• Nenhum resultado encontrado

RELAÇÕES ENTRE AS REALIDADES CONCRETA E PENSADA: CONCEPÇÕES DE PROFESSORES NA UTILIZAÇÃO DE IMAGENS VISUAIS NO ENSINO DE FÍSICA 1

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "RELAÇÕES ENTRE AS REALIDADES CONCRETA E PENSADA: CONCEPÇÕES DE PROFESSORES NA UTILIZAÇÃO DE IMAGENS VISUAIS NO ENSINO DE FÍSICA 1"

Copied!
11
0
0

Texto

(1)

RELAÇÕES ENTRE AS REALIDADES CONCRETA E PENSADA:

CONCEPÇÕES DE PROFESSORES NA UTILIZAÇÃO DE IMAGENS VISUAIS

NO ENSINO DE FÍSICA1

Sheila Cristina Ribeiro Rego Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências e Matemática/CEFET/RJ

Resumo

Para os videntes, as imagens visuais permeiam nosso cotidiano em várias esferas da vida: propaganda, cinema, artes plásticas, ensino escolar, entre outras. Todas elas fazem parte de alguma área do conhecimento, tendo uma história de produção, sendo criadas por determinadas comunidades, direcionadas a leitores específicos e com objetivos diversos, mas, sempre com a intenção de produzir significado na mente de quem lê. A imagem em livros didáticos de Física do ensino médio tem sido o objeto de investigação de pesquisas com diferentes perspectivas. O presente estudo buscou compreender como professores de Física trabalham com imagens visuais que representam as realidades concreta (cotidiana) e pensada (abstrata) tendo em vista uma situação de ensino. Para isso, primeiramente, trazemos uma reflexão sobre a representação da realidade no ensino de ciências, mais especificamente, no que diz respeito ao ensino de Física, tendo em vista as reflexões de Bachelard (1996) e Medeiros e Medeiros (2001). Em seguida, tratamos do que se espera das imagens presentes em livros didáticos de Física, a partir dos critérios de avaliação do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), já que o livro didático é um recurso amplamente utilizado na formação acadêmica de professores de ciências naturais (KHUN 2005), e, geralmente, presente em sua atuação profissional. No grupo pesquisado, composto por 11 professores que atuam no nível médio, percebemos que, numa situação de ensino apresentada por um questionário, a maioria prefere começar com o uso de imagens do cotidiano (realidade concreta) para, em seguida, utilizar as imagens próprias da ciência (realidade pensada). Consideramos relevante investigar as formas como lidamos com imagens de diferentes realidades, buscando-se compreender as concepções que carregamos sobre a maneira como chegamos à elaboração dos conceitos científicos.

Palavras-chave: imagem, Física, realidade. Introdução

Para os videntes, as imagens visuais permeiam nosso cotidiano em várias esferas da vida: propaganda, cinema, artes plásticas, ensino escolar, entre outras. Todas eles fazem parte de alguma área do conhecimento, tendo uma história de produção, sendo criados por determinadas comunidades, direcionados a leitores específicos e com objetivos diversos, mas, sempre com a intenção de produzir significado na mente de quem lê.

Não é novidade a utilização da imagem no ambiente escolar, e, mais precisamente, em materiais didáticos. Data de 1685 o primeiro livro didático em que as

(2)

imagens possuíam um papel fundamental na transmissão do conhecimento, o Orbissensualiumpictus(Mundo sensível ilustrado) de Comenius (COMENIUS, 1685 apud CHALMEL, 2004). Nele, a imagem era utilizada para substituir objetos que deveriam ser manipulados para um melhor aprendizado, mas que, por vários motivos, não se encontravam disponíveis ao professor e aos alunos.A imagem era uma ferramenta para ilustrar o texto verbal. Embora, desde a época de Comenius até agora, tenhamos tido um desenvolvimento científico e tecnológico que possibilite um uso em sala de aula de diferentes mídias para a imagem visual (fotografia, revistas, jornais, apresentações em slides, vídeo, simulações computacionais, histórias em quadrinhos etc), o livro didático continua sendo “um mediador preferencial nas interações discursivas realizadas em salas de aula de ciências” (BITTENCOURT, 2004 apud GOUVÊA; MARTINS; IZQUIERDO, 2006)

No Brasil, estudos realizados por Martins, Gouvêa e Piccini (2003 apud GOUVÊA; MARTINS; IZQUIERDO, 2006), indicam que dependendo do nível de ensino, os livros didáticos de ciências se utilizam de imagens com diferentes aspectos:

… as imagens presentes nos livros dos primeiros quatro anos do ensino fundamental são tipicamente naturalistas e remetem a cenários familiares do cotidiano infantil. Por outro lado, as imagens nos livros destinados às quatro últimas séries se tornam cada vez mais abstratas e passam a privilegiar representações esquemáticas de fenômenos microscópicas. (GOUVÊA; MARTINS; IZQUIERDO, 2006, p. 4).

A imagem em livros didáticos de Física do Ensino Médio também tem sido o objeto de investigação de pesquisas com diferentes perspectivas. Andrade, Dickman e Ferreira (2012) buscaram entender as dificuldades enfrentadas por estudantes cegos na compreensão de figuras utilizadas em aulas e em provas por meio de sua leitura por terceiros. A partir da análise de 5 livros didáticos de Física, abrangendo um período de 1910 a 2007, Gouvêa e Oliveira (2010b) indicaram que através das imagens pode-se perceber diferentes perspectivas didáticas expressas por elementos que compõem as imagens. Testoni (2010) categorizou histórias em quadrinhos presentes em livros didáticos, obtendo quatro funções didáticas para elas: ilustrativa, motivadora, explicativa e instigadora. Nove livros didáticos de Física foram examinados por Silva e Martins (2008), com o objetivo de compreender a relação entre as imagens, a realidade e o conteúdo teórico.

O presente estudo buscou investigar como professores de Física trabalham com imagens visuais que representam as realidades concreta (cotidiana) e pensada (abstrata) tendo em vista uma situação de ensino. Mas, para isso, primeiramente, trazemos uma

(3)

reflexão sobre a representação da realidade na forma de imagens visuais no ensino de ciências, mais especificamente, no que diz respeito ao ensino de Física. Em seguida, tratamos do que se espera das imagens presentes em livros didáticos da referida disciplina a partir dos critérios de avaliação do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), já que o livro didático é um recurso amplamente utilizado na formação acadêmica de professores de ciências naturais (KHUN 2005), e, geralmente, presente em sua atuação profissional. Por fim, apresentamos uma análise das respostas a um questionário aplicado a 11 professores que atuam no nível médio.

Realidades concreta e pensada no ensino de Física

Para Medeiros e Medeiros (2001), produzimos uma realidade mental (pensada) que não é idêntica à realidade concreta (cotidiana), mas é uma representação da mesma que pode ser compartilhada por uma determinada comunidade (no nosso caso, a científica). Essa realidade mental parte da simplificação da realidade concreta, tornando possível sua generalização e matematização. Quanto mais semelhante à realidade concreta, mais icônica será a representação da mesma e, portanto, mais facilmente compartilhada por grupos sociais inseridos na mesma cultura. Por outro lado, quanto mais abstrata a representação, torna-se necessário um aprendizado formal para sua leitura. Assim, o nível de iconicidade se refere à semelhança da imagem com a realidade concreta e o nível de abstração diz respeito à analogia com a realidade pensada: quanto maior o nível de iconicidade menor será o de abstração.

Figura 1: Realidade concreta e realidade pensada

Na figura 1, a imagem A é mais icônica que a imagem B, sendo, portanto, a segunda mais abstrata que a primeira. Relacionada à realidade pensada, a imagem B, construída pela comunidade científica para tratar de um conceito científico (o equilíbrio do corpo rígido), representa algumas características presentes na imagem A (que se refere à realidade concreta), após a elaboração de um modelo mental.

A realidade concreta, para Bachelard (1996), é um obstáculo à formação do espírito científico que, para desenvolver-se plenamente, deve passar por três estados, nesta ordem: o estado concreto (das experiências sensíveis), o concreto-abstrato (da sensibilidade representada na geometrização) e o abstrato (o conhecimento perde o vínculo com a experiência imediata). Nesta evolução, as imagens concretas são consideradas por ele como pobres exemplos da realidade pensada porque os objetos da

(4)

ciência são construídos pela ciência, seu conhecimento contradiz o senso comum. Ao admitir que o conhecimento se dá contra um conhecimento anterior, Bachelard (1996) considera que o conhecimento da ciência é construído de modo a superar ideias estabelecidas a partir da observação primeira da realidade concreta, que “se apresenta repleta de imagens, é pitoresca, concreta, natural, fácil” (Bachelard, 1996, p. 25). Ele chega a dizer que a ciência precisa “lutar sempre contra as imagens, contra as analogias, contra as metáforas” (Bachelard, 1996, p. 48), pois para haver ciência devemos nos voltar para seu objeto de estudo: a realidade pensada (o abstrato).

Como obstáculos ao desenvolvimento da ciência e do espírito científico, o referido autor leva em conta não apenas imagens visuais, mas, também as imagens mentais sugeridas por determinados termos verbais acompanhados por todas as propriedades dos objetos concretos aos quais eles se referem. Uma vez que, no primeiro contato com o conhecimento científico, carregamos essas imagens cotidianas, um dos aspectos do trabalho do professor é “extrair o mais depressa possível o abstrato do concreto” (Bachelard, 1996, p. 50), para se chegar à elaboração abstrata da ciência. Ao atingir esse objetivo, a realidade concreta necessita ser apresentada após a abstração.

Quando a abstração se fizer presente, será a hora de ilustrar os esquemas racionais. Em suma, a intuição primeira é um obstáculo para o pensamento científico; apenas a ilustração que opera depois do conceito, acrescentando um pouco de cor aos traços essenciais, pode ajudar o pensamento científico. (Bachelard, 1996, p. 97)

Imagens visuais em livros didáticos

O Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) garante a entrega de livros para estudantes de escolas públicas, a partir da avaliação dos mesmos. Na edição de 2012, foram distribuídos para o ensino médio livros didáticos de Biologia, Filosofia, Física, Geografia, História, Língua Portuguesa, Língua Estrangeira Moderna (Espanhol e Inglês), Matemática, Química e Sociologia (BRASIL, 2011a). Um dos critérios utilizados para a avaliação dos livros foi a apresentação de conceitos, informações e procedimentos de forma correta e atualizada. Por isso, excluíram-se os livros que “utilizaram de modo incorreto, descontextualizado ou desatualizado esses mesmos conceitos e informações em exercícios, atividades,ilustrações e imagens.” (BRASIL, 2011b, p. 13). Na análise das ilustrações dos livros de Física, foi observado se eles utilizavam “ilustrações de forma adequada, tendo em vista sua real necessidade e sua referência explícita e complementar ao texto verbal” (BRASIL, 2011b, p. 16).

(5)

As ilustrações presentes nos livros didáticos precisaram (BRASIL, 2011b, p. 15):

1. ser adequadas para a finalidade para as quais foram elaboradas; 2. ser claras e precisas;

3. retratar adequadamente a diversidade étnica da população brasileira, a pluralidade social e cultural do país;

4. quando de caráter científico, respeitar as proporções entre objetos e seres representados;

5. estar acompanhadas dos respectivos créditos e da clara identificação da localização das fontes ou acervos de onde foram reproduzidas;

6. apresentar títulos, fontes e datas no caso de gráficos e tabelas;

7. apresentar legendas, escala, coordenadas e orientação em conformidade com as convenções cartográficas, no caso de mapas e outras representações gráficas do espaço.

Segundo esses critérios, é recomendado que as obras destinadas aos estudantes iniciem a discussão conceitual do conteúdo dando atenção às possíveis concepções alternativas que eles possam apresentar sobre o assunto, geralmente, oriundas de suas experiências anteriores com a realidade concreta. Nesse sentido, a contextualização relacionada a aspectos cotidianos, culturais, econômicos, históricos e sociais é considerada relevante para o aprendizado em toda a obra, inclusive nos exercícios, problemas e atividades a serem desenvolvidos pelos estudantes, evitando-se utilizar somente situações idealizadas. Aconselha-se, ainda, que sejam explicados os limites de validade dos conceitos científicos, teorias e modelos, discutindo-se as condições em que eles podem ser empregados para analisar situações concretas.

Essa preocupação com a avaliação das imagens presentes nos livros didáticos demonstra que sua presença é considerada importante, sendo preciso que as mesmas estejam de acordo com suas finalidades em sua complementaridade com o texto verbal. Apesar do Guia de Livros Didáticos do PNLD 2012 para a Física não especificar de que forma esses dois textos (verbal e imagético) devam se relacionar tendo em vista o aprendizado, alguns de seus critérios de avaliação nos faz pensar sobre a maneira como eles estabelecem relações entre situações do cotidiano (realidade concreta) e os conceitos científicos (realidade pensada). Uma vez que é sugerido que aspectos do cotidiano sejam utilizados no início da apresentação dos conceitos científicos, parece que a realidade pensada deva vir, no texto didático, após a apresentação da realidade concreta, de modo a estabelecer uma relação entra as duas realidades.

Análise dos dados

Para investigar como professores de Física do ensino médio utilizam imagens no trabalho do conteúdo dessa disciplina, levando-se em conta a relação entre as

(6)

realidades concreta e pensada, solicitamos que 11 professores, participantes de um curso de pós-graduação stricto sensu em Ensino de Ciências, respondessem a questão apresentada na Figura 2. Quando nos referirmos às respostas dos professores à questão, essas serão indicadas por P, seguido de um número (P1, P2..., P11).

Figura 2: Questão apresentada aos professores

O texto verbal a que se refere a questão é o enunciado da Terceira Lei de Newton, presente em livros didáticos para o ensino de Mecânica. Expomos quatro imagens (A, B, C e D) com diferentes níveis de iconicidade, onde a imagem (B) é a que está mais próxima da representação da realidade cotidiana. A imagem (C) apresenta elementos do cotidiano, acompanhados de elementos da ciência escolar Física (os vetores que representam as forças). Com maiores níveis de abstração, a imagem (D) apresenta elementos genéricos, círculos e setas, que representam, respectivamente, corpos e vetores, e o texto verbal indicando os corpos e as forças. A imagem (A), relacionada ao menor nível de iconicidade, diz respeito à relação vetorial entre as forças que formam um par ação-reação.

As imagens foram escolhidas após analisarmos um dos livros de Física recomendados pelo PNLD. No capítulo sobre as leis de Newton, o referido livro, apresentava a enunciação verbal da terceira lei de Newton (também conhecida como princípio da ação e reação) e mostrava imagens semelhantes às presentes na questão apresentada aos professores. Assim, procuramos dar aos professores a possibilidade de escolha de tipos de imagens presentes em livros didáticos.

Categorizamos as respostas de acordo com a sequência de imagens construída: no grupo 1, consideramos as sequências que começavam com imagens que continham elementos da realidade concreta (B e/ou C) e terminavam com imagens relacionadas à realidade pensada (A e /ou D), no grupo 2, as sequências que faziam o caminho oposto, e no grupo 3, aquelas que alternavam entre as duas realidades.

Quadro 1: Respostas dos professores

Apenas um professor respondeu que não utilizaria nenhuma imagem porque prefere “exemplos reais”, como quando encosta em uma parede ou caminha pela sala de aula, para “trabalhar com a ideia conceitual mais contextualizada, pois muitas vezes os

(7)

alunos não conseguem ter um raciocínio vetorial (numérico ou geométrico) avançado” (P1). Notamos em sua resposta que, mesmo não escolhendo uma imagem visual presente em um suporte, o professor faria uso de uma imagem visual produzida pelo movimento do seu próprio corpo, com o objetivo de relacionar o conhecimento científico à realidade cotidiana.

Nenhum dos professores pesquisados faria uso de apenas uma das imagens. Dos 10 que empregariam as imagens, um utilizaria duas imagens, quatro construíram uma sequência com três imagens e, cinco professores usariam as quatro imagens.

Sete professores organizaram sequências que começavam com imagens que continham elementos do cotidiano (B e/ou C) e finalizavam com elementos da realidade pensada (A e/ou D), dois professores escolheram o caminho inverso, enquanto um professor alternou a sequência iniciando com elementos cotidianos (B) para, em seguida, diminuir o nível de iconicidade com as imagens (D) e a (A), respectivamente, terminando com um aumento de iconicidade, com a imagem (C).

Das respostas do grupo 1, apenas o professor P2 construiu uma sequência com duas imagens, justificando sua não escolha das outras duas por serem muito matemáticas (imagem A) e complexas (imagem C) para introduzir o tema. Os professores P4, P5, P6 e P7, preferiram começar com “exemplos palpáveis” (P7) para “verificar as concepções dos estudantes” (P4) e, em seguida, apresentar o conceito físico. O professor P9 “tentaria partir da exposição mais concreta em direção à mais abstrata e matemática”. A sequência utilizada por P8 serviria para “introduzir a ideia” (C), aproximar o conhecimento científico do cotidiano do aluno (B) e explicar o modelo científico (D e A).

Nas sequências relacionadas ao grupo 2, o professor P3 começaria com a definição científica (A), expressaria sua representação em corpos diferentes (C) e exemplificaria com “uma aplicação do conceito no cotidiano” (B). Já P11 incluiria a imagem D em sua sequência para “discutir a universalidade da lei da ação-reação”.

O professor P10, o único classificado no grupo 3, começou utilizando a imagem mais icônica (B), aumentou gradualmente o nível de abstração (D e A), para finalizar retornando à realidade concreta, agora acompanhada de elementos da realidade pensada (C). A finalidade de P10 foi iniciar trazendo um questionamento cotidiano (B), exemplificar o conceito científico (D), sistematizá-lo (A) e analisar o problema proposto com base nesse conceito (C).

(8)

As imagens mentais e visuais, assim como as palavras, os sons, os cheiros, os gostos e os toques fazem parte do modo como representamos nossas experiências. Não é possível, e talvez não seja necessário, nem recomendável, simplesmente, eliminar alguma dessas formas de representação. Apesar de Bachelard (1996) se posicionar contra as imagens no que diz respeito ao conhecimento científico, ele mesmo afirma ser impossível anular nossas experiências anteriores: quer queiramos ou não, elas estarão presentes nas diversas linguagens que utilizamos em nossa cultura.

Mesmo que as imagens concretas venham a se apresentar como um obstáculo ao aprendizado de conceitos científicos - como defende Bachelard (1996) -, reportamo-nos a elas, juntamente com outras imagens e palavras conhecidas, quando estamos diante de novos saberes. Então, por que não tentar usá-las a favor do ensino e do aprendizado dos conceitos abstratos?

Observamos, nas recomendações do PNLD (BRASIL, 2011a, 2011b), o uso da realidade concreta (na forma de imagens visuais) para aproximar a realidade pensada (os conceitos abstratos da ciência) do cotidiano dos estudantes. Embora, a segunda seja uma simplificação da primeira, e a primeira não possa ser explicada completamente pela segunda, existem contextos de validade em que alguns aspectos da realidade concreta são compreendidos através da realidade pensada (MEDEIROS; MEDEIROS, 2001).

O presente estudo pareceu mostrar que a maioria dos professores pesquisados concorda com a forma de utilização da imagem orientada pelo PNLD: pensando em trabalhar um conceito abstrato com seus alunos, eles preferiram iniciar com imagens da realidade concreta para, em seguida, apresentar as imagens mais abstratas. Em suas justificativas, foi verificada a preocupação de, antes de mostrar o modelo da ciência, trazer imagens conhecidas dos estudantes.

Em um trabalho anterior realizado com estudantes de Engenharia (REGO; GOUVÊA, 2013) percebemos que, ao estarem diante de uma situação de ensino, a maioria dos estudantes agiu como os professores pesquisados: fizeram uso de uma sequência de imagens que começava com elementos do cotidiano para, gradualmente, diminuir o nível de iconicidade das imagens, até chegarem às imagens com maior nível de abstração.

Essas formas de representação incorporadas por professores e estudantes podem ter sua origem em sua formação acadêmica, presentes nos livros didáticos, nos experimentos, nas práticas pedagógicas que tendem a privilegiar o ensino de Física a partir de elementos cotidianos (GOUVÊA; OLIVEIRA, 2010a).

(9)

Nosso objetivo neste trabalho não foi o de verificar qual é a melhor forma de trabalhar com imagens tendo em vista o aprendizado. Mas, consideramos que seja importante, em estudos futuros, que haja reflexões sobre seu uso no ensino, investigando-se as relações estabelecidas entre as representações das realidades concreta e pensada nos textos verbais e imagéticos.

Referências

ANDRADE, L. M.; DICKMAN, A. G; FERREIRA, A. C. Identificando dificuldades na descrição de figuras para estudantes cegos. In: XIV Encontro de Pesquisa em Ensino de Física (EPEF), 2012, Maresias. Anais... Maresias: SBF, 2012. Disponível em: <http://www.sbf1.sbfisica.org.br/eventos/epef/xiv/sys/resumos/T0157-2.pdf>. Acesso em: 30 mar. 2014.

BACHELARD, G. A formação do espírito científico: contribuição para uma psicanálise do conhecimento. Rio de Janeiro: Contraponto, 1996. 314p.

BITTENCOURT, C. M. F. Apresentação da seção Em foco: História, produção e memória do livro didático. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 30, n. 3, p. 471-473 set./dez. 2004.

BRASIL. Ministério da Educação. Guia de Livros Didáticos: PNLD 2012: Apresentação. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica, 2011a. ______. Guia de Livros Didáticos: PNLD 2012: Física. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica, 2011b.

CHALMEL, L. Imagens de crianças e crianças nas imagens: representações da infância na iconografia pedagógica nos séculos XVII e XVIII. Educação e Sociedade, Campinas v. 25, n. 86, p. 57-74, abr. 2004. Disponível em: <http://www.scielo.br>. Acesso em: 05 jan. 2008.

COMENIUS, J. A. Orbissensualiumpictusquadrilinguis. Leutschovle: Samuel Brewer, 1685.

GOUVÊA, G; MARTINS, I.; IZQUIERDO, M. Discutindo as retóricas do texto didático de física a partir de uma análise do seu projeto gráfico. In: X Encontro de Pesquisa em Ensino de Física (EPEF), 2006, Londrina. Anais... Londrina: SBF, 2006. ________; OLIVEIRA, C. I. C. Memória e Representação: imagens nos livros didáticos de física. Ciências & Cognição, Rio de Janeiro (UFRJ), v. 15, n. 1, p. 1-15, 2010a. ________. Imagens no livro didático de Física: perspectivas de práticas de ensinar.In: XII Encontro de Pesquisa em Ensino de Física (EPEF), 2010, Águas de Lindóia.

Anais... Águas de Lindóia: SBF, 2010b.

KUHN, Thomas S. A estrutura das revoluções científicas. 9ª edição. São Paulo: Perspectiva, 2005.

MARTINS, I.; GOUVÊA, G.; PICCINI, C. Uma Análise das Imagens nos Livros Didáticos de Ciências para o Ensino Fundamental. In: IV ENCONTRO NACIONAL DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS, 2003, Bauru. Atas... Porto Alegre: ABRAPEC, 2003.

MEDEIROS, Alexandre; MEDEIROS, Cleide. Questões epistemológicas nas iconicidades de representações visuais em livros didáticos de Física. Revista Brasileira

de Pesquisa em Educação em Ciências, Belo Horizonte, v. 1, n. 1, p. 103-117,

(10)

REGO, S. C. R.; GOUVÊA, G. Imagens na disciplina escolar Física: possibilidades de leitura. Investigações em Ensino de Ciências, Porto Alegre, v.18, n. 1, pp. 127-142, mar. 2013.

SILVA, C. F.; MARTINS, M. I. A iconicidade em livros didáticos de física.In: XI Encontro de Pesquisa em Ensino de Física (EPEF), 2008, Curitiba. Anais... Curitiba: SBF,2008.

TESTONI, L. A. Histórias em quadrinhos nos livros de Física: uma proposta de

categorização. In: XII Encontro de Pesquisa em Ensino de Física (EPEF), 2010, Águas de Lindóia. Anais... Águas de Lindóia: SBF, 2010.

Figura 1: Realidade concreta e realidade pensada A)

Fonte: Arquivo pessoal.

B)

Fonte Arquivo pessoal.

Figura 2: Questão apresentada aos professores Considere o texto e as imagens a seguir:

“A toda ação existe uma reação de mesma intensidade e direção, mas de sentido oposto”

(A) (B)

Fonte: Arquivo Pessoal

(C)

Fonte: Fonte: CEPA- Instituto de Física – USP http://www.cepa.if.usp.br

(D)

(11)

Se você quisesse trabalhar o texto acima com seus alunos e dispusesse das quatro imagens apresentadas, você:

(a) não utilizaria nenhuma imagem. (b) utilizaria apenas a imagem ( )

(c) utilizaria duas imagens, na seguinte sequência: ( ) - ( ) (d) utilizaria três imagens, na seguinte sequência: ( ) - ( ) - ( )

(e) utilizaria as quatro imagens, na seguinte sequência: ( ) - ( ) - ( ) - ( )

Justifique sua resposta:

Quadro 1: Respostas dos professores Grupo Sequência Professores

1 B – D P2 B – A – D P4, P5 e P6 C – B – D – A P7 e P8 B – C – D – A P9 2 A – C – B P3 D – A – B – C P11 3 B – D – A – C P10 1

Referências

Documentos relacionados

3.5 Não nos responsabilizamos perante você por qualquer perda que venha a sofrer em decorrência do acesso à sua conta feito por uma pessoa não autorizada e pelo fato de tal pessoa

visam o ensino de habilidades de compreensão e de produção de textos orais e escritos e o desenvolvimento da competência comunicativa, na proposta curricular da instituição

(2008), o cuidado está intimamente ligado ao conforto e este não está apenas ligado ao ambiente externo, mas também ao interior das pessoas envolvidas, seus

Por outro lado, a heterogeneidade constitutiva da enunciação da autora, pensada a partir de seus exteriores: o dialogismo de Bakhtin e a psicanálise lacaniana,

Percebo que um objetivo esteve sempre presente desde o princípio, sendo notadamente insistente em muitos momentos do desenvolvimento do trabalho, destacável não só porque faz parte

O modelo matemático que representa o comportamento físico do VSA é composto por equações diferenciais ordinárias cujos principais coeficientes representam parâmetros

A turma deverá formar uma comissão de formatura e elaborar uma ata, com a data da eleição, o nome do curso, turnos e a matrícula dos componentes com seus devidos cargos, além

Esse capítulo apresentou a teoria usada como base para este trabalho, bem como soluções para auxiliar o usuário na escolha da solução mais adequada.. No próximo capítulo