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INDÚSTRIAS NA CIDADE DISTRIBUIÇÃO E IMPLICAÇÕES AMBIENTAIS PARA A VULNERABILIDADE 1

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Academic year: 2021

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INDÚSTRIAS NA CIDADE – DISTRIBUIÇÃO E IMPLICAÇÕES AMBIENTAIS PARA A VULNERABILIDADE1

Eduardo J. Marandola Jr.2

Hugo Trevisan Paggiaro3

RESUMO

A localização industrial foi, no modernismo urbano, objeto de planejamento e segregação no espaço da cidade, visando ao mesmo tempo a potencialização da localização (constituições de cadeias produtivas, por exemplo) e a diminuição dos impactos dos riscos industriais, sobretudo os relacionados à contaminação e agravos à saúde. No entanto, com a flexibilização oriunda das reestruturações produtivas e uma nova economia política de gestão dos riscos (no contexto da sociedade de risco), os riscos industriais se instalaram silenciosamente na própria estrutura do espaço urbano-metropolitano, se tornando às vezes invisíveis ou incorporados de tal maneira à paisagem urbana que se tornaram onipresentes. O resultado é a constituição do espaço urbano como distrito industrial, implicando a introdução de riscos difíceis de identificar e manejar. Esse fenômeno pode ser observado em cidades do interior de São Paulo, como Limeira, demandando um olhar renovado sobre os riscos industriais neste contexto de globalização, dispersão urbana e intensa mobilidade que marca as relações população-ambiente e interfere ontologicamente na constituição da vulnerabilidade dos lugares. Neste trabalho, investigamos este fenômeno a partir da análise do papel das indústrias na constituição do espaço urbano de Limeira, com atenção especial para o período recente em que Distrito Industrial e Cidade se confundem, radicalizando a onipresença dos riscos e afetando diferentemente populações e os lugares da cidade.

Palavras-chave: Riscos industriais. População e ambiente. Planejamento urbano.

O deslocamento de São Paulo para as cidades do chamado ABC (Santo André, São Bernardo do Campo e São Caetano do Sul) é realizado pela Avenida do Estado, nome do antigo caminho que acompanha o rio Tamanduateí: berço da cidade de São Paulo.

O caminho, ocupado por várias pistas de rolamento de ambos os lados para abrir o intenso fluxo diário que há décadas articula os subúrbios industriais, nos quais massas de trabalhadores vão e vem, vem e vão entre suas residências e as

1 Trabalho apresentado no IV Seminário Nacional sobre População, Espaço e Ambiente, realizado

nos dias 23 e 24 de Outubro de 2017, em Limeira, SP, nas dependências da FCA/UNICAMP.

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Laboratório de Geografia dos Riscos e Resiliência (LAGERR), Faculdade de Ciências Aplicadas (FCA) da Unicamp.

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Laboratório de Geografia dos Riscos e Resiliência (LAGERR), Faculdade de Ciências Aplicadas (FCA) da Unicamp.

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milhares de plantas industriais que ocupam todo o trajeto. São quilômetros de fábricas, indústrias e barracões de diferentes idades, tecnologias e finalidades.

Fazer este caminho, em 2017, não deixa de ser um pouco nostálgico, se pensarmosno significado que aquela região tem não apenas para São Paulo, mas para todo o país: quantos milhões de pessoas já não trabalharam ali que certamente seria a fornalha se São Paulo fosse de fato (ou tenha sido) a locomotiva do país.

Se por um lado passar por ali nos remete à história do sindicalismo e do industrialismo brasileiro, nos faz pensar também em sua decadência, anunciada pelas reestruturações produtivas que marcam uma nova etapa do capitalismo: ao invés das grandes plantas industriais de transformação, com intensa produção de rejeitos e poluentes à base de combustíveis fósseis e exército de mão de obra, a flexibilização, os novos sistemas que se focam no capital financeiro e especulativo, o que gera a mobilidade também da mão de obra, dos trabalhos e, por fim, das próprias localizações industriais (HARVEY, 1995; SOJA, 1993; CASTELS, 2000).

Na história urbana, a modernização das cidades se confundem com a própria industrialização (BENEVOLO, 2015). É a industrialização que permite a conformação atual das cidades, seja pela possibilidade das edificações e extensão, expressas pela forma urbana (SERRA, 1987), seja pela capacidade produtiva ligada ao seu sentido social e possibilidade de acumulação (LEFEBREVE, 2002).

Cidade e indústria, portanto, possuem uma relação direta no período pós-revolução industrial, que chega até os anos 1960 no caso das cidades brasileiras, sobretudo aquelas que capitanearam tal processo, como São Paulo.

Dois processos acontecem a partir daí, no entanto, que iniciam um longo processo de mudança. O primeiro se refere à desconcentração produtiva, sobretudo a partir dos anos 1970, que no estado de São Paulo será analisada como interiorização do desenvolvimento, iniciada décadas antes, embora em outro ritmo (CANO, 1989), levando à mudança de plantas industriais que passam a se espalhar por diferentes cidades do estado, sobretudo as com acessibilidade via as grandes rodovias, como a Via Anhanguera. O segundo processo se refere à adoção do planejamento modernista, já presente no entre-guerras, que passa a organizar as reforças urbanas e o subsequente planejamento a partir das funções, o que implica isolar as áreas industriais em distritos específicos e exclusivos para tal prática. Benevolo (2015) reafirma a orientação de tal planejamento, que busca uma maior racionalidade no uso do espaço urbano, o que implica gerar uma isonomia maior no

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espaço para reduzir os inconvenientes da mistura de tais funções.

As indústrias, sem dúvida, são as grandes vilãs: trazem poluição, inconvenientes com o tráfego pesado, ruído excessivo e uma série de inconvenientes que entram em choque com as noções puras e racionais do modernismo, mas também com a busca crescente, que se acentuará nos anos 1970, de busca de qualidade de vida nas cidades. Grandes plantas industriais expelindo contaminantes no céu no solo ou na água não são bem-vindas como antes, quando carregavam apenas o signo do desenvolvimento.

Neste cenário, a preocupação com a poluição industrial e a busca por melhoria da saúde urbana e de sua população (HOGAN, 1995) já ocupa os ambientalistas e aqueles preocupados com as cidades.

A ênfase no planejamento territorial como solução para os riscos oriundos da industrialização, ao menos o ambiente urbano, aparece como solução para um problema que parece se limitar aos possíveis desastres oriundos de falhas em sistemas de segurança, na forma de perigos tecnológicos (ZEIGLER; JOHNSON JR.; BRUN, 1983) ou mesmo para aqueles preocupados com as relações entre população e ambiente, com o foco claro na capacidade das populações de enfrentar tais situações de risco (TORRES, 1993).

No entanto, com a globalização do risco e a reestruturação produtiva, o enfrentamento dos riscos industriais se tornou sensivelmente mais complexos. Plantas cada vez menores ganharam mobilidade a partir dos anos 1990, podendo ser montadas e desmontadas, levadas para novas localizações (DRUCK; FRANCO, 1997). Isso favoreceu a nova lógica de distribuição dos riscos, conforme analisa Beck (2010), constituindo também uma nova política dos riscos.

No caso dos riscos industriais, há um aparente desencaixe com relação à escala da produção da cidade, tanto pela fluidez e possibilidade de deslocamento de tais riscos, quanto pela introdução de riscos produzidos e distribuídos na escala global (BECK, 2010). Esse processo contribui para a introdução silenciosa de riscos na cidade, sobretudo pelo seu caráter lento e intrínseco à própria forma de reorganização das atividades industriais e sua distribuição espacial.

No entanto, os riscos industriais na cidade possuem também uma faceta claramente ligada à produção do espaço urbano. Se de um lado é verdade que as indústrias constituem a própria urbanização, de outro a adoção da orientação modernista de setorização, na forma da constituição de distritos industriais, parece

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ter criado uma falsa impressão de que as indústrias estariam restritas a estes espaços da cidade. Esse fato, somado à aparentemente perda de importância das grandes plantas poluidoras (face à ênfase na financeirização da economia), parece ter deixado as indústrias fora da mira principal dos esforços de compreensão dos processos de vulnerabilidade, tão influentes e presentes nos últimos anos.

Não que nos esteja faltando estudos mostrando os efeitos negativos do modelo de industrialização no campo de população e ambiente. Desde os primeiros estudos de Hogan (1989; 1993; 1995) sobre Cubatão, passando por Torres (1993); Franco (1997); Costa (2000); Porto e Freitas (2000); Braga (2000) e Santos e Marandola Jr. (2012), esta tem sido uma temática perene, sobretudo no que se refere à dinâmica demográfica e aos agravos à saúde.

No entanto, chamamos atenção para a necessidade de um novo olhar para as indústrias na cidade, não apenas nos contextos de grandes acidentes ou desastres, mas na sua presença quase onipresente e naturalizada que elas parecem ter assumido, sobretudo nesse formato menor e desconcentrado.

Esta onipresença da indústria pode ser bem exemplificada pelo estudo realizado na cidade de Limeira, interior de São Paulo. Cidade que nasce já ligada à indústria, no caso, a que vem promovida pelas grandes fazendas de café (HEFLINGER JR., 2016; 2017), as quais ajudam a formar o capital que significará posteriormente a constituição de grandes plantas industriais na cidade (ainda na primeira metade do século XX), e que após receber parte da desconcentração produtiva de São Paulo organiza um Arranjo Produtivo Local baseado na indústrias de semi joias que dinamiza e alimenta toda uma cadeia produtiva (ETULAIN et al., 2012).

Contando também com distritos industriais o espaço urbano, no entanto, apresenta uma presença da indústria que torna a cidade como um todo um verdadeiro distrito. Com exceção da região de condomínios fechados e de dois extremos da cidade, cada ponto do espaço urbano está a menos de 800m de uma unidade industrial (Figura 1). A distribuição de tais unidades e seu significado constitui o foco principal de discussão e investigação deste trabalho.

Em vista disso, realizamos a análise das localizações segundo as regiões da cidade, seus eixos de circulação (baseado em uma tipificação espacial), tanto historicamente quanto na configuração atual. O objetivo é compreender o entrelaçamento entre as indústrias e o espaço urbano, identificando os momentos

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diferentes em relação aos modelos de industrialização que convivem na cidade. A caracterização da população e sua distribuição permite qualificar as populações em situação de risco bem como as concentrações, vazios e ausências. Por outro lado, esta qualificação abre caminho para a discussão das implicações desta presença industrial, sobretudo no que se refere à segurança, aos riscos e à constituição da vulnerabilidade.

Os resultados apontam para a importância da compreensão da multiescalaridade na produção do espaço urbano no contexto dos novos contextos de distribuição de riscos e suas consequências para a vulnerabilidade.

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REFERÊNCIAS

BECK, U. Sociedade de risco. São Paulo, SP: Editora 34, 2010.

BENEVOLO, Leonardo. História da cidade. São Paulo: Perspectiva, 2015.

BRAGA, T. M. Risco e conflito ambiental sob o signo da (mono) indústria: um estudo sobre políticas ambientais na bacia do rio Piracicaba, Minas Gerais. In: TORRES, H.; COSTA, H. (org.). População e ambiente: debates e desafios. São Paulo, SP: Senac, 2000. p. 327-348.

COSTA, H. S. M. Indústria, produção do espaço e custos socioambientais: reflexões a partir do exemplo do Vale do Aço, Minas Gerais. In: TORRES, H.; COSTA, H. (org.). População e ambiente: debates e desafios. São Paulo, SP: Senac, 2000. p. 191-212.

CANO, W. (coord.). A interiorização do desenvolvimento econômico no Estado de São Paulo – 1920-1980. São Paulo, SP: Fundação Seade, 1989.

CASTELS, M. A sociedade em rede. São Paulo, SP: Paz e Terra, 2000.

DRUCK, G.; FRANCO, T. A degradação do trabalho e os riscos industriais no contexto da globalização, reestruturação produtiva e das políticas neo-liberais. In: FRANCO, T. (org.). Trabalho, riscos industriais e meio ambiente: rumo ao desenvolvimento sustentável? Salvador, BA: Edufba, 1997. p. 33-61.

ETULAIN, C. et al. Perfil económico da Microrregião de Limeira. In: BAENINGER, R. et al. (org.). Região de Limeira. Campinas, SP: Nepo/Unicamp; Limeira, SP: FCA/Unicamp, 2012. p. 35-61. (Por Dentro do Estado de São Paulo, v. 5).

FRANCO, T. (org.). Trabalho, riscos industriais e meio ambiente: rumo ao desenvolvimento sustentável? Salvador, BA: Edufba, 1997.

HARVEY, D. Condição pós-moderna: uma pesquisa sobre as origens da mudança cultural. São Paulo, SP: Loyola, 1995.

HEFLINGER JR., J. E. Um pouco da história de Limeira. Limeira, SP: Unigráfica V.II., 2017.

HEFLINGER JR., J. E. Um pouco da história de Limeira. Limeira, SP: Unigráfica, V.I., 2016.

HOGAN, D. Migração, ambiente e saúde nas cidades brasileiras. In: HOGAN, D.; VIEIRA, P. F. (org.). Dilemas socioambientais e desenvolvimento sustentável. Campinas, SP: Editora da Unicamp, 1995. p. 149-166.

HOGAN, D. População, pobreza e poluição em Cubatão, São Paulo. In: MARTINE, G. (org.). População, meio ambiente e desenvolvimento: verdades e contradições. Campinas, SP: Editora da Unicamp, 1993. p. 101-131.

HOGAN, D. População e meio ambiente. Textos NEPO 16, Campinas, SP, 1989. LEFEBVRE, H. A revolução urbana. Belo Horizonte, MG: Editora da UFMG, 2002. PORTO, M. F. S.; FREITAS, C. M. Indústria química brasileira, acidentes químicos ampliados e vulnerabilidade social. In: TORRES, H.; COSTA, H. (org.). População e ambiente: debates e desafios. São Paulo, SP: Senac, 2000. p. 301-326.

SANTOS, F. M.; MARANDOLA JR., E. Populações em situação de risco ambiental e vulnerabilidade do lugar em São Sebastião, Litoral de São Paulo. Desenvolvimento

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e Meio Ambiente, Curitiba, PR, v. 26, p. 103-125, 2012.

SERRA, G. O espaço natural e a forma urbana. São Paulo, SP: Nobel, 1987. SOJA, E. Geografias pós-modernas: a reafirmação do espaço na teoria social crítica. Rio de Janeiro, RJ: Zahar, 1993.

TORRES, H. Indústrias sujas e intensivas em recursos: importância crescente no cenário industrial brasileiro. In: MARTINE, G. (org.). População, meio ambiente e desenvolvimento: verdades e contradições. Campinas, SP: Editora da Unicamp, 1993. p. 43-67.

ZEIGLER, D.; JOHNSON JR., J.; BRUNN, S. Technological hazards. Washington, DC: AAG, 1983.

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