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Agradecimentos

A realização deste trabalho não teria sido possível sem o auxílio de várias pessoas, às

quais deixo uma palavra de agradecimento e apreço.

Ao meu orientador, Professor Doutor António Goucha Soares, por todo o

acompa-nhamento e apoio prestado.

Ao nível pessoal, agradeço a confiança e incentivo dos meus pais e irmã ao longo de

(4)

ii

Resumo

Com o colapso da ex-União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, o modelo da União

Europeia (UE) serviu de guia orientador para as relações entre a UE e a Federação Russa.

Con-tudo, no século XXI tem-se assistido a um distanciamento entre os dois blocos. O rápido

cres-cimento económico da Rússia permitiu aumentar a influência desta, ao nível regional,

procu-rando também obter uma posição forte à escala global. O aprofundar da cooperação entre as

duas regiões foi acompanhado pela Política Externa de Segurança Comum (PESC) da UE, a qual

incorporou questões energéticas na sua área de actuação, de forma gradual. Sendo a Rússia

um dos mais importantes parceiros comerciais da UE, e o seu principal fornecedor de

maté-rias-primas energéticas, sobretudo de gás natural, será relevante considerar o sector da

ener-gia como fundamental no desenvolvimento desta cooperação. Dadas as divergências

existen-tes, a segurança energética assume-se como um tema crucial nesta relação bilateral. Para a

UE, um sector energético competitivo e sustentável, e uma política de energia eficiente e

coe-rente são necessárias para contrariar a excessiva dependência de importações de gás natural

russo. Num período de indefinição e impasse do seu relacionamento, Bruxelas e Moscovo têm

(5)

iii

Abstract

After the dissolution of the former Soviet Union the European Union’s (EU) integration

model functioned as a framework to the relations between the EU and the Russian Federation.

Nevertheless, during the twenty-first century an increasing distance separating the two blocs

took shape. Due to Russian’s fast economic progress its regional influence grew while assu

m-ing a more prominent voice on the international front. The deepenm-ing of this relationship was

developed compliant with the Common Foreign and Security Policy (CFSP) which steadily

as-similated energy concerns in its decisions. Russia is one of the main trade partners of the EU

and EU’s main supplier of raw materials and fossil fuels, primarily natural gas. Thus it is

rele-vant to consider energy as a key issue concerning these two regions. Given existing conflicts of

interest between importing and exporting States energy security then becomes a decisive

top-ic in this bilateral cooperation. A competitive and sustainable energy sector and an efftop-icient

and coherent energy policy are crucial to offset EU’s dependence on fossil fuel imports. At the

moment the negotiation for a new agreement remains deadlocked, therefore both Brussels

(6)

0

Conteúdo

Introdução ...

1

Capítulo 1 - Ressurgimento da Federação ...

4

Desempenho Macroeconómico ... 5

Comércio ... 6

Sector Energético ... 6

Crise Internacional de 2008 ... 7

Capítulo 2

Relações Federação Russa-União Europeia ...

9

Evolução das relações ... 9

Contexto Actual ... 12

Capítulo 3

Energia ... 14

Política Energética ... 15

Mercado Energético ... 19

Capítulo 4

Desafios Futuros ... 22

Perspectivas ... 26

Liberalização do Mercado de Gás ... 30

Conclusão ... 32

Referências Bibliográficas ... 36

(7)

1

Introdução

A desintegração da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), em 1991, resul-tou numa alteração política, económica, social e do equilíbrio de poder no continente euro-peu. As obrigações da ex-URSS, ao nível internacional, foram assumidas pela Federação Russa,

que atravessou períodos conturbados, na década de 1990, quando iniciou o seu processo de transformação para uma economia de mercado enquadrada por um Estado de Direito. Porém, já na primeira década do século XXI, após a crise de 1998, a Rússia beneficiou de elevadas ta-xas de crescimento económico que reafirmaram o seu estatuto de potência regional. A Rússia

procura, então, ser respeitada a nível internacional, pretendendo repor a sua importância à escala europeia e mundial e afirmando-se, orgulhosamente, como parte dos BRIC1.

O modelo da União Europeia (UE) serviu, numa primeira fase, de referência para o

en-quadramento das reformas estruturais implementadas na sequência do desmembramento do bloco soviético, tendo a cooperação entre a UE e a Federação Russa ficado formalizada com a adopção de um Acordo de Cooperação e Parceira (ACP), em 1997. Nesse período, a Política Externa e de Segurança Comum (PESC) da UE, instituída através do Tratado de Maastricht,

dava os seus primeiros passos, acompanhando os desenvolvimentos da relação com a Rússia. Contudo, o esforço realizado para manter contactos frequentes entre a UE e a Rússia não foi acompanhado por progressos concretos na generalidade das áreas negociadas.

É, neste quadro, que o sector energético aparece como um possível eixo orientador das relações entre a UE e a Rússia. O desenvolvimento de um sector energético competitivo e sustentável é fundamental para qualquer economia desenvolvida e, nos últimos anos, esta

questão tem estado no centro das atenções da UE e dos seus Estados-Membros dada a volati-lidade do preço do petróleo, os cortes no abastecimento de energia e a crescente preocupação

(8)

2 com as alterações climáticas. Como não dispõe de recursos energéticos suficientes, nem para

satisfazer a sua estrutura produtiva, nem para corresponder aos actuais padrões de vida dos seus cidadãos, a UE tem procurado desenvolver uma política energética ambiciosa que englo-be combustíveis fósseis, energia nuclear e renováveis, promova a eficiência energética e

sepa-re os custos energéticos do psepa-reço de petróleo.

A Rússia é o terceiro maior parceiro comercial da UE e o principal fornecedor de maté-rias-primas energéticas da UE. Consequentemente, a agenda de política externa da UE com a

Rússia tem sido dominada pela energia e a energia tem sido, gradual e parcialmente, incorpo-rada na PESC. Esta incorporação tem sido feita através de memorandos de entendimento, iniciativas e acordos desconectados de outras políticas externas, como a resolução de conflitos ou programas de cooperação regional.

A questão da segurança energética tornou-se num tema sensível na relação bilateral entre a UE e a Rússia, apesar de apenas uma minoria dos Estados-Membros ser, consideravel-mente, dependente dessa fonte de abastecimento. Sendo um bem transaccionado na base de

considerações meramente comerciais, mas também utilizado como um instrumento de política externa, a energia encontra-se num antagonismo entre a liberalização do mercado das

com-modities e a persistência em utilizá-la como um activo estratégico a nível internacional (Westphal, 2006).

Os dois lados apresentam, porém, noções distintas de segurança energética. Na pers-pectiva da UE (consumidor de energia) esta traduz-se na diversificação de fornecedores e de fontes de energia e na existência de preços baixos, estáveis e previsíveis. Do ponto de vista da Federação Russa (produtor de energia), tenta-se obter a estabilidade da procura e ganhos nos

(9)

3 lado da oferta, a região exportadora procura obter monopólios maximizadores do lucro,

origi-nando interesses antagónicos que podem resultar em sérios conflitos.

Os dois espaços têm de se consciencializar sobre o futuro da sua relação, reconhecen-do a existência de uma dependência mútua da qual ambas podem beneficiar. Um verdadeiro

mercado interno assume-se fundamental para que uma política externa energética da UE seja credível ao nível internacional e seja capaz de pôr termo ao bilateralismo ainda existente.

No capítulo 1 do presente texto, pretende-se compreender a evolução económica e política da Rússia nos últimos dez anos, analisar a posição em que se encontra actualmente e

identificar alguns dos seus eventuais obstáculos futuros. No capítulo 2, enfatiza-se o desenvol-vimento da relação entre a UE e a Rússia, fazendo um enquadramento dos progressos alcan-çados, desde o desmembramento da União Soviética, e da estrutura de cooperação, bem

co-mo um esclarecimento da situação actual desta relação. No capítulo 3, pretende-se focar na política energética da UE e na sua intervenção no mercado energético mundial, essencialmen-te na relação de (inessencialmen-ter)dependência com a Federação Russa. O capítulo 4 divide-se entre os

desafios que têm surgido no aprofundar desta cooperação e as perspectivas exequíveis para o futuro da mesma. Por fim, na Conclusão, defende-se a necessidade de uma cooperação basea-da na confiança mútua, num momento conturbado de alterações incertas na esfera mundial,

(10)

4

Capítulo 1 - Ressurgimento da Federação

O término da Guerra Fria, em 1989, ditou o fim de um conflito ideológico, terminou com um mundo bipolar e originou o desmembramento da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas. A Federação Russa, enquanto sucessora, a nível institucional, da União Soviética,

pretende participar de forma activa nos assuntos internacionais, não apenas por um imperati-vo político, mas sustentada na sua importância histórica e cultural e no seu potencial bélico e económico (Bowker, 2000). Ao contrário da União Soviética, a Federação Russa não pretende instaurar uma ideologia contra os valores ocidentais, mas seguir o seu próprio caminho,

usu-fruindo de uma certa influência sobre os países vizinhos, fundamental para a sua afirmação no contexto mundial.

Durante toda a década de 1990, a Rússia não se conseguiu adaptar ao processo de

globalização e ao capitalismo moderno, o que contribuiu para a sua descredibilização a nível internacional. O período associado à presidência de Boris Yeltsin teve efeitos catastróficos no sistema económico russo. O poder de compra dos cidadãos foi notavelmente reduzido, origi-nando uma quebra acentuada na procura e, consequentemente, na produção. Como resultado

desse abrandamento da actividade económica, o Estado viu-se privado de grande parte das receitas fiscais, ficando sem capacidade para pagar salários ou investir (Dashichev, 2007).2

No entanto, desde 1992, este Estado tem tentado afirmar, a nível doméstico e

interna-cional, a imagem de um país em ascensão capaz de assumir as responsabilidades de uma gran-de potência regional. Essa projecção assenta no pressuposto gran-de que a Rússia apenas pogran-derá ser bem-sucedida num mundo globalizado se conseguir evitar um desgaste acrescido do espa-ço pós-soviético (Zagorski, 2012). Na primeira década de 2000, com Vladimir Putin na

presi-dência, iniciou-se uma fase de afirmação real da sua política externa, apoiada pelo crescimento

2

(11)

5 económico e pela estabilidade doméstica, com o objectivo de dinamizar o crescimento da

con-fiança russa ao nível mundial.

Desempenho Macroeconómico

A crise financeira de 1998 marcou o ponto de viragem na recuperação de grande parte dos problemas internos do país. Desde essa data, a economia russa beneficiou de elevadas taxas de crescimento que lhe proporcionaram uma situação macroeconómica estável. Com

efeito, no período de 2003 a 2008, a economia russa registou um crescimento real do Produto Interno Bruto anual em torno dos 7% (Anexo I).

Para este fenómeno contribuiu o incremento da propriedade privada (aumentando a

eficiência da economia) e o desenvolvimento de novos negócios nas telecomunicações móveis e serviços financeiros (Aggarwal & Govella, 2012). Verificaram-se, assim, aumentos considerá-veis no rendimento pessoal (o Produto Interno Bruto per capita mais do que duplicou entre 2003 e 2010 – Anexo II) e no nível de consumo (o valor das importações de bens e serviços

mais do que triplicou até 2008 – Anexo III).

Os fluxos de investimento directo aceleraram consideravelmente nesse período (ver Anexo IV). No entanto, se alguns agentes económicos, já estabelecidos, lucraram com esse

mercado em crescimento, a corrupção instalada e um sistema jurídico ineficiente, e em bene-fício do Estado, têm dificultado a atracção de novos capitais estrangeiros.

O volume de receitas, associadas ao aumento do preço do petróleo nos mercados

(12)

6 crise de 2008). Essa medida teve, contudo, pouco impacto directo no crescimento da

econo-mia, pois as verbas foram direccionadas para investimentos em activos estrangeiros, não sen-do investidas na própria economia.

Comércio

A UE surge como o principal parceiro comercial da Federação Russa, enquanto a Rússia é o 3º parceiro comercial mais significativo para a UE (Anexo V). Em 2011, o comércio bilateral

UE-Rússia fixou-se nos 308 182 milhões de euros, um aumento de 256% face a 2000 (com ticular destaque após 2004 com o alargamento da UE a Leste, países já, tradicionalmente, par-ceiros da Rússia). Apesar do aumento contínuo das exportações para a Rússia (excepto em

2009), a UE tem registado défices significativos, apenas se verificando uma diminuição, em 2009, face à quebra dos preços mundiais de energia (Anexo VI). A proximidade geográfica dos dois territórios realça a importância destas relações comerciais, beneficiando a economia russa

da tecnologia, conhecimento e investimento da UE. Esta, por seu turno, usufrui, nesta relação, dos vastos recursos naturais e de mão-de-obra qualificada existentes na Rússia (Anexo VII)

Sector Energético

Historicamente, a Rússia é um fornecedor de energia estável e fiável, sendo que, em 2010, 33,1% das importações de petróleo da UE e 34,2% das importações de gás (Anexo VIII)

provinham desse mercado. Este país é o maior produtor e exportador de gás natural e alterna com a Arábia Saudita o primeiro lugar na produção e exportação de petróleo (Energy Information Agency, 2010). Porém, a produção de gás e de petróleo na Rússia tem aumentado

a ritmos decrescentes (Anexo X), podendo vir a registar quebras no futuro.

(13)

7 momento em que a indústria refinadora está sujeita a padrões de qualidade, exigências de

eficiência e preocupações ambientais cada vez mais apertadas. No sector do gás, a maior parte da produção ocorre em apenas três grandes campos de exploração na Sibéria Ocidental

(Yam-burg, Urengoy e Medvezh’ye) que se encontram, contudo, relativamente obsoletos e

necessi-tam de elevados investimentos em exploração, extracção e armazenamento (Energy Information Agency, 2010).

O sistema económico da Federação Russa é dominado pela exportação de um

peque-no número de recursos naturais, estando o Goverpeque-no russo relutante em efectuar reformas profundas nas suas estruturas. Assim, a inexistência de diversificação da estrutura produtiva torna este país extremamente vulnerável à volatilidade dos mercados financeiros e dos fluxos de capitais e a choques externos.

Crise Internacional de 2008

Na última década verificaram-se progressos em áreas como a propriedade da terra, os

impostos e direitos alfandegários, a liberalização comercial e cambial e a reorganização dos sectores bancário e ferroviário. No entanto, o regresso às taxas de crescimento observadas antes da crise financeira afigura-se improvável, de forma sustentável, enquanto existir um

enfoque na distribuição de subsídios e benefícios sociais, ao invés da modernização da econo-mia.

Em 2008, a Rússia caracterizava-se por ser uma democracia soberana onde as

institui-ções não escondiam um défice democrático. O Estado controlava sectores estratégicos da economia, como a energia, mas permitia a iniciativa privada nos restantes sectores. A sua polí-tica externa direccionava-se para a consolidação da sua esfera de influência nos países

(14)

8 A Rússia enfrentou a crise financeira de 2008 de forma bastante célere e eficaz,

desva-lorizando gradualmente o rublo, baixando as taxas de juro e implementando várias políticas de apoio à economia. A rápida recuperação da economia russa apoiou-se nas suas reservas de moeda estrangeira e no desenvolvimento positivo dos preços da energia, voltando aos níveis

de crescimento de 4.3%, em 2010 e em 2011.

As taxas de crescimento dos últimos anos não são comparáveis com as da década pre-cedente, enfrentando um conjunto de factores3 favoráveis ao desencadear de uma crise

eco-nómica e social neste país. A Rússia necessita de ajustar as suas políticas macroecoeco-nómicas de forma a garantir a sua estabilidade num momento conturbado internacionalmente. Por outro lado, terá de diversificar a sua economia e aumentar a sua produtividade numa situação de redução da força laboral (The World Bank in Russia, 2012).

A presidência de Dmitri Medvedev, entre 2008 e 2012, não impulsionou resultados significativos na estrutura económica russa ou na indústria energética nacional russa. Com efeito, desde o desmembramento da União Soviética, o sector energético é controlado por

elementos próximos a Vladimir Putin, cujos interesses são apoiados pelo Governo russo. Este sistema impede a redistribuição de propriedade ou a perda do controlo sobre as empresas estatais que dominam a economia nacional e permite, assim, a estas elites manter a sua

influ-ência num sistema baseado não em critérios de eficiinflu-ência, mas de lealdade (Krutikhin, 2012).

No curto prazo, a dependência da Rússia das exportações de petróleo poderá originar o mais grave desafio a Vladimir Putin no seu terceiro mandato presidencial. O orçamento russo para 2012 foi elaborado prevendo um preço aproximado de 100 dólares por barril de petróleo, o que pode não acontecer caso se verifique outra recessão a nível global. Com o

3 Economia excessivamente dependente das exportações de energia e a actuação de grandes empresas

(15)

9 to do crescimento na Europa e no resto do mundo, é expectável que os preços de petróleo

sofram uma quebra, quer por uma procura mundial mais fraca, quer por correcções de pertur-bações no fornecimento. Em 2009, ano em que o barril de petróleo sofreu uma forte desvalo-rização, o PIB russo sofreu uma quebra de 7.8% em apenas um ano, mais do que qualquer

outro país do G-8 ou dos BRIC (Saradzhyan & Abdullaev, 2012).

Capítulo 2

Relações Federação Russa-União Europeia

A UE enquadra as relações com os países vizinhos do Sul e do Leste na sua Política de Vizinhança (PEV). Porém, a Rússia cedo se distanciou de um envolvimento nos mesmos moldes que os países parceiros no âmbito da PEV, isto é, das condições impostas por esse instrumento de política externa. O desenvolvimento das relações entre a UE e a Rússia deu-se, portanto,

num quadro específico, de cariz bilateral e diferenciado e não em bloco, como é o caso para os países da PEV. Assim, os contornos e os resultados desta relação são também, por isso, dife-rentes.

Evolução das relações

A estratégia original da UE face à Rússia visava uma construção do espaço

pós-soviético semelhante ao do modelo europeu e, portanto, necessitaria da ajuda política, eco-nómica e financeira europeia. Consequentemente, a UE definiu as normas e valores comuns associados ao seu processo de integração como a base das relações bilaterais que se

(16)

10 A primeira tentativa de conceber uma orientação estratégica para as relações

UE-Rússia consubstanciou-se nas negociações para um Acordo de Cooperação e Parceria4, inicia-das em 1992. Esse documento serviu de base legal para o desenvolvimento inicia-das futuras rela-ções. A sua orientação estratégica baseava-se em declarações bastante vagas sobre

democra-cia, direitos humanos e economia de mercado e o seu resultado mais significativo cifrou-se no estabelecimento de encontros conjuntos ao mais alto nível governamental, proporcionando um diálogo político contínuo em questões de interesse mútuo. Porém, a crise política e eco-nómica na Rússia, em 1998, abalou o optimismo com que a UE vinha a encarar o

desenvolvi-mento das relações. A inexistência de mecanismos e instrudesenvolvi-mentos, por parte da UE, capazes de lidar com essa situação alertou para a necessidade de uma política multidimensional que

considerasse todos os aspectos da realidade russa (Haukkala, 2001).

Os principais interesses da UE na Rússia reflectem-se na promoção da estabilidade po-lítica e económica da Federação Russa, na manutenção de um abastecimento estável de ener-gia, na cooperação na área da justiça e assuntos internos e na segurança nuclear e ambiental. A manutenção da estabilidade geopolítica no Cáucaso Sul e nos Novos Estados Independentes

é fundamental para ambas as partes, tendo, por isso, a resolução dos conflitos existentes nes-sa zona ganho uma significativa relevância. O desenvolvimento das relações da UE com a Rús-sia está, então, intrinsecamente relacionado com o processo interno de desenvolvimento da

Política Externa e de Segurança Comum ao nível europeu (Haukkala & Medvedev, 2001).

A UE é uma entidade cuja acção externa combina políticas da União e dos seus Esta-dos-Membros, procurando a harmonização dessas políticas. Assim, a compreensão e a

4

(17)

11 ção dos interesses de cada Estado-Membro são essenciais para reorganizar a política externa

da UE. De acordo com Katinka Barysch, a União Europeia deve preocupar-se em construir uma posição comum e credível em questões urgentes como a energia, a vizinhança comum e os direitos humanos (Barysch, 2006). Para tal, tem de assumir a necessidade de uma parceria

estratégica do interesse de ambas as partes, não pela identidade e unidade dos parceiros, mas porque são o contraponto do outro parceiro em muitas áreas de cooperação (Tassinari, 2005).

O empenho demonstrado em tornar os diálogos bilaterais entre a UE e a Rússia mais

frequentes assume um carácter único nas relações da UE com países terceiros5 e reflecte a importância do contacto regular ao mais alto nível. No entanto, se o fim da Guerra Fria fazia prever um grande optimismo sobre a aproximação da Rússia ao Ocidente, ao longo da década de 1990, várias discordâncias e conflitos6 dificultaram o desenvolvimento dessa relação. Com

efeito, a existência de acordos de cooperação e de vários grupos de trabalho não foram acom-panhados de progressos e de resultados relevantes na maioria das áreas de intervenção. As duas partes não alcançaram um consenso quanto à forma e conteúdo da sua relação, mas a rede de contactos criada produziu um vasto grau de confluência de normas e padrões em

al-gumas áreas, com destaque para as relações económicas.

A adesão à UE, em 2004 e 2007, de países economicamente interligados com a Rússia transformaram a União numa realidade distinta da União de 15 Estados-Membros.

Proporcio-nou um considerável crescimento das relações económicas entre as duas regiões, mas introdu-ziu uma percepção mais negativa desse país no seio das instituições europeias. Estes novos países procuraram vincar as suas posições e obter, conjuntamente, alguma vantagem face ao

5

O enquadramento institucional entre a União e a Federação Russa baseia-se nas Cimeiras UE-Rússia; num Conselho Permanente de Parceria; em Encontros Ministeriais, de Directores Políticos e de Técnicos Especializados; e num Comité Político e de Segurança.

6 A primeira guerra na Chechénia, em 1994-96; a crise financeira e política russa, em 1998; a guerra no

(18)

12 país euro-asiático nas conversações dentro da UE (Trenin, 2005). Paralelamente, a confiança

mútua sofreu um declínio com a Revolução Laranja na Ucrânia e com o conflito de gás russo-rcraniano, em 2006. O conflito na Geórgia, iniciado em Agosto de 2008, e, poucos meses mais tarde, um novo conflito de gás entre a Rússia e a Ucrânia comprometeram o papel da Rússia

como um fornecedor estável de energia, tornando-a um desafio para a segurança energética europeia.

Por outro lado, a partir de 2004, ano em que o barril de petróleo ultrapassou os 30 eu-ros por barril, a Rússia registou elevadas taxas de crescimento económico, acompanhando as

variações do preço das matérias-primas energéticas (Anexo XI). Esse período coincidiu com um distanciamento nas suas relações com a UE e pela reafirmação do patriotismo russo, sustenta-do no potencial económico e energético da Federação Russa. Assim, as elevadas taxas de

cres-cimento económico, verificadas na primeira década do século XXI, e a acumulação de reservas tornaram desnecessária a ajuda financeira europeia e suscitaram dúvidas quanto ao alinha-mento com os padrões ocidentais.

O enquadramento institucional promovido pelo Tratado de Lisboa permitiria à UE

ob-ter uma política exob-terna bastante mais coerente e objectiva. No entanto, à medida que a crise financeira se foi agravando no espaço europeu, foi dado uma maior ênfase à recuperação da economia, por parte da UE, reemergindo, na Rússia, o bilateralismo como a opção mais viável

de relacionamento (Fischer, 2012).

Contexto Actual

Em 2003, na Cimeira de São Petersburgo, foi acordada a criação de quatro Espaços Comuns: o Espaço Económico Comum, o Espaço Comum de Liberdade, Segurança e Justiça, o Espaço de Cooperação na Segurança Externa, e o Espaço Comum de Educação e Investigação.

(19)

13 criação desses espaços, mas estas revelaram-se demasiado vagas ao não conterem quaisquer

prazos ou ao não especificarem projectos (Conselho da União Europeia, 2005).

A tentativa de reaproximação das relações entre a UE e a Rússia coincidiu com o esfri-amento das mesmas provocado pela Revolução Laranja e os conflitos de gás russo-ucranianos.

Logo, a resposta às propostas da UE para a implementação das orientações associadas aos Espaços Comuns tem sido lenta por parte da Federação Russa, que se mostra reticente quanto à liberalização política e económica. A Administração russa mostra sinais de insatisfação com a

abordagem da UE, exigindo uma relação paritária baseada na cooperação.

As negociações para um novo acordo que pudesse substituir o anterior Acordo de Co-operação e Parceria foram iniciadas, em 2008, na Cimeira de Khanty-Mansyisk, tendo-se alcan-çado pequenos desenvolvimentos a nível político, económico e social. No decorrer da crise

financeira iniciada em 2008 parece evidente que os Estados-Membros, ao se relacionarem com o exterior, procuram depender menos da UE e desenvolver parcerias com os Estados mais importantes fora do bloco europeu (Current Concerns, 2011). Aqui, a Rússia assume um papel

determinante, principalmente para o Centro e Leste europeu. Como resultado, em Junho de 2010, na Cimeira de Rostov-on-Don, estabeleceu-se a Parceria UE-Rússia para a Modernização. Esta iniciativa tem, desde então, servido de enquadramento para o desenvolvimento de re-formas, promoção do crescimento e aumento da competitividade complementando, no

con-texto dos espaços comuns, as parcerias entre os Estados-Membros da UE e a Federação Russa.

Após a Cimeira UE-Rússia de Bruxelas, no final de 2011, Dmitry Medvedev manifestou o interesse russo, de acordo com as suas obrigações no FMI, em apoiar a Zona Euro a ultrapas-sar a actual crise financeira, sendo do seu interesse garantir a estabilidade da moeda que

(20)

14 teria acesso a vastos recursos e a uma extensão do seu mercado, enquanto a Rússia utilizaria

essa cooperação para modernizar as suas estruturas, aproximando-as do Ocidente.

O Diálogo Energético, posteriormente analisado, enquadra-se no Espaço Económico Comum e pretende assegurar a segurança e a estabilidade de preços da energia para ambas as

partes. O seu objectivo final consiste na edificação de uma relação energética de confiança favorável à abertura e à integração dos mercados energéticos, respeitando os padrões ambi-entais.

Capítulo 3

Energia

A génese da UE encontra-se associada a questões de segurança e energia. A criação da Comunidade Europeia do Carvão e do Aço (CECA), em 1951, e da Comunidade Europeia da

Energia Atómica (CEEA), em 1957, forneceram as bases para o aprofundamento da integração entre os Estados-Membros.

No decurso do processo de construção da UE, vários acontecimentos7 despertaram a

vulnerabilidade dos países europeus face a crises externas, consciencializando-os para uma

possível instabilidade no abastecimento de energia, bem como para a utilização da energia

como “arma” política por parte dos países exportadores. Em 1968, foi tornada obrigatória a

manutenção de stocks petrolíferos de emergência equivalente ao consumo de 90 dias, dando

o primeiro impulso para a criação de uma Política Energética Europeia. No entanto, foi o tér-mino da Guerra Fria que proporcionou as oportunidades de cooperação e investimento no

7 A Crise do Suez, em 1956; A Guerra dos Seis Dias entre Egipto e Israel, em 1967; O embargo de

(21)

15 sector da energia, através da abertura das reservas energéticas dos países de Leste à

capaci-dade financeira e tecnológica das empresas ocidentais.

Política Energética

Em 2000, num contexto de aumento dos preços da energia, foi iniciado o Diálogo Energético UE-Rússia. Estas duas regiões reconheceram-se como parceiros complementares no sector energético, dado existir um interesse mútuo em manter estáveis os mercados

energéti-cos do continente europeu. O principal objectivo seria fornecer um espaço de estudo e discus-são sobre as questões energéticas e incentivar o estabelecimento de laços mais próximos

en-tre os dois espaços8.

Em menos de uma década, a Comissão Europeia estabeleceu os princípios básicos para uma Política Energética Comum, através da publicação de três documentos. O primeiro visava a sustentabilidade, a estabilidade do fornecimento e a necessidade da criação de um mercado interno, incentivando a intervenção da UE no sector energético através da harmonização das

políticas nacionais e comunitárias (Comissão Europeia, 1995). O segundo sugeria a incorpora-ção gradual de energias renováveis nas fontes de energia primárias, de produincorpora-ção de energia, na UE (Comissão Europeia, 1997). O terceiro salientava as preocupações ambientais, a

impor-tância da interdependência entre os Estados-Membros e a necessidade de uma dimensão co-munitária para o sucesso das estratégias energéticas (Comissão Europeia, 2000). Ao evidenciar a crescente dependência das importações, este último relatório suscitava ainda questões

rela-cionadas com a segurança energética, direccionando a Política Energética Europeia para a di-minuição da vulnerabilidade face ao exterior, ao invés de se focar, exclusivamente, na eficiên-cia energética.

8 Pretendia, de certa forma, promover a cooperação em medidas de poupança energética; racionalizar a

(22)

16 Simultaneamente, a falta de incentivos adequados, falhas de informação e ausência de

mecanismos financeiros de apoio foram identificados como os principais entraves à eficiência energética. Assim, foi proposta a intensificação da cooperação internacional na eficiência energética e a integração deste conceito nas políticas de desenvolvimento com os países

vizi-nhos da UE (Comissão Europeia, 2005).

Na Cimeira Europeia de Hampton Court, em Outubro de 2005, alcançou-se um com-promisso formal para o estabelecimento de uma política energética europeia comum

domina-da pela coerência entre os Estados-Membros (Comissão Europeia, 2006), cujas primeiras pro-postas ficaram definidas no Livro Verde de 20069. Tal política comum teria de ser consistente com os objectivos gerais da política externa europeia: prevenção e resolução de conflitos, não proliferação de armas e promoção dos direitos humanos.

Em 2006, a crise de gás russo-ucraniana acelerou o processo de criação de uma Política Energética para a UE e redefiniu as relações UE-Rússia. Sendo a Ucrânia um país pelo qual atravessa a maioria dos gasodutos provenientes da Rússia, esta crise energética não só

susci-tou preocupações sobre a dependência da UE num restrito número de fornecedores e rotas de abastecimento, como também tornou evidente a complexa relação entre países exportadores, países de trânsito e países importadores de energia.

A abordagem económica da energia passou, então, para segundo plano face às

estra-tégias de segurança nacional e de política externa (Geden, et al., 2006). Como consequência, os responsáveis políticos europeus focaram-se na elaboração de uma estratégia energética credível, centrada no desenvolvimento sustentável, na competitividade e na segurança do

9

(23)

17 fornecimento (Comissão Europeia, 2006). Porém, rapidamente ficou evidente a dificuldade em

alcançar um resultado favorável quanto a duas ideias consensuais: a liberalização do mercado de gás e a diversificação da sua origem. Apesar da inexistência de consenso político entre os Estados-Membros sobre a implementação das estratégias energéticas, os sucessivos Livros

Verdes permitiram definir os moldes de uma futura Política Energética Europeia.

O Tratado de Maastricht, em 1992, trouxe uma nova perspectiva sobre a implementa-ção gradual de um mercado interno de energia. A energia foi lenta e gradualmente associada

ao desenvolvimento de relações com diferentes parceiros internacionais da UE, mas só com o Tratado de Lisboa a energia passou a estar intrinsecamente relacionada com a Política Externa e de Segurança da UE. O Tratado de Lisboa não possui, explicitamente, referências à coopera-ção energética, mas introduziu uma nova base jurídica para futura legislacoopera-ção europeia, ao

atri-buir competências à UE na área da energia (Artigo 194º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia), as quais são partilhadas com os Estados-Membros.

Actualmente, nas suas relações com os países de fornecimento e trânsito de energia, a

Leste e a Sul, a UE fá-lo através da exportação do acervo comunitário para essas zonas, de forma a aceitarem as regras do mercado interno europeu. A UE tem de considerar os interes-ses geostratégicos e os de mercado, de forma a garantir, no longo prazo, a sustentabilidade de uma política de segurança energética. (Tekin & Williams, 2011). A ambição da UE em assumir a

liderança na eficiência energética e ambiental10 tem sido decisiva para a implementação de novas políticas na área da energia. No entanto, essas decisões não originaram, por si só, uma política comum. Os diferentes perfis energéticos dos Estados-Membros e divergências sobre os

10 O foco nas alterações climáticas, durante a primeira década do século XXI, resultou, em 2008 na

(24)

18 contornos de abordagem à questão têm impossibilitado o estabelecimento de uma política

comum.

O Tratado da Carta da Energia serve de base para a institucionalização das relações energéticas da UE com países terceiros. Porém, o documento não foi ainda ratificado pela

Fe-deração Russa, o que inviabiliza grande parte das provisões nele contidas.

O Governo russo, ao elaborar a Estratégia Russa para a Energia até 2030, em 2009, sa-lientava a necessidade de garantir a sua segurança energética e alertava para a urgência de elevados investimentos privados na expansão das capacidades de produção (em

infra-estruturas e eficiência energética). Estas orientações, no entanto, não tiveram qualquer impli-cação prática, pois o controlo governamental e a censura não permitem uma discussão livre e aberta sobre as deficiências do sector da energia russo. Adicionalmente, o documento não

contém dados concretos sobre o investimento necessário para atingir os objectivos propostos, nem como obter esse financiamento (Ministry of Energy of the Russian Federation, 2010).

O sector energético russo enfrenta vários problemas estruturais, de gestão, de

subsí-dios excessivos e de falta de racionalidade económica. A indústria do gás é ligeiramente mais sensível do que a do petróleo, pois as infra-estruturas fixas dificultam a diversificação e, no caso russo, sustém-se à custa das exportações para a Europa. Esta indústria é controlada por monopólios estatais que se apropriam dos programas de investimento público, discriminando

a iniciativa privada e as empresas estrangeiras. A iniciativa privada tem-se manifestado em sectores variados como o comércio, a construção, a agricultura, o entretenimento e o automó-vel (Saradzhyan & Abdullaev, 2011). No entanto, os investidores estrangeiros são obrigados a

realizar esforços acrescidos e a condições de negociação menos vantajosas (Krutikhin, 2012).

(25)

im-19 postos. A Gazpromposiciona-se de tal forma no mercado que domina a oferta de gás natural e

mantém o monopólio das exportações russas. O governo russo utiliza a Gazprom para satisfa-zer as necessidades energéticas básicas da população a baixos preços, subsidiados pelo lucro das exportações de gás para a União Europeia, ou seja, indirectamente sustentado por activos

europeus. O monopólio interno da Gazprom assegura a permanência deste sistema que, con-tudo, tem vindo a enfrentar custos crescentes com a degradação da rede de distribuição e o declínio de campos de produção (Van Der Meulen, 2009).

Mikhail Krutikhin (2012) afirma que a atitude dos responsáveis políticos russos é con-sequência da inexistência de considerações estratégicas, sendo bastante comum ocorrerem declarações oficiais contraditórias sobre a política energética, não por questões tácticas, mas sim, por incompetência dos seus líderes. Este autor defende que não é a Gazprom que é

utili-zada como arma política pelo Governo russo, mas é a política externa russa que se encontra dependente das iniciativas dessa empresa. Ou seja, as decisões ao nível da indústria energética prejudicam, por vezes, os interesses da Rússia a nível regional e internacional.

Mercado Energético

Desde o fim da década de 1990, tem-se verificado um aumento da procura de energia,

com a UE a consumir mais energia do que a que consegue produzir (Figura VII). A combinação energética da UE é dominada pelos combustíveis fósseis, sendo o petróleo o mais utilizado. Tendo-se verificado um ligeiro aumento da contribuição de energias renováveis11, as maiores

alterações registaram-se no carvão (diminuição) e gás natural (aumento). Em 2010, a depen-dência de gás natural e de petróleo era de, respectivamente, 62.38% e 84,27% (Anexo XIII), sendo expectável o seu aumento.

11 Espera-se que, com a Estratégia 2020, os recursos renováveis atinjam os 20% da produção de energia

(26)

20 Se a tendência se mantiver e a dependência de importações de energia persistir,

gran-de parte dos sectores económicos europeus pogran-dem tornar-se vulneráveis às oscilações dos mercados internacionais (Comissão Europeia, 2000). Essa situação, acompanhada de alguma incerteza relativamente à vontade e à capacidade futura dos países exportadores em satisfazer

a procura mundial, torna o risco de interrupções do fornecimento um dos maiores problemas para a UE (Comissão Europeia, 2007b).

Este possível cenário despertou a consciência dos responsáveis políticos para a

neces-sidade de estabelecer, de forma estável e sustentável, o aprovisionamento de energia. Adicio-nalmente crescem as preocupações com o aquecimento global e os efeitos nocivos para o ambiente resultantes da produção, transporte e consumo de determinadas fontes de energia (Comissão Europeia, 2010).

O elevado consumo de gás natural e petróleo, a nível mundial, e o seu peso nas impor-tações de energia (Anexo XIV), tendem a favorecer relações com os países exportadores dessas matérias-primas. Assim, a UE tem interesse em manter boas relações e termos de troca

favo-ráveis, quer com os países produtores de energia, quer com os países de trânsito de gás.

A Rússia possui elevadas reservas energéticas, o que a torna a principal fornecedora de energia para a EU, permitindo combater o crescente défice de energia europeu. As relações da UE com a Rússia centram-se, essencialmente, no gás natural. Contudo, os dados relativos às

importações europeias de gás natural russo, podem levar a preocupações excessivas. Vários países da UE não adquirem gás à Rússia (Espanha, Reino Unido, Suécia), sendo a Alemanha, a Itália os países de Leste os que se encontram mais dependentes desse mercado. O Norte e o Sul da Europa usufruem, respectivamente, do gás existente no Mar do Norte e das

(27)

21 O perfil energético da União Europeia e a sua dependência de fontes externas realça a

importância objectiva dos aspectos externos da política energética. A dependência económica mútua entre um país consumidor e um produtor não contribui para o desenvolvimento de uma relação de longo prazo estável, uma vez que ambas as partes têm incentivos à

minimiza-ção dessa dependência. Dessa forma, considerando os diferentes interesses, é imperativo con-ceber uma política equilibrada entre o Leste e o Sul que satisfaça todos os Estados-Membros e incentive o intercâmbio cultural (Vasconcelos, et al., 2009).

A segurança energética dos países produtores depende da existência de vários consu-midores, tanto quanto a dos países consumidores depende da obtenção de diversos produto-res. A UE, como importadora, procura a diversidade de fornecedores e a previsibilidade dos fluxos e dos preços dos combustíveis nos mercados internacionais. Os países produtores

pre-tendem uma relação mais estável, garantindo receitas necessárias para cobrir os elevados custos de investimento. Os principais países consumidores estão, cada vez mais, dependentes da importação de energia e, dado o elevado preço do petróleo e do gás natural no mercado

mundial, a relação de força tem vindo a desviar-se para os países produtores de energia.

A tentativa de diversificação de mercados abastecedores por parte da UE e a incerteza face ao mercado energético europeu podem aumentar os esforços russos em vender mais aos mercados emergentes, nomeadamente à China. No curto prazo, tal poderá ser, no entanto,

inviável, dado que exigiria avultadas despesas em infra-estruturas, uma vez que todos os gran-des gasodutos estão direccionados para o continente europeu. Por outro lado, a China não estará disponível para pagar os elevados preços cobrados aos consumidores europeus, assu-mindo uma posição de maior interesse no continente africano onde pode controlar os recursos

(28)

22

Capítulo 4

Desafios Futuros

O impasse verificado nas relações políticas entre a UE e a Rússia não traduz a dinâmica existente entre estes dois blocos. De facto, com a maior facilidade de acesso a informação e menores entraves nas suas deslocações, existe agora uma maior percepção entre os cidadãos

russos dos desenvolvimentos a Ocidente. Uma União Europeia próspera e estável terá um maior impacto do que meros acordos assentes em exigências e concessões formais.

Nesse sentido, os esforços para desenvolver a Rússia à imagem da UE estão

condena-dos ao insucesso, pois não se pode negar a identidade característica de um país com o tama-nho da Rússia com uma língua, história e cultura próprias (Seiffert, 2007). Todavia, estabelecer uma parceria, estratégica ou não, é tarefa inviável enquanto for evidente a ausência de alguns valores comuns. Assim, exige-se uma transformação da mera intenção para a colaboração

pragmática e flexível onde sejam considerados interesses e valores, comuns ou divergentes, de ambas as partes.

Os russos enfrentam uma UE dividida com problemas internos e sem uma posição

úni-ca e forte úni-capaz de aproximar países, de forma inequívoúni-ca, da sua área de influência, como é o caso da Ucrânia ou da Geórgia. A inexistência de negociações, entre Bruxelas e estes Gover-nos, com vista à sua adesão à UE, contribui para que a Rússia não necessite de definir uma política de vizinhança efectiva, eficiente e exclusiva para com esses Estados. A Rússia tem uma

certa vantagem ao agir como actor único, utilizando uma estratégia de “dividir e conquistar” os países europeus, enfraquecendo a posição da UE como um todo (Barysch, 2004). Dessa forma, quanto mais fraca for a União Europeia, mais divisões existirão no seu interior e maior a

oportunidade de negociação com os Estados individualmente (Lukyanov, 2012).

(29)

23 dos seus Estados-Membros. O corte no fornecimento de gás à Ucrânia, por parte da Rússia, e,

consequentemente, a vários outros países europeus, em Janeiro de 2009, originaria a maior interrupção de abastecimento energético em largas décadas, demonstrando o excessivo nível de dependência europeu do gás russo e do sistema de trânsito ucraniano. Apesar de questões

financeiras (divergências nas negociações quanto ao preço do gás a ser pago pela Ucrânia) estarem na origem da suspensão no fornecimento de gás12, o principal objectivo seria desa-creditar a fiabilidade e a estabilidade da Ucrânia, como país de trânsito de energia, numa altu-ra em que políticas pró-europeístas ganhavam apoio na classe política ucaltu-raniana. De forma a

conseguir acesso directo ao mercado europeu, e diminuir alguma dependência da Ucrânia, a Rússia mostrava interesse em criar novas rotas de exportação de gás (os projectos para os

gasodutos Nord Stream e South Stream) (Loskot-Strachota, 2009).

A UE pretende, igualmente, desenvolver novos projectos a Sul, mas a crise financeira levantou dúvidas sobre a forma mais eficiente de investir fundos limitados na segurança ener-gética europeia, nomeadamente sobre a viabilidade da construção do gasoduto Nabucco, li-gando Ahiboz (Turquia) a Baumgarten an der March (Áustria), e se esse é, efectivamente, uma

prioridade (Kassenova, 2009).

Enquanto for rentável explorar petróleo e gás natural, e não se tornar economicamen-te viável a generalização dos seus substitutos, isto é, enquanto a utilização de recursos

reno-váveis se mantiver comparativamente mais dispendiosa, os combustíveis fósseis permanece-rão as mais importantes fontes de energia. Contudo, o mercado mundial está saturado, com margem reduzida para satisfazer uma procura crescente, ou enfrentar quebras potenciais. Logo, o principal problema a enfrentar poderá estar relacionado com a capacidade da Rússia

satisfazer a crescente procura europeia, e não com o seu interesse em continuar a fornecer

(30)

24 gás à Europa a preços mais elevados. O rápido progresso económico da Rússia tem aumentado

o consumo interno de energia, absorvendo uma parte das suas reservas. Se os preços domés-ticos responderem ao crescimento da procura, o mercado russo tornar-se-á mais atractivo e significativo, resultando num aumento considerável dos gastos em energia importada (pela

União Europeia) e/ou na diminuição do peso da Europa nas receitas russas (Stern, 2006).

Ao afirmar-se como um mercado vital para as exportações de energia russas, a União Europeia sustenta uma grande parte da economia desse país. Consequentemente, a ameaça

de diversificação dos mercados energéticos, por parte do espaço europeu, pode provocar per-das importantes de receitas e colocar em causa a estabilidade e o crescimento da economia russa (ameaçando a segurança energética da União). A Rússia figura como o principal fornece-dor de petróleo e gás natural, mas estabelecer acordos com os principais mercados

alternati-vos – Nigéria, Irão, Venezuela, Argélia, Líbia – exigirá uma precaução extra, pois estes não po-dem ser considerados parceiros mais estáveis, prósperos e credíveis que a própria Rússia.

Para a economia russa, o aumento do preço das matérias-primas energéticas resulta

no aumento de receitas, mas, simultaneamente, origina uma valorização do Rublo. Assim, as exportações russas dos outros sectores tornam-se menos competitivas no mercado mundial. O Governo russo depara-se com a necessidade de sustentar o seu crescimento económico atra-vés da diversificação da economia (reduzindo o peso do petróleo e do gás natural nas suas

contas nacionais), do fomento do investimento estrangeiro e da promoção da inovação e da investigação. Para tal, terá de direccionar as receitas provenientes das exportações de energia (aplicadas em fundos estrangeiros) para investimentos internos estratégicos. Torna-se impera-tivo manter relações estáveis e de confiança com os países ocidentais, particularmente com os

(31)

25 A ineficiência da indústria energética, as disparidades políticas, económicas e sociais, a

diminuição e o envelhecimento da população são problemas que continuarão a afectar a Rús-sia, pelo menos a médio prazo, e requerem intervenções urgentes (Saradzhyan & Abdullaev, 2011). Só assim a Rússia poderá reduzir a sua dependência das exportações de energia e

inte-grar-se, cada vez mais, na economia mundial.

Contudo, as elevadas receitas das commodities não impulsionaram o Governo russo a reformar o seu mercado de energia e a terminar com os monopólios existentes. Aliás, se o

controlo estatal dos sectores estratégicos da economia se propagar aos sectores mais dinâmi-cos, existe um elevado risco de a Rússia se transformar num Petro-Estado, isto é, um país eco-nómica e tecnologicamente pouco desenvolvido, servindo, essencialmente, como fornecedor de matérias-primas para a China e a União Europeia (Comissão Europeia, 2007a).

A Federação Russa não domina as questões internacionais, como a União Soviética era capaz de fazer. Contudo, permanece capaz de influenciar decisões importantes, não só como membro permanente do Conselho de Segurança da ONU, ou da participação no fórum G20,

mas também das suas relações com países mais distanciados dos valores ocidentais. Assim, o possível alargamento da NATO a Leste, as revoluções nos países da Comunidade de Estados Independentes e nos Balcãs e as invasões do Iraque e Afeganistão suscitaram o interesse da

Rússia em participar activamente nas organizações internacionais.

Através desses mecanismos multilaterais, a Federação Russa pode intervir mais asser-tivamente, defendendo as suas prioridades nacionais e contrapondo os interesses estrangei-ros. A adesão da Rússia à Organização Mundial do Comércio (OMC), concluída em Agosto de 2012, após longos anos de negociações, engloba muito mais do que meros acordos e

(32)

inves-26 timento estrangeiro, essenciais para o seu desenvolvimento económico e, sobretudo, para a

sua aproximação económica e política ao resto do mundo. Nesse sentido, pode-se esperar que a adesão da Rússia à OMC e um eventual acordo com a UE quanto a uma maior liberdade de circulação (isenção de vistos) contribua indirectamente para a abertura da sociedade russa e

das políticas estatais.

Perspectivas

As questões energéticas assumem especial relevo nas relações entre a UE e a Rússia, mas estas não podem ser resumidas apenas a este âmbito. Durante a segunda metade da dé-cada de 2000, enquanto os líderes das duas regiões focavam a sua atenção na segurança

ener-gética, desenvolviam-se contactos em vários sectores não relacionados com a energia. De tal forma que, no seguimento do conflito na Geórgia, em 2008, diversas sanções económicas por parte da UE foram ponderadas, mas depressa se tornaram inconvenientes quando os

interes-ses dos exportadores europeus foram considerados.

O Acordo de Cooperação e Parceria entre a Federação Russa e a UE não englobava al-guns aspectos cruciais como a cooperação em questões de segurança, assuntos internos e justiça ou o diálogo energético. Apesar de terem acordado uma Parceria para a Modernização,

a adesão da Rússia à Organização Mundial do Comércio (OMC), em 2012, tornou praticamente irrelevante os capítulos comerciais. As divergências quanto às questões de Vizinhança Comum e o terceiro Pacote Energético da UE permanecem no topo da agenda política, enquanto as

negociações para maior mobilidade e um novo acordo de substituição do ACP se encontram estagnadas (Fischer, 2012). A guerra na Geórgia, em 2008, provocou uma certa tensão na rela-ção entre ambas as partes que se tem tentado atenuar, mas a União vive um momento em que os problemas internos ganham particular relevância e as medidas de austeridade impostas

(33)

estra-27 tégica para a União Europeia, mas não se afigura fácil conceber uma via coerente para a

inten-sificação desta parceria.

O Tratado da União Europeia afirma que qualquer Estado europeu, caso respeite os va-lores democráticos europeus, pode solicitar a adesão à União (Art. 49º Tratado da União

Euro-peia). Para o fazer, tem de satisfazer critérios de adesão políticos (possuir instituições estáveis que garantam a democracia, o Estado de direito e os direitos humanos) e económicos (operar numa economia de mercado funcional que garanta a concorrência no interior da União). O

Estado tem, também, de aceitar o acervo comunitário, ou seja, a capacidade para alcançar os objectivos da União e de aplicar e gerir, eficazmente, a legislação da UE. Ora, como a Federa-ção Russa não preenche, efectivamente, nenhum dos critérios supramencionados, a sua ade-são à UE afigura-se improvável no médio-prazo.

Todavia, o cumprimento dos critérios de Copenhaga não é, por si só, condição suficien-te para a adesão à UE. Para tal aconsuficien-tecer seria necessário existir insuficien-teresse de ambas as parsuficien-tes. As elites russas não estão interessadas em ceder poder e perder capacidade de tomar decisões

independentes para o seu país e, no espaço europeu, dificilmente se alcançará a unanimidade necessária para aprovar novos alargamentos.

Caso a adesão da Federação Russa à UE se verificasse, o seu vasto território, a sua po-pulação e os seus recursos naturais tornariam a Rússia numa das principais forças europeias,

implicando a perda relativa de poder dos maiores países europeus. A integração da Rússia implicaria um desafio sem precedentes na história do bloco europeu, exigindo uma reformula-ção dos processos de tomada de decisão que garantisse uma capacidade de actuareformula-ção eficien-te. A extensão do território e das fronteiras ao Oceano Pacífico e ao continente asiático

(34)

emer-28 gentes. A UE necessita, então, considerar a Rússia como sendo parte integrante do continente

europeu, não podendo negligenciar a sua pretensão de se desenvolver à margem dos valores e instituições europeias (Artigo 2º do Tratado da União Europeia).

A UE continua a ser um agente mais relevante do que a Federação Russa13, mas

neces-sita dessa cooperação para garantir a sua segurança e o fornecimento de energia. Estes dois espaços dividem agora uma fronteira alargada, não partilhando, contudo, os objectivos cen-trais para essa vizinhança comum. A UE pretende estabilizar a sua periferia, enquanto a Rússia

procura manter o controlo dos acontecimentos nas suas fronteiras. Assim, a evolução pacífica, coordenada e sustentada das relações entre a União Europeia e a Federação Russa é essencial para a implementação de outras políticas europeias.

A possibilidade de ocorrência de conflitos, de crises mais complexas e de divisões entre

os Estados-Membros que têm reais interesses na Rússia e os que não têm tais interesses são fraquezas que a Rússia certamente utilizará em seu benefício. Logo, a UE tem de procurar uma relação que produza efeitos benéficos para ambas as partes e que se estenda à vizinhança

comum destes dois blocos (Vasconcelos, 2008).

Pavel Baev assume uma visão mais negativa para o futuro desta relação, defendendo que a União depende dos produtos energéticos russos, mas que a Rússia está bastante mais dependente das suas relações com o Ocidente. Dessa forma, à medida que o bloco europeu se

vai focando nos seus problemas internos, nas suas parcerias com o Leste e o Mediterrâneo (mais instável), e na ascensão da China, dedica menos atenção à Rússia (Baev, 2012). O opti-mismo está patente em Christopher Granville, ao defender que o crescimento dos laços eco-nómicos e comerciais da Rússia com a UE tornou a relação mais importante para ambas as

13 A UE possui uma população mais numerosa, um peso económico mais significativo e intervém

(35)

29 partes, ultrapassando a mera questão da energia. A sua relevância económica (sendo o

tercei-ro maior parceitercei-ro comercial da UE) poderá servir de moderador face às tensões políticas mais recentes (Granville, 2012).

Independentemente das expectativas dos responsáveis políticos europeus, quanto ao

futuro do relacionamento entre a UE e a Federação Russa, o modelo de integração europeu de alargamento está a atingir o seu limite, sendo necessário aprofundar certas questões de segu-rança, energia, economia, coesão territorial e política social.

A criação de um mercado interno de energia revela-se condição essencial para garantir

a segurança energética do espaço europeu, mas também para alcançar uma política energética externa credível e eficaz (Vasconcelos, et al., 2009). Uma Política Energética uniforme pode potenciar os benefícios da liberalização dos mercados para os cidadãos europeus, aumentar o

nível de investimentos nesse sector e desenvolver um mercado interno de energia baseado em preços justos e concorrenciais.

O recém-criado Serviço de Acção Externa Europeu (SAEE), que entrou em

funciona-mento em 2010, assumiu o desenvolvifunciona-mento de parcerias estratégicas com os países dos BRIC e outras potências emergentes como uma das suas principais prioridades (Ashton, 2012). Po-rém, os esforços focaram-se nos parceiros chineses, indianos e brasileiros, negligenciando, em parte, os russos (Conselho da União Europeia, 2010). Essa situação pode ser justificada pelo

facto de as relações com a Rússia já se encontrarem altamente institucionalizadas, mas, sobre-tudo, por ser um parceiro menos atractivo, com excepção dos interesses energéticos, que apresenta taxas de crescimento mais baixas comparativamente a outras economias

emergen-tes (Judah, et al., 2011).

(36)

econo-30 mias emergentes provocou, nas últimas décadas, uma escalada na procura de energia no

mer-cado mundial. Perspectiva-se uma maior rivalidade entre os vários países pelo acesso a reser-vas de gás e petróleo, o que diminuirá a importância da UE e aumentará o peso da Ásia e Pací-fico como destino final das exportações russas de energia – estimando-se que os mercados a

Leste representem 20% das exportações russas de gás natural, em 2030 (Ministry of Energy of the Russian Federation, 2010).

Logo, a Rússia não pode mais ficar isolada entre o continente asiático e o continente

europeu. Face à emergência de países como a China ou a Índia e à existência de conflitos na Ásia Central, a vizinhança com a UE assume contornos menos problemáticos para a Rússia, podendo a sua política regional beneficiar da cooperação com a UE. Se a UE necessita de uma maior percepção das motivações geopolíticas da Rússia, esta, por seu lado, deve aprofundar as

ligações com a Europa, aceitando as consequências do regionalismo do projecto europeu (Gomart, 2006).

Liberalização do Mercado de Gás

Dadas as suas reservas energéticas, é expectável que a Rússia permaneça o principal fornecedor de energia a nível internacional, mas, decerto, acentuará a sua posição no mercado

de energia mundial através da diversificação dos seus destinos de exportação e de uma maior presença das empresas nacionais no exterior.

Nesse sentido, o desenvolvimento de um mercado europeu do gás eficiente e atractivo

ao investimento, sustentado na política de concorrência da União, permitiria criar uma rede integrada de gasodutos e reservas, que permitissem suprir quebras no abastecimento, com regras uniformizadas para todos os agentes económicos que nele operassem. Uma Alta

(37)

31 A criação de um mercado interno de energia exige maior liberalização, mas com

pre-cauções acrescidas, com maior regulação e fiscalização por parte de uma Autoridade compe-tente. Um mercado liberalizado concentra o poder nos grandes fornecedores e a inexistência dos contratos de fornecimento existentes actualmente entre os Estados-Membros permitiria a

manipulação do volume exportado de forma a controlar os preços (The Economist, 2012).

O terceiro pacote de liberalização dos mercados de energia europeus, aprovado em 2009, estabelecia três hipóteses para os Estados-Membros separarem a produção, transporte

e distribuição da energia, transpondo a legislação europeia para as leis nacionais: a separação da propriedade, a introdução de um operador independente dos sistemas de transmissão ou a introdução de um operador de rede. A separação entre produção e distribuição da energia, proposta pela Comissão, procurava promover a eficiência interna, mas também a segurança

externa. As grandes empresas de países terceiros, como a Gazprom, teriam de se desarticular dentro do mercado europeu, o que tornaria mais difícil a conquista de uma posição dominante através de um pequeno número de acordos bilaterais (Youngs, 2009). Contudo, o estabeleci-mento de joint-ventures maioritárias com empresas nacionais permite à Gazprom contornar as

regras de concorrência da UE, mantendo a sua influência e controlando as rotas de trânsito de gás (Heinrich, 2008). A liberalização do mercado do gás na UE tem, assim, beneficiado a expan-são da Gazprom na Europa, aumentando a sua participação no mercado a jusante,

nomeada-mente em empresas de distribuição ao consumidor final.

A segurança energética é resultado, em grande parte, das percepções e do grau de confiança entre os agentes envolvidos. Uma parceria não significa total concordância nos as-suntos que engloba, sendo natural a defesa de interesses específicos e que tal possa originar

(38)

32 garantindo uma resolução harmoniosa das diferenças que possam surgir (Gower, 2000). A

salvaguarda da segurança energética, no âmbito da separação da propriedade exigida pela UE, poderia beneficiar da inclusão de cláusulas de investimento na interligação da rede energética europeia como condição para aceder a esse mercado.

A diversificação é importante, mas é necessária regulamentação ao nível internacional e uma adequação da política energética europeia ao Direito Internacional Público. Os Estados consumidores, produtores e de trânsito de energia necessitam de se organizar e criar

condi-ções para um diálogo multilateral que promova a regulação e a simplificação do trânsito de energia, evitando a maioria dos conflitos que, no caso da Ucrânia, surgem com decisões unila-terais sobre o aumento das taxas de trânsito.

Conclusão

A última década assistiu à recuperação económica da Federação Russa e à sua relativa afirmação no panorama mundial, como resultado do aumento do preço mundial dos principais

produtos exportados pela Rússia. No entanto, após vinte anos de transformação e de adapta-ção à nova realidade mundial, a Rússia não se encontra, ainda, próxima de ser uma sociedade verdadeiramente democrática e igualitária. O poder tem vindo a concentrar-se na Administra-ção Presidencial e a oposiAdministra-ção permanece fraca, bastante dividida e largamente restringida pela

corrupção existente (Transparency International, 2011).

A desaceleração das taxas de crescimento do seu PIB, alguma instabilidade política e a inexistência de reformas estruturais de grande alcance podem interferir, negativamente, na confiança dos investidores e num crescimento económico impulsionado, nos últimos anos,

(39)

33 das suas estruturas, reduzindo o poder das elites e o respectivo controlo sobre a indústria da

energia. Recentes manifestações de descontentamento, após as eleições para a Duma Estatal demonstram que os cidadãos russos exigem uma sociedade e uma actuação Estatal diferente e que estão prontos para a mudança. A Rússia dificilmente se tornará um actor respeitável e

confiável ao nível europeu e mundial se, em resultado da corrupção e da violência, continuar a rejeitar o direito dos seus cidadãos em escolher o seu próprio desenvolvimento democrático.

A UE cedo assumiu interesse explícito em contribuir para a modernização do Estado

russo e para a sua aproximação às instituições europeias e internacionais. O desenvolvimento desta relação acompanhou a evolução da PESC, desde o Tratado de Maastricht até ao Tratado de Lisboa. Contudo, várias divergências e conflitos sobre questões energéticas geraram dúvi-das quanto à estabilidade desta cooperação, e colocaram em causa a segurança energética da

UE.

Esta será, porventura, uma relação dominada pela energia e pela aproximação dos mercados de energia das duas regiões. A UE necessita de gás, petróleo e carvão russos e a

Rússia usufrui de elevadas receitas com a exportação dessas matérias-primas para o resto do continente europeu. No entanto, a União Europeia e a Federação Russa têm vindo a acumular défice de confiança mútua nos últimos anos, o qual não pode ser ultrapassada apenas com a

Parceria para a Modernização, iniciada em 2010, fundamentalmente de carácter técnico.

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