• Nenhum resultado encontrado

IZABELLE KAROLLINE DAMASCENO CATANHEIDE

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "IZABELLE KAROLLINE DAMASCENO CATANHEIDE"

Copied!
25
0
0

Texto

(1)

GEOPOLÍTICA DOS ILÍCITOS EM ÁREAS TRANSFRONTEIRIÇAS: O PAPEL DA RECEITA FEDERAL NO COMBATE AO CONTRABANDO DE

CIGARROS NA FRONTEIRA BRASIL-PARAGUAI

Trabalho de Conclusão de Curso - artigo científico - apresentado à Comissão de Avaliação de TCC da Escola Superior de Guerra - Campus Brasília, como exigência parcial para obtenção do certificado de Especialista em Altos Estudos em Defesa. Orientador: Prof. Dr. Fábio Albergaria de Queiroz

Brasília 2020

(2)

Termo de Cessão de Direitos Autorais

Os TCC, nos termos da legislação que resguarda os direitos autorais, são considerados propriedade da Escola Superior de Guerra (ESG). É permitida a transcrição parcial de textos do trabalho ou mencioná-los para comentários e citações, desde que sem propósitos comerciais e que seja feita a referência bibliográfica completa. Os conceitos expressos nos TCC são de responsabilidade do autor e não expressam necessariamente qualquer orientação institucional da ESG.

(3)
(4)

Geopolítica dos ilícitos em áreas transfronteiriças: o papel da Receita Federal no combate ao contrabando de cigarros na fronteira Brasil-Paraguai

Izabelle Karolline Damasceno Catanheide1

RESUMO

Os ilícitos estão presentes na sociedade desde os tempos mais remotos. As fronteiras, pela sua porosidade são os locais onde mais facilmente são cometidos os diversos crimes, tais como contrabando, descaminho e o tráfico de drogas. O comércio de cigarros é altamente lucrativo e uma das principais fontes de renda tributária e, também, uma das mercadorias mais contrabandeadas do Brasil, pelo alto valor agregado e a penalidade mais baixa se comparada aos tráficos. A Receita Federal atua fortemente no combate ao contrabando dessa mercadoria, juntamente com as demais agências e órgãos de segurança pública. Há uma necessidade de maior integração dos agentes estatais para que efetivamente haja uma redução dessa prática ilícita e nociva a sociedade, seja com redução da arrecadação, bem como os danos causados a saúde pública.

Palavras-chave: Cigarro, fronteiras, porosidade, contrabando, ilícitos.

Geopolitics of illegal activities in compulsory areas: the role of the Federal Revenue in combating cigarette smuggling on the Brazil-Paraguay border

ABSTRACT

Illicit acts have been present in society since the most remote times. The borders, due to their porosity, are the places where the most diverse crimes are most easily committed, such as smuggling, embezzlement and drug trafficking. The cigarette trade is highly profitable and one of the main sources of tax income and also one of the most smuggled goods in Brazil, for its high added value and the lowest penalty compared to trafficking. The Federal Revenue Service acts strongly in combating the smuggling of this merchandise, together with other agencies and public security agencies. There is a need for greater integration of state agents so that effectively there is a reduction in this illicit and harmful practice to society, be it with reduced collection, as well as the damage caused to public health.

Keywords: Cigarette, borders, porosity, contraband, illicit

1 Auditora-Fiscal da Receita Federal do Brasil. Trabalho de Conclusão do Curso de Altos Estudos em Defesa da Escola Superior de Guerra (ESG).

(5)

1. INTRODUÇÃO

Os ilícitos, sobretudo, transnacionais, fazem parte de um problema mundial e por gerarem recursos vultosos acabam por serem atrativos – mesmo a despeito dos riscos envolvidos – a uma série de atores que se organizam em redes dotadas de alta mobilidade e capazes de se embrenhar na estrutura dos Estados. Tais redes se fazem valer dos mesmos instrumentos que os Estados para projetar seus interesses em um mundo onde, segundo Friedman (2012), as distâncias se tornaram menos relevantes e os fluxos de pessoas, capital e mercadorias relevam uma complexa interdependência.

Ao longo dos anos se considerava o ilícito como mera questão criminal, mas não é somente isso. Ele tem transformado o sistema internacional, modificando suas regras e, por conseguinte, a política e a economia mundial. Estes crimes se tornaram, concomitantemente, problemas de segurança pública e internacional (NAÍM, 2006).

Aspecto importante para os fins deste estudo é o fato de que os ilícitos tendem a prosperar, sobremodo, em Estados frágeis ou falidos, onde o Estado de Direito não funciona adequadamente, onde direitos e garantias fundamentais são desrespeitados continuamente e o Estado, em sua acepção weberiana, não consegue ser um eficiente provedor da Segurança. São nesses Estados que, em grande medida, a rede criminosa prospera com maior facilidade, como é o caso do Paraguai onde há uma simbiose entre a economia formal e atividades ilícitas2:

2 De acordo com o Failed States Index 2020, o Paraguai ocupa a posição 104 na lista dos 178 países falidos ou frágeis, fato que aponta para esta perigosa interconexão. Para maiores informações ver: https://fragilestatesindex.org/

(6)

Figura 1- Paraguai no ranking de Estados Falidos (2020)

Fonte: https://fragilestatesindex.org/ Acesso em 04/09/2020.

Isso porque, segundo Newman (2009), entre outros aspectos, Estados fracos3 são aqueles onde o Estado controla de forma precária a ordem pública em seu território, não controla adequada e constantemente suas fronteiras, não consegue manter de forma confiável os serviços públicos e as instituições e é vulnerável a desafios internos. Com isso tem-se baixos níveis de desempenho econômico, bem-estar humano, distribuição econômica e níveis de conflito com

3 Cabe destacar que o termo fraco, frágil, falido, apesar de serem comumente usados como sinônimos guardam diferenças quanto ao nível de comprometimento da qualidade institucional de nossa unidade de referência, o Estado. Assim, Rocha (2007) apud Queiroz e Barros (2018, p.02) “avança no esforço de refinamento conceitual ao propor diferenças semânticas na designação destes atores. Na tipologia por ele proposta, Estados colapsados são aqueles nos quais a situação de anarquia prevalece dentro do território, parte do qual é controlado por senhores da guerra, que são capazes de comandar pessoas e recursos em prol de seus próprios grupos. Estados fragmentados são aqueles nos quais um Estado legítimo subsiste, e tem sua autoridade reforçada pela comunidade internacional, mas é incapaz de controlar totalmente seu território e/ou população. Já Estados frágeis são aqueles em que a legitimidade não é diretamente contestada por entidades subnacionais, nem por agências internacionais, mas cuja capacidade governativa é extremamente baixa – ou cujas elites não estão interessadas em prover bens públicos em quantidade suficiente para garantir um mínimo bem-estar a sua população”. Por fim, seguimos a orientação de Queiroz e Barros (2018, p02) de que, não obstante estas variações, a não utilização de uma única adjetivação não implica prejuízos de interpretação, pois, ao fim, “estas designações se referem ao mesmo objeto: países em situações desconfortáveis com a qualificação como Estado de Direito”

(7)

alta capacidade de transbordamento (NAÍM, 2006). Em suma, o fracasso do Estado resulta em ausência de autoridade e controle do Estado que, por sua vez, estimula a atividade ilícita.

Assim, entender o funcionamento do comércio de ilícitos e como eles interferem no desenvolvimento dos Estados se torna primordial, especialmente na América do Sul, onde temos protótipos de Estados falidos e que tem nestas atividades uma de suas fontes de receita, em uma relação simbiótica perigosa.

Sendo assim, faz-se importante o estudo da geopolítica dos ilícitos em áreas transfronteiriças, proposta ora apresentada, onde serão considerados aspectos gerais sobre os crimes ocorridos nessa região, levando em consideração a presença de Estados frágeis, fronteiras porosas, simbiose com o poder constituído e impacto dos ilícitos na economia local. O foco será o contrabando de cigarros na região de fronteira Brasil – Paraguai, mais precisamente na região de Foz do Iguaçu.

A importância de se estudar ilícitos transfronteiriços, com foco num caso específico, se dá pelo fato de os crimes nunca serem estanques, estando sempre correlacionados, formando uma grande rede com alta capacidade de mobilidade e adaptação. Assim, o estudo do contrabando de cigarros e suas conexões com outras atividades ilícitas pode apontar caminhos importantes para o aperfeiçoamento de ações repressivas.

Outro fator relevante neste estudo refere-se às fronteiras como elemento ontológico (são as referências concretas, os elementos que compõem as Relações Internacionais). Como já referenciado, as organizações criminosas possuem alta capilaridade e, associado à grande extensão de nossas fronteiras, muitas delas porosas, há grandes dificuldades na atuação do Estado brasileiro no combate a esses crimes transfronteiriços lembrando, novamente, que o Brasil faz fronteira com Estados que tem o ilícito muitas vezes como importante atividade geradora de receitas que, uma vez incorporadas ao fluxo lícito da economia, tornam-se, praticamente, irrastreáveis.

Os dados referentes ao setor reforçam a importância desta análise. A Indústria de cigarros produz, no mundo, cerca de 5,4 trilhões de unidades por ano. O Brasil é o maior mercado latino-americano do produto, com consumo correspondente a 42% do total vendido na América Latina. (MDIC, 2020). Além de produzir e consumir cigarros, o Brasil é alvo de contrabandos, vindos mais especificamente do Paraguai. Esse mercado é altamente lucrativo, pois trata-se de produto de fácil transporte, lucros elevados e baixa penalidade, por não se tratar propriamente de tráfico de entorpecentes como as demais drogas.

(8)

Esta pesquisa é, em sua essência, exploratória, pois trata-se de estudo de caso que, embora não se resuma à exploração, permite ao investigador elencar elementos, a partir de um contexto muito específico, que lhe consinta obter inferências que se somem ao esforço de produzir conhecimento generalizável (YIN, 2005). Para tal, a partir de nossos objetivos gerais e específicos, a cadeia causal a guiar este estudo tem, como variável dependente, o papel da Receita Federal no combate a atividades ilícitas e, como variáveis independentes: 1) a porosidade das fronteiras Brasil-Paraguai; 2) as externalidades associadas ao contrabando de cigarro e; 3) natureza flexível e altamente adaptável de redes criminosas.

Para a coleta de informações, foram utilizadas fontes primárias como documentos de governo e relatórios técnicos de agências especializadas e, também, fontes secundárias como livros, dissertações e teses acadêmicas e outras fontes de pesquisas já publicadas. Em consonância com o objeto de análise, especial atenção foi dedicada às informações já existentes em bancos de dados da Receita Federal que nos permitiu analisar quantitativamente e qualitativamente as dinâmicas da região de Foz do Iguaçu, de forma que, ao fim, fossem cruzados dados referentes a apreensões, por exemplo, e o modus operandi de redes criminosas relacionadas ao contrabando de cigarros.

A fim de cumprir os objetivos deste trabalho, foram apresentados os dados já coletados sobre o contrabando de cigarros na região, bem como fontes de pesquisas dos diversos órgãos e agências que trabalham no combate a esse crime. Foram utilizadas, também, pesquisas já realizadas por Institutos, Organizações e outros agentes, bem como coleta de dados sobre acordos e tratados internacionais referentes ao tema.

Objetivamente, valemo-nos da coleta de dados e a transformação destes em resultados inteligíveis para, então, fazer uma análise conceitual das inferências obtidas. Por fim, para alcançar os objetivos propostos, o texto foi divido em três partes, além da introdução e conclusão. Primeiramente, será analisada a fragilidade e porosidade das fronteiras na região de Foz do Iguaçu, bem como os impactos do contrabando de cigarros em termos de segurança (controle de atividades fronteiriças) e desenvolvimento (saúde pública e arrecadação). Por fim, mas não menos importante, será contextualizada a atuação da Receita Federal no combate aos ilícitos, nossa variável dependente.

(9)

2. REFERENCIAL TEÓRICO-CONCEITUAL: UMA BREVE REVISÃO DA LITERATURA

A pesquisa não utilizará uma teoria, no sentido lato, mas, por seu caráter essencialmente empírico, valer-se-á de conceitos norteadores. Assim, conceitualmente, o referencial escolhido é a de Moisés Naím (2006) que, em linhas gerais, apresenta o crime transnacional como uma rede altamente permeável e fluída, o que nos ajudará a demonstrar possíveis conexões entre o contrabando de cigarros com outros ilícitos e crimes.

Vamos, então, a algumas de suas contribuições que balizam o texto. Para Naím (2006) a utilização de poderosas tecnologias (como a internet) possibilita menos barreiras ao comércio o que gera rapidez e conforto aos contrabandistas. O autor considera ainda que o crime organizado tem aumentado seu poder político, tomando importantes parcelas dos Estados mais fracos. Além disso, apesar das atividades ilícitas serem antigas no plano internacional, tem tomado força e se tornando cada vez mais forte e dificultando a capacidade de intervenção dos entes estatais.

Ainda segundo Naím (2006), o sistema é formado por redes e nós, em que há uma colisão clara entre “pontos claros geopolíticos” e “buracos negros geopolíticos”, onde um fator crucial – que dá aos buracos negros boa parte de sua potência: sua capacidade de conexão especializada com os pontos claros. Uma região remota, primitiva e mal governada – ou desgovernada – não é um buraco negro geopolítico a não ser que possa irradiar ameaças a lugares distantes. As redes de comércio que operam internacionalmente servem como canais por meio dos quais tais ameaças se movimentam de lugares remotos para o resto do mundo.

Adicionalmente, serão utilizados elementos ontológicos da teoria dos regimes como normas, procedimentos e ações, bem como mecanismos de ações conjuntas, tratado e convênios internacionais em torno dos quais convergem a ação dos atores das relações internacionais em uma determinada área.

Da geopolítica, utilizaremos as reflexões sobre o papel das fronteiras como epiderme do Estado complementarmente às contribuições de Francis Fukuyama (2005) sobre a dimensão de segurança atribuída à proliferação de Estados frágeis. Para o autor, os Estados precisam prover a ordem pública e a defesa de invasões externas antes de prover seguro-saúde ou ensino superior gratuito. Pontua, ainda, que a força de um Estado reside na capacidade deste de cumprir as funções mais básicas. Não que não possa cumprir as demais, mas que essas sejam apenas um complemento.

(10)

Dialogamos, também, com as ideias de Medeiros Filho (2005) para, então, verificarmos se, tal qual nos é por ele apresentado, o Cone Sul permanece como um arco de estabilidade ante as externalidades negativas geradas pela prática recorrente de ilícitos. Cabe destacar que, na perspectiva apresentada pelo autor, a América do Sul pode ser dividida em dois grandes arcos: o “Arco de Estabilidade” e o “Arco de Instabilidade”.

Enquanto o primeiro corresponde a faixa Atlântica (Mercosul estendido), o segundo se refere à porção onde persistem zonas potenciais de conflitos, notadamente Amazônia e Andes. E é nesse primeiro Arco que está incluso nosso objeto de estudo, a fronteira Brasil-Paraguai. De acordo com este autor, os níveis de integração geopolítica na América do Sul parecem seguir uma linha crescente partindo da parte atlântica (maior nível de integração/estabilidade) para a parte pacífica (integração comprometida e instabilidade regional):

Figura 2- Arcos da Estabilidade e Instabilidade na América do Sul

Fonte: Medeiros Filho (2005)

Por último, mas não menos importante, recorremos a Cepik e Pedro Borba (2011, p.376) para os quais o crime “pode ser diferenciado entre os delitos com motivação econômica (tráfico

(11)

de drogas, por exemplo) e os que não a possuem (estupro, por exemplo) ”. Além disso, são discerníveis “entre crimes de dano direto (latrocínio, por exemplo) e de prejuízo difuso (contrabando, por exemplo)”.

O crime organizado está “no campo dos crimes economicamente motivados e, em sua ampla maioria, de prejuízo difuso” (CEPIK e BORBA, 2011, p.376). Crimes difusos são aqueles que atentam as leis e a sociedade de uma forma geral, causando prejuízo a todos e não somente a uma pessoa ou grupo específico. E, nisso, eles se diferem dos crimes que atingem as vítimas diretamente, as quais ao serem prejudicadas recorrem à justiça/polícia. Embora mereça atenção como objeto de análise, esse tipo de crime não é o foco desse estudo.

Mais especificamente, sobre o objeto de análise, cumpre tipificar que crimes cometem aqueles que trazem cigarros para o Brasil. Por ser uma mercadoria lícita, apesar dos males causados a saúde, o cigarro não é, necessariamente, enquadrado como tráfico assim como as demais drogas, que por sua vez são ilícitas. O cigarro possui importação restrita ou proibida. Quando a importação é restrita, são necessárias algumas medidas por meio dos importadores, inclusive pagamento de tributos. Caso isso não ocorra, teremos aí o crime de descaminho que é entendido como “Iludir, no todo ou em parte, o pagamento de direito ou imposto devido pela entrada, pela saída ou pelo consumo de mercadoria”, conforme preconiza o Art. 334 do Código Penal.

Se o cigarro encontrado dentro do território for de importação proibida, aí, sim, teremos o caso de contrabando que é entendido como “Importar ou exportar mercadoria proibida”, conforme Art. 334ª do referido código. Este é o foco do nosso trabalho.

3. UNIVERSO DE ANÁLISE

A faixa de fronteira terrestre brasileira corresponde a 27% do território nacional (2.357.850 km²), englobando 11 estados da federação fronteiriços e 10 países da América do Sul. Caracteriza-se geograficamente por ser uma faixa de até 150 km de largura ao longo dos 16.886 km de extensão, sendo 7.363 km em linha seca e 9.523 km em rios, lagos e canais. Para atender a demanda na região fronteiriça, a Receita Federal dispões de diversas unidades conforme mapa abaixo, porém como pode se observar a quantidade ainda é muito pequena considerando o vasto espaço a ser coberto. Apenas a título de exemplo, cita-se que na região

(12)

norte que possui grande área e que faz fronteira com diversos países, a Receita Federal possui apenas 8 unidades. O mapa abaixo mostra as diversas unidades da Receita Federal no Brasil:

Figura 3- Mapa do Brasil com algumas unidades da Receita Federal

Fonte: Receita Federal (2020)

A região de Foz do Iguaçu já foi a maior porta de entrada do contrabando de cigarros do Brasil, perdendo lugar para outras regiões como Guaíra-PR. Porém, esta região continua sendo importante devido ao grande volume de descaminho, contrabando e tráfico em geral. Por, historicamente, ser uma região de prática recorrente de atividades ilícitas, Foz tem sido alvo de operações constantes de diversos órgãos e agências governamentais, o que explica a migração de crimes para outras fronteiras menos visadas.

Mais precisamente quanto às externalidades geradas, o contrabando de cigarros no universo de pesquisa interfere diretamente no desenvolvimento local, visto que muitas pessoas são envolvidas na logística do contrabando. Pessoas são recrutadas para transportar a

(13)

mercadoria de um local para outro, como demonstrado no estudo “O custo do Contrabando”, publicado em 2015, e coordenado pela Empresa Gaúcha de Opinião Pública e Estatística, para o Idesf. Nele verificou-se que o contrabando de cigarros emprega cerca de 15 mil pessoas na região de Foz do Iguaçu. O estudo aponta, ainda, o cigarro como líder dos produtos contrabandeados na região, correspondendo a 67% de uma lista dos dez itens que entram de forma ilegal por esta região.

Assim, como apontam os dados, Foz do Iguaçu é um ponto estratégico pois se trata de fronteira tríplice (Brasil, Paraguai e Argentina) com grande movimentação de pessoas e que, historicamente, registra uma enorme ocorrência de ilícitos, tais como o contrabando de cigarros. Não à toa a cidade foi escolhida para a implementação do Centro Integrado de Operações de Fronteiras (CIOF), inaugurado no dia 16 de dezembro de 2019, e onde atuarão sob mesmo teto as mais diversas instituições que trabalham na repressão dos ilícitos transfronteiriços. A proposta do Centro é ser um Fusion Center: tornar acessível em um mesmo lugar a base de dados dos diversos órgãos.

Arie Kacowicz (2015, p. 90) destaca que “é um consenso que a Tríplice Fronteira é um notável exemplo de circulação transnacional lícita e ilícita, abrangendo o ‘lado negro’ da globalização em um contexto de integração regional”

Voltando ao nosso marco conceitual, Medeiros Filho (2003) dividiu a América do Sul em três grandes grupos a saber: Cone Sul (Argentina, Chile, Paraguai e Uruguai), Andes (Bolívia, Colômbia, Equador, Peru e Venezuela) e Brasil. Segundo o autor, a classificação de Brasil e Chile merece uma explicação. O Brasil, pelo papel histórico e geopolítico (além de ser o maior de todos os países, faz fronteira com quase todos, exceto Chile e Equador). Geopoliticamente, ele faz ligação entre o Cone Sul e os países amazônicos. Já o Chile, apesar de compor o arco de instabilidade, inclusive com disputas fronteiriças com Bolívia e Peru e possuir características andinas, está geograficamente situado no cone sul. O país possui um modelo de organização de suas capacidades e força muito parecido com o padrão geral adotado na Sub-Região, caracterizado pela separação entre defesa e de segurança.

Interessante pontuar que o Continente sul-americano é um peculiar Complexo Regional de Segurança, marcado por um paradoxo: a ausência de guerras formais, de um lado, e o elevado nível de violência social, de outro. Assim, a região é considerada como um grupo de Estados

(14)

interdependentes que, por imperativos geográficos de proximidade ou vizinhança, compartilha ameaças e preocupações militares, independentemente de seus interesses (Buzan, 2003).4

Neste continente, uma das maiores ameaças à estabilidade regional estaria na incapacidade dos Estados de adotarem políticas públicas para enfrentamento de vulnerabilidades sociais. Sendo assim, problemas enfrentados por esses países seriam de segurança, ou seja, “na” fronteira, e não de defesa, “de” fronteira. Logo, segundo Villa e Medeiros Filho (2007), as ameaças não são os vizinhos fortes e sim os fracos, incapazes de controlar seu próprio território.

Nesse contexto, de instabilidade e fragilidade do Estado de Direito, fator que contribui para a prosperidades de atividades ilícitas é que estas conseguem ter uma movimentação nas fronteiras que os órgãos de combate não dispõem. Isso devido a restrições impostas pela soberania de cada ente estatal, o que exige ações coordenadas, bilaterais e/ou multilaterais, o que, por vezes, é complexo e demanda tempo. Foi tendo como referência os fatos narrados que selecionamos, como objeto de análise, o contrabando de cigarros, por ser um produto que ao tempo em que impacta o desenvolvimento, por se tratar de uma questão de saúde pública, é também um grande gerador de receitas. Além disso, o cigarro representa mais de 50% dos produtos contrabandeados pelas fronteiras com o Paraguai, nosso universo de análise, conforme demonstra a figura a seguir:

4 De acordo com Medeiros Filho (2007), alguns fatores são responsáveis por essa anormalidade na América do Sul. O primeiro deles seria a localização periférica da região em relação aos grandes conflitos. O segundo, tendo ligação direta com o primeiro, tem a ver com o baixo potencial bélico dos países da região. O terceiro corresponde à presença hegemônica dos Estados Unidos como elemento de estabilidade regional, tendo a capacidade de constranger qualquer tentativa de aventura bélica entre os países da região. O quarto se refere a prioridade dada aos problemas domésticos (inimigo interno) em detrimento dos interesses externos. Estes países, acabam se utilizando demasiadamente do aparelho militar na repressão dos conflitos internos, devido a instabilidades políticas e fragilidades institucionais. E por fim, temos o papel das normas nas relações internacionais. Para Kacowicz, (2005), o impacto das normas no comportamento dos Estados da região e em suas relações externas poderia ser evidenciado no considerável número de pendências territoriais resolvidas de forma pacífica, por meio de arbitragem ou negociação.

(15)

Figura 4 - Percentual de contrabando fronteira Brasil-Paraguai

Fonte: IDESF (2015, p.08)

Ainda segundo dados do Instituto de Desenvolvimento Econômico e Social (Idesf), sobre o custo de logística do contrabando dos 10 produtos mais apreendidos pela Receita Federal, temos as seguintes cifras:

Tabela 1- Produtos Apreendidos pela RF

Fonte: IDESF (2015, p.09)

Por esta tabela observa-se a disparidade de preços dos produtos no Brasil e no Paraguai, bem como o lucro máximo e mínimo de cada categoria. Da análise acima depreende-se o motivo pelo qual o cigarro é tão amplamente contrabandeado: lucro mínimo chega próximo aos 200%.

(16)

4. MECANISMOS DE REPRESSÃO E O PAPEL DA RECEITA FEDERAL NO COMBATE AOS ILÍCITOS TRANSNACIONAIS

A Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil (RFB) é órgão específico e singular da estrutura do Ministério da Economia. Ela é responsável pela administração dos tributos de competência da União, inclusive os previdenciários, e aqueles incidentes sobre o comércio exterior, abrangendo parte significativa das contribuições sociais do País.

Além disso, atua no combate e na prevenção aos ilícitos fiscais e aduaneiros como sonegação fiscal, contrabando, descaminho, pirataria, fraude comercial, tráfico de drogas e de animais em extinção e outros delitos relacionados ao comércio internacional, e auxilia o Poder Executivo Federal na formulação da política tributária.

Dentre as diversas competências da Receita Federal, temos o combate ao contrabando e descaminho, no limite da sua alçada e é baseada nesta que a RFB atua, isolada ou conjuntamente, com as demais agências e forças de segurança pública, nos combates aos crimes transfronteiriços, incluindo aí o contrabando de cigarros.

No Regimento Interno da Receita Federal, aprovada pela Portaria nº 284 de 27 de julho de 2020, no Anexo I, artigo 1º, inciso XX, tem-se que uma das finalidades da RFB é: planejar, coordenar e realizar atividades de repressão aos ilícitos tributários e aduaneiros, inclusive a contrafação, pirataria, entorpecentes e drogas afins, armas de fogo, lavagem e ocultação de bens, direitos e valores, observada a competência especifica de outros órgãos.

E para atuar nesse combate a RFB dispõe de unidades especificas, porém não exclusivas, que trabalham no combate aos delitos. São as unidades de repressão, sendo: 1 Coordenação Geral de Combate ao Contrabando e Descaminho (COREP), localizada em Brasília; as Divisões/Seções de Vigilância e Repressão ao Contrabando e Descaminho, localizadas nas diversas unidades da RFB pelo Brasil; além das Equipes de Vigilância e Repressão ao Contrabando e Descaminho (EVR). Ao todo a Aduana brasileira é composta por 29 Alfândegas, 43 Inspetorias, 10 Divisões Aduaneiras, 10 Divisões de Repressão, 1 Centro Nacional de Cães de Faro e um Centro Nacional de Operações Aéreas.

A RFB possui ainda, dentre outras, a Coordenação-Geral de Fiscalização – COFIS que atua no combate a produção clandestina de cigarros. Dentro da COFIS existe uma Equipe Especial de Acompanhamento Integral – Cigarros (EEAI) que é composta por membros desta coordenação, membros da COREP e membros da Coordenação-Geral de Pesquisa e Investigação (COPEI). Além disso, a RFB implantou o Sistema Scorpios, de controle

(17)

automático da produção, que controla a quantidade de cigarros produzida e tem promovido o fechamento de fábricas que não se adéquam ao regime especial de produção que engloba a instalação do Scorpios, bem como ações de repressão e combate ao contrabando de cigarros.

Dentre as estratégias adotadas para combater o comércio ilícito, tem-se a integração e articulação de ações conjuntas de segurança pública, inteligência e controle aduaneiro, bem como articulação com países vizinhos por meios de acordos de cooperação. Complementarmente, há também o aprimoramento da gestão de recursos humanos e de estrutura dos órgãos de combate e fiscalização do contrabando e o compartilhamento de informações e ferramenta entres esses órgãos.

Em 2011, diante da ameaça produzida pela ação de crime organizado transnacional, em especial da produção e tráfico de drogas e de ilícitos conexos e da consequente necessidade de fortalecer a presença governamental, adotou-se um conjunto de políticas públicas para o fortalecimento da faixa de fronteira. Essas ações foram basicamente orientadas pelo Decreto nº 7.496/2011, que estabeleceu o Plano Estratégico de Fronteiras (PEF).

Na evolução temporal do tema, e em decorrência dos ensinamentos colhidos nas ações desenvolvidas no âmbito do PEF, observou-se a necessidade de se estabelecer uma visão mais geral das medidas de governança necessárias à otimização da atuação governamental nas questões fronteiriças, de forma a permitir a implementação de atuações operacionais mais sistêmicas e constantes.

Complementarmente, o Tribunal de Contas da União (TCU) publicou o relatório de auditoria operacional e avaliação de governança de políticas públicas para o fortalecimento da faixa de fronteira (acórdãos nº 2252/2015 e 1995/2016), onde foi apresentada uma análise sistêmica das oportunidades de melhoria por meio de recomendações aos órgãos responsáveis. Diante disso, o Presidente da República, no uso da atribuição que lhe confere o art. 84, caput, inciso VI, alínea “a”, da Constituição, decreta no art. 1º do Decreto nº 8.903, de 16 de novembro de 2016, a instituição do Programa de Proteção Integrada de Fronteiras (PPIF), para o fortalecimento da prevenção, do controle, da fiscalização e da repressão aos delitos transfronteiriços.

O art. 2º do referido Decreto define que o PPIF terá como diretrizes a atuação integrada e coordenada dos órgãos de segurança pública, dos órgãos de Inteligência, da Secretaria da Receita Federal do Brasil do Ministério da Fazenda e do Estado-Maior Conjunto das Forças Armadas, nos termos da legislação vigente, além da cooperação e integração com os países

(18)

vizinhos. A coordenação dos trabalhos ficou a cargo do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República.

Durante o ano de 2017 realizou-se um diagnóstico estratégico, no qual, por meio de uma análise do ambiente interno e externo dos órgãos participantes do PPIF e considerando as recomendações feitas nos acórdãos nº 2252/2015 e 1995/2016, ambos do TCU, aprovou-se o Planejamento Estratégico do PPIF com quarenta e dois Planos de Ação e vinte e cinco Indicadores para monitorar a execução dos Planos. Tudo isso formalizado pela Portaria GSI nº 38, de 20 de abril de 2018.

Finalizada essa etapa de elaboração, os planos foram distribuídos conforme a afinidade do órgão com o escopo do plano de ação e, também, considerando um equilíbrio quantitativo de planos para cada órgão. Coube à Receita Federal coordenar cinco Planos de Ação.

A Receita Federal também desenvolve iniciativas de integração com a Marinha do Brasil, fruto do Acordo de Cooperação Técnica entre a Receita Federal a Marinha do Brasil, assinado em outubro de 2017, para prevenção e repressão aos delitos de repercussão nacional ou internacional, quanto ao uso do mar, águas interiores e áreas portuárias.

Operações conjuntas já foram realizadas em 2018 e outras iniciativas estão em curso visando a atuação da Receita Federal no Centro Integrado de Segurança Marítima da Marinha do Brasil (CISMAR-MB); integração de sistemas da Receita Federal ao Sistema de Gerenciamento da Amazônia Azul (SisGAAz); integração da Declaração Eletrônica de Bens de Viajante da Receita Federal ao aplicativo do COMCONTRAM (Comando do Controle Naval do Tráfego Marítimo) e; aperfeiçoamento dos sistemas de detecção e monitoramento de tráfego marítimo nos portos brasileiros. Além disso, cumpre destacar a cooperação técnica na capacitação de servidores e desenvolvimento de doutrina e protocolos para atuação interagências.

No que diz respeito ao combate ao contrabando e descaminho, aqui incluindo, a título de exemplo, a entrada ilegal de produtos contrafeitos (pirateados), cigarros, armas e drogas no país, ou ainda à pesca eventualmente associada à exportação ilegal, registre-se a necessidade crescente de integração e intercâmbio de informações entre as agências de governo. Trata-se de medida essencial na busca de maior efetividade no combate a tais ilícitos, razão pela qual está se aperfeiçoando o intercâmbio de informações, integração de sistemas e operações conjuntas com a Marinha do Brasil.

(19)

Apesar de desafios impostos por um mundo de fronteiras permeáveis e conexões multivariadas, o Estado tem se mostrado mais presente na região de Foz do Iguaçu. A Receita Federal, por exemplo, organiza semestralmente a Operação Muralha, com vistas a coibir os ilícitos transfronteiriços na região. Inclusive, em 2019, esta Operação se estendeu até Guaíra-PR devido ao crescente aumento de ilícitos. Trata-se de uma operação conjunta, organizada pela Receita Federal, e que conta com a participação de diversas agências e órgãos de segurança pública, tais como Polícia Rodoviária Federal, Polícia Militar do Paraná, Exército Brasileiro, Polícia Civil do Paraná, dentre outros.

Estudos e propostas governamentais já foram feitos no sentido de tentar diminuir a tributação como forma de diminuir o contrabando, visto que um cigarro legalmente comercializado no país tem uma carga tributária de cerca de 80% do valor. Porém, como o preço do produto contrabandeado é muito acessível, ainda que zerássemos a tributação, o produto ilegal continuaria atrativo. Ou seja, redução do contrabando de cigarros com redução de tributação não se mostra uma opção viável. Para redução do contrabando necessitamos de ações mais intensas por parte da Receita Federal e demais órgãos e agências governamentais. Além disso, a RFB sugere algumas alterações nas penalidades, de forma a tornar esse tipo de crime menos atraente.

4.1 - A RECEITA FEDERAL NO COMBATE AO CONTRABANDO DE CIGARROS EM FOZ DE IGUAÇU

Quanto à RFB, a instituição realiza ações fiscais em todo o Brasil para combater o comércio ilegal de cigarros, que gera, além dos demais danos, graves prejuízos aos cofres públicos em decorrência da sonegação de tributos. O comércio ilegal de cigarros caracteriza-se, principalmente, pela colocação, por parte de redes de distribuição, de produtos em situação irregular no comércio varejista que, na maioria das vezes, até mesmo por desconhecimento, acaba confundindo este produto com o legalmente fabricado no Brasil. A quantidade e o valor estimado dos maços de cigarros apreendidos pela RFB em Foz do Iguaçu é:

(20)

Tabela 2: apreensões de cigarros pela Receita Federal em Foz do Iguaçu

(21)

Observa-se que, mesmo com ações diversas de combate, o número de apreensões caiu nos anos de 2016 e 2017 voltando a subir, novamente, em 2019. E em 2020 temos dados até o mês de julho que apontam um dado relevante: em sete meses já se ultrapassou os números de apreensões superior ao observado em alguns anos, conforme gráfico abaixo:

Gráfico 1: Quantidade de maços de cigarros apreendidos em Foz do Iguaçu-PR

Fonte: elaborado pela autora com base na Tabela extraída do CTMA (Receita Federal – 2020)

Assim, observamos que as apreensões em 2015 eram de cerca de 35 milhões de maços ao ano, quantidade essa que foi diminuindo ao longo dos anos, voltando a subir novamente em 2019. Observa-se que no ano de 2020, a despeito de estarmos vivendo uma pandemia mundial, a apreensão em Foz do Iguaçu foi expressiva, chegando até julho do corrente ano a marca de quase 25 milhões de maços apreendidos.

A Receita Federal é ainda um dos membros do CONIQC - Comissão Nacional para Implementação da Convenção Quadro para o Controle do Tabaco - instrumento que contempla iniciativas para controlar o mercado ilegal de cigarros. No âmbito desta Convenção, o Brasil ratificou o texto do Protocolo para Eliminar o Comércio Ilícito de

0 5000000 10000000 15000000 20000000 25000000 30000000 35000000 40000000 2015 2016 2017 2018 2019 2020 Qua n ti d a d e (m a ç o s ) Ano

(22)

Produtos de Tabaco, em complemento ao Artigo 15 da CQCT, com o objetivo de combater, e eventualmente eliminar, o contrabando desses produtos por meio de ações coordenadas de cooperação internacional. O Decreto nº 9.517, de 1 de outubro de 2018, instituiu o Comitê para Implementação deste Protocolo para Eliminar o Comércio Ilícito de Produtos de Tabaco.

Tanto a Convenção Quadro para Controle do Tabaco quanto o Protocolo para Eliminar o Comércio Ilícito de Cigarros estabelecem uma séria de medidas intersetoriais em diversas áreas de atuação nos setores públicos e privados, como, por exemplo, nas áreas de propaganda, publicidade, patrocínio, advertências sanitárias, tabagismo passivo, tratamento de fumantes, comércio ilegal e preços e impostos.

Em síntese, a atuação do Brasil é relevante, especialmente na adoção pioneira de um sistema de rastreamento e de localização da produção dos cigarros e, ainda, na implementação de uma política de tributação que força a alta dos preços, buscando a redução do consumo, sem afetar a arrecadação. O desafio maior, atualmente, é o combate ao mercado ilícito. Contudo, ainda que ressaltados tais avanços, atualmente, os produtos contrabandeados são responsáveis por 38,5% do total de cigarros comercializados no país.

5. CONCLUSÃO

Nesse trabalho foi analisado o contrabando de cigarro na região de Foz do Iguaçu, sua relação com crimes conexos e, concomitantemente, com a segurança e desenvolvimento deste espaço notadamente conhecido pelas fragilidades de suas fronteias.

Os desafios no combate ao comércio ilícito de cigarros são complexos devido, entre outros fatores, à enorme extensão de nossas fronteiras e à sua porosidade. Soma-se a isso a nossa proximidade a países ditos frágeis, os quais têm embrenhado em sua estrutura organizacional as mais diversas atividades ilícitas, tal qual apontado tanto pela literatura especializada como pelas evidências empíricas.

Essa pesquisa demonstrou que o contrabando é um dos grandes problemas com relação ao tema ilícito, inclusive sendo uma questão de segurança, atuando, pois, como um fator de instabilidade. Assim, revisitando nossa cadeia causal, qual o peso das

(23)

variáveis porosidade das fronteiras e Estados frágeis na equação: geopolítica dos ilícitos-estabilidade regional?

Inicialmente, levantou-se a premissa de que a porosidade das fronteiras é um grande problema, o que se confirmou, pois, ao lado de uma demanda quase inelástica, tem sido um dos fatores explicativos do aumento do contrabando, especialmente de cigarros, e descaminho, ao longo do tempo em Foz do Iguaçu, um ponto de contato com um Estado notadamente conhecido pela simbiose entre sua economia e atividades ilícitas. Ao mesmo tempo, a pesquisa permitiu-nos qualificar a Receita Federal como agente de repressão relevante, uma vez que, além de propor mecanismos para o combate, por meio de ações interagências foi determinante na repressão ao contrabando e descaminho, bem como no aumento das apreensões.

No ano de 2020, apesar da pandemia do COVID 19 ter frustrado algumas operações como a Muralha, a Receita Federal realizou diversas ações na Região de Foz do Iguaçu, que resultaram em apreensão de diversas mercadorias, drogas e cigarros. No feriado de carnaval, no âmbito da Operação Fronteira Blindada, a Receita com o apoio da Força Nacional desarticulou um depósito de cigarros contrabandeados em Villa Portes/Foz do Iguaçu. No local foram encontrados cerca de 15 mil maços de cigarros, com valor estimado de R$ 75.000(setenta e cinco mil reais). Em março, uma ação conjunta da Receita e da Polícia Rodoviária Federal resultou na apreensão de um ônibus carregado de cigarros contrabandeados do Paraguai. Havia cerca de 30 mil maços no bagageiro do veículo.

Em maio de 2020 a Alfandega da Receita Federal em Foz do Iguaçu recebeu 1.750.000 maços de cigarros, vindos da Inspetoria de Guaíra, também da Receita Federal, para destruição na unidade local, visto que possuem maquinário disponível para destruição sustentável e de acordo com a legislação ambiental. O comboio, avaliado em R$ 8,75 milhões, era composto de uma carreta bitrem, uma carreta baú, uma carreta e dois caminhões que foram escoltados por equipes da Receita e do Batalhão de Fronteira da Polícia Militar do Paraná (BPFron).

Além da apreensão de cigarros, a Receita Federal também realizou apreensão de eletrônicos, drogas, brinquedos, dinheiro em espécie, calçados, dentre outros produtos sem comprovação de origem ou com indícios de contrafação/pirataria. Algumas operações são rotineiras e foram realizadas apenas pelas equipes da Receita Federal.

(24)

Outras foram realizadas em conjunto com outros órgãos, como o Exército Brasileiro, Polícia Militar, Polícia Rodoviária Federal e Receita Federal.

A última grande apreensão realizada em Foz do Iguaçu, apesar de não ter sido de cigarros, merece um destaque pois foi realizada em parceria com os órgãos acima em um hotel da cidade que servia de depósito de mercadorias, resultando numa apreensão de mais de R$ 1 milhão de reais, entre remédios de importação proibida, celulares, drones, receptores de TV, eletrônicos em geral dentre outros.

Além do problema de segurança pública e de diminuição da arrecadação, o contrabando de cigarros também nos leva a um problema de saúde pública. Esse tema também muito interessante não será tema de estudo deste trabalho, ficando assim como a mudança na qualificação da pena de contrabando, de modo a igualar ao crime do tráfico de drogas, bem como demais penalidades administrativas, como sugestão para trabalhos futuros.

REFERÊNCIAS

BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, Nicola; GIANFRANCO, Pasquino. Dicionário de política I. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1 ed., 1998.

BRASIL. Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Código Penal. Publicada no Diário Oficial da União de 31 de dezembro de 1940. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm>. Acesso em: 20 abril 2020.

FRIEDMAN, Thomas. O mundo é plano. São Paulo: Objetiva, 2012. FUKUYAMA, Francis. Construção dos Estados. Editora Rocco, 2005.

IDESF ( Instituto de Desenvolvimento Economico e Social de Fronteiras). O Custo do

Contrabando. 2015. Disponível em: http://www.idesf.org.br, acessado em 24 de abril de 2020.

MEDEIROS FILHO, Oscar. Entre a Cooperação e a Dissuasão: políticas de defesa e

percepções militares na América do Sul. Tese de Doutorado. Faculdade de Filosofia,

Letras e Ciências Humanas, USP, 2005.

NAÍM, Moisés. Ilícito: o ataque da pirataria, da lavagem de dinheiro e do tráfico à

(25)

NEWMAN, Edward. “Failed States and International Order: Constructing a

PostWestphalian World”. Contemporary Security Policy. 2009

PÊGO B., Moura R., Krüger C., Nunes M. e Oliveira S. Fronteiras do Brasil:

diagnóstico e agenda de pesquisa para política pública, Vol.2. Brasília: Ipea, 2017.

PÊGO B., Moura R., Krüger C., Nunes M. e Oliveira S. Fronteiras do Brasil:

diagnóstico e agenda de pesquisa para política pública, volume 2. Brasília: Ipea, 2017.

QUEIROZ, Fábio Albergaria, BARROS, Thaís. “Uma Abordagem Cognitiva sobre o Haiti: o papel do ambiente psicológico na construção de imagens no contexto da MINUSTAH (2004-2016)”. Revista de Estudos e Pesquisas Sobre as Américas, V.12 N.3 2018. Brasília

SAVIANO, Roberto. Gomorra. Editora Bertrand Brasil. 2009

VISMONA E.L. Manual de Combate ao cigarro ilegal. Fórum Nacional Contra a Pirataria e Ilegalidade – FNCP.

YIN, R. K. Estudo de caso - planejamento e métodos. 3. ed. Porto Alegre: Bookman, 2005.

Referências

Documentos relacionados

Assim, no capítulo 1, &#34;O Exército Inútil de Robert Altman&#34;, Flávio Trovão preocupou-se, primeiramente, com as questões em torno das motivações e condições de

Aproveitamento, até o limite de 2% (dois por cento) de seu efetivo capaz, em funções adequadas e com a correspondente redução salarial, dos empregados que de qualquer forma,

11.1. A qualquer tempo, o presente edital poderá ser revogado ou anulado, no todo ou em parte, seja por decisão unilateral da Unilab, seja por motivo de interesse público ou

Por isso, quando a quantidade de Oxigênio Dissolvido na água diminui, os peixes não conseguem compensar esta.. Diminuição, ficando prejudicados e,

A definição pela área de concentração “Educação” fundamenta-se na necessidade de pesquisas voltadas para o campo da educação, com enfoque em investigações e

Relação entre as variáveis ambientais (altura, cota do rio, temperatura do ar média, temperatura do ar máxima, temperatura do ar mínima, umidade relativa do ar e precipitação e

Com o objetivo de inserir uma Biblioteca de Projetos Integradores do Instituto Federal de Santa Catarina (IFSC) , do curso Técnico de Meteorologia, este trabalho foi realizado

Em outro recipiente, misture todos os ingredientes do quindim manualmente até obter uma massa homogênea.. Com uma manga de confeitar, aplique por cima a massa