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A aplicação dos Dados Demográficos na Regularização Fundiária da Amazônia Legal * Pedro Assumpção Alves **

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A aplicação dos Dados Demográficos na Regularização Fundiária da

Amazônia Legal

*

Pedro Assumpção Alves** Thiago Batista Marra***

Palavras chave: Regularização Fundiária; INCRA; Censo Agropecuário IBGE de 2006; Compatibilização de Dados.

Resumo: Qual a importância do trabalho de regularização fundiária, em curso no Ministério do Desenvolvimento Agrário, para a prevenção e solução dos principais conflitos ambientais e sociais da região Amazônica? Até que ponto a realidade Amazônida está expressa nos Bancos de dados das instituições que tratam da gestão de terras no Brasil? Qual a utilidade das informações demográficas para captar o dinamismo das ocupações em terras públicas? Até que ponto os dados dos Censos Agropecuários podem ser comparados aos demais dados oficiais para compor a realidade amazônida? Estes e outros questionamentos dão o Norte do presente artigo, que busca demonstrar a estratégia e a metodologia do Ministério do Desenvolvimento Agrário ao utilizar a Contagem Populacional e o Censo Agropecuário de 2006 no trabalho de regularização fundiária da Amazônia Legal.

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Trabalho apresentado no XVII Encontro Nacional de Estudos Populacionais, ABEP, realizado em Caxambú- MG – Brasil, de 20 a 24 de setembro de 2010.

** Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental do Ministério do Planejamento, lotado no

Ministério do Desenvolvimento Agrário.

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A aplicação dos Dados Demográficos na Regularização Fundiária da

Amazônia Legal

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Pedro Assumpção Alves** Thiago Batista Marra***

Introdução

Um dos principais desafios para a construção de uma estratégia de desenvolvimento para a região amazônica é o „anacronismo de sua estrutura fundiária‟1

. Pode-se dizer que este é um problema que permeia todo o território amazônico, não obstante a enorme diversidade regional que caracteriza esta porção do território brasileiro.

Um dos principais sintomas de tal anacronismo pode ser apontado como o desencontro das bases de dados disponíveis nos diferentes órgãos e instituições que tratam da gestão de terras nesta região. Desta forma, é possível afirmar que existe um quadro do panorama fundiário presente em cada um dos órgãos que tratam do tema, que raras vezes coincide com os demais.

O Censo Agropecuário de 2006 trouxe importantes elementos para uma melhor compreensão desta problemática. Este Texto busca apresentar um quadro geral das principais dimensões da questão fundiária na Amazônia Legal, com o objetivo de apresentar a estratégia do Ministério do Desenvolvimento Agrário na utilização dos dados do Censo Agropecuário de 2006 como um dos principais subsídios para planejar o início do hercúleo empreendimento da regularização fundiária de ocupações em terras públicas.

Por esta razão, é importante destacar que o objetivo do presente trabalho é contribuir para a agenda de pesquisa que trata do tema fundiário, a partir da exposição das presentes estratégias do Governo Federal para enfrentar o problema, ressaltando a importância da utilização dos dados coletados no Censo Agropecuário de 2006 para o planejamento deste processo.

Sendo assim, busca-se expor a forma como tais dados foram assimilados pelo Programa de regularização fundiária, com o intuito de que, no decorrer do debate acadêmico, novas contribuições possam ser apreendidas e incorporadas a esta metodologia.

Para alcançar este objetivo este trabalho foi dividido em cinco seções, sendo esta pequena introdução a primeira. A segunda parte trata de uma breve exposição sobre a dimensão social do desafio da regularização fundiária Amazônica, a partir do histórico da ocupação antrópica na Amazônia Legal.

* Trabalho apresentado no XVII Encontro Nacional de Estudos Populacionais, ABEP, realizado em

Caxambú- MG – Brasil, de 20 a 24 de setembro de 2010.

** Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental do Ministério do Planejamento, lotado no

Ministério do Desenvolvimento Agrário.

*** Servidor do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária. 1

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A terceira parte aborda o ambiente institucional da gestão fundiária na Amazônia. Esta seção é enfocada na organização do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), abordando o funcionamento do Sistema Nacional de Cadastro Rural e sua atual base de dados.

A quarta parte trata especificamente da contribuição da base de dados coletadas pela FIBGE (no decorrer do Censo Agropecuário de 2006) para a estruturação do inicio dos trabalhos de regularização fundiária na Amazônia Legal. Vale destacar que esta seção do texto reserva um espaço dedicado à descrição da metodologia empregada pelo MDA, especialmente na compatibilização dos dados disponibilizados pelo IBGE com as demais fontes de dados que tratam do tema fundiário na Amazônia.

Por fim, a última parte deste trabalho aborda o atual Programa de regularização fundiária (Programa Terra Legal) como importante ferramenta para buscar a mitigação e solução de parte dos conflitos sociais existentes nessa região.

1) Dimensão Social

A dimensão Social do desafio de executar um programa de Regularização fundiária na Amazônia Legal pode ser classificada como a mais aguda e de difícil solução. É importante ressaltar que a Amazônia se constitui em um mosaico de situações, com enorme diferenciação regional (e local). Não obstante, é possível entender grandes padrões de ocupação e exploração na região, que estabelecem em linhas gerais as principais questões a serem enfrentadas.

Na dinâmica de ocupação da região Amazônica na segunda metade do século XX, ocorrem dois processos distintos (Cardoso, 2002; Becker, 2005; Ab‟Saber, 2005). A primeira fase pode ser caracterizada por uma expansão da ocupação da Amazônia capitaneada por grandes investimentos federais, através da criação de estrada, incentivos fiscais, e grandes projetos de exploração mineral, agrícola2 e hidráetétrico.

Nessa fase, predominaram migrações provenientes de diferentes partes do Brasil em direção à Amazônia. Dentro de um contexto em que as frentes de expansão se localizavam principalmente nas três grandes artérias rodoviárias (Belém-Brasília, Brasília-Cuiabá e Transamazônica) a tradicional conectividade entre os núcleos populacionais, a partir da rede de transporte fluvial, alterou-se para uma conectividade rodoviária.

Nessa fase, a ocupação populacional foi planejada a partir de um paradigma de criação de uma hierarquia entre os assentamentos populacionais. Deveriam ser criados novos pólos a partir das cidades existentes, contando que, a partir da nova conectividade por transporte rodoviário, estas cidades comandariam as vilas criadas ao longo das novas rodovias, que, por sua vez, dinamizariam comunidades rurais mais afastadas3 (Cardoso, 2002).

2 Dentre os quais vale ressaltar o Plano de Integração Nacional – PIN (1970), Programa de Redistribuição

de Terras e de Estímulo à Agroindústria do Norte e Nordeste - PROTERRA (1971), Programa de Pólos Agropecuários e Agrominerais da Amazônia - POLAMAZÔNIA (1974).

3 Contudo, é importante ressaltar que a grande maioria dos projetos de colonização induzida foi

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A segunda fase de ocupação da Amazônia delineia-se a partir da crise fiscal atravessada pelo Estado brasileiro no decorrer dos anos de 1980. Nessa fase, os grandes planos de investimento federal vão sendo paulatinamente abandonados e a expansão das frentes de ocupação passa a ser comandada por “madeireiras, pecuaristas e sojeiros já instalados na região, que a promovem com recursos próprios” (Becker, p. 81, 2005). Por essa razão, entende-se que a dinâmica recente de expansão populacional e de aumento da complexidade da rede urbana da região apresenta impulso endógeno. Dessa forma, os movimentos migratórios predominantes, a partir de 1980, passam a ser intra-regionais, entre os estados da região, e com uma grande dimensão de movimentos no sentido rural-urbano. Vale ressaltar que a característica de „agricultura itinerante‟, observada por Celso Furtado, ainda é válida, mas a dinâmica geral do movimento de ocupação foi alterada.

Gráfico 1 – População Urbana e Rural Residente nas Unidades da Federação que formam a Amazônia Legal

Fonte: FIBGE Contagem da População 2007; DATASUS acesso em 15/10/09

O aumento das migrações do tipo rural-urbano foi fruto da contraposição entre dois modelos de uso da terra e dos recursos florestais (Becker, 2005; Cardoso, 2002). De um lado, o modelo que caracteriza a agricultura familiar do tipo minifundista e o modo de vida das populações tradicionais; de outro, o modelo capitaneado pela expansão da agroindústria da soja, dos grandes pecuaristas e das madeireiras, cuja posse da terra pode ser caracterizada como de tipo latifúndio4. A principal conseqüência deste quadro é a importante evasão populacional5 de comunidades rurais e de pequenas vilas

relação à infra-estrutura urbana, e, por outro, os processos de fixação do homem na terra, a partir da concessão de títulos de domínio definitivo, acumulam-se nos arquivos das Superintendências Regionais do Incra sem conclusão.

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O uso sustentável dos recursos florestais, dos quais o projeto RECA seria o exemplo mais bem sucedido, tem maior possibilidade de se tornar efetivo a partir do modelo de uso do solo da agricultura familiar, onde existe maior aproveitamento da cultura „amazônida‟, em que a biodiversidade se compõe como uma vantagem comparativa. Em contraposição, o modelo de uso do solo historicamente preponderante nos latifúndios: caracterizado pela busca de homogeneização da natureza (monocultura), via de regra, sem levar em conta as características particulares do solo amazônico e da relação estabelecida entre os mais antigos ocupantes da Amazônia com o ambiente. Fato que pode ser apontado como uma das principais causas do rápido empobrecimento do solo em diferentes áreas de fronteira dessa região (Ab‟Saber, 2005).

5 Na segunda fase de ocupação da região amazônica, transparece uma progressiva desvinculação entre

fixação populacional e dinâmica de desmatamento de áreas florestais. “[...]onde as migrações rural- urbana estão se tornando majoritárias e pequenos agricultores têm deixado o campo, pesquisas têm demonstrado que as florestas não estão aumentando. Mais precisamente, muitos pequenos proprietários

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em direção a cidades e vilas de maior porte, que acabaram adquirindo status de município. Como demonstra o Gráfico 1 acima.

Gráfico 2. Desmatamento na Amazônia, Acumulado anual, Período 1988–2008, Km²

Fonte: INPE, PRODES, www.inpe.br acesso em 15/10/09.

Outro ponto importante a ser destacado é que a forma de uso do solo se alterou no decorrer deste período, mudando a correlação entre a dinâmica de ocupação humana e a pressão sobre os recursos florestais. No Gráfico 2, pode-se observar que no decorrer do período de 1988 a 2008, a pressão sobre os recursos naturais, expressa na taxa anual de desmatamento, apresenta um movimento senoidal, com pouquíssima relação com os dados apresentados no Gráfico 1, que trata do crescimento da população. Sendo assim, corrobora-se a afirmação de que o dinamismo do desmatamento na região (uma das principais agendas do Governo federal na Amazônia) não é mais ditado pelo crescimento demográfico (Hogan et alli, 2007).

Pode-se dizer que esta mudança acirrou os conflitos que giram sobre o direito ao uso e ocupação da terra, colocando em foco a multiplicidade de atores/agentes sociais na região (indígenas; populações tradicionais; ocupantes fruto de colonização induzida; assentados de reforma agrária; grileiros; madeireiros; produtores de soja; pecuaristas; etc). De qualquer forma, o exercício a ser realizado na análise da dimensão social dos desafios à Regularização Fundiária deve ser centrado nas formas de inserção econômica destes agentes, bem como a forma de reprodução social destes grupos.

No que se refere à dinâmica de ocupação do solo, é importante ressaltar o papel progressivo da „especulação imobiliária‟ neste processo. Em um artigo publicado em 1991, Fearnside já chamava atenção para este ponto, quando afirmava que “a pecuária bovina toma a maior parte das terras desmatadas na Amazônia”, contudo, “a produção de carne bovina é baixa, mas o papel das pastagens na especulação fundiária acelera o processo do desmatamento” (Fearnside, 1991, p.1).

Esta exposição reflete o imbróglio institucional que incide sobre a Gestão de Terras na Amazônia, cujo resultado mais aparente é a falsa identidade cultivada na região, em que a degradação florestal se constituiu como uma das principais ferramentas para a comprovação da posse e exploração da terra.

são substituídos por fazendeiros de maior escala ou por novos migrantes que simplesmente substituem aqueles que saíram.” Padoch e Brondizio et all (2008) (Tradução livre).

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2) Dimensão Interinstitucional

A dimensão Interinstitucional é estreitamente ligada à falta de coordenação do aparato burocrático do Estado brasileiro, sendo a principal causa da insegurança jurídica nesta região. Pode-se dizer que ela também é resultado de uma atuação insuficiente (ou ineficiente) do Estado na Amazônia. De qualquer forma, a principal questão relacionada a esta problemática é a multiplicidade de ações, que vislumbraram cumprir diferentes objetivos, muitas vezes antagônicos.

É correto afirmar que até os anos 1960, a maior parte das terras da Amazônia pertencia à União e aos estados. A forma de ocupação e uso do solo, majoritariamente, estava caracterizada por terras públicas não tituladas, ocupadas por posseiros.

A partir de meados da década de 1960, a ocupação antrópica da Amazônia passa a integrar a agenda dos Governos Militares. Neste contexto, é criado o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), pela Lei 6.383 de 1976. A partir de então, esta autarquia passa a ser o principal órgão responsável pela gestão de Terras na Amazônia. É importante destacar que a regularização fundiária não era o principal foco da atuação desta autarquia, que foi marcada por uma seqüência de reformas e interrupções, tanto em sua estrutura funcional, quanto em suas prioridades de atuação.

No início da década de 1980, o acirramento dos conflitos pela posse de terra, na região Norte do País, aliado a uma crescente organização dos movimentos sociais, levou a criação do Ministério Extraordinário para Assuntos Fundiários e dos Grupos Executivos de Terras do Araguaia/Tocantins - GETAT, e do Baixo Amazonas - GEBAM. Pode-se dizer que esta foi a primeira tentativa de focalizar a atuação do INCRA na regularização fundiária.

Contudo, a vida destes Grupos Executivos foi curta, visto que o INCRA acaba sendo extinto em 1987, pelo Governo José Sarney, que passa suas atribuições para o Ministério da Agricultura. Vale ressaltar, que neste momento a regularização fundiária passa para o segundo plano, e o enfoque da atuação dos órgãos de gestão de terras se volta para o esforço de ampliar os programas de „reforma agrária‟.

Em 1989 o INCRA é recriado pelo Congresso Nacional e vinculado à Presidência da República. Posteriormente, em 1996, esta autarquia é atrelada ao Ministério Extraordinário de Política Fundiária. Este Ministério, por sua vez, acabou sendo extinto, resultando na criação do Ministério do Desenvolvimento Agrário, ao qual o INCRA está subordinado, a partir da edição do Decreto nº. 3.338. Os primeiros nove anos da atuação do INCRA sob a tutela do Ministério do Desenvolvimento Agrário também foram marcados pelo maior enfoque na Reforma Agrária, deixando a regularização fundiária em segundo plano.

A edição da Medida Provisória 458, e sua converção na Lei 11.952, de junho de 2009, marcam a iniciativa de tentar focalizar o trabalho de regularização fundiária como uma das ações prioritárias do INCRA. Para alcançar tal objetivo foi criada uma engenharia de gestão, em que o Programa Terra Legal é coordenado diretamente pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário6 e executado pela Supertintendência Nacional

6 Na figura do Secretário Executivo Adjunto Extraordinário de Regularização Fundiária da Amazônia

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de Regularização Fundiária na Amazônia Legal. A organização proposta para a execução dos trabalhos de regularização fundiária difere da tradicional estrutura do INCRA. Isto pelo fato de se constituir por uma estrutura de comando centralizada, em que os servidores lotados nas diferentes Unidades da Federação estão subordinados à Escritórios Regionais, e, não Superintendências Regionais. Resta saber se esta nova configuração da estrutura executiva será dotada de recursos físicos e humanos para levar a cabo o trabalho que se propõe.

Este breve quadro lança luz sobre a descontinuidade do processo histórico de regularização fundiária, em especial, o da regularização fundiária na Amazônia. Aliado a este panorama histórico, é importante ressaltar que na atual estrutura organizacional do Estado Brasileiro, a União e os estados apresentam uma série de órgãos que tratam da gestão de terras nessa região, dentre as quais: Fundação Nacional do Indio - FUNAI; Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodeversidade – ICMBio; Institutos de Terras Estaduais; Cartórios e Tabelionatos de Registro Civil; dentre outros.

Dentre estas instituições, vale destacar a situação específica dos Cartórios e Tabelionatos de Registro Civil, que, apesar de instituições do Direito Privado, exercem função de utilidade pública. Não são raros os casos de cartórios que apresentam registro de imóveis que superam em muito a área de sua comarca. Outra questão que também envolve os cartórios é a falta de um sistema que interligue as bases de informações das diferentes comarcas, permitindo o registro de um mesmo imóvel em diferentes cartórios, levando a duplicidade de informações. Por fim, vale ressaltar o fato de que os Cartórios e Tabelionatos de Registros de imóveis são órgãos regulados pelo Poder Judiciário, o que, via de regra, torna inviável a correção de registros cartoriais que não condizem com os dados registrados no Sistema Nacional de Cadastro Rural (SNCR) pela via administrativa.

O principal ponto a ser ressaltado do atual arranjo institucional concertado sobre o tema da gestão de terras no Brasil é o de que não existe uma base de dados unificada para consulta de tais órgãos, fato que culmina na sobreposição espacial de informações e destinações.

A conseqüência mais aparente deste problema é a incerteza sobre os números que envolvem a Amazônia: não se sabe qual o volume de terras já titulado em nome de particulares; não se sabe com exatidão qual o volume de Unidades de Conservação na região, nem sua posição geográfica; em menor grau, tem-se o mesmo problema com as Terras Indígenas; grande parte dos projetos de assentamento não tem sua posição Geográfica bem definida. Sendo assim, não é certo o montante (área) de terras

públicas que será objeto do Programa de Regularização Fundiária.

Desta forma, é mister ressaltar a necessidade de repensar e redesenhar o fluxo de informações entre as instituições afetadas e envolvidas na gestão de terras7. Iniciativas

Amazônia Legal e das Coordenações Estaduais Extraordinárias de Regularização Fundiária na Amazônia Legal.

7 Deve-se apontar para o atual esforço de construção da Infraestrutura Nacional de Dados Espaciais –

INDE, na qual se prevê a disponibilização das informações e dados Georreferenciados de todos os órgãos públicos, por serviços oferecidos por meio da Internet, através de protocolos internacionais públicos, de ampla aceitação. Quando esta estrutura estiver em funcionamento, será possível a um órgão acessar de forma mais simples, ágil, completa e integrada, e sem necessidade de conhecimento especializado, tanto os dados e as informações de suas próprias bases quanto dados e informações existentes nas bases de outros órgãos do Governo Federal.

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como o Plano Amazônia Sustentável (PAS) e o Macrozoneamento Ecológico Econômico da Amazônia Legal (MacroZee) devem ser acompanhadas de perto pelo núcleo de decisão dos governos, para que exista coerência nas iniciativas empreendidas pelos diferentes órgãos na estratégia de desenvolvimento da Amazônia.

2.1) O Sistema Nacional de Cadastro Rural

Pode-se dizer que o Sistema Nacional de Cadastro Rural (SNCR) foi uma das principais iniciativas do Governo Federal no sentido de alcançar uma base de dados confiáveis para a gestão de terras no Brasil.

O Cadastro de Imóveis Rurais foi criado em 1964 pela Lei 4.504, com o foco de dar maior capacidade executiva para as ações de Zoneamento Agrário, Políticas de Reforma Agrária, de Desenvolvimento Agrário e de Tributação da Terra.

No ano de 1972, buscando aprimorar a capacidade de tributação do Estado, é criado o SNCR, com a promulgação da Lei 5.868. A partir da criação do SNCR foram efetuados quatro esforços de recadastramento de imóveis rurais, nos anos de 1972, 1978 e 1992 e 2008.

Em 2001 o foco de atuação do SNCR ganha maior escopo, e a gestão das terras passa a configurar-se como um de seus principais objetivos, a partir da promulgação da Lei 10.267. Assim sendo, o SNCR passa a buscar maior interface com as informações contidas nos Serviços de Registro Imobiliário. É criado o Sistema Público de Registro de Terras, estabelecendo um vínculo entre o SNCR (INCRA) e o registro imobiliário (sistema cartórios). Além disso, passam a ser exigidas as plantas georreferenciadas do imóvel rural para a efetivação de qualquer transação imobiliária no sistema cartorário.

Desta forma, o atual SNCR apresenta uma estrutura que tenta cumprir quatro objetivos principais8:

 “Caracterização do domínio e uso da terra (incluindo títulos de domínio, natureza da posse, localização geográfica, área com descrição das linhas de divisas e nome dos respectivos confrontantes, dentre outras);

 Identificação e o grupamento dos vários imóveis rurais que pertençam a um único proprietário

 Certificado de Cadastro de Imóveis Rurais (documento expedido pelo INCRA e que não faz prova de propriedade ou de direitos a ela relativos).

 Classificação fundiária – imóveis passíveis de intervenção para correção do regime de uso e posse da terra.”

Contudo, é importante ressaltar que a implementação das alterações legais efetuadas pela Lei 10.267/01 esbarraram em problemas estruturais e institucionais do SNCR:

Em primeiro lugar, toda a base de cadastros constantes no SNCR antes de 2001 não apresentava dados da localização espacial dos imóveis, impossibilitando o posicionamento geográfico de tais imóveis, bem como a definição de seus limites.

8 Informações coletadas a partir de uma exposição realizada em 2006 pela Coordenação de Cadastro

Rural da Diretoria de Ordenamento Fundiário do INCRA. Disponível no endereço eletrônico

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Via de regra, o recadastramento de imóveis rurais realizado pelo INCRA na Região Norte, apresentou baixa adesão, fato que impossibilitou a correção dos dados já presentes na base.

As Superintendências Regionais do INCRA apresentaram baixa capacidade de execução no que se refere à certificação de plantas e memoriais descritivos, provenientes de serviços de georreferenciamento executado por particulares, inviabilizando a emissão sistemática de Certificados de Cadastro Imóvel Rural (CCIR). Por sua vez, os CCIRs são peça chave para a vinculação do SNCR com o registro de imóveis, fato que levou à continuidade da prática de registros que não atendiam à Legislação.

O Panorama dos registros contidos no SNCR é um bom exemplo da baixa qualidade dos dados disponíveis para o início do Programa de regularização fundiária. Segundo a tabulação realizada em 2003, pela Coordenação de Obtenção da Diretoria de Ordenamento Fundiário do INCRA, apenas 35% da área territorial da Amazônia Legal estava cadastrada no SNCR. Desta forma, se esta base de dados fosse tomada como um reflexo da realidade amazônida, ela poderia expressar apenas um terço de sua situação fundiária.

Quando os dados da base do SNCR são agregados em nível municipal é possível observar maiores fragilidades nesta fonte de registros:

Tabela 1.

Informações Cadastradas no SNCR Agrupadas por Municípios, Amazônia Legal, 2003. UF

Municípios que apresentaram área cadastrada superior a

área do município

Municípios que apresentam menos de 50% de sua área territorial cadastrada no SNCR Total de municípios AC 0,0% 76,2% 21 AM 0,0% 90,3% 62 AP 0,0% 93,8% 16 MA 11,1% 58,9% 180 MT 33,8% 20,9% 139 PA 4,9% 65,7% 143 RO 11,3% 60,4% 53 RR 13,3% 73,3% 15 TO 24,5% 20,1% 139 Total 15,1% 50,4% 768

Fonte: Coordenação de Obtenção, Diretoria de Ordenamento Fundiário, INCRA.

Na Tabela 1 é possível observar a enorme lacuna existente nos dados cadastrados no SNCR. Por um lado, cerca de 15% dos municípios dessa região apresentam uma área cadastrada que excede sua dimensão territorial. Por outro lado, mais de 50% dos municípios apresentam menos de 50% de sua extensão territorial cadastrada no SNCR.

Estes dados são um exemplo da fragilidade das informações constantes na base de dados do INCRA para o início do trabalho de regularização fundiária na Amazônia Legal, indicando a necessidade de buscar outros fontes de informação para o início deste esforço, dentre os quais os dados coletados no Censo Agropecuário de 2006, do IBGE.

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3) Os dados do Censo Agropecuário de 2006 e o trabalho de regularização fundiária.

Os dados do Censo Agropecuário de 2006 foram importantes para o planejamento do inicio das operações do Programa Terra Legal em diferentes aspectos. O primeiro motivo foi o de permitir uma crítica aos dados presentes nos registros do SNCR, a partir daqueles coletados em uma pesquisa que teoricamente representa o universo de atuação do Programa.

Deve-se destacar que existem diferenças no conceito de imóvel rural9, dos dados presentes no SNCR, daqueles coletados no Censo Agropecuário de 2006, quando tratam de estabelecimentos agropecuários10.

No que se refere ao trabalho de regularização fundiária da Amazônia Legal11, regido pela Lei 11.952/09, o perfil dos beneficiários do Programa Terra Legal pode ser apreendido quando é utilizado o conceito de estabelecimento agropecuário. Esta informação se corrobora pelo fato de que o beneficiário deve comprovar o exercício da ocupação e exploração de forma „direta, mansa e pacífica‟, enquanto o Censo Agropecuário reconhece que „todo estabelecimento agropecuário é subordinado a uma única administração‟.

Tabela 2

Condição Legal das Terras, Amazônia Legal, 2006.

Estabele-cimentos Área (ha) Estabele-cimentos Área (ha) Rondônia 87.077 8.329.133 2,7% 1,3% 3,8% 1,1% Acre 29.482 3.491.283 11,4% 5,9% 12,6% 7,8% Amazonas 66.784 3.634.310 6,5% 5,1% 13,7% 8,7% Roraima 10.310 1.699.834 5,9% 2,9% 1,9% 0,7% Pará 222.028 22.466.026 5,6% 3,6% 7,1% 5,4% Amapá 3.527 873.789 12,1% 4,3% 9,8% 1,7% Tocantins 56.567 14.292.923 8,0% 1,4% 2,5% 1,1% Maranhão 287.037 12.991.448 6,1% 3,5% 16,4% 4,3% Mato Grosso 112.978 47.805.514 15,1% 2,1% 4,1% 1,2% Total 875.790 115.584.258 7,1% 2,6% 9,8% 2,8% Ocupadas Condição legal das terras Unidades da Federação Total de estabele-cimentos Área total (ha)

Sem titulação definitiva

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Lei nº º 4.504, de 1964: “o prédio rústico de área contínua qualquer que seja sua localização que se destine à exploração extrativa agrícola, pecuária ou agroindustrial, quer através de planos públicos de valorização, quer através de iniciativa privada.”

10 Estabelecimento Agropecuário: “É toda unidade de produção dedicada, total ou parcialmente, a

atividades agropecuárias, florestais e/ou aqüícolas. Todo estabelecimento agropecuário é subordinado a uma única exploração: a do produtor ou a do administrador. Independente de seu tamanho, de sua forma jurídica, ou de sua localização em área urbana ou rural, todo estabelecimento agropecuário tem como objetivo a produção para subsistência e/ou para venda, constituindo-se assim numa unidade recenseável”. Manual do Recenseador, FIBGE, 2007, p.18.

11 Segundoos critérios estabelecidos nos Artigos 2º, 3º, 4º e 5º da Lei 11.952, bem como de informações

coletadas no decorrer da 5ª Reunião do Grupo Executivo Intergovernamental do Programa Terra Legal, ocorrido no dia 25/03/2010, no Centro Regional do SIPAM, em Porto Velho, RO.

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Fonte: FIBGE, Censo Agropecuário de 2006.

Os dados da Tabela 2 demonstram que cerca de 7,1% (62.503), de todos os estabelecimentos agropecuários recenseados nas Unidades da Federação da Amazônia Legal, declararam que não tinham titulação definitiva, enquanto outros 9,8% (85.445) declararam que aquele estabelecimento era fruto de uma ocupação. Dessa forma, a partir de uma leitura simplificada, é possível estimar que o público do Programa Terra Legal circula em torno de 150.000 potenciais beneficiários, que ocupam uma área de cerca de 6,2 milhões de hectares.

Dessa forma, os dados do Censo Agropecuário de 2006 foram uma fonte de informação de extrema importância para a delimitação do universo de beneficiários do Programa Terra Legal. Em primeiro lugar a partir das informações coletadas nas entrevistas e disponibilizadas de forma agregada. Contudo, o substancial ganho trazido pelo Censo Agropecuário 2006 foi a espacialização dos dados, ou seja, a associação da informação coletada a uma coordenada georreferenciada.

Até então, as informações coletadas pelo IBGE estavam espacialmente associadas a unidades territoriais pré-definidas, geralmente divisões administrativas, e, no máximo, setores censitários. Porém, dentro de um município, ou mesmo de um setor censitário, pode haver grandes variações de fenômenos estudados. Do ponto de vista espacial, isso se torna muito limitado pensando no caso amazônico, onde os municípios possuem vastas áreas. Para exemplificar as grandezas em questão, seria possível percorrer uma distância de mais de 700 km em linha reta sem sair do município de Altamira-PA, que possui quase 160 mil km² de área. Espacialmente, ter dados referentes ao município de Altamira significa muito pouco para localização destes fenômenos em sua vasta área, ou seja, é um dado homogêneo para uma área de mais de um milhão de hectares, que não consegue representar suas variações internas.

Com a obtenção da coordenada georreferenciada agregada à informação12, tornou-se possível a correlação desses dados a níveis muito mais refinados de localização. Isso quer dizer que, com um grau considerável de precisão, estaríamos aptos a contar quantos estabelecimentos agropecuários foram identificados em um determinado projeto de assentamento, ou mesmo em todos eles. O mesmo raciocínio é válido para domicílios, tal como para outros temas fundiários, como Unidades de Conservação, Terras Indígenas e Glebas Públicas Federais.

Deve-se ressaltar que tais dados não foram tomados como reflexos diretos da realidade local, visto que o IBGE alertou para o elevado número de entrevistas em que a coordenada espacial não pode ser coletada por problemas técnicos. Contudo, este foi o princípio do processo aplicado para avaliar quantitativa e qualitativamente a ocupação em termos de domicílio e estabelecimentos nos diferentes tipos de domínio e ocupação na Amazônia Legal.

Estes diferentes tipos de ocupação e dominialidades foram representados pelas camadas de dados geoespaciais. Estas camadas contêm polígonos que representam, no espaço, a circunscrição de áreas sob domínio de cada Órgão que cuida de questões fundiárias. Como exemplo, a FUNAI disponibiliza em sua página na internet uma

12 É importante ressaltar que não foram disponibilizadas as informações presentes no questionário do

Censo Agropecuário, apenas a tipologia de classificação do ponto geográfico capitado no decorrer da entrevista („estabelecimento agropecuário‟, „domicílio‟, etc.)

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camada indicando os limites das Terras Indígenas no Brasil13. De forma análoga, foram colhidas, junto a diversas fontes, as informações geoespaciais mais atualizadas e confiáveis disponíveis.

Cabe aqui um importante parêntese sobre a confiabilidade/qualidade dos dados geoespaciais fundiários disponíveis hoje no país. A informação geográfica/geoespacial está diretamente associada aos métodos de levantamento e processamento utilizados para originá-la e representá-la. Como as informações fundiárias comumente derivam da interpretação de documentos antigos, produzidos a partir de técnicas de levantamento primitivas, estão sujeitas a severos desvios e imprecisões. Também é comum o uso de fontes secundárias para originar informações fundiárias, como a prática de extração de feições a partir de cartas topográficas, geralmente em escalas muito pequenas. Quando se trata da Amazônia, boa parte do território encontra-se mapeado apenas na escala 1:250.000, absolutamente inadequada para se trabalhar com informações dessa natureza. No intuito de se superar essa situação, foi promulgada em 2001 a lei federal 10.267, que institui a Certificação de Imóveis Rurais, já comentada anteriormente neste artigo. Além dos aspectos cadastrais e registrais já abordados, esta trouxe consigo uma sistemática para o levantamento de imóveis rurais, especificada na Norma Técnica para Georreferenciamento de Imóveis Rurais, editada em 2003 e reeditada em 2010. A referida norma buscou modernizar e principalmente padronizar a forma com que a informação geoespacial representativa dos imóveis rurais.

Como a adoção destes padrões exige a utilização de equipamentos específicos e de custo considerável, e também de técnicas dominadas por técnicos qualificados. É importante ressaltar que foram necessários alguns anos até que o padrão de qualidade proposto fosse efetivamente assimilado pelo mercado de prestadores de serviço, por proprietários de imóveis e pelo próprio governo. Este último tem apresentado, recentemente, ações no sentido de adequar a situação cadastral e registral das terras sob seu domínio, o que pode ser exemplificado pela abertura de pregões para execução de serviços de georreferenciamento de Unidades de Conservação sob responsabilidade do ICMBio.

3.1) Metodologia para unificação das bases de dados e sobreposição aos pontos georreferenciados fornecidos pelo IBGE.

3.1.1) Preparação e cruzamento de dados fundiários

Os dados são obtidos junto às fontes oficiais (IBGE, INCRA, FUNAI, ICMBio) e inseridas em um banco de dados que avalia a geometria das feições. Os freqüentes erros de geometria são corrigidos.

As diferentes feições que representam os limites fundiários são processadas umas em relação às outras, retornando um produto como o esquematizado abaixo:

13 Deve-se alertar novamente para o fato de que existe um grande número de áreas indígenas que não

estão georreferenciadas de acordo com as normas vigentes, assim como de Unidades de Conservação, Assentamentos de Reforma Agrária, etc.

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Fonte: ENVIROMENTAL SYSTEMS RESEARSCH INSTITUTE – ESRI (2010).

Dessa forma, as identidades primitivas são preservadas, de forma que são somados todos os dados fundiários em uma única fonte, permitindo a identificação o agrupamento de área por município e UF e ainda a identificação de sobreposição entre todos os temas fundiários considerados. No exemplo acima, a sobreposição entre as feições G1, UC1 e UC2 passa a ser identificável e quantificável – é possível extrair a informação de cada uma separadamente e da relação entre elas. Torna-se possível responder à pergunta: qual a área da UC1 que está na G1?

Devido à precária descrição de limites e a feições extraídas de cartas topográficas com escalas pequenas, entre outros fatores, a ocorrência de sobreposições é significativa. Também deve ser considerada limitada a informação de área por município/UF, já que a camada de limites municipais fornecida pelo IBGE possui uma escala muito pequena, o que reflete diretamente nos resultados.

3.1.2) Preparação dos dados do Censo Agropecuário (IBGE, 2007)

Os dados coletados no Censo Agropecuário 2007 pelo IBGE, cedidos em formato shapefile, com o tipo de feição ponto, foram filtrados em cinco níveis:

I. Excluídos os estabelecimentos que não fossem os agropecuários;

II. Excluídos os pontos incidentes em áreas urbanas (fonte: polígonos de localidades IBGE/Siscom IBAMA);

III. Excluídos os tipos de logradouros que remetiam a áreas urbanizadas (Agrovila, Alameda, Aldeia, Arraial, Avenida, Bairro, Edifício, Praça, Residencial, Rotatória, Rótula, Rua, Ruela);

IV. Os domicílios foram estratificados por tipo (1= Domicílio Particular Permanente Ocupado, 2= Domicílio Particular Permanente Fechado, 3= Domicílio Particular Permanente de Uso Ocasional, 4= Domicílio Particular Permanente Vago, 5= Domicílio Particular Improvisado Ocupado, 6= Domicílio Coletivo com Morador, 7= Domicílio Coletivo sem Morador);

V. Foi realizada uma subseleção dos dados em que havia coincidência de posição entre estabelecimentos agropecuários e domicílios, identificando os domicílios (por tipo) dentro de estabelecimentos agropecuários e os estabelecimentos agropecuários sem domicílio.

UC2 UC1 G1 UC1 UC2 UC1G1 UC2G1 G1

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Segmentados os dados, estes são cruzados com os polígonos processados no item 1. Dessa forma é possível quantificar para cada parcela territorial identificada da Amazônia Legal, quantos e quais pontos do censo agropecuário incidem sobre a mesma. A tabela de dados alfanuméricos do produto geoespacial resultante é exportada para o formato xls, permitindo consultas fora do ambiente do Sistema de Informações Geográficas (SIG).

3.1.3) Aplicações

Com os dados exportados e organizados (em filtros ou tabela dinâmica), tornou-se possível responder, considerando as limitações das fontes dos dados, a perguntas como:

Quantos estabelecimentos agropecuários existem na unidade de conservação X? Quantos domicílios incidentes em estabelecimentos agropecuários estão em Glebas Públicas Federais no município Y? Quais glebas são essas? Qual a área delas? Qual a quantidade de área destinada de cada uma? Qual a área não destinada?

Ou seja, o planejamento das operações e a delimitação das áreas prioritárias para atuação no Programa sofreram uma melhora substancial depois da agregação da base de pontos coletados pelo Censo Agropecuário de 2006 e pela Contagem Populacional de 2007, realizados pelo IBGE.

De qualquer forma, o ponto paradoxal nesta discussão é o fato de que as informações que serão resultantes do trabalho de regularização fundiária, ou seja, (entre outras coisas) uma base de dados fundiários consistente, seria requisito básico para o planejamento das ações que irão levá-la a cabo.

4) Programa ‘Terra Legal’ – Nova estratégia para executar a Regularização Fundiária na Amazônia?

Pode-se dizer que 2008 e 2009 foram dois anos de intensos debates na arena governamental acerca de novas estratégias para a execução da regularização fundiária na Amazônia Legal. Neste sentido, a conversão da Medida Provisória 458 na Lei 11.952, de junho de 2009, pode ser encarada como a proposta vencedora neste debate.

Tendo em vista que o Programa Terra Legal trabalha com três passos para a regularização (o cadastramento, o georreferenciamento e a destinação/ regularização das posses,) pode-se afirmar que as principais inovações do processo de regularização fundiária na Amazônia Legal estão na celeridade do rito e no arranjo institucional previsto para implementação das ações. Até o advento da medida provisória 458, as exigências para a regularização fundiária na Amazônia Legal eram similares às exigências de regularização no Centro-Sul do Brasil. Com a mudança no marco legal, o rito de titulação foi simplificado, tornando mais expedita a titulação de ocupações com

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até 4 módulos fiscais, cuja vistoria prévia tornou-se facultativa, além da aplicação de valores diferenciados abaixo do valor de mercado, com pagamento até 20 anos.

Buscando garantir a regularização de cidadãos brasileiros e evitar a intensificação do processo de concentração de terras no Brasil, os termos da Lei 11.952/09, dizem que o ocupante e seu cônjuge ou companheiro deverão atender aos seguintes requisitos: ser brasileiro nato ou naturalizado; não ser proprietário de imóvel rural em qualquer parte do território nacional; não ter sido beneficiado por programa de reforma agrária ou de regularização fundiária de área rural (ressalvadas as situações admitidas pelo INCRA); ter sua principal atividade econômica advinda da exploração do imóvel; e não exercer cargo ou emprego público no INCRA, no Ministério do Desenvolvimento Agrário, na Secretaria do Patrimônio da União do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão ou nos órgãos estaduais de terras. Não será objeto de regularização a área rural ocupada por pessoa jurídica.

Para ser passível de regularização a ocupação tem que ser comprovadamente anterior a dezembro de 2004. O atual ocupante pode ter chegado depois dessa data e requerer a regularização se ele conseguir provar que a ocupação já existia na data limite, antes de ele chegar.

Os imóveis situados em áreas até 4 módulos fiscais não poderão ser vendidos dentro de um prazo de dez anos, mas poderão ser utilizados como garantia nas operações de crédito rural junto a instituições financeiras. Os que se encontram em posses acima de 4 módulos fiscais poderão ser vendidos a partir de 3 anos, mantidas as cláusulas resolutivas para os novos proprietários.

No que se refere à capacidade da regularização fundiária, proposta no Programa Terra Legal, de atuar como ferramenta de mitigação e prevenção dos principais conflitos sociais da Amazônia, pode-se apontar os seguintes pontos previstos na legislação:

Com o intuito de evitar ocupações que incidam em áreas ocupadas por populações tradicionais, ou de interesse especial da Administração Federal, em seu art. 4º, a legislação faz uma ressalva e elimina a possibilidade de regularização de terras que sejam “tradicionalmente ocupadas por indígenas”; “reservadas à administração militar”; “de floresta pública, [...] unidades de conservação”; que “contenham acessões ou benfeitorias federais”; além de instituir regimes especiais para a regularização de áreas ocupadas por comunidades quilombolas e por populações cujas ocupações são incidentes em áreas da marinha.

Buscando reduzir ainda mais a potencialidade de conflitos, o art. 8º deixa claro que em caso de conflitos a União priorizará “a regularização em benefício das comunidades locais, [...] se o conflito for entre essas comunidades e particular, pessoa natural ou jurídica”.

Por fim, vale ressaltar a parceria entre o Ministério do Desenvolvimento Agrário e o Centro Gestor do Sistema de Proteção da Amazônia (CENSIPAM), para operacionalizar o monitoramento via satélite das áreas tituladas, buscando garantir o comprimento das cláusulas ambientais.

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A equipe do Censipam disponibiliza, na forma de relatórios trimestrais, os quadros do desmatamento a partir do "momento zero" da titulação nas glebas pelo Programa Terra Legal. O relatório inicial contém a evolução do desmatamento desde o ano de 2003 até o momento que antecede a titulação. Os relatórios subseqüentes utilizam diferentes fontes de dados para monitorar a ocorrência de desflorestamento nas áreas tituladas. Volta-se a ressaltar que o objetivo é garantir o monitoramento sistemático das áreas tituladas pelo Programa Terra Legal, com a responsabilização pelo uso e ocupação destas áreas, com base nas cláusulas contratuais dos títulos expedidos.

5) Conclusão

Este texto buscou apresentar as diferentes dimensões do problema fundiário na Amazônia Legal, destacando os desafios que se apresentam ao Programa „Terra Legal‟ e as soluções propostas para superar tais desafios. Ponto importante é avaliar qual será a governabilidade do Programa para levar a cabo a tarefa ao qual ele se propõe.

De uma maneira geral, espera-se que este texto contribua para o fomento das discussões acadêmicas sobre o tema, e mais, que tais debates possam gerar aportes que levem ao aperfeiçoamento da difícil tarefa de regularizar as ocupações em terras públicas da região.

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