tenho nenhuma doença e sinto-me bem quotidianamente).

Hipóteses

H1) A idade do falecido estará associada de forma negativa com as variáveis do Trauma e da Dor-Ansiedade (PG-13) e com os Laços Continuados Desadaptativos (QAVCAL), no sentido de quanto menor for a idade do falecido maior será a probabilidade de a pessoa enlutada desenvolver luto complicado.

H2) A saúde física estará associada de forma negativa com as variáveis do Trauma e da Dor-Ansiedade (PG-13), e com os Laços Continuados Desadaptativos (QAVCAL) sendo que quanto melhor for a saúde física do enlutado, menor será a probabilidade de desenvolver luto complicado.

H3) A qualidade da relação estará associada de forma negativa com as variáveis do Trauma e da Dor-Ansiedade (PG-13), e com os Laços Continuados Desadaptativos (QAVCAL), no sentido em que quanto maior for a qualidade da relação com o falecido, menor será a probabilidade de o enlutado desenvolver luto complicado.

H4) O estilo de Coping Evitante e o consumo de substâncias estarão associados de forma positiva com as variáveis do Trauma e da Dor-Ansiedade (PG-13) e com os Laços Continuados Desadaptativos (QAVCAL).

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H5) O Isolamento Social/Falta de apoio social estará associado de forma positiva com as variáveis do Trauma e da Dor-Ansiedade (PG-13) e com os Laços Continuados Desadaptativos (QAVCAL).

H6) O Neuroticismo estará associado de forma positiva com as variáveis do Trauma e da Dor-Ansiedade (PG-13) e com os Laços Continuados Desadaptativos (QAVCAL).

H7) A Depressão estará associada de forma positiva com as variáveis do Trauma e da Dor-Ansiedade (PG-13) e com os Laços Continuados Desadaptativos (QAVCAL).

H8) A responsabilidade pela perda e a possibilidade de evitamento da mesma, estarão associadas de forma positiva com as variáveis do Trauma e da Dor-Ansiedade (PG-13) e com os Laços Continuados Desadaptativos (QAVCAL).

H9) A perda vista como natural e a morte como alívio para o sofrimento do falecido, estarão associadas de forma negativa com as variáveis do Trauma e da Dor-Ansiedade (PG-13) e com os Laços Continuados Desadaptativos (QAVCAL).

H10) Perdas anteriores estarão associadas de forma positiva com as variáveis do Trauma e da Dor-Ansiedade (PG-13) e com os Laços Continuados Desadaptativos (QAVCAL).

H11) Experiências anteriores de trauma estarão associadas de forma positiva com as variáveis do Trauma e da Dor-Ansiedade (PG-13) e com os Laços Continuados Desadaptativos (QAVCAL).

H12) Existirá uma diferença em termos dos grupos dos participantes (homens e mulheres) nas variáveis do Trauma e da Dor-Ansiedade (PG-13) e nos Laços Continuados Desadaptativos (QAVCAL).

Análises de regressão para teste das hipóteses e validação como medida de risco Para analisar se as hipóteses acima mencionadas seriam apoiadas ou refutadas foram feitas análises de regressão, colocando as variáveis do Trauma e da Dor-ansiedade (PG-13) como variável dependente, e como variáveis independentes as variáveis abrangidas pelo instrumento desenvolvido. Estas variáveis foram inseridas na análise de regressão múltipla por blocos, por uma ordem específica, correspondendo à própria sequência temporal do processo de avaliação. No primeiro bloco foram consideradas as variáveis sociodemográficas, no segundo bloco foi inserida a variável qualidade de relação, por ser algo anterior à perda, no terceiro bloco foi considerada a variável saúde física, por ser constituída por um item isolado e por a mesma poder ser avaliada ainda

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antes da pessoa estar em processo de luto. No quarto bloco foram inseridos os fatores de neuroticismo, trauma, isolamento social e depressão, por serem fatores relacionados com traços de personalidade e vivências não relacionadas com a perda, portanto também anteriores a esta. No quinto bloco, foram introduzidas as variáveis, alívio/perda natural, sofrimento ao morrer, responsabilidade pela perda/evitamento e perdas anteriores, por serem fatores relacionados diretamente com as da perda, podendo ser avaliadas logo depois desta. No sexto bloco foram introduzidas as variáveis profundidade da relação, consumo de substâncias e Coping de evitamento por estas serem formas de reação face á perda e por último, no sétimo bloco, foram introduzidas as variáveis culpa, autocrítica e perda inesperada, por estas, na análise fatorial, não tendo obtido nenhum tipo de correlação com os restantes fatores, tendo entrado nesta análise como itens isolados e de utilidade duvidosa (Quadro 1). O mesmo foi feito posteriormente para a escala de Laços Continuados Desadaptativos do QAVCAL, como variável dependente (Quadro 2).

No primeiro passo destas análises de regressão, foram inseridas variáveis demográficas (idade do falecido, género do enlutado, tempo desde a perda e idade do enlutado). Para o Trauma e Dor-ansiedade (PG-13) como variáveis dependentes, a variável que se revelou mais preditiva para o desenvolvimento do LC foi a idade do falecido, no sentido negativo, o que indica que quanto mais jovem é o falecido, maior a probabilidade do enlutado desenvolver LC. O que confirma parcialmente (faltando a análise com os laços continuados desadaptativos (QAVCAL)) a H1. Ainda neste modelo, a variável tempo desde a perda surge também com um efeito significativo, no sentido negativo, o que indica que quanto menor o tempo desde a perda, maior será a probabilidade do enlutado desenvolver LC. Também surge a variável idade do enlutado com significância, no sentido positivo, indicando que quanto maior a idade do enlutado, maior será a probabilidade de desenvolver LC.

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Quadro 1. Resultados das análises de regressão prevendo as variáveis do Trauma e da Dor-Ansiedade (PG-13) a partir das variáveis demográficas e do QRLC: Variância explicada e coeficientes β.

Mod. 1 Mod. 2 Mod. 3 Mod. 4 Mod. 5 Mod. 6 Mod. 7

R² .34 .34 .34 .63 .70 .76 .80

Idade .34* .34* .33* .24 .19 .20 .25†

Género .06 .05 .06 .27* .28* .16 .22 Tpo. desde perda -.37** -.35** -.35* -.16 -.07 -.07 -.11 Idade do falecido -.47*** -.46*** -.46*** -.30** -.18 -.23† -.22† Qualidad. relação -.80 -.09 -.21† -.25* -.15 -.21† Saúde Física -.02 -.02 -.02 .00 .06 Isolamento social .11 .16 .13 .07 Depressão .29* .27† .30† .33* Neuroticismo .24** .23† .13 .09 Trauma .26† .25† .14 .09 Perda Evitável .23† .16 .13 Perda natural -.22* -.15 -.13 Sofrimento -.04 -.01 -.07 Perdas anteriores .10 .02 .00 Profund. relação .18 .09 Coping evitante .22 .19 Consumo subst. .09 .09 Culpa .20† Auto-crítica .12 Perda inesperada .18 Nota. † - p < .10, * - p < .05, ** - p < .01, *** - p < .001

No segundo modelo desta análise, foi inserida a variável qualidade de relação, que não se revelou significativa enquanto preditora do desenvolvimento do LC. Contudo, neste modelo, as variáveis, idade do falecido, tempo desde a perda e idade do enlutado, continuam a apresentar graus de significância enquanto preditoras (p <.05). Com base apenas nestes dados, a H3 seria rejeitada.

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No terceiro modelo, foi contemplada a variável de saúde física, que não se revelou significativa enquanto preditora do desenvolvimento do LC, o que rejeita a H2. Neste modelo, as variáveis, idade do falecido, tempo desde a perda e idade do enlutado, continuam a ser significativas enquanto preditoras do desenvolvimento do LC.

No quarto modelo, foram inseridas as variáveis, neuroticismo, trauma, isolamento social e depressão. O neuroticismo apresentou um efeito significativo, o que indica que maiores níveis de neuroticismo contribuem enquanto preditores para o desenvolvimento do LC, tal como previsto pela H6. A depressão também se mostrou significativa, o que indica que é preditora positivamente com o desenvolvimento do LC, apoiando deste modo a H7. Também a variável trauma se mostrou- significativa, indo ao encontro do previsto na H11. Contudo, neste modelo a idade do falecido continua a ser a mais preditiva e o género ganha uma significância que até então não tinha ocorrido, indicando haver uma diferença entre géneros na manifestação dos fatores considerados neste modelo, o que era previsto na H12. A qualidade da relação, embora não tão significativa, parece poder ter alguma influência no desenvolvimento do LC, mas o valor não permite que se possa considerar uma boa preditora do seu desenvolvimento. Neste modelo, tendo em conta as variáveis incluídas, verifica-se que as mais significativas são a idade do falecido, género, neuroticismo, depressão e experiências de trauma. Ao contrário do que fora previsto na H5, o isolamento social não se revelou significativo.

No quinto modelo, foram contempladas as variáveis morte como alívio para o sofrimento do falecido/perda vista como natural, sofrimento ao morrer, alguém ser responsável pela perda/perda poderia ter sido evitada e perdas anteriores. Face à entrada destas variáveis, o género continua a revelar-se significativo, o que corrobora a confirmação já feita da hipótese H12. A qualidade da relação neste modelo, revela-se significativa positivamente, o que indica que quanto pior a relação prévia com o falecido, maior será a probabilidade do enlutado desenvolver LC, o que era previsto na H3. Das variáveis neste modelo introduzidas, a que se revelou mais preditiva foi a morte como alívio para o sofrimento do falecido/perda vista como natural , de forma negativa, indicando que quando a morte não foi um alívio para o sofrimento do falecido e a perda não é vista como natural, aumenta a probabilidade do enlutado desenvolver LC, estando de acordo com a H9. O neuroticismo também revela significância, assim como o trauma. Não tão significativo, mas que requer alguma atenção, surge a depressão e alguém ter sido responsável pela perda/a perda poderia ter sido evitada, o que sugere que quando não existe uma pessoa responsável pela perda e quando a perda é vista como inevitável,

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poderá haver uma menor probabilidade de desenvolvimento do LC, embora os dados não permitam afirmar confortavelmente a H8, deverá ser tido em conta.

No sexto modelo, foram inseridas as variáveis profundidade da relação, consumo de substâncias e coping de evitamento, e nenhuma destas variáveis se revelou significativa enquanto preditora de LC, o que implica rejeitar a H4. Com a entrada destas variáveis, a variável que se mostrou mais preditora de LC foi a depressão, demonstrando, tal como no quarto e quinto modelo, que quanto maiores os níveis de depressão, maior será a probabilidade de desenvolver LC, o que reforça a previsão da H7.

No sétimo, e último, modelo desta análise foram inseridos os itens isolados, constituindo as seguintes variáveis: culpa, autocrítica e perda inesperada. Destas variáveis introduzidas, a que se revelou mais preditiva foi a culpa. Contudo, neste modelo, a mais preditiva foi a depressão, o que poderá indicar que a depressão, incluindo sentimentos de culpa, é uma forte preditora do desenvolvimento do LC. A idade do enlutado também revela alguma significância, o que indica que quanto maior a idade do enlutado, maior a probabilidade de desenvolver LC.

Para a análise feita com a variável dependente Laços Continuados Desadaptativos (do QAVCAL), o primeiro modelo desta análise revela que a idade do falecido é significativa enquanto preditora dos laços continuados desadaptaivos, no sentido negativo, mostrando que quanto menor a idade do falecido, maior será a probabilidade do enlutado manter laços continuados desadaptativos, indo de encontro ao previsto pela H1. No segundo e terceiro modelo, tendo sido introduzidas as mesmas variáveis que na análise anterior (para Trauma e Dor-ansiedade (PG-13)), a idade do falecido continua a ser a única preditora significativa para Laços Continuados Desadaptativos. No quarto modelo, a variável mais significativa é o neuroticismo, associando-se positivamente com Laços Continuados Desadaptativos, conforme previsto na H6. No quinto modelo foi possível verificar que as variáveis: alguém ser responsável pela perda e a possibilidade de evitamento da mesma, tal como previsto na H8, associaram-se positivamente com Laços Continuados Desadaptativos. No sexto modelo, o Coping evitante revela-se o maior preditor de Laços Continuados Desadaptativos, tal como previsto com na H4, e a depressão também surge com alguma significância, associando-se de forma positiva com Laços Continuados Desadaptativos, como previsto na H7. No sétimo, e último modelo, o Coping evitante continua como o maior preditor de Laços Continuados Desadaptativos, surgindo também como preditora a perda inesperada, e embora essa associação não tenha sido comtemplada nas hipóteses, parece ser relevante considerá-la.

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Quadro 2. Resultados das análises de regressão prevendo as variáveis de Laços Continuados Desadaptativos (QAVCAL) a partir das variáveis demográficas e do QRLC: Variância explicada e coeficientes β.

Mod. 1 Mod. 2 Mod. 3 Mod. 4 Mod. 5 Mod. 6 Mod. 7

R² .14 .14 .14 .29 .46 .59 .68

Idade .11 .11 .09 -.03 -.11 -.06 -.04

Género .08 .08 .10 .16 .17 .05 .21

Tpo. desde perda -.23 -.23 -.22 -.11 .01 .04 -.01 Idade do falecido -.30* -.30* -.29† -.23 .05 -.02 -.01 Qualidad. relação -.05 -.03 .02 .12 .02 .11 Saúde Física -.06 -.10 -.14 -.09 -.20 Isolamento social -.20 -.26 -.22 -.12 Depressão .28 .30 .39† .32 Neuroticismo .30† .21 .09 .04 Trauma -.22 -.21 -.07 -.01 Perda Evitável .49*** .27 .08 Perda natural -.00 .06 .16 Sofrimento -.13 .02 -.10 Perdas anteriores -.01 -.04 -.01 Profund. relação -.09 .07 Coping evitante .51** .46** Consumo de subs. -.18 -.14 Culpa -.17 Auto-crítica -.18 Perda inesperada .40* Nota. † - p < .10, * - p < .05, ** - p < .01, *** - p < .001

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Discussão

Os resultados deste estudo mostram que o objetivo de construir um instrumento de rastreio capaz de medir diferentes fatores de risco para o desenvolvimento do LC, foi em grande parte atingido. Após a análise das qualidades psicométricas do questionário inicial, que foi aplicado, procurou-se determinar quais os itens mais relevantes para o questionário final, por forma a explorar as suas qualidades psicométricas no rastreio de fatores de risco para o desenvolvimento de LC. No entanto, dada a reduzida dimensão da amostra que foi possível recrutar para este estudo, esta seleção dos itens terá sempre de ser continuada e confirmada em estudos futuros. Embora o questionário seja extenso, era da dimensão adequada, uma vez que nele estão inseridos múltiplos fatores, e outro objetivo deste estudo era de que fosse um instrumento o mais completo possível. Também importa referir que o fato de se tratar de um instrumento de rastreio e não de avaliação, pelo fazia sentido ser o mais abrangente possível, de modo a que uma vez identificados os fatores de risco numa determinada pessoa, o psicólogo conseguisse informação concreta sobre que aspetos seriam importantes para avaliar de forma mais completa e identificar quais as áreas de intervenção mais adequadas, permitindo também, desse modo, uma poupança de recursos e uma avaliação mais especializada.

Uma tarefa essencial para os profissionais que ajudam as pessoas em processo de luto, é determinar se a reações de luto estão ou não dentro dos parâmetros normais. Esta decisão deverá orientar o modo como a perda é gerida (Prigerson, 2004). Neste sentido, penso que o instrumento desenvolvido poderá ser um bom complemento ao PG-13, que avalia se a pessoa está em luto prolongado ou não, dando outro tipo de informação diferenciada, mas complementar. Importa também referir que o fato deste instrumento de rastreio conter fatores não diretamente ligados à perda em si (e.g., neuroticismo, qualidade da relação, depressão, experiências anteriores de trauma), possibilita que o mesmo seja aplicado antes de a perda ocorrer, para que assim se possa intervir de forma preventiva, que era o principal objetivo do presente estudo.

É importante que a avaliação do luto seja cuidadosa. Shear, Ghesquiere e Glickman (2013) fazem uma comparação muito interessante. Segundo estes autores uma inflamação é a resposta dolorosa e universal à exposição a certas bactérias, contudo não existe um debate se o médico está a patologizar uma experiência humana natural ao diagnosticá-la e tratá-la. No entanto, na visão destes mesmos autores, as perturbações mentais têm uma maior carga de estigma, existindo um desafio de diagnóstico, uma vez que a maioria das perturbações mentais estão inseridas num continuum com o

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