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Afiliação universitária de serviços de cirurgia: uma solução para o ensino e um caminho para a academização dos cirurgiões

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Cadernos de Saúde Vol. 4 N.º 2 2011 – pp. 7-13

Summary

The affiliation of non -university hospital Services for teaching undergraduate students has been implemented, under the Reform process of the Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa, through the nineties of the last century. Constraints and challenges of this experience are now ready to analysis and the debate of data should proceed to reassure convergence of the educational aims with the ongoing results and to redefine strategies for the future. Formal training of tutors seems to be felt as a plus for the quality of the educational affiliation. As the affiliation network has come to a mature status a new level of institutional cooperation should be looked for. Research enterprises should be developed inside this network to build up a regular in -house incorporating team environment to call and select candidates for an academic surgical career, as if they worked in the main university hospital.

Keywords: Academic affiliation, teaching strategy, formal training of tutors, academic surgery !

Resumo

A afiliação de Serviços Hospitalares não -universitários, para permitir o ensino prático das matérias clínicas, foi uma alternativa e uma aposta de sucesso. As potencialidades da afiliação em geral não estão dissociadas de alguns constrangimentos, que importa acautelar, para que os modelos a implementar possam corresponder aos objectivos educacionais para que forem estabelecidos.

A formação educacional dos tutores deve ser considerada como uma mais -valia no processo de afiliação para o ensino. As faculdades e os serviços afiliados devem passar para um novo patamar de cooperação, a fase da academização, não deixada ao acaso, mas institucionalizada, como um desiderato a concretizar.

Palavras-chave: Afiliação Universitária de Serviços hos-pitalares, ensino educacional de assistentes, academização de assistentes em serviços afiliados, academização de cirurgiões!

– uma solução para o ensino e um caminho para

a academização dos cirurgiões

Academic affiliation of Surgical Departments – a pathway

towards surgery teaching and surgeons’ academic

promotion

Paulo Costa1*; Rui Maio2

1 Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa, Hospital de Santa Maria 2 Hospital Beatriz Ângelo – Loures

* paulomatoscosta@gmail.com

1. Afiliação para o ensino de alunos A afiliação de Serviços Hospitalares não--universitários, para permitir o ensino prático das matérias clínicas, foi uma alternativa e uma aposta de sucesso. As potencialidades da afiliação em geral não estão dissociadas de alguns constrangimen-tos, que importa acautelar, para que os modelos a implementar possam corresponder aos objectivos educacionais para que forem estabelecidos. Cotejar estas potencialidades e putativos constrangimentos com dados da experiência, em que temos partici-pado, é uma das intenções deste ensaio.

Mas após um já longo ciclo de anos de ensino, geralmente bem sucedido, as faculdades e os serviços afiliados devem passar para um novo patamar de cooperação, a fase da academização, não deixada ao acaso, mas institucionalizada, como um desiderato a concretizar.

A nossa experiência de afiliação remonta ao iní-cio da Reforma de 1995/96 que introduziu novos conceitos de formação para o 6.º Ano da Faculdade de Medicina de Lisboa1, 2. Ao assentar o projecto

educativo no ensino tutelado e com ratio discente/ /docente tendencialmente igual a 1, tornou incon-tornável este “universo” das afiliações, que veio a

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Os alunos do 6.º Ano, deverão ter acesso a ensino clínico tutorado, acompanhando a actividade clínica do seu tutor, como a sua “sombra”, sendo também integrados nas equipas de acção clínica, com uma capacidade de intervenção efectiva, tendencialmente autonomizante, mas sem que esta tendência se traduza por disfuncionalidades educacionais com repercussão negativa sobre os doentes ou por sentido de auto didactismo exagerado, gerador de ansiedades e frustrações a evitar.

A capacidade de participação dos alunos, nesta fase, tem -se revelado particularmente interessante para os Serviços que frequentam, pela sua vontade em participar como parte integrante efectiva e eficaz, sendo geralmente constatado que obtiveram uma formação prévia adequada e sólida, que lhes permite a integração desejada.

Aos alunos devem ser asseguradas as condições logísticas para que venham a poder participar acti-vamente nas actividades de formação complementar previstas para as diferentes fases da sua evolução. Para os alunos do 6.º Ano, que se encontram em blocos reservados a cada área de ensino, quando em Serviços afiliados, será apenas conveniente que seja garantida a possibilidade de frequentar, de forma coadunada, a sessões educacionais programadas.

A introdução à estrutura e contexto em que se desenvolve o ensino e a aprendizagem nos estágios clínicos, foi considerada como um dos três factores mais importantes, na óptica dos alunos, para que o desenrolar do estágio seja proveitoso e gratificante6,7,8.

Para os alunos de Disciplinas integradas em Blocos (4.º e 5.º Anos), o acerto de horários e de deslocações entre a Faculdade e os Serviços afilia-dos exige maior imaginação e uma compaginação que não interfira negativamente com o ensino das outras disciplinas do mesmo Bloco. É necessário assegurar tempo suficiente para as deslocações, ou ter horários diferidos, como aconteceu nestes anos com os alunos que foram ensinados pelo grupo do Prof. João Gíria, no Hospital Garcia d’Orta.

A organização dos Departamentos de Cirurgia por Serviços orientados por patologias também requer uma resposta logística apropriada. Para assegurar uma exposição generalista e global, optou -se no IPOFG, sob a orientação do Prof. Doutor Mendes de Almeida, por uma rotação calendarizada pelos vários serviços, pela consulta externa e bloco operatório. Esta experiência foi bem aceite pelos alunos, mas é exigente quanto à programação e efectivação.

O combate às assimetrias de exposição educa-cional (Serviços vários, assistente único vs pool desenvolver -se em vários centros hospitalares e de

saúde, tal como hoje o conhecemos.

Para tornar possível uma exposição conveniente dos alunos da Disciplina de Cirurgia Geral 1 (4.º Ano), ao aceitar a Regência desta Disciplina (2007) defrontámo -nos com a inevitabilidade de alargar as alternativas de ensino fora do HSM, já existentes nos Hospitais dos Capuchos e Garcia d’Orta, passando a poder actualmente ter turmas de alunos no IPOFG e no Hospital de Cascais. No próximo ano lectivo, passamos a poder incluir, neste grupo de Serviços afiliados, o Hospital Beatriz Ângelo – Loures.

Os objectivos educacionais destas duas populações de alunos (4.º e 6.º Anos) estão em correlação com o seu diferente desenvolvimento cognitivo, com a evolução das suas aptidões e atitudes, resultante do esforço individual e das possibilidades de interacção com os problemas clínicos, os doentes e as equipas de saúde, a que a exposição no tempo lectivo não se pode alhear, sendo um co factor determinante da aprendizagem.

Para estes objectivos educacionais diferentes são necessários cenários de ensino/aprendizagem adapta-dos. Para acautelar estas diferenças e garantir eficácia educacional pensamos que devem ser avaliadas as especificidades dos alunos, dos tutores e dos serviços que vão estar envolvidos no processo de afiliação para o ensino.

Aos alunos do 4.º ano (ou do 5.º ano) o ensino prático da Cirurgia deve permitir uma exposição da realidade cirúrgica, designadamente na consulta externa, na enfermaria, na urgência e no bloco operatório. O ensino ministrado por um assistente, a turmas de 6 -7 alunos, deve permitir que estes assistam à realização de interrogatórios clínicos, manobras semiológicas e discussão de hipóteses de diagnóstico e tratamento de doentes, sendo -lhes facultado a execução dos mesmos, sob a visão, orientação e feedback do assistente. A dinâmica das turmas é geralmente não -monótona e, no estádio de desenvolvimento de conhecimentos e aptidões destes Alunos, a participação activa do Assistente é essencial.

A participação na actividade operatória deve ser possibilitada e estimulada desde muito cedo no Curso. Tem vindo a ser demonstrado, e a nossa experiência corrobora esses dados, que quanto mais precoce for a exposição e intervenção tutelada no bloco operatório, ajudando a intervenções cirúrgicas, maior será a possibilidade de se manifestar uma tendência e vontade de prosseguir numa carreira cirúrgica3,4,5.

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de inovação, novas aproximações para tornar cada encontro clínico num propósito educacional14. Treinar

a mente dos agentes de ensino para descobrir, na urgência do dia -a -dia e no sobre -preenchimento das agendas diárias, esta riqueza de situações para o ensino -aprendizagem, pode começar por sessões de discussão das metodologias andragógicas e da sua aplicação ao ambiente onde o “trabalho” cirúrgico acontece14 ou ter lugar em cursos equacionados e

vocacionados para este fim.

A participação do aluno como “sombra” do tutor nas actividades diárias, que se pretende como forma de transmissão de saberes, exige uma capacidade pedagógica e uma dedicação que devem sofrer um processo contínuo de aperfeiçoamento15,16,17.

O modelo pedagógico de aprendizagem por “spoon -feeding” não resulta bem no ambiente hos-pitalar, é particularmente pouco rentável quando os alunos são integrados numa equipa cirúrgica, com actividade “hectic and frenetic”, em que as oportunidades de aprendizagem se perdem, pura e simplesmente por falta de preparação para as reconhecer como tal14.

A principal fraqueza dos modelos tradicionais de ensino reside na não atenção aos princípios de ensino e aprendizagem de adultos (andragogia), resultantes da inércia e falta de suporte e encorajamento dos professores para se diferenciarem nestas áreas18.

O que é necessário fazer para melhorar as con-dições de ensino da cirurgia e garantir um ensino eficaz? Será necessário ensinar os cirurgiões a ensinar, ou aceitamos que abundam carismáticos “Mister Fox” – sedutores educacionais, com experiência cirúrgica que se vão disponibilizar para ensinar19?

Sedução e eficácia devem evoluir em paralelo, para encontrar soluções e modelos de ensino tutorial. Numa Escola com ainda pouca tradição desta forma de ensino, se pretendemos que os alunos venham a ser cirurgiões ou, pelo menos, adquiram aptidões cirúrgicas, temos que os deixar agir como tal, os alunos no 6.º Ano têm que deixar de ser os visitantes “convidados” das nossas enfermarias, para passar a actuar como jovens internos20.

Os assistentes, com turmas de 6 -7 alunos e um tempo lectivo condicionado pela estrutura dos “Blocos”, que a disciplina integra, para rentabilizar o tempo e as condições logísticas de exposição clínica dos seus alunos, a par com os pressupostos gerais como competência, dedicação, imaginação e vontade de ensinar, necessitam de informação e treino educacionais específicos, focados na agilização de formas de ensino e de avaliação de pequenos grupos. de assistentes, como acabámos de referir, tutores

diferentes no 6.º Ano) deve passar, em nosso enten-der, pela uniformização da linguagem educacional, pela utilização de log books dedicados (cadernetas estruturadas de desempenhos e avaliação), por uma sistematizada análise de feedback aluno/tutor bi direccional e pela avaliação sistemática do ensino, de preferência por auditoria externa.

Destes três elementos, o mais generalizado tem sido a caderneta de desempenhos, principalmente no 6.º Ano. Defendemos a sua aplicação como instrumento de trabalho desde há vários anos e, com as modificações que têm vindo a ser introduzidas no seu formato e filosofia de aplicação, tornou -se num valioso instrumento educacional9.

A selecção dos alunos, para os postos de ensino em serviços afiliados, deve obedecer inicialmente à escolha por vontade própria. As situações de conflito, que nestes anos têm ocorrido num número reduzido de casos, ou por excesso ou falta de candidatos para preencher estas vagas, devem ser equacionadas em colaboração com as Comissões de Curso, que têm uma enorme capacidade de resolução destas questões.

2. Dos assistentes e do seu treino edu-cacional

Embora tutores e assistentes sejam agentes de ensino com finalidades coincidentes, a sua missão no dia -a -dia tem peculiaridades que devem ser bem definidas e entendidas, quando se faz a sua selecção e quando se definem os seus princípios de actuação. O ensino da cirurgia, a nível pré -graduado, exige mais do que dar aulas teóricas ou práticas de enfer-maria.

A aprendizagem e treino dos gestos e das atitudes próprias do Cirurgião são as características mais específicas do ensino da cirurgia. Mas se o Bloco operatório e os laboratórios de gestos10 tipificam os

teatros de aprendizagem gestual, não devem ser per-didas as oportunidades de aí ensinar os fundamentos e dilemas éticos relacionados com os actos cirúrgi-cos11. Mas é também, por role -modelling, durante

as intervenções cirúrgicas, que será transmitida a imagem do comportamento humano e profissional dos intervenientes no Bloco Operatório12, na sua

eficácia que importa perceber e na sua potencial conflitualidade que deve ser compreendida para poder combater13.

Aprender nos locais de trabalho cirúrgico é uma necessidade, não um luxo, apontando caminhos

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em faculdades em que ocorreram mudanças signi-ficativas nos modelos de ensino demonstrou que o envolvimento precoce do corpo docente aumenta a eficácia e reduz a resistência à implementação das modificações24.

Para que os assistentes e tutores possam ser parti-cipantes activos na implementação das reformulações da metodologia e das condições de ensino/apren-dizagem parece -nos que deveria ser desenvolvido e tornado disponível um programa de formação educacional e treino9,21,25,26. Quanto mais informados

e treinados estiverem os tutores da área de Cirur-gia, maior será o seu empenhamento e melhor o desempenho no ensino.

É fundamental desenvolver mecanismos de com-bate à rotina e à desilusão dos docentes – pensamos que um programa bem elaborado de desenvol-vimento de técnicas de andragogia aplicáveis à sua vivência educacional, que solicite a sua activa participação, pode ser um contributo significativo e útil nesse sentido.

As condições logísticas para a realização destas acções de formação devem ser institucionalmente acordadas, para que assistentes e tutores tenham disponibilidade efectiva de tempo para as frequentar com interesse, sem que sejam mais uma sobrecarga dramática em cima das responsabilidades assisten-ciais. É necessário que os tutores se distanciem das actividades de rotina diária para adquirir uma helicopter view para as suas funções e papel como agentes de um tipo particular e exigente de prestação pedagógica25.

Este tipo de actividades e reformas deve ser encarado como tendo impacto positivo não só na qualidade do ensino em si, mas por juntar, num grande projecto comum, diferentes intervenientes no ensino e na assistência, minimizando assim o impacto eventualmente negativo sobre a produti-vidade clínica27.

3. Dos Serviços e Hospitais a afiliar No estritamente respeitante às condições de ensino/aprendizagem da área Cirúrgica, a proble-mática da afiliação centra -se nos aspectos a seguir enumerados e na procura de soluções que conduzam a uma clara definição das relações académicas e pedagógicas que lhe estão inerentes.

A afiliação de Serviços deve assentar num contrato a estabelecer com o Director do Serviço a afiliar, que garanta, na sua pessoa, a coordenação e responsa-bilização pelo processo de ensino, nomeadamente A selecção dos tutores e assistentes deve passar

necessariamente pela definição do seu perfil fun-cional e tipo de contrato a estabelecer.

Relativamente ao primeiro aspecto, pensamos que os tutores, para o ensino da Cirurgia do 6.º Ano, devem associar a proficiência assistencial reconhecida ao interesse, capacidade e disponibilidade para o ensino em regime tutorial. A possibilidade de gestão de recursos assistenciais, para garantir os meios de ensino/aprendizagem necessários para que o seu aluno atinja os objectivos pedagógicos do estágio, deve ser tida como um pressuposto na pessoa do tutor, para assegurar os resultados desejáveis.

A maioria dos tutores elegíveis trabalha em regime de voluntariado. Sem modificar estas condições de “contratação” parece difícil envolver os Cirurgiões, imprescindíveis ao ensino da Cirurgia, em actividades de formação pedagógica. Por outro lado, o “mer-cado de contratação” é reduzido, escasso mesmo, competindo (ou geralmente coincidindo) a selecção dos tutores com a dos assistentes para as disciplinas do 4.º e 5.º Anos e com as actividades assistenciais. Esta divisão torna -se fictícia em muitos Serviços, sendo assistentes e tutores os mesmos cirurgiões.

Frequentemente, o ensino da Medicina a nível mundial tem sido atribuído a profissionais senio-res, mais pela demonstração de conhecimentos ou proficiência num determinado campo, do que pelas suas capacidades ou interesse em ensinar21.

Neste contexto, muitos académicos oferecem resistência à introdução de alterações significativas nos seus modelos de ensino21. A esse respeito cite -se

uma carta publicada no The Guardian: ‘I do not wish to be a teacher, I am employed as a lecturer and in my naiveté I thought my job was to ‘know’ my field, …Students attend my lectures but the onus to learn is on them. It is not my job to teach them”22.

Sentimentos contraditórios, deste género, são previsíveis e provavelmente expressos por muitos dos docentes de cirurgia, submersos em rotinas hospitalares pesadas e pouco ou nada beneficiados pela actividade pedagógica.

O treino dos assistentes e tutores pode ser um factor limitativo para a selecção e contratação dos mesmos, por consumir tempo e poder induzir resis-tências por parte dos agentes de ensino a contratar.

Contudo, os agentes de ensino a nível de assistente e tutor são frequentemente excluídos do processo de revisão curricular e da programação dos cursos que são chamados a ministrar e é necessário que adiram à ideia das modificações no ensino, para que estas ocorram com sucesso23. A experiência

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ensino que venham a ser estabelecidas e a facilitar o processo de avaliação9. A estabilidade do contrato

educacional deve ser garantida pelas Administrações Hospitalares, assegurando a continuidade das funções de Director de Serviço durante o período lectivo. À semelhança do que se tem pretendido nos Hos-pitais Universitários, mas nem sempre realizado, a audição da Faculdade que mantém a Afiliação parece -nos altamente desejável.

A nossa experiência de afiliação pode ser melho-rada, como referimos, tendo em conta os novos desafios que “deverá” ter que enfrentar.

4. Da academização dos cirurgiões em Serviços afiliados

A recente introdução do Trabalho final de Mestrado Integrado tem revelado uma potencial fonte de trabalhos de investigação, de análise estruturada de casos clínicos, muitos deles com elaboração e interesse capazes de poderem ser submetidos para publicação em algumas revistas. Dos Hospitais afiliados, têm chegado, à discussão pública, trabalhos de inegável interesse.

O mérito não parece ser atribuível apenas aos alunos. A qualidade dos Serviços e dos tutores, para organizarem a sua actividade assistencial, num formato compatível com o desenvolvimento destes trabalhos finais, é seguramente um, ou o, co factor determinante.

Na selecção dos tutores pelos alunos já começa a parecer desenhar -se um padrão em que a eficácia, ou garantia de qualidade, ditam as “regras do mercado”. Provavelmente estes tutores, que mais têm sido procurados pelos alunos, têm em si mesmos o germe da auto motivação e necessidade de procura, a que chamamos investigação. Perguntamo -nos, pois, como deverá a Faculdade alargar o seu campo de recrutamento para carreiras universitárias neste terreno que parece fértil?

A resposta, julgamos, encaminha -nos para o segundo aspecto que pretendemos ver enquadrado, normalizado, estimulado e garantido na eficácia e pragmatismo das condições logísticas, que apro-ximem os potenciais candidatos ao “mundo da investigação”, à semelhança do que a nossa Facul-dade tão acertadamente, em boa hora, tem vindo a desenvolver dentro de portas.

A menor proximidade dos centros académicos, gera isolamento e reduz as possibilidades efectivas para a realização das actividades de investigação. Aproximar da Escola os cirurgiões, que têm a sua no respeitante às condições logísticas do Serviço e

às características exigíveis ao corpo docente9.

O coordenador da área de Cirurgia do 6.º Ano, nomeado pelo Conselho Cientifico, deve ter, no Director de Serviço, a figura de interlocutor para assegurar que existem as condições assistenciais e de corpo docente necessárias para que os objectivos educacionais estabelecidos possam ser atingidos pelo número de alunos que venha a fazer estágio nessa instituição. O Regente das Disciplinas Cirúrgicas (4.º e 5.º Anos) terá um papel sobreponível na escolha e relacionamento institucional com o Director do Serviço afiliado9.

O Director de Serviço deve ter, no processo de selecção e contratação de tutores, bem como na criação das condições para que possam exercer eficazmente a sua actividade formativa, papel semelhante ao dos Directores das Clínicas Uni-versitárias e Regentes das Disciplinas, sendo os objectivos educacionais e a missão convergentes. Como os tutores e assistentes dependem hierárquica e tecnicamente do seu Director de Serviço, no que respeita à actividade assistencial, o elo universitário deve ficar explicitamente definido, para assegurar o cumprimento da filosofia e a estratégia que venha a ser definida pelo Regente e pelo Coordenador da Área de ensino9.

Esta condição funcional assegurará, na pessoa do Director de Serviço Afiliado, que a actividade assistencial cirúrgica (na enfermaria, consulta externa, bloco operatório) e os meios complementares da actividade clínica (laboratório e radiologia) estejam disponíveis para a aprendizagem dos alunos, na actividade de rotina e na de urgência9. As actividades

complementares que fizerem parte do funcionamento regular do Serviço, nomeadamente visitas clínicas, reuniões para discussão de casos clínicos, ou outras com carácter formativo podem, assim, estar acessíveis aos alunos. A Biblioteca, o acesso a bases de dados informatizadas, aos meios audio visuais de proces-samento e transmissão de iconografia, devem estar acessíveis para a aprendizagem dos alunos. A todos os alunos deve ser garantida uma eficaz introdução ao funcionamento do Serviço e do Hospital9.

A Administração do Hospital a que pertençam os Serviços a afiliar deve ser co -responsabilizada pelo processo de estágio, designadamente na aceitação das alterações que possam decorrer da presença de alunos e da necessidade de modificações na gestão de horários dos tutores contratados9. O Director

de Serviço e a Administração do Hospital devem comprometer -se a aceitar as regras de avaliação do

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A cirurgia académica, no seu microcosmo, sus-tentado pelo conceito Flexeneriano, integrador do desenvolvimento equilibrado da actividade docente e de investigação, a par da exigência superlativa de especialização assistencial32, atravessa hoje um

período que a conduzirá a uma “crise Kunhiana”, se é que já não estamos a viver em plena crise institucional33. Na melhor das hipóteses, isto é, ainda

termos possibilidade de continuar a explorar as potencialidades deste conceito integrador em que nos desenvolvemos enquanto membros de uma Escola, exige -se que saibamos “inovar” para assegurar a transição de paradigma. Se não inovarmos não tardaremos a sofrer o choque de não termos sabido explorar totalmente as potencialidades que ainda estão ao nosso dispor, enquanto a salvação da cirurgia académica, e da medicina universitária no seu todo, não nos vier a impor uma rotura e uma “verdadeira investigação” de processos e finalidades. A academização dos cirurgiões nos hospitais afi-liados não pode ficar ao acaso de mailing lists, nem de cartazes nas paredes, por mais apelativos que sejam, tem que ser uma missão para os Cirurgiões Académicos e para os órgãos de governo da “rede afiliada”, que conhecendo o meio, se devem mobi-lizar para individualmente promover a investigação com vista à obtenção do Grau de Doutor, não apenas pelo efeito promotor individual, que não é para subvalorizar, mas pelo aumento da massa crítica com formação e preocupações universitárias. Mas não se trata apenas de promover investigação esporádica, isolada ou no contexto de projectos com finalidades curriculares específicas para expandir o portefólio de marketing pessoal34,35. O que é

desejável, e institucionalmente recomendável, é que este núcleo, alargado pela inclusão de mais cirurgiões envolvidos em processos de investigação prolongada, possa vir a contribuir para o avanço da nossa especialidade.

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prática em hospitais afiliados, é o desafio organiza-cional que se nos põe, para combater a tendência preocupante de diminuição das concretizações académicas28.

A aceitação do part -time nas carreiras académi-cas, de internos e especialistas, tem vindo a ser comprovadamente justificada, pela eficácia dessas experiências, com ganhos para os departamentos, e pela efectiva abertura para a translação from bedside to bench e no sentido complementar. Este conceito pode ser aplicável aos assistentes e tutores afiliados, seguramente com vantagens para a rede de afiliação como um todo integrado. Importa procurar e definir bem as linhas mestras e as orientações que venham a ordenar institucionalmente estas participações.

À semelhança de outras experiências29,30, entre nós

refiro -me, por exemplo, ao Programa Gulbenkian de Doutoramento para Internos, uma task -force encarregada de descrever a missão e as regras de implementação, as contrapartidas das instituições envolvidas e as responsabilidades, direitos, obri-gações e benefícios dos candidatos, ponderaria e explicitaria um modos operandi que abriria caminho para esta demanda de procura de vocações acadé-micas nos cirurgiões dos hospitais afiliados.

Se, para enveredar pela cirurgia académica num hospital universitário, nos é exigida uma resiliência “reconfortante”, fora destes centros, sem o convívio natural com os agentes da investigação e sem as facilidades operacionais necessárias, que actual-mente são quase sempre de elevada sofisticação tecnológica, as dificuldades a ultrapassar adensam -se e são penosamente desmotivantes. Numa rede de hospitais afiliados, a missão do centro académico deve contemplar o desenvolvimento universitário dos assistentes que lhe “prestam” um serviço como educadores dos seus alunos. A partilha da respon-sabilidade educacional deve ter como contrapartida, por parte da Faculdade, uma sustentada, equilibrada e efectiva aproximação das oportunidades de acesso à investigação.

“As universidades albergam paróquias diversas, o mais das vezes rivais”31 e este esforço de

academiza-ção fora da alma mater pode consubstanciar a forma de reduzir “o fosso entre certos centros privilegiados de investigação e estudos de pós -graduação e as universidades e institutos” ou serviços hospitalares “mais directamente vocacionados para o ensino” e a assistência, porque se este caminho não for seguido, tornando inevitável o alargamento do fosso existente, “ambas as empresas ficarão a perder”31.

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