i
MEIRIELE DA SILVA DAS NEVES
CARACTERIZAÇÃO FENOTÍPICA E MOLECULAR DE
LINHAGENS ATENUADAS DE Salmonella enterica
Typhimurium
ATTENUATED STRAINS OF Salmonella enterica
CAMPINAS
2015
iii
iv
vii RESUMO
O gênero Salmonella pertence à família Enterobacteriaceae que agrupa bacilos Gram-negativos, anaeróbios facultativos, fermentadores e geralmente flagelados. S.
enterica é um dos patógenos de origem alimentar mais prevalente, sendo que infecções
causadas por essa bactéria podem estar relacionadas a praticamente todos os tipos de
alimentos. O trabalho foi proposto com o intuito de realizar a caracterização fenotípica e
molecular de linhagens atenuadas de Salmonella enterica Typhimurium para genes
codificadores de proteínas associadas ao nucleóide (NAPs Nucleoid associated
Proteins). As características fenótipicas dos mutantes nulos de Salmonella enterica para
os genes ihfA ou ihfB, codificadores das subunidades A e B de IHF, foram avaliadas
através de crescimento in vitro, motilidade, sobrevivência frente ao estresse nutricional
(sobrevivência em fase estacionária), sob condições ácidas, na presença de sais biliares e
quanto à capacidade de invasão e sobrevivência em macrófagos (linhagem J774A.1).
Testes de confirmação da atenuação e avaliação da capacidade de induzir proteção em
caso de infecção por S. enterica foram realizados utilizando o modelo murino. Os
mutantes não apresentaram diferença no crescimento in vitro e na capacidade de
sobreviver na presença de sais biliares em comparação com a linhagem selvagem. As
linhagens mutantes para os genes ihfA ou ihf ihf ihfB)
apresentaram uma menor capacidade de sobrevivência sob condições ácidas quando
comparadas com a linhagem selvagem. A motilidade dos mutantes simples também foi
reduzida. Os mutantes simples e duplo apresentaram maior capacidade de sobreviver sob estresse nutricional quando comparados com a linhagem selvagem. O mutante para o gene
ihfA e o duplo mutante apresentaram um aumento na capacidade de invadir macrófagos.
ihf ihfB mostraram uma capacidade aumentada em sobreviver no
viii
de Salmonella enterica para os genes ihfA ou ihfB apresentam atenuação, em diferentes
graus, quanto à virulência e apresentaram capacidade de induzir proteção no modelo
murino de infecção por S. enterica. Esses resultados demonstram que essa proteína
apresenta função relacionada com a virulência bacteriana, sendo um importante alvo de
estudo na busca de linhagens atenuadas.
Palavras-chave: Salmonella enterica, mutantes, proteína IHF, caracterização fenotípica e
ix ABSTRACT
The genus Salmonella belongs to the Enterobacteriaceae family that comprises Gram-negative bacillus, facultative anaerobe, fermenting and generally flagellate. S.
enterica is one of the most prevalent food-borne pathogen, and infections caused by this
bacterium can be associated to almost all types of food. The work was proposed with the
purpose of performing phenotypic and molecular characterization of attenuated strains of
Salmonella enterica Typhimurium for genes encoding proteins associated with the
nucleoid (NAPs - Nucleoid associated Proteins). The phenotypic characteristics of the
null mutants of Salmonella enterica for genes ihfA or ihfB, encoding the A and B subunits
of IHF, were evaluated by in vitro growth, motility, survival under nutritional stress
(survival in the stationary phase), under acidic conditions, in the presence of bile salts and
for the ability of invasion and survival in macrophages (J774A.1 strain). Attenuation tests
and evaluation of the capacity to induce protection in case of infection by S. enterica were
performed using the murine model. The mutants showed no difference in the in vitro
growth and the ability to survive in the presence of bile salts in comparison with the wild
type strain. The single mutant for ihfA or ihf ihf ihfB)
showed decreased survival under acidic conditions when compared to the wild type strain.
Motility of single mutants was also reduced. Single and double mutants showed higher
ability to survive under nutritional stress when compared with the wild type strain. The
mutant gene for ihfA and the double mutant showed an increased ability to invade
ihf ihfB mutants showed an increased ability to survive within
macrophages when compared with the wild type strain. Null mutants of Salmonella
enterica for ihfA or ihfB genes exhibited attenuation, to varying degrees, for virulence
x
These results demonstrate that this protein has function associated to bacterial virulence
and is an important subject of study in search for attenuated strains.
Keywords: Salmonella enterica, mutants, IHF protein, phenotypic characterization and
xi SUMÁRIO
RESUMO... vii
ABSTRACT ... ix
AGRADECIMENTOS ... xv
LISTA DE FIGURAS ... xvii
LISTA DE TABELAS... xix
LISTA DE ABREVIATURAS ... xxi
1. INTRODUÇÃO ... 1
1.1. O gênero Salmonella ... 1
1.2. Salmonelose... 2
1.3. Patogenicidade... 4
1.4. Salmonella e vacinas ... 7
1.5. O Nucleóide Bacteriano e as Nucleoid-associated proteins (Naps)... 10
2. OBJETIVOS ... 13
2.1. Geral ... 13
2.2. Específicos... 13
3. MATERIAIS E MÉTODOS ... 14
3.1. Linhagens Bacterianas ... 14
3.2. Meios de cultura e armazenamento das linhagens bacterianas utilizadas ... 15
3.3. Complementação dos mutantes de S. enterica para os genes ihfA e ihfB ... 16
ihf ihfB ... 18
3.5. Caracterização fenotípica dos mutantes de S. enterica Typhimurium ... 21
3.5.1. Curva de crescimento ... 21
3.5.2. Ensaio de sobrevivência sob condições ácidas ... 21
3.5.3. Ensaio de crescimento na presença de sais biliares ... 22
3.5.4. Ensaio de sobrevivência na fase estacionária de crescimento ... 23
3.5.5. Ensaio de motilidade ... 23
3.5.6. Ensaio de invasão e sobrevevivência em macrófagos ... 24
3.5.6.1. Preparo das linhagens bacterianas ... 24
3.5.6.2. Preparo da célula J774A.1 ... 24
3.5.6.3. Invasão ... 24
3.5.6.4. Sobrevivência ... 25
3.6. Quantificação da transcrição dos genes ihfA e ihfB através de qRT-PCR ... 26
xii
3.7.2. Ensaio de Confirmação da Atenuação ... 28
3.7.3. Ensaio de desafio e proteção ... 28
4. RESULTADOS ... 30
4.1. Complementação dos mutantes de S. enterica para os genes ihfA e ihfB ... 30
4.2. Construção do duplo mutante ... 31
4.3. Curva de crescimento das linhagens selvagem e mutantes ... 33
4.4. Sobrevivência sob condições ácidas ... 35
4.5. Ensaio de crescimento na presença de sais biliares ... 37
4.6. Ensaio de sobrevivência na fase estacionária de crescimento ... 41
4.7. Ensaio de motilidade ... 42
4.8. Ensaio de invasão e sobrevevivência em macrófagos ... 44
4.9. Expressão Gênica de ihf avaliada por RT-PCR ... 46
4.10. Ensaio de Confirmação da Atenuação ... 48
4.11. Ensaio de desafio e proteção ... 49
5. DISCUSSÃO ... 52
6. CONCLUSÃO ... 60
xiii
feito sem concentração e auto-sacrifício,
xv AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus pela oportunidade de realizar meus sonhos e pela força dada nos momentos difíceis.
Ao Prof. Dr. Marcelo Brocchi que deu a oportunidade de desenvolver o trabalho no laboratório e sempre se mostrou uma pessoa paciente e disposta a ajudar no meu
crescimento profissional.
Ao programa de Pós Graduação em Genética e Biologia Molecular que
proporcionou a realização do meu mestrado.
A Capes e Fapesp que concederam as bolsas de mestrado e financiamento para
realização do projeto e participação em congressos.
Aos meus pais, que me apoiaram em todas as minhas decisões e me deram todo
suporte, afetivo e espiritual, para permanecer firme até o final dessa etapa, abrindo mão
dos seus sonhos individuais para que fosse possível a realização dos meus. E ao meu
irmão que sempre torceu por mim e me deu o maior presente até hoje, o meu sobrinho
Caio, que alegra meus dias simplesmente por existir.
Ao Mauro, que mesmo distante permaneceu torcendo por essa minha conquista e
me apoiou nos momentos que precisei.
A Preta, que foi uma segunda mãe para mim e infelizmente partiu mais cedo do
que eu esperava, mas que sempre torceu pelo meu sucesso e felicidade.
Aos meus amigos que mesmo longe sempre me apoiaram, principalmente a Ana
Gabriela que me proporcionou muitos momentos de descontração e risada, e a Thamara que permaneceu próxima e disposta a me ajudar nos momentos tristes e comemorar
xvi
A Dra. Jacqueline Paiva, que me auxiliou no desenvovimento de parte do meu
projeto e se tornou uma amiga muito especial, que compartilhou meus momentos de
alegria e me apoiou nos momentos dificeis.
A doutoranda Camila Pinheiro que me ensinou muito sobre biologia molecular,
trabalhou comigo em partes do projeto e proporcionou conversas muito construtivas,
sobre ciência e sobre a vida.
Aos amigos do laboratório: Aline Parolin, Ana Carolina Cauz, Bruna Leite, Bruna
Lima, Catierine Werle, Diego Nóbrega, Fábio Floresta, Fernanda Luz, Fernanda Morais,
Guilherme Milanez, Juliana Pastorello, Luciana Antoniassi, Marina Gilioli, Rafael
Ribeiro e Tamires Cordeiro, por compartilhar conhecimento, pela convivência nesses dois
anos e pelas conversas e risadas.
Aos funcionários Evandro Luis e Sandra Martins, por auxiliar e facilitar a
realização dos experimentos.
Ao Prof. Dr. Wanderley Dias da Silveira e a Profa. Dra. Selma Giorgio por
cederem seus laboratórios para a realização de parte do projeto.
A Ms. Myriam Janeth Salazar Terreros, pelo auxílio nos experimentos realizados
com as células J774, e a Dra. Janaína L. Leite Garbim pela paciência e ajuda com o
experimento de PCR real time.
Aos componentes da banca de qualificação, pré banca e banca de defesa, Prof.
Dr. Angelo Berchieri Junior, Profa. Dra. Valéria Maia Merzel, Profa. Dra. Clarice Weis
Arns, Prof. Dr. Anderson Ferreira Cunha, Profa. Dra. Cristina Elisa Alvarez Martinez e
Prof. Dr. Gerson Nakasato, pela avaliação, colaboração e sugestões dadas visando
xvii LISTA DE FIGURAS
Figura 1: Mapa do vetor de clonagem pACYC184 utilizado na clonagem dos genes ihfA
e ihfB (Fonte: New England Biolabs).
Figura 2 - Eletroforese em gel de agarose (1%) demonstrando o perfil eletroforético da
digestão do vetor pACYC184 com os insertos ihfA e ihfB.
Figura 3 - Eletroforese em gel de agarose (1%) da amplificação de DNA por PCR para confirmação da retirada do cassete de resistência ao cloranfenicol
Figura 4 - Eletroforese em gel de agarose (1%) demonstrando os produtos de amplificação por PCR com diferentes pares de iniciadores e DNA genômico das
linhagens como molde, para confirmar a construção do duplo mutante.
Figura 5 - ihfA e
ihfB com a linhagem selvagem STm662.
Figura 6 - Ensaio de sobrevivência sob condições ácidas.
Figura 7 - Ensaio de sobrevivência na presença de sais biliares (0,85%) com a linhagem
selvagem STm662.
Figura 8 - Ensaio de sobrevivência na presença de sais biliares (0,85%) com a linhagem
ihfA.
Figura 9 - Ensaio de sobrevivência na presença de sais biliares (0,85%) com a linhagem
ihfB.
Figura 10 - Ensaio de sobrevivência sob estresse nutricional, baseado na quantidade de UFC/mL em 1 e 6 dias após o inóculo em meio mínimo M9.
xviii
Figura 11 Ensaio de motilidade. Imagens das placas utilizadas na análise do deslocamento das linhagens selvagem e mutantes em meio semi-sólido, LB 0,35% ágar.
Figura 12 Ensaio de motilidade. Gráfico com valores do diâmetro médio das linhagens
ihfA ihfB em meio semi-sólido, LB
0,35% ágar.
Figura 13 Ensaio de invasão e sobrevivência em macrófagos de camundongo linhagem
J774.
Figura 14 Análise da expressão gênica dos genes ihfA e ihfB, codificadores das
Figura 15 Ensaio de desafio e proteção. Porcentagem de sobrevivência dos animais imunizados com uma ou duas doses da linhagem ihfA e desafios com a
linhagem selvagem STm662.
Figura 16 Ensaio de desafio e proteção. Porcentagem de sobrevivência dos animais imunizados com uma ou duas doses da linhagem ihfA e desafios com a
linhagem selvagem STm662.
Figura 17 - Ensaio de desafio e proteção. Porcentagem de sobrevivência dos animais imunizados com uma ou duas doses da linhagem ihfB e desafios com a
xix LISTA DE TABELAS
Tabela 1. Linhagens bacterianas de Salmonella enterica Typhimurium.
Tabela 2. Sequência dos iniciadores utilizados na construção de plasmídios pACYC184
recombinantes para complementação dos mutantes da linhagem STm662.
Tabela 3. Sequência dos iniciadores utilizados na detecção dos mutantes simples e duplo na linhagem STm662.
Tabela 4. Sequência dos iniciadores utilizados na quantificação da transcrição dos genes
ihfA e ihfB através de qRT-PCR.
Tabela 5. Ensaio de sobrevivência sob condições ácidas. Porcentagem de bactérias
sobreviventes dez minutos e uma hora após o inóculo em caldo LB pH 2,6.
Tabela 6. Ensaio de Confirmação da Atenuação da virulência com as linhagens selvagem
xxi LISTA DE ABREVIATURAS
BHI Brain Heart Infusion
cat Gene cloranfenicol acetil transferase
CDS Seqüências Codificantes
DL50 Dose Letal 50
DNA Ácido Desoxirribonucléico
IHF Fator de Integração ao Hospedeiro
IPS Ilha de Patogenicidade de Salmonella
Kb Kilobase
LB Luria Bertani
LB-ágar LGBMB
LPS
Luria Bertani Ágar
Laboratório de Genômica e Biologia Molecular Bacteriana Lipopolissacarídeos M Min Molar Minutos mM Mili molar
MAI Moving Average Interpolation
mL Mililitro
Microlitro
N Normal
xxii
NSA Nitrito de Sódio em meio Acidificado
pb Pares de base
PBS Tampão Salina Fosfato
PCR Reação em Cadeia da Polimerase
RPMI
rpm Rotação por minuto
STm Salmonella enterica Typhimurium
Taq Thermus aquaticus
TLR Toll Like Receptor
UFC Unidade Formadora de Colônia
1 1. INTRODUÇÃO
1.1. O gênero Salmonella
O gênero Salmonella é classificado como bacilo Gram-negativo, anaeróbio
facultativo, fermentador, geralmente flagelado, intracelular facultativo e pertence à
família Enterobacteriaceae (Mastroeni e Maskell, 2006). Atualmente o gênero Salmonella
consiste em apenas duas espécies, Salmonella bongori e Salmonella enterica. Essa
classificação foi realizada através de técnicas de biologia molecular associadas a testes
bioquímicos, permitindo a realização de uma análise taxonômica mais apurada (Agbaje
et al., 2011). S. enterica subdivide-se em seis subespécies ou grupos (enterica grupo I, salamae grupo II, arizonae grupo IIIa, diarizonae grupo IIIb, houtenae grupo V, indica grupo VI). Na subespécie I encontram-se a maioria das sorovariedades
patogênicas para o homem, pois essa subespécie é específica para animais de sangue quente, enquanto as outras podem infectar somente animais de sangue frio (Garai et al., 2012; Popoff et al., 2004).
A classificação sorológica de Salmonella é realizada através da detecção de
antígenos flagelares (H), somáticos (O) e capsulares (Vi) (Mastroeni & Maskell, 2006).
Os antígenos capsulares são característicos de alguns isolados e quando presentes
definem uma sorovariedade. De acordo com o sistema de classificação Kauffman-White,
atualmente há mais de 2600 sorovariedades de S. enterica (Issenhuth-Jeanjean et al.,
2014). Os sorovares Typhi e Paratyphi de S. enterica são os agentes causadores da forma
mais grave de salmonelose em humanos, a febre tifóide, enquanto outros sorovares, como Typhimurium, causam gastroenterites até infecções sistêmicas graves, cujo grau de
2
morbidade depende do estado nutricional e imunológico do paciente e da sorovariedade
bacteriana.
1.2. Salmonelose
S. enterica é um dos patógenos de origem alimentar mais prevalente, visto que
apresenta capacidade de infectar diferentes animais. Infecções por S. enterica podem estar
relacionadas a praticamente todos os tipos de alimentos, uma vez que é uma bactéria
ubíqua e pode crescer em temperaturas que variam de 7 a 45oC (Mastroeni e Maskell,
2006). As fontes mais comuns de infecção são água e produtos contaminados derivados
de aves domésticas, de carne suína ou bovina e mesmo plantas (Ruby et al., 2012;
Álvarez-Ordóñez et al., 2011; Woc-Colburn et al., 2009).
A virulência está relacionada ao tipo de sorovar bacteriano e o tipo de hospedeiro
envolvido. As sorovariedades de S. enterica patogênicas causam, em mamíferos,
infecções que variam desde gastroenterites localizadas na mucosa intestinal até infecções
sistêmicas graves, podendo levar a morte (Garai et al., 2012; Andrews-Polymenis et al.,
2010; Fierer e Guiney, 2001; Baumler et al., 1998).
As sorovariedades Typhi e Paratyphi causam a febre tifóide em humanos, uma
infecção sistêmica grave, de grande preocupação para a saúde mundial, uma vez que é
endêmica em regiões do mundo onde a qualidade da água potável e o tratamento de esgoto
são precários (Guzman et al., 2006; Ruby et al., 2012). Em suínos e bovinos, os principais agentes etiológicos responsáveis por septicemia são respectivamente, S. enterica
Choleraesuis e S. enterica Dublin. Embora essas sorovariedades sejam muito adaptadas
a esses animais, elas também podem causar infecções e diarréia no homem
3
Além destas sorovariedades, S. enterica Typhimurium e Enteritidis, são bastante
estudadas e merecem atenção, uma vez que são frequentes em gastroenterites e infecções
extra-intestinais em humanos. Essas duas sorovariedades causam em camundongos, um
tipo de infecção muito semelhante à febre tifóide humana. Assim, camundongos BALB/c
são utilizados nos estudos dessas bactérias como modelo murino para infecção sistêmica
por S. enterica (revisado por Watson e Holden, 2010).
A organização mundial de Saúde estima a ocorrência de 16 a 33 milhões de casos
de febre tifóide no mundo, com 500 a 600 mil fatalidades anuais (Woc-Colburn e Bobak,
2009). Além disso, casos de salmonelose por sorovares não tifoides (NTS) são também
muito frequentes, estima-se que milhões de casos humanos ocorram no mundo a cada
ano, resultando em mais de cem mil mortes (Andrews-Polymenis et al., 2010;
Woc-Colburn e Bobak, 2009; WHO 2013). Em um estudo de meta-análise, Reddy et al. (2010)
observaram que um dos principais causadores de infecções da corrente circulatória na
África é S. enterica, particularmente sorotipos não-tifóide, denominados iNTS para
invasive Non-typhoidal Salmonella. A incidência de NTS na África aumenta ainda mais
em associação com a predisposição consequente de outras infecções, como as
ocasionadas por HIV (Andrews-Polymenis et al., 2010).
No Brasil, de 1999 a 2008, ocorreram 6602 surtos causados por patógenos
entéricos, sendo S. enterica presente em 43% dos casos no qual o agente etiológico foi
identificado (Medeiros et al., 2011). No Estado de São Paulo, durante o período de
1996-2003, foram isoladas de humanos, 3554 amostras de Salmonella classificadas em 68
sorovares diferentes (Fernandes et al., 2006).
A salmonelose, devido a sua alta incidência e gravidade, ainda é um dos principais
problemas de saúde pública a nível mundial (Woc-Colburn e Bobak, 2009), e tornou-se
4
manipulados de forma com que diminua o risco de contaminação. O uso indiscriminado
de antibióticos levou ao aparecimento de isolados multirresistentes a drogas (MDR), que
dificultou o tratamento destas infecções (Monack, 2012; Vlieghe et al., 2009;
Woc-Colburn e Bobak, 2009; Coburn et al., 2007; Boyle et al., 2007; Figueroa-Ochoa e
Verdugo-Rodriguez, 2005; Graham, 2002). Estudos realizados com esses isolados
multirresistentes a drogas associaram esta característica com uma ilha genômica
Salmonella Genomic Island
a bactéria resistência a ampicilina, cloranfenicol, estreptomicina, espectinomicina,
sulfonamidas e tetraciclina (Kiss et al., 2012; Mulvey et al., 2006).
1.3. Patogenicidade
A infecção por S. enterica normalmente ocorre por via oral, iniciando com a
ingestão de água ou alimentos contaminados, principalmente por alimentos derivados de
aves e suínos (Andrews-Polymenis et al., 2010; Woc-Colburn e Bobak, 2009; Mastroeni
e Maskell, 2006; Figueroa-Ochoa e Verdugo-Rodriguez, 2005). A dose infectante média
(DI50) capaz de produzir infecções clínicas ou subclínicas em humanos está entre 105-1010
organismos ingeridos, porém a quantidade exata requerida para causar a doença varia de
acordo com a sorovariedade de S. enterica, o estado imunológico do paciente, assim como
outras características do hospedeiro (Darwin e Miller, 1999). O processo infeccioso
ocorre no intestino e manifesta-se dentro de 6-72 horas após a ingestão de alimento contaminado, com o aparecimento de diarréia, vômito e dores abdominais (WHO, 2013).
Uma característica importante de S. enterica é resistir ao pH ácido do estômago e
aos sais biliares intestinais, propriedades essenciais uma vez que elas infectam o
5
destas bactérias no estômago se dá por um mecanismo de ácido-tolerância, que induz uma
função de regulação da homeostase do pH para manter o pH intracelular em valores mais
elevados do que o ambiente extracelular (Garcia Del Portillo et al, 1993; Fabrega e Vila,
2013). Este processo é mediado por alterações fisiológicas como mudanças na
composição da membrana e a expressão de proteínas relacionadas ao estresse, que repara
os danos nas macromoléculas, proteínas de superfície e sistemas de transporte ativos
(Álvarez-Ordóñes et al., 2011; Rychlik e Barrow, 2005). O contato de S. enterica com os
sais biliares induz o sistema SOS, para reparar os danos no DNA causados pelos sais
(Álvarez-Ordóñes et al., 2011)
S. enterica são patógenos intracelulares facultativos que aderem e invadem as
células da mucosa intestinal, principalmente as células M. Estas são células epiteliais
especializadas que capturam antígenos intestinais por endocitose e os transportam para
células linfóides presentes nas placas de Peyer (Jones et al, 1994). A invasão das células
M também permite que as bactérias infectem células epiteliais adjacentes através de sua
superfície basolateral. S. enterica expressa uma série de tipos diferentes de fímbrias,
variáveis de acordo com a sorovariedade bacteriana, que proporcionam a adesão inicial
as células ou a matriz extracelular, mediando à colonização do trato intestinal e
participando no processo de invasão tecidual (Wagner e Hensel, 2011; Figueroa-Ochoa e
Verdugo-Rodriguez, 2005; Van Asten e Van Dijk, 2005).
Outra característica importante de S. enterica é a capacidade de causar intensa
inflamação na mucosa intestinal. Após a passagem de S. enterica pelo epitélio intestinal,
os macrófagos da submucosa detectam e internalizam a bactéria para eliminá-la do
hospedeiro (Sano et al, 2007). No entanto, uma parte delas sobrevive ativando
mecanismos de virulência que permitem a evasão da atividade microbicida das células
6
lisossomais e peptídeos antimicrobianos), possibilitando sua replicação no interior do
vacúolo (Alpuche-Aranda et al, 1994.) Após sua replicação no vacúolo, S. Typhimurium
ativa a caspase-1 (uma cisteína protease que induz apoptose) dentro de macrófagos
infectados, possibilitando o escape das bactérias e infecção de novas células. Esta
ativação ocorre através de diferentes mecanismos, incluindo aqueles produzidos pela
flagelina, por meio do sistema de secreção tipo III, e pela proteína efetora SopE (Hoffman
et al, 2010). S. enterica secreta ativamente monômeros de flagelina que, alcançam a
porção basolateral das células e desencadeiam o processo inflamatório via
reconhecimento por Toll-like receptor 5 (TLR 5) (Zeng et al., 2006; Zeng et al., 2003;
Gewirtz et al., 2001).
produzindo citocinas bioativas que potencializam a inflamação local e promovem
infiltração de fagócitos polimorfonucleares que, por sua vez, internalizam mais bactérias,
levando-as às placas de Peyer e aos linfonodos mesentéricos. Ativando novamente os
mecanismos de apoptose, as bactérias escapam dos fagócitos, passam a colonizar esses
órgãos e podem alcançar a circulação sanguínea através da circulação linfática.
Em um primeiro momento, o processo inflamatório estimulado pela bactéria
parece ser um contrassenso no processo infeccioso, uma vez que levaria a migração de
células do sistema imunológico para o controle da infecção. No entanto, S. enterica
desenvolveu uma série de mecanismos celulares e moleculares para escapar do sistema
imune (revisado por Jantsch et al., 2011). Ao mesmo tempo, radicais reativos de
oxigênio, produzidos durante o processo inflamatório, reagem com tiossulfato formando
tetrationato. Este último é utilizado por S. enterica como aceptor final de elétrons na
cadeia respiratória, produzindo uma vantagem adaptativa frente à microbiota, sendo um
7
S. enterica apresenta Ilhas de Patogenicidade (IP) onde estão presentes a maioria
de Salmonella igne e Blanc-Potard, 2008; Van Asten e Van Dijk, 2005). IPS-1 foi
a primeira a ser descrita (Mills et al., 1995; Galan e Curtiss, 1989) sendo responsável pela
aquisição de ferro e como codificadora do sistema de secreção do tipo III, que está
envolvido na reestruturação do citoesqueleto celular e invasão de células do hospedeiro,
assim como também na indução de inflamação na mucosa intestinal (Malik-Kale et al.,
2011; McGhie et al., 2009; Coburn et al., 2007). A reestruturação do citoesqueleto resulta
em aberturas em regiões específicas na membrana, promovidas por um conjunto de
proteínas que se ligam a actina e impedem sua despolimerização, que permitem a
passagem da bactéria para outras células (McGhie et al., 2009). IPS-2 (Vazquez-Torres
et al., 2000), IPS-3 (Blanc-Potard et al., 1999) e o sistema regulatório de dois
componentes PhoP/PhoQ (Groisman, 2001; McGhie et al., 2009) são os principais
responsáveis pela sobrevivência e multiplicação intracelular.
A regulação dos fatores de patogenicidade em S. enterica é complexa e envolve
tanto processos de regulação transcricional como pós-transcricional (Shen e Fang, 2012;
Cotter e Dirita, 2000). Dentro deste último grupo de reguladores está Hfq, uma proteína
ligante de RNA que regula a expressão pós-transcricional de vários genes em S. enterica,
sendo uma proteína essencial para a virulência (Sittka et al., 2007). Hfq auxilia na
estabilidade do RNA mensageiro S, importante fator de virulência que
medeia à expressão dos genes presente no plasmídeo de virulência de Salmonella (spv),
que são necessários para a infecção sistêmica (Sittka et al., 2007).
1.4. Salmonella e vacinas
8
milhões de pessoas no mundo, estudos se voltaram para encontrar uma forma de proteger
as pessoas expostas a esse patógeno. Na busca de uma vacina eficaz contra a febre tifoide,
diferentes estratégias e formulações vacinais foram testadas, tais como bacterinas, vacinas
de subunidades e linhagens vivas atenuadas (Martin, 2012; Galen et al., 2009; Guzman
et al., 2006). O antígeno capsular Vi purificado, livre ou conjugado com proteínas
carreadoras é imunogênico quando administrado por via intramuscular ou subcutânea e
tem se mostrado efetivo em alguns estudos (Guzman et al., 2006; Strugnell e Wijburg,
2006). Mas como o objetivo de uma vacina contra S. enterica seria a indução do sistema
imune ao nível de mucosa (MALT, do inglês mucosal associated lymphoid tissue), essa
estratégia se mostrou ineficaz já que não atinge esse alvo devido a suas características e
modo de administração. Como a maioria dos microrganismos patogênicos inicia a
infecção colonizando ou invadindo a mucosa, os esforços foram direcionados para o
desenvolvimento de vacinas constituídas por linhagens vivas atenuadas, capazes de
induzir uma resposta imune ao nível do MALT.
A primeira vacina viva atenuada desenvolvida contra a febre tifóide é composta
pela linhagem S. enterica Typhi Ty21a, uma linhagem obtida por mutagênese química da
linhagem parental Ty2 (Germanier e Fürer, 1983). Ela foi introduzida em 1896, sendo
muito usada pelos militares Ingleses e Americanos, levando a grande redução nos casos
de febre tifóide e morte causadas por essa doença (revisado por MacLennan et al., 2014).
Esta vacina oral é segura, mas devido a sua grande atenuação, requer várias doses para
induzir imunidade, que frequentemente é de curta duração e com eficácia de 73%
(Guzman et al., 2006; Strugnell e Wijburg, 2006; MacLennan et al., 2014).
Alguns estudos realizados utilizando uma linhagem de S. enterica Typhi com
deleção nos genes phoP/phoQ e aroA, mostraram que houve uma atenuação excessiva
9
outro lado, uma atenuação insuficiente pode resultar em reatividade, infecção sintomática
e outros efeitos colaterais indesejados, principalmente em hospedeiros com sistema
imune deprimido (Kotton e Hohmann, 2004).
Os resultados alcançados com a linhagem Ty21a levaram outros grupos a
construírem novas linhagens vacinais de S. enterica, contendo deleções em genes
específicos que sejam capazes de atenuar a virulência. Consequentemente, essas
linhagens apresentam uma característica fundamental para vacinas vivas, a estabilidade
da atenuação, alcançada através da deleção de um ou mais genes (Galen et al., 2009;
Guzman et al., 2006; Curtiss e Kelly, 1987). Esses mutantes foram construídos
inicialmente em S. enterica Typhimurium, devido à disponibilidade do modelo murino
para infecção, sendo as mutações promissoras transferidas para linhagens de S. enterica
Typhi, muitas vezes a própria Ty2 (Galen et al., 2009; Guzman et al., 2006). Por meio
dessa estratégia, linhagens mutantes foram construídas e demonstraram-se imunogênicas.
No entanto, frequentemente, testes em voluntários humanos indicaram a ocorrência de
bacteremia e/ou a necessidade de várias doses para a indução de imunidade (Guzman et
al., 2006; Strugnell e Wijburg, 2006). Esses resultados evidenciam a dificuldade de se
ajustar o grau de atenuação da linhagem vacinal para, não comprometer a resposta imune
e ao mesmo tempo não causar efeitos colaterais nas pessoas vacinadas. Mesmo com todos
os esforços para o desenvolvimento de uma vacina eficiente e segura, ainda não existe
uma formulação vacinal totalmente efetiva na proteção contra a febre tifóide.
As características de S. enterica, como sua capacidade de invadir e se manter no
interior de macrófagos e células dendríticas, alida a possibilidade de construir mutantes
atenuados, a fizeram um excelente carreador de antígenos a células do sistema imune.
Sendo assim, estudos foram realizados utilizando linhagens atenuadas que foram
10
microrganismos, construindo linhagens vacinais multifatoriais. Essas linhagens foram
capazes de induzir resposta imune protetora contra salmonelose e também contra o
organismo doador do antígenos heterólogo (Cheminay e Hensel, 2007; Kwon et al., 2007;
Loessner et al., 2007; Mahoney et al., 2007; Atkins et al., 2006, Oliveira et al., 2007,
Brocchi et al., 1999).
1.5. O Nucleóide Bacteriano e as Nucleoid-associated proteins (Naps)
Para que o material genético ocupe uma área mais restrita dentro da bactéria há
uma série de mecanismos que permitem a compactação do cromossomo bacteriano. O
DNA cromossômico é condensado por meio de proteínas de baixo peso molecular que se
associam ao nucleóide (Naps Nucleoid-associated proteins) e influenciam a topologia
do DNA (Luijsterburg et al., 2006). O enovelamento do DNA e os fatores que influenciam
essa compactação começaram a ser descritos na década de 1970.No entanto, a primeira
investigação completa e sistemática das Naps foi realizada por Azam e Ishihama et al.
em 1999, que catalogou as diferentes Naps de Escherichia coli, medindo suas afinidades
de ligação, investigando seus alvos preferenciais e quantificando seus níveis. As NAPs
mais bem descritas são IHF, FIS e H-NS (Mangan et al, 2006).
A associação das Naps ao DNA não influencia somente a conformação do
material genético, mas também influencia a replicação, recombinação, reparo e
transcrição, desempenhando uma importante função na regulação transcricional de genes que respondem à mudanças ambientais (Fang e Rimsky, 2008; McLeod e Johnson, 2001).
A composição protéica do nucleóide bacteriano reflete as necessidades celulares para que
a célula se adapte às diversas condições ambientais ou fase de crescimento (Azam e
11
A proteína IHF (Integration Host Factor) é um heterodímero composto pelas
subunidades (IHF- ) e (IHF- ), codificados pelos genes ihfA e ihfB, respectivamente.
Apesar de ser mais encontrado como heterodímero é possível observar a formação de
homodímeros no interior da célula (Magan et al, 2006). Estes genes são encontrados em
locais distintos no cromossomo, são sujeitos a influências regulatórias independentes
(Aviv et al, 1994) e sua expressão aumenta no início da fase estacionária de crescimento
(Magan et al, 2006). IHF impõe ao DNA curvaturas de aproximadamente 180º (Lorenz
et al., 1999), sendo essa atividade capaz de induzir importantes alterações topológicas no
DNA (Dorman, 2009; Thanbichler et al., 2005), modulando a expressão de vários genes,
e outros eventos celulares, como recombinação sítio específica, replicação e transposição
(Dorman, 2009; Goosen e van de Putte, 1995).
Em S. enterica, IHF controla a expressão do operon pnt, piridina nucleotídeo transidrogenase enzima importante na respiração celular, (Palacios &
Escalante-Semerena, 2000) e dos genes cysJIH,
fosfosulfato em sulfeto (Sirko et al, 1998). IHF também pode regular a expressão gênica
da enzima carbamoilfosfato sintetase, responsável por catalisar a formação de
carbamoilfosfato, precursor da arginina e pirimidinas (Charlier et al, 1995).
Além disso, IHF estimula a expressão do gene fis, cujo produto é necessário para
a inversão eficaz do fragmento hin, que controla a variação de fase das flagelinas
FliC-FljB em Salmonella (Beach & Osuna, 1998). Em consequência a perda da expressão de
IHF, as populações bacterianas expressam exclusivamente fliC ou fljB por causa da
redução da inversão do fragmento hin. Um mutante deficiente em ihfA expressa somente
fljB e outro deficiente em ihfB expressa somente fliC (Mangan et al, 2006). Fis (Factor for inversion) é a Nap de E. coli mais abundante na fase exponencial de crescimento, mas
12
Dorman, 2007; Ali-Azam et al., 1999). Uma função biológica relevante de Fis é a
ativação da expressão de genes envolvidos na maquinaria de tradução, tais como operons
de RNA e de fatores de tradução (Thanbichler et al., 2005). Dessa forma, observar-se a
grande influência da proteína IHF, que além de controlar diversos processos celulares
através de sua ligação direta ao DNA bacteriano, tem a capacidade influenciar a expressão
de outras Naps, com funções específicas.
Dados prévios de nosso grupo indicaram que mutantes nulos de S. enterica
Typhiurium para ihfA ou ihf
mutações e recombinações adicionais no genoma (Murphy K. C., Campellone K. G..
2003. Lambda Red-mediated recombinogenic engineering of enterohemorrhagic and
enteropathogenic E. coli. BMC Mol. Biol. 4:1) sendo necessário o uso de passos
adicionais na construção de mutantes por este sistema. Dentro de uma grande população
de bactérias é possível encontrar algumas que contêm uma camada de LPS incompleta.
Estas são mais facilmente transformadas por eletroporação. Desta forma, após as etapas
de eletroporação é possível que sejam selecionadas colônias que sofreram recombinação,
mas cujo LPS é incompleto. Bactérias com LPS incompleto são mais suscetíveis à ação
do sistema imune e menos imunogênicas. Desta forma, em um estudo anterior realizado
no laboratório (Damiani, 2011), as mutações foram transferidas para linhagens selvagens
de S. enterica por transdução, utilizando o fago P22. No presente trabalho, as mutações
foram complementadas pela expressão dos genes selvagens a partir de plasmídeos. As
linhagens resultantes foram testadas para diferentes características fenotípicas e
13 2. OBJETIVOS
2.1. Geral
Aprofundar estudos na caracterização de mutantes simples de S. enterica
Typhimurium nulos para ihfA ou ihfB e construir o duplo mutante, nulo para os genes ihfA e ihfB, em linhagem de S. enterica Typhimurium.
2.2. Específicos
Caracterizar linhagem de S. enterica Typhimurium STm ihfA ihfB
quanto a diversos aspectos fenotípicos, tais como: curva de crescimento,
resistência a sais biliares, resistência a pH ácido, crescimento em fase estacionária,
motilidade, invasão e sobrevivência em macrófagos;
Construir o mutante nulo para os genes ihfA e ihfB na linhagem de S. enterica
Typhimurium STm662;
14 3. MATERIAIS E MÉTODOS
3.1. Linhagens Bacterianas
As linhagens utilizadas no presente trabalho estão descritas na Tabela 1. A linhagem
selvagem Salmonella enterica Typhimurium 662 (STm662) pertencem à coleção do
Laboratório de Genômica e Biologia Molecular Bacteriana (LGBMB), tendo sido isolada
de paciente humano com quadro de enterite e previamente caracterizada quanto aos fatores
de patogenicidade comuns de S. enterica . O uso dessa linhagem em pesquisa foi
previamente aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (HCRP n°2997/2005). As linhagens mutantes para os genes ihfA e ihfB de S. enterica Typhimurium foram
(Mendes, 2008). Estas linhagens foram
ihf ihfB) e duplo
ihfA ihfB) por transdução com fago P22 (Tabela 1).
Para assegurar que as linhagens utilizadas nas experiências tenham LPS completo,
foi realizada em um trabalho anterior, uma etapa de transdução com o bacteriófago P22
(Damiani, 2011). Assim, através do bacteriófago, o cassete de recombinação foi
transferido do genoma da bactéria transformada para o de uma linhagem selvagem que não
foi eletroporada, gerando um mutante com LPS completo, uma vez que o fago depende do
15
Tabela 1. Linhagens bacterianas de Salmonella enterica Typhimurium.
Bactérias Procedência
STm662 Linhagem selvagem LGBMB
ihfA* STm662 contendo deleção do gene ihfA LGBMB
ihfB* STm662 contendo deleção do gene ihfB LGBMB
ihf ihfB* STm662 contendo deleção dos genes ihfA
e ihfB
LGBMB
* Linhagens obtidas por transdução com fago P22
3.2. Meios de cultura e armazenamento das linhagens bacterianas utilizadas
Os meios de cultura utilizados foram o caldo LB (Luria Bertani), LB-Ágar e Meio
Mínimo M9 (Sambrook e Russell, 2001). Ao longo do desenvolvimento dos ensaios
propostos no projeto, a pureza das culturas bacterianas foi verificada por crescimento em
ágar MacConkey e ágar SS (Oxoid do Brasil Ltda, São Paulo, SP). As linhagens
bacterianas foram estocadas a -80 C em LB líquido com glicerol 30% (v/v).
Antes de dar início a qualquer ensaio com as linhagens bacterianas em estoque sob -80oC, foi realizado um inóculo para cultivo bacteriano, o qual consistiu em obter
uma alíquota da cultura estoque com o auxilio de uma alça bacteriológica e a inocular em
um tubo de polipropileno de 15 mL contendo 3 mL de caldo LB. Este inóculo era então
16
3.3. Complementação dos mutantes de S. enterica para os genes ihfA e ihfB
A reversão dos mutantes ao fenótipo selvagem foi realizada a partir da clonagem
do respectivo gene (ihfA e ihfB) no vetor de clonagem pACYC 184 (Figura 1). Para isso,
foram construídos iniciadores (Tabela 2), a partir do genoma da linhagem S. enterica
Enteritidis P12 5109, que amplificassem a região reguladora e codificadora dos genes
ihfA e ihfB, adicionando em suas extremidades, sequências reconhecidas pelas enzimas
de restrição NcoI e EcoRI. As reações de PCR foram feitas para um volume final de 50
, utilizando Tampão 10X para PCR (Biotools), dNTP mix (0,2 mM cada), MgCl2 (2
mM), os iniciadores (1 µM cada), a enzima DNA Polymerase (1,25 U) e o DNA proveniente de uma colônia isolada em placa de LB, seguindo a programação no
termociclador: 1º estágio de 95ºC/4min (1 ciclo), 2º estágio de 95ºC/30seg, 58ºC/30seg,
72ºC/45seg (35 ciclos) e 3º estágio 72ºC/10min. Os produtos da PCR foram confirmados
em gel de agarose (1,0 % m/v) e purificados por Wizard® Genomic DNA Purification Kit
(Promega). Tanto os produtos purificados, quanto o plasmídio pACYC 184 foram
digeridos com as enzimas NcoI e EcoRI por incubação por 1 hora e 30 minutos à 37°C,
°C por 10 min. Os DNAs foram então submetidos a reação de ligação com T4 DNA ligase
e a enzima foi inativada incubando a 65 °C por 10 min. Os possíveis vetores
recombinantes foram eletroporados em células de E. coli
o auxílio do eletroporador (Eletroporador Bio Rad. Gene Pulser II, Hercules - CA, USA,
aj
tetraciclina. Posteriormente, os clones obtidos foram submetidos a uma extração de DNA
plasmidial para a verificação do perfil de bandas em relação ao pACYC 184 sem o inserto
17
digestão com as enzimas de restrição e amplificação por PCR foi utilizado como vetor
para a complementação dos mutantes nulos de S. enterica Typhimurium para os genes
ihfA e ihfB. Os vetores recombinantes foram transformados em células de S. enterica
Typhimurim ihf ihfB eletrocompetentes e selecionados em ágar
LB contendo tetraciclina. Estes experimentos foram realizados em conjunto com a
Doutoranda Camila Pinheiro do Carmo (LGBMB UNICAMP).
Tabela 2. Sequência dos iniciadores utilizados na construção de plasmídios pACYC184
recombinantes para complementação dos mutantes da linhagem STm662.
Iniciador Sequência
IhfAc - F 5´ - GCGCCGAATTCCGGGAGATTTCACGCTTC - 3´
ihfAc - R 5´ - GCGGCCCATGGGTTATACGGGTCATCTTTCAGG - 3´
ihfBc - F 5´ - GCGCCGAATTCAGCATTCAAAGCAGCTAAAGG - 3´
18
Figura 1: Mapa do vetor de clonagem pACYC184 utilizado na clonagem dos genes ihfA
e ihfB (Fonte: New England Biolabs). As setas indicam o local onde as enzimas EcoRI e
NcoI clivam o plasmídeo.
3.4. Construção do duplo mutante ihf ihfB
Para realizar a construção do duplo mutante o primeiro passo foi retirar o cassete
de resistência ao cloranfenicol presente no genoma do mutante simples. Foram utilizadas
ihfA:cat complementada com
19
de reconhecer as regiões FRTs que flanqueam o cassete de resistência, e por meio de
recombinação homóloga retira o gene de resistência ao cloranfenicol, deixando uma
cicatriz FRT no genoma. A linhagem complementada foi utilizada na construção do
duplo mutante, pois o plamídeo pCP20 necessita da presença das duas subunidades da
proteína IHF para ser replicado. A eletroporação foi realizada conforme descrito
anteriormente e as células transformadas foram selecionadas em placas de ágar LB com
ampicilina (25 por 18 horas a 37ºC. Em seguida, as colônias
selecionadas foram incubadas em caldo LB a 43ºC durante a noite, pois devido à sua
origem de replicação termo-sensível, o plasmídio pCP20 é perdido durante o crescimento
a essa temperatura. Após esse passo, a bactéria foi plaqueada em ágar MacConkey e para
confirmar a retirada do cassete de resistência e a perda do plasmídeo pCP20, as colônias
isoladas foram crescidas em três placas, uma de ágar LB com ampicilina, uma de ágar LB
com cloranfenicol e a última de ágar LB sem nenhum antibiótico. As colônias que
cresceram na placa de ágar LB sem antibiótico e não cresceram nas outras duas placas
foram selecionadas e a confirmação dos clones sem resistência ao cloranfenicol foi
realizada através de amplificação por PCR (Tabela 3).
O passo seguinte para a construção do duplo mutante foi realizado seguindo o
princípio da transdução. Para isso, ihfB foi inoculada em um
tubo de polipropileno de 15 mL contendo 3 mL de caldo LB. No dia seguinte, em um
tubo de polipropileno de 50 mL foram adicionados 2 mL da suspensão de fago P22
originário da linhagem 125109 ihfB ativada, e
deixados sob agitação durante a noite. No mesmo dia, a cultura da célula receptora
STm662 ihfA sem resistência ao cloranfenicol foi ativada. O próximo passo foi transferir
1,5 mL da combinação do fago com as células doadoras para microtubos de 2 mL,
20
quatro minutos. O conteúdo do microtubo foi filtrado utilizando filtro de 0,22 µm,
evitando o clorofórmio e o sedimento. Em um microtubo acrescentou-se 100 µL da célula
receptora STm662 ihfA sem resistência ao cloranfenicol e 100 µL da suspensão de fagos,
e essa combinação foi incubada por quinze minutos a 37ºC sem agitação. Após o período
de incubação, todo o volume foi plaqueado em LB ágar com cloranfenicol. As colônias
que cresceram na placa foram selecionadas e o duplo mutante foi confirmado através de
uma reação de PCR com iniciadores específicos (Tabela 3), utilizando a seguinte
programação no termociclador: 1º estágio de 95ºC/1min (1 ciclo), 2º estágio de
95ºC/1min, 60ºC/1min, 72ºC/30seg (30 ciclos) e 3º estágio 72ºC/10min.
A retirada do plasmídeo pACYC184, utilizado na complementação dos mutantes
simples e necessário para a retirada do cassete de resistência, foi realizada através de
passagens consecutivas em LB ágar contendo uma concentração crescente de sais de
níquel (1,0 mM a 1,5mM).
Tabela 3. Sequência dos iniciadores utilizados na detecção dos mutantes simples e duplo
na linhagem STm662. Iniciador Sequência ihfADT - f 5´ - TTGCGGAGGGTTATAAGAGC - 3´ ihfADT - r 5´ - GCGTGATTTTACGGTGGGTA - 3´ ihfBDT - f 5´ - GTTTCGGCCTGTAATCAAGC - 3´ ihfBDT - r 5´ - TTTTCGGTCGAATAGCGTTT - 3´
21
3.5. Caracterização fenotípica dos mutantes de S. enterica Typhimurium
3.5.1. Curva de crescimento
O crescimento bacteriano foi avaliado in vitro para verificar a influência das
mutações no tempo de geração (duplicação) dos mutantes comparado a linhagem
selvagem. Para isso, foi realizado um pré-inocúlo das linhagens selvagem e mutantes, no
dia anterior ao ensaio, nas condições anteriormente descritas. Para iniciar o experimento,
-inóculo em um frasco Erlenmeyer (250 mL) contendo 50 mL de caldo LB (diluição 1:1000). O conteúdo do Erlenmeyer foi
homogeneizado e em seguida realizada a primeira leitura de densidade ótica (DO
coletadas, diluídas em solução salina (0,85%) (1:10) e a quantidade de
diluições selecionadas, foram plaqueadas em ágar LB. O crescimento bacteriano foi
acompanhado ao longo de 12 horas, e a cada hora foram realizados a leitura da densidade
a quantidade de UFC/mL.
3.5.2. Ensaio de sobrevivência sob condições ácidas
A sobrevivência sob condições ácidas foi avaliada in vitro para verificar a influência das mutações na capacidade da bactéria sobreviver em condições de estresse,
no caso o pH ácido. Para isso, foi realizado um pré-inóculo das linhagens selvagem e
mutantes, no dia anterior ao ensaio, nas condições anteriormente descritas (item 3.2). Para
22
Erlenmeyer (250 mL) contendo 45 mL de caldo LB com pH 2,6 (diluição 1:10), ajustado
com o acréscimo de HCl 1M. O conteúdo do Erlenmeyer foi homogeneizado e colocado
das culturas foram coletadas, diluídas em salina (0,85%)
diluições selecionadas, foram plaqueadas em ágar LB para determinação da quantidade
de UFC/mL. A comparação das médias foi realizada pelo teste de Tukey, utilizando o
programa ASSISTAT Versão 7.7 Beta (2015).
3.5.3. Ensaio de crescimento na presença de sais biliares
Da mesma forma que o ensaio anterior, a sobrevivência na presença de sais
biliares foi avaliada in vitro para verificar a influência das mutações na capacidade da
bactéria sobreviver em condições estressantes, nesse experimento, na presença de sais
biliares. Para isso, foi realizado um pré-inóculo das linhagens selvagem e mutantes, no
dia anterior ao ensaio, nas condições anteriormente descritas. Para iniciar o experimento,
-inóculo em um frasco Erlenmeyer (250 mL)
contendo 50 mL de caldo LB e 0,85% de sais biliares (diluição cultura 1:100). Após esse
procedimento foi realizada a primeira leitura de densidade ótica (DO) e determinação da
quantidade de UFC/mL. A sobrevivência na presença de sais biliares foi acompanhada ao
terminação
da quantidade de UFC/mL em ágar LB a cada hora. A determinação da quantidade de
23
3.5.4. Ensaio de sobrevivência na fase estacionária de crescimento
Para testar a capacidade de sobrevivência das linhagens selvagem e mutantes de
S. enterica Typhimurium à falta de nutrientes, estas foram crescidas em 3 ml de meio
mínimo M9 sob agitação (150 rpm) a 37 -inóculo foi
inoculada em um frasco Erlenmeyer (250 mL) contendo 50 mL de meio mínimo M9
(diluição 1:100). Após 1 e 6 dias de crescimento, alíquotas foram retiradas, diluídas e
plaqueadas em ágar LB para determinação da UFC/mL. A determinação da quantidade
de UFC foi realizada da mesma forma descrita anteriormente. A sobrevivência após seis
dias de incubação foi determinada e comparada com a obtida após um dia de cultivo.
3.5.5. Ensaio de motilidade
A motilidade de cada linhagem foi testada observando sua capacidade de movimentação em meio semi-sólido. Para tanto, foi realizado um pré-inóculo das
linhagens a serem testadas em 3 mL de caldo LB e as culturas incubadas durante a noite
a 37ºC sob agitação (150 rpm). No dia seguinte, 1 µL destas culturas foram inoculadas
em forma de ponto, com o auxílio de uma ponteira, no centro de placas de meio LB com
0,35% ágar. Após 11 horas, o halo de crescimento foi avaliado e medido (duas medidas
perpendiculares por halo) com o auxílio de uma régua ou paquímetro digital. Os testes
24
3.5.6. Ensaio de invasão e sobrevevivência em macrófagos
Esses ensaios foram realizados para observar a capacidade das linhagens em
invadir e sobreviver no interior de macrófagos, e verificar a influência das mutações nessa
capacidade.
3.5.6.1. Preparo das linhagens bacterianas
A linhagem bacteriana selvagem utilizada como controle e as linhagens mutantes
e complementadas, foram semeadas em caldo LB e incubadas por 18 horas a 37ºC sob
agitação (150rpm).
3.5.6.2. Preparo da célula J774A.1
As células foram cultivadas em microplacas (Costar, 3524) com 24 poços em
estufa a 37°C, com 5% de CO2. Cada poço continha 1 mL de meio RPMI (Sigma Aldrich),
acrescido de 10% de soro fetal bovino e
monocamadas foi acompanhado pela observação em microscópio invertido. A cultura foi
considerada ideal para o teste quando as células apresentavam uma monocamada
uniforme.
3.5.6.3. Invasão
Os poços da microplacas contendo as células J774 foram lavados duas vezes com
PBS pH 7,4 esterilizado (37°C) para retirar o meio contendo antibiótico. Foram
25
contendo aproximadamente 106 bactérias, e as placas incubadas a 37ºC por uma hora.
Após esse período, o meio de cultura foi descartado e as células lavadas duas vezes com
PBS (pH 7,4). Em seguida, foi adicionado 1 mL de meio RPMI com 10% de soro fetal
amicina, em cada poço, e as placas incubadas por
uma hora e trinta minutos a 37ºC em estufa de 5% de CO2 (Shel Lab, modelo TC2323).
Após a incubação, as células foram lisadas utilizando Triton X 0,1% (preparado em água
deionizada) e plaqueadas para contagem das bactérias. A suspensão obtida foi diluída (em
diluições seriadas 1:10) e plaqueadas em ágar LB. As placas de ágar LB foram incubadas
a 37ºC durante a noite, as colônias contadas e o número de unidades formadoras de
colônias por mL foi determinado. A comparação das médias foi realizada pelo teste de
Tukey, ao nível de 5% de significância, utilizando o programa ASSISTAT Versão 7.7
Beta (2015).
3.5.6.4. Sobrevivência
Os poços da microplacas contendo as células J774 foram lavados duas vezes com
PBS pH 7,4 esterilizado (37°C) para retirar o meio contendo antibiótico. Foram
adicionados 990 µL do meio RPMI com 10% de soro fetal bovino e 10µL de caldo LB contendo aproximadamente 106 bactérias, e as placas incubadas a 37ºC por uma hora.
Após esse período, o meio de cultura foi descartado e as células lavadas duas vezes com PBS (pH 7,4). Em seguida, foi adicionado 1 mL de meio RPMI com 10% de soro fetal
uma hora e trinta minutos a 37ºC em estufa de 5% de CO2 (Shel Lab, modelo TC2323).
Após a incubação, o meio de cultura foi descartado e as células lavadas duas vezes com
26
de 5% de CO2. Logo após o período de incubação, as células foram lisadas utilizando
Triton X 0,1% (preparado em água deionizada) e plaqueadas para contagem das bactérias.
A suspensão obtida foi diluída e plaqueada em meio LB ágar. As placas de LB ágar foram
incubadas a 37º C durante a noite, as colônias contadas e o número de unidades
formadoras de colônias por mL foi determinado. A comparação das médias foi realizada
pelo teste de Tukey, ao nível de 5% de significância, utilizando o programa ASSISTAT
Versão 7.7 Beta (2015).
3.6. Quantificação da transcrição dos genes ihfA e ihfB através de qRT-PCR
início da fase estacionária foi extraído através do Rneasy Mini Kit (Quiagen) e tratados
com Dnase I, Amplification Grade (Sigma Aldrich). Os experimentos foram realizados
-min a 95°C, 40 cic
RT-PCR Master Mix QuantiTect RT Mix (enzima)
-free suficiente para um volume final
concentrações de RNA conhecidas. Os dados foram normalizados utilizando níveis de
expressão do gene rpoD (subunidade sigma da RNA polimerase) e analisados utilizando
CT). As barras de erros representam os
27
Tabela 4. Sequência dos iniciadores utilizados na quantificação da transcrição dos genes
ihfA e ihfB através de qRT-PCR.
Iniciador Sequência rpoDRT - F GCATCTGGGTGATTTCATCGA rpoDRT - R CCAGCCAAAACGTCGTGAGT ihfART - F 5´ - GGTGAAACTCTCTGGTTTTGGTAAC - 3´ ihfART - R 5´ - CGCCCCGGACGTTGAT - 3´ ihfBRT - F 5´ - AGCATATGGCCTCGACTCTTG - 3´ ihfBRT - R 5´ - CCGAAACCGCGGATTTC - 3´
3.7. Caracterização dos mutantes de S. enterica Typhimurium in vivo
3.7.1. Animais
Os camundongos BALB/c foram adquiridos do Centro Multidisciplinar para
Investigação Biológica na Área da Ciência em Animais de Laboratório da UNICAMP
(CEMIB). Os animais, com idade de 4 semanas, foram acondicionados em
microisoladores de policarbonato em racks ventilados (Alesco, Brasil), em condições
livres de patógenos, no Laboratório de Experimentação Animal, composto por uma sala
com ciclo claro/escuro de 12 horas, temperatura e umidade controladas. Durante o período experimental, os animais foram alimentados com ração comercial (Nuvilab,
Brasil) e água a vontade, ambos esterilizados por autoclavagem. Os experimentos foram
28 3.7.2. Ensaio de Confirmação da Atenuação
Este experimento foi realizado para confirmar os dados prévios obtidos no
laboratório. Nesse ensaio, as amostras das linhagens selvagem STm662, e mutantes
ihf ihfB foram cultivadas em tubos contendo 3 mL de caldo LB
durante a noite e uma alíquota de 1,650 mL foi acrescentada em um frasco Erlenmeyer
(250 mL) contendo 50 mL de caldo LB (diluição 1:30). O crescimento bacteriano com
agitação de 150 rpm a 37 ºC foi acompanhado até DO 0,8 a 0,9 (
esse valor de DO, o material foi centrifugado por 15 minutos a 4oC, o sobrenadante foi
descartado e as células foram ressuspendidas em 50 mL de PBS. Nova centrifugação foi
realizada nas mesmas condições, o sobrenadante foi descartado novamente e as células
ressuspendidas em 1,250 mL de PBS. Uma diluição seriada foi realizada em PBS, e as
células puras e as diluições escolhidas (107, 108 e 109) foram inoculadas oralmente em
camundongos BALB/c fêmeas com 6 a 8 semanas de idade. A sobrevivência dos
camundongos foi avaliada durante 30 dpi (dias pós-infecção).
3.7.3. Ensaio de desafio e proteção
Nos experimentos de proteção, camundongos BALB/c fêmeas com 6 a 8 semanas
de idade, foram imunizados com duas doses orais (CFU de aproximadamente 107 células)
ihf ihfB nos dias 0 e 21, e desafiados no
39 dia após a primeira imunização com a linhagem selvagem STm662 nas doses de 10
a 100 vezes a DL50. A preparação das bactérias que foram inoculadas nos animais foi
29
em 1,250 mL de PBS, elas foram diluídas em 1:10 e foram inoculadas via oral nos
camundongos. A taxa de sobrevivência, assim como o retardo na mortalidade foram
30 4. RESULTADOS
4.1. Complementação dos mutantes de S. enterica para os genes ihfA e ihfB
Antes de eletroporar o plasmídeo nas bactérias, foi realizada a digestão desse vetor
utilizando as enzinas NcoI e EcoRI para confirmar se o vetor apresentava os genes de
interesse. A Figura 2 confirma a presença dos genes ihfA e ihfB no vetor pACYC184, que
ihf ihfB,
respectivamente. A digestão gerou bandas de 715 pb quando o inserto era o gene ihfA e
de 557 pb quando o inserto era o gene ihfB.
Figura 2 - Eletroforese em gel de agarose (1%) demonstrando o perfil eletroforético da
digestão do vetor pACYC184 com os insertos ihfA e ihfB. 1 Marcador molecular de 1 Kb (Promega); 2 e 3 Plasmídio pACYC184:ihfA digerido com as enzimas NcoI/EcoRI;
4 e 5 coluna Plasmídio pACYC184:ihfB digerido com as enzimas NcoI/EcoRI.
700 pb 500 pb
31 4.2. Construção do duplo mutante
O plasmídeo pCP20 foi eletroporado na linhagem ihfA:cat contendo o
plasmídio pACYC184:ihfA e através de recombinação sítio específica, por ação de uma
flipase, o cassete de resistência foi reconhecido e retirado do genoma, gerando uma ihfA (Figura 3).
A deleção do gene ihfB na linhagem ihfA sem o cassete de resistência
ao cloranfenicol, foi realizada através da transdução da mutação com o auxílio do fago
P22. Através de recombinação homóloga o gene ihfB foi substituído no genoma pelo
cassete de resistência ao cloranfenicol, gerando o mutante com a deleção dos genes ihfA
e ihfB. Na Figura 4 é possível observar um padrão de bandas que confirma a deleção do
gene ihfA, com a cicatriz gerada pela retirada do cassete de resistência, e do gene ihfB,
32
Figura 3 - Eletroforese em gel de agarose (1%) da amplificação de DNA por PCR para
confirmação da retirada do cassete de resistência ao cloranfenicol. PCR realizada com
DNA genômico das linhagens e os iniciadores ihfADTs. 1 Marcador molecular de 1 Kb
(marca); 2 - STm662 (623 pb); 3 - ihfA:cat (1500 pb); 4 a 8 ihfA
complementado sem o cassete de resistência (456 pb); 9 Controle negativo, água
ultrapura.
Figura 4 - Eletroforese em gel de agarose (1%) demonstrando os produtos de
amplificação por PCR com diferentes pares de iniciadores e DNA genômico das
500 pb 700 pb 1500 pb 1 2 3 4 5 6 7 8 9 500 pb 700 pb 1500 pb 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11
33
linhagens como molde, para confirmar a construção do duplo mutante. 1 Marcador
molecular de 1 Kb (Promefa); 2 - STm662 amplificado com os iniciadores ihfADTs; 3 -
STm662 amplificado com os iniciadores ihfBDTs; 4 - ihfA:cat amplificado
com os iniciadores ihfADTs; 5 - ihfB:cat amplificado com os iniciadores
ihfBDTs; 6 - ihfA ihfB colônia 1 amplificado com os iniciadores ihfADTs; 7
- ihfA ihfB colônia 1 amplificado com os iniciadores ihfBDTs; 8 -
ihfA ihfB colônia 2 colônia 1 amplificado com os iniciadores ihfADTs; 9 - ihfA ihfB colônia 2 amplificado com os iniciadores ihfBDTs; 10 e 11
Controle negativo, água ultrapura.
4.3. Curva de crescimento das linhagens selvagem e mutantes
Para verificar se a ausência dos genes ihfA ou ihfB influência a taxa de
crescimento de Salmonella enterica Typhimurium, foi realizada a curva de crescimento.
Obteve-se a medida de crescimento através da leitura da densidade ótica em 600 nm
(Figura 5A) e alíquotas foram retiradas e plaqueadas em ágar LB para determinação da
CFU/mL (Figura 5B), a cada uma hora, durante doze horas. Não foi observada nenhuma
ihf ihfB, quando
comparadas com a linhagem selvagem. Este resultado demonstra que a ausência desses
34
Figura 5 - ihfA e
ihfB com a linhagem selvagem STm662. A - Baseada na leitura da densidade
B - Baseada na quantidade de UFC/mL. Ensaio realizado em
triplicata. 0 0,5 1 1,5 2 2,5 3 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 TEMPO (HORAS) STm662 6 6,5 7 7,5 8 8,5 9 9,5 10 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 TEMPO (HORAS) STm662
A
B
35 4.4. Sobrevivência sob condições ácidas
Para observar algum envolvimento da proteína IHF na capacidade da bactéria
sobreviver em ambiente com pH ácido, foi realizado o ensaio de sobrevivência sob
condições ácidas. A bactéria foi incubada em caldo LB pH 2,6, e nos tempos de dez
minutos e uma hora, aliquotas foram coletadas e plaqueadas em LB ágar, para
determinação da UFC/mL.
A ihf ihf ihf ihfB
em sobreviver nas condições ácidas foi menor em comparação com a linhagem selvagem,
na análise realizada dez minutos após o inóculo das bactérias (p<0,01). Enquanto que, na
ihfA e
ihf ihfB apresentaram uma capacidade reduzida em sobreviver no caldo LB
pH 2,6 (p<0,01). Na tabela 5 é pode-se observar a porcentagem de bactérias que
sobreviveram dez minutos e uma hora após o inóculo em caldo LB pH 2,6. Os dados
sugerem que a proteína IHF apresenta um envolvimento na adaptação da bactéria ao
36
Figura 6 - Ensaio de sobrevivência sob condições ácidas. Baseado no número de
UFC/mL do inóculo, dez minutos após o inóculo e uma hora após o inóculo das bactérias
em caldo LB pH 2,6. Ensaio realizado em triplicata.
Tabela 5. Ensaio de sobrevivência sob condições ácidas. Porcentagem de bactérias
sobreviventes dez minutos e uma hora após o inóculo em caldo LB pH 2,6.
Bactérias Tempo 0 10 minutos Desvio Padrão 1 hora Desvio Padrão STm662 100% 50,77% 8,25 1,33% 0,53 STm662 ihfA 100% 15,69% 1,22 0,02% 0,008 STm662 ihfB 100% 9,01% 3,61 0,12% 0,09 STm662 ihfAc 100% 30,07% 10,34 0,16% 0,05 STm662 ihfBc 100% 41,25% 29,2 0,03% 0,04 STm662 ihf ihfB 100% 14,64% 2,27 0,009% 0,005 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 STm662 STm662