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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ FACULDADE DE DIREITO CURSO DE DIREITO JOSÉ RICARDO SOUSA AYRES DE MOURA

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ FACULDADE DE DIREITO

CURSO DE DIREITO

JOSÉ RICARDO SOUSA AYRES DE MOURA

ABORTO LÍCITO

NÃO CONTIDO NO CÓDIGO PENAL

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JOSÉ RICARDO SOUSA AYRES DE MOURA

ABORTO LÍCITO

NÃO CONTIDO NO CÓDIGO PENAL

Monografia apresentada a Universidade Federal do Ceará - Faculdade de Direito, para obtenção do Titulo de Bacharel em Direito.

Orientador: Prof. Sérgio Rebouças

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Ayres de Moura, José Ricardo Sousa

Aborto licito não contido no código penal. / José Ricardo Sousa Ayres de Moura – Ceará 2007.

54f.

Monografia (Graduação) – Universidade Federal do Ceará. Faculdade de Direito.

Licit Abortion, not include in Legal Code.

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Folha de Aprovação

JOSÉ RICARDO SOUSA AYRES DE MOURA

ABORTO LÍCITO

NÃO CONTIDO NO CÓDIGO PENAL

Monografia apresentada a Universidade Federal do Ceará Faculdade de Direito para obtenção do Titulo de Bacharel em Direito.

Banca Examinadora:

______________________________________________________ Prof. Sérgio Rebouças

______________________________________________________ Prof. Dr. Diogo Musy

_____________________________________________________ Prof. Dr. Weiber Xavier

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Dedicatória

Dedico essa monografia ao meu pai, Evandro Ayres de Moura,

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Agradecimentos

Ao Prof. Candido Albuquerque e Prof. Sérgio Rebouças, pelas orientações, apoio e incentivo.

À amiga e sobrinha Rebecca Ayres de Moura Chaves de Albuquerque, por ajudar-me nas horas precisas.

Aos Professores Marcelo Souto Maior e Mauricio Benevides, por acreditarem em mim e, a sua maneira, colaborarem para que eu seguisse adiante.

Aos colegas, Frederico Lissere Barruffini, Rafael Frederico Bruns e Daniel Maia, pela ajuda e incentivo nesse último período.

Aos Professores Dr. Weiber da Silva Xavier e Diogo Musy, por aceitarem fazer parte da banca em pouco tempo de leitura.

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Resumo

Devido ao aprofundamento da medicina, no seu ramo de medicina fetal, ficou cada vez mais precoce o diagnóstico de anomalias fetais, algumas capazes de serem revertidas ainda intra-útero e outras que são incompatíveis com a vida extra-uterina são alvo hoje em dia de muita discussão acerca do Abortamento eugênico ou abortamento licito, autorizado pelos juizes, mas não contido no ordenamento jurídico. Esse trabalho leva-nos ao histórico do aborto, mostrando que nem sempre foi ilícito ou tipificado no ordenamento jurídico de vários povos, ate mesmo em alguns era recomendado para formação de uma etnia mais forte e também como controle populacional. Com advento do cristianismo, começou-se a incriminar e a recriminar as mulheres que assim o procedessem, nesses casos, ou melhor, nos casos anteriores por simplesmente não ser uma gravidez desejada, pois os métodos propedêuticos naquela época não existiam para detectar gestações com más-formações. Assim tentamos reunir opiniões diversas e demonstrar que nesses casos o bom senso, e a disposição ou interesse da mãe gestante devem falar mais alto do que as defesas pela vida de um ser que jamais saberá que seja dignidade ou ter capacidade de discernir o seu destino ou lutar para uma sobrevivência sem ajuda. Finalmente concluímos que antes de ser uma questão de foro privativo é também uma questão social e de saúde publica, pois a ilicitude do ato de aborto de um feto seguramente incapaz de sobreviver fora do útero, pode acarretar atos clandestinos e sérias conseqüências para mãe principalmente aquelas de poder econômicos inferiores.

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Abstract

The medicine is nowadays getting deeper in acknowledgement and specially in one of its branch, Fetal Medicine. The Diagnosis of any fetal anomalies has been made at very precocious time, some of them even capable to be reverted intra-uterus death and others to assure the fetus are incompatible with the extra-uterine life. Because of those, Diagnoses are been used in some countries to allow the mother to proceed the abortion. There are currently much quarrel about that. The eugenic Abortion or licit abortion is how they have been called when authorized by one judge, as they are permitted even though they are not written in the legal laws’ system. This paper leads us into the history and description of the abortion, showing that it has not been ever illicit or it was not contained in the legal system of some peoples. They were recommended during the ancient Greece as part of rules for formation of a stronger etnia and also as population control system. With advent of the Christianity, it started to be incriminated and to recriminate the women who thus done it, in these cases, or better, in the previous cases simply or not being a desired pregnancy. At this time there were no methods to detect any gestations with harm-formations. Thus we try to congregate different opinions and, to demonstrate that in these cases the good-sense, the disposal or the interest of the pregnant woman must play the most important role in the decision, much more than those who defends the life of someone who will never know what is dignity life or who will never have capacity to discern his destiny or to fight for a survival without aid. Finally we conclude that before being a question of privative forum it is also a social matter and even public health question. Therefore illegality of the act of abortion of an embryo, surely incapable to survive outside of the uterus, can cause mainly clandestine acts with serious consequences for mother, specially those from low economic level.

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Lista de Figuras

Figura 1 - Anencéfalo 1... 29

Figura 2 - Anencéfalo 2... 31

Figura 3 - Holoprosencefalia 1... 32

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Lista de Tabelas

Tabela 1 - Paises e permissão do aborto... 38 Tabela 2 - Embasamento jurídico da sentença judicial e do parecer da

promotoria favorável a pedido de aborto seletivo... 46 Tabela 3 - A argumentação de juízes e promotores contra a

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Lista de Abreviaturas e Siglas

ADPF Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental APGAR Índice de Bem e Estar do recém nascido da Dra. Apgar. CNTS Conselho Nacional dos Trabalhadores da Saúde

CREMESP Conselho Regional de Medicina – São Paulo. CRF Conselho Federal de Medicina

DIU Dispositivo Intra-uterino

FIGO Federação Internacional de Ginecologia e Obstetrícia

HC Hábeas Corpus

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Sumário

1. Introdução... 12

2. Aborto na história... 14

3. Aborto – Tipo - classificação... 20

4. Vida: conceito, dignidade e qualidade... 23

5. Anomalias congênitas não compatíveis com a vida... 28

6. O aborto e as legislações brasileira e estrangeira... 34

7. Jurisprudência... 39

8. Considerações finais... 48

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Introdução 13

Na perspectiva médica e na visão jurídica, o vocábulo aborto significa a interrupção da gestação nas semanas iniciais, correspondente até a 20ª-22ª semana de gravidez ou cerca de 500g, produzida por meios naturais ou artificiais, ou seja, espontâneo ou provocado e somente será controvérsia dependendo da maneira de se considerar a matéria.

Etimologicamente a palavra aborto deriva do latim “abortus”, onde Ab significa privação e ortus significa nascimento.

Damásio E. de Jesus exemplifica exatamente essa questão e escreve que a prática do aborto pode ser definida sinteticamente como: interrupção da gravidez com a morte do produto da concepção.

O aborto continua ainda um tema tabu, principalmente nos paises de maioria católica, onde a igreja não abre mão de seus princípios e seus dogmas, mesmo que seja em detrimento da saúde da mulher.

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Aborto na História 15

O Aborto foi tratado como conduta criminalizada pela primeira vez no Código de Hamurábi (BOUZON, 1982):

§ 209 Se um awilum bateu na filha de um awilum e a fez expelir o (fruto) de seu seio, pesará 10 siclos de prata pelo (fruto) de seu seio.

§ 210 Se essa mulher morreu, matarão a sua filha.

§ 211 Se pela pancada fez a filha de um muskênum expelir o (fruto) de seu seio, ele pesará 5 siclos de prata.

§ 212 Se essa mulher morreu, ele pesará ½ mina de prata.

§ 213 Se bateu na escrava de um awilum e a fez expelir o (fruto) de seu seio, ele pesará 2 siclos de prata.

§ 214 Se essa escrava morreu, ele pesará 1/3 de uma mina de prata.

Mesmo estando no Código Hamurabi, sabemos que o aborto nem sempre foi uma conduta criminalizada, segundo histórico de Nelson Hungria, a prática do aborto é de todos os tempos, mas raramente foi objeto de incriminação, ficava, de regra, impune, quando não acarretasse dano à saúde ou morte da gestante. Entre os hebreus, não foi senão muito depois da lei mosaica que se considerou ilícita, em si mesma, a interrupção da gravidez.

Desde a Grécia Antiga, o aborto sempre foi uma conduta bastante utilizada pelas mulheres, que, devido aos mais diversos motivos, não desejavam gerar um feto, sendo usual naquela época e não se restringia, como hoje, a nenhuma classe específica, afinal, essa preocupação de não levar uma gestação a termo existe em qualquer classe social. Hoje a grande diferença é em relação ao tratamento concedido às mulheres, que é diferenciado em uma classe mais elevada em relação a outra mais baixa. A possibilidade de um melhor atendimento e de condições mais seguras são garantias para aquelas que podem pagar por esses serviços.

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Aborto na História 16

Aristóteles e Platão foram predecessores de Malthus: o primeiro aconselhava o aborto (desde que o feto ainda não tivesse adquirido alma) para manter o equilíbrio entre a população e os meios de subsistência, e o segundo preconizava o aborto em relação a toda a mulher que concebesse depois dos quarenta anos - já naquele tempo tinha-se noção que fetos advindos de mulheres com mais de 40 anos poderiam vir com defeitos e com incompatibilidade a vida. Assim o uso do aborto difundiu-se por todas as camadas sociais.

Platão, no seu livro “A República”, concede aos governantes a tarefa de melhorar a descendência dos membros da cidade, por meio de casamentos entre homens e mulheres superiores. Aos governantes seria dado o poder de decidir sobre a realização dos matrimônios, em que número esses aconteceriam e quem seriam os cônjuges. As crianças nascidas pertenceriam à Cidade e seriam cuidadas por autoridades competentes para cumprir esse objetivo. O filósofo aconselhava sobre a idade dos nubentes e especificava punições para aqueles que não seguissem as regras da polis.

“...Pegar-se-ia então os filhos dos homens superiores, e levá-los-iam para o aprisco, para junto de amas que moravam à parte num bairro da cidade; os dos homens inferiores, e qualquer dos outros que sejam disformes, escondê-los-iam num lugar interdito e oculto, como convim”.

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Aborto na História 17

Para o direito romano, não existia o aborto enquanto conduta criminalizada, uma vez que o feto era considerado parte do corpo da mulher e, portanto, ela podia dispor livremente de seu corpo, conforme fosse sua vontade. Assim, quando a mulher grávida era vítima de agressão que não resultasse na sua morte ou ameaça à sua saúde, geralmente o agressor não era punido, pois a morte do feto não estava tipificada como crime. No direito romano o aborto não era punido na República nem durante os primeiros tempos do Império e foi assimilado ao homicídio somente a partir da época de Sétimo Severo (ARMANI et al, 1995).

Para o direito romano antigo, segundo Alves (1999), o aborto não tinha existência autônoma como crime, a Lei das XII Tábuas e as leis republicanas não tratavam da matéria. A conduta era considerada crime contra a mulher, porquanto o ser humano em vida intra-uterina era tido como uma porção do corpo da mulher ou parte de suas vísceras (mulieris pars vel viscerum): Geralmente, ficava-se a salvo da punição quando não implicasse

óbito da mulher ou mesmo agressão à sua saúde.

No governo de Septimio Severo (193-211 d.C.), houve, contudo, uma modificação nesse entendimento, a lei romana passou a tratar do aborto como uma privação do pai ao direito de possuir sua prole. Nessa época, a repressão social romana era a mesma dada a homicídio praticado com a propinação de veneno. Foi então que o aborto passou a caracterizar ofensa à possibilidade de prole do pai, pois a este não cabia nenhuma ingerência sobre o feto, uma vez que o concebido era considerado parte do corpo da mulher. Nessa época, o homem passa a ser o principal interessado no produto da concepção e, por isso, foi criado um tipo penal, o aborto, para proteger o direito do homem a ter descendentes.

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Aborto na História 18

terapêutico ou sentimental, decorrente de estupro, como deixam claro as encíclicas papais.

Entre as religiões, aquelas que conferem caráter sagrado à vida, a partir da concepção, estão o judaísmo, o cristianismo e o budismo. Os protestantes dividem-se em duas correntes: uma é a doutrina do caráter sagrado, outra aceita as determinações do legislador civil. O islamismo permite o aborto até o quarto mês de gravidez. Em relação aos argumentos religiosos católico-romanos, que são basicamente quatro citados por Callahan (1996) no livro “Abortion: a reader”:

(1) Somente Deus é o senhor da vida, (God alone is the Lord of life) (2) Os seres humanos não têm o direito de tirar as vidas de outros

(inocentes) seres humanos, (Human beings do not have the right to take the lives of other (innocent) human beings).

(3) A vida humana inicia no momento da concepção, (Human life begins at the moment of conception).

(4) Aborto independente do estágio de desenvolvimento do concepto, é retirar a vida de um ser inocente. (Abortion, at whatever the stage of development of the conceptus, is the taking of innocent life).

Perante os olhos de Deus chegamos à conclusão é de que o aborto é errado. Esses argumentos praticamente estão baseados em um só, ou seja, o primeiro, no qual Deus é o provedor de toda vida e, portanto, essa é sagrada, cabendo a Ele as decisões sobre vida e morte. Deus dar, Deus tira e só ele tem esse direito.

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Aborto na História 19

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Aborto - Tipo - Classificação 21

Os casos de abortamento constituem a terceira causa de morte materna no Brasil. Anualmente são atendidas, no Sistema Único de Saúde (SUS), cerca de 250.000 mulheres com complicações de aborto. É a causa mais freqüente de hemorragia na primeira metade da gestação, seja ele espontâneo ou provocado. Por isso mesmo para o meio jurídico é importante saber classificá-lo e conhecê-lo para poder saber como ocorreu e o que tudo isso implica. Sabemos também que não se pode estabelecer adequadamente taxa de incidência correta pelo motivo de a maioria dos abortos não ser detectada, pois são o que chamamos de abortamento sem diagnóstico, acontecido antes da 5ª semana de gestação. Dentro dos abortamentos de gestações clinicamente diagnosticadas, há uma incidência em torno de 15% a 20% das gestações que prosseguem sendo que destes 80% são abortos precoces, ou seja, antes da 13ª semana.

Como conceito ou definição do que seria um aborto, escolhemos a definição dada pela Federação Internacional de Ginecologia e Obstetrícia (FIGO), que a define como a interrupção da gestação, com a expulsão ou extração do feto ou concepto antes da viabilidade fetal, ou idade gestacional igual ou inferior a 22 e feto apresentando peso inferior a 500g ou com comprimento menor que 28cm antes da viabilidade.

Classificação

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Aborto - Tipo - Classificação 22

b) Segundo o período - Precoce e Tardio

- Precoce - quando ocorrer até a 12ª semana gestacional. - Tardio - quando ocorrer após a 12ª semana gestacional,

porém dentro do conceito de abortamento.

Forma clínica

Pode-se apresentar como ameaça de abortamento, abortamento inevitável, abortamento completo, abortamento incompleto, abortamento retido e abortamento infectado.

Todas as explicações acima se referem à classificação, e forma clínica, no que se diz respeito à visão do medico. Agora como maneira de visualizar juridicamente a classificação e formas de aborto, dividimos da seguinte maneira:

a) Natural ou espontâneo, quando há interrupção espontânea da gravidez, independendo da vontade da gestante;

b) Terapêutico ou necessário, em que a gravidez põe em risco a vida da gestante ou poderá ocasionar um mal sério e iminente à mesma; c) Honroso ou moral, que consiste em abortar o feto por ser a

gestação resultante de estupro;

d) Seletivo, eugênico ou eugenésico, o encarregado de impedir a continuação da gravidez em que haja possibilidade de que a criança nasça com taras hereditárias ou más-formações, como por exemplo, a anencefalia;

e) Social ou econômico, aquele que ocorre para não agravar a situação econômica e social de famílias já numerosas.

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Vida: Conceito, Dignidade e Qualidade 24

O “direito de matar” ou o “direito de morrer” ou mesmo o “direto de não viver” sempre teve, em todas as épocas, seus mais extremados defensores. Na Índia de antigamente, os incuráveis eram jogados no Ganges, depois de se lhes vedar a boca e as narinas com a lama sagrada.

Os espartanos, conta Plutarco em Vidas Paralelas, do alto do monte

Taijeto, lançavam os recém-nascidos deformados e até anciãos, pois “só viam

em seus filhos futuros guerreiros que, para cumprir tais condições deveriam

apresentar as máximas condições de robustez e força”. Os Brâmanes

eliminavam os velhos enfermos e os recém-nascidos defeituosos por

considerá-los imprestáveis aos interesses do grupo.

Para iniciarmos nossa discussão iniciamos falando sobre o que seria vida, ou mesmo conceito de vida e aproveitamos o que escreveu tão perfeitamente Alfradique (2005), quando se referiu a vida: O vocábulo vida possui inúmeros significados, dificultando demasiadamente um sentido pronto e acabado. Trata-se de assunto cuja conceituação é tida como inextrincável por muitos autores. Citaremos diferentes concepções de tratadistas para tentarmos chegar a um ponto comum neste trabalho.

Tecendo considerações acerca do direito à vida e reconhecendo a dificuldade de uma definição, o Constitucionalista José Afonso da Silva disse: "Não intentaremos dar uma definição disto que se chama vida, porque é aqui

que se corre o risco de ingressar no campo da metafísica suprarreal, que não

nos levará a nada".

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Vida: Conceito, Dignidade e Qualidade 25

Quando se procura fazer uma dicotomia entre vida e morte, e procurando atribuir a definição de uma atrelada a outra, torna se mais difícil conseguir uma definição de vida adequada. Autores tanatologistas costumam afirmar, que, por exclusão, vida é tudo aquilo que não está morto, ou seja, que não faleceu, não finou, não expirou, não pereceu. Embora atribua clareza solar às suas definições, acreditamos que afirmativas assim são por demais incompletas e defeituosas.

O próprio José Afonso da Silva elucida dizendo que no texto constitucional (art. 5o, caput) não será considerada apenas no seu sentido biológico de incessante auto-atividade funcional, peculiar à matéria orgânica, mas na sua acepção biográfica mais compreensiva. Sua riqueza significativa é de difícil apreensão porque é algo dinâmico, que se transforma incessantemente sem perder sua própria identidade. E conclui afirmando que é mais um processo (processo vital), que se instaura com a concepção (ou germinação vegetal), transforma-se, progride, mantendo sua identidade, até que mude de qualidade, deixando, então, de ser vida para ser morte.

Atentando somente para o que se vê no dicionário da língua portuguesa teríamos de dizer que vida é um Conjunto de propriedades e qualidades graças às quais animais e plantas, ao contrário dos organismos mortos ou da matéria bruta, se mantêm em contínua atividade, manifestada em funções orgânicas tais como o metabolismo, o crescimento, a reação a estímulos, a adaptação ao meio, a reprodução, e outras; existência; o estado ou condição dos organismos que se mantêm nessa atividade desde o nascimento até a morte; o espaço de tempo que decorre desde o nascimento até a morte (HOLANDA, 1994).

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Vida: Conceito, Dignidade e Qualidade 26

assegurar outros direitos fundamentais, como a igualdade, a intimidade, a liberdade, o bem-estar, se não erigisse a vida humana em um desses direitos. A tarefa de consubstanciar juridicamente, de maneira indiscutível, o direito à vida, cumpre ao Direito Constitucional, viga mestra de todas as outras ramificações. Por isso que o laureado Arinos (1978), ao tecer escorreita dissecação sobre o objeto de estudo do Direito Constitucional, declara que outro aspecto de que se reveste o Direito Constitucional é que ele abrange a estrutura jurídica do Estado, suas normas fundamentais, a definição e o funcionamento dos seus órgãos, os direitos públicos individuais e outros assuntos, estejam eles, ou não estejam consignados no texto da Constituição.

Levamos agora nossa discussão no que seria, portanto uma vida digna e qualidade de vida. Vimos por tudo dito acima que nosso direito constitucional preza pelo bem da vida e tudo demais gira em torno de dar ao cidadão uma vida digna com qualidade.

Então para se ter uma vida digna deve-se ter antes de tudo a possibilidade de poder conquistá-la com seus próprios meios, ter educação básica e profissionalizante para que esse cidadão possa decidir o que quer ou que não quer do seu Estado e fazer opções quanto sua qualidade de vida.

A dignidade da pessoa humana é fundamentada em valores explicados pela religião, filosofia e ciência que geraram documentos jurídicos ao longo da história, como a Magna Carta de 1215, Lei do Habeas Corpus de 1679, Declaração de independência dos Estados Unidos da América de 1787, Declaração dos Direitos da Revolução Francesa de 1789, a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, algumas Constituições a partir dos séculos XIX e XX e Convenções Internacionais, como a Européia dos Direitos Humanos de 1950, a da Proteção do Patrimônio Mundial, Cultural e Natural de 1972 e a Convenção da Biodiversidade de 1992.

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Vida: Conceito, Dignidade e Qualidade 27

depois, a primeira organização internacional proclamou na abertura de uma Declaração dos Direitos do Homem, que “todos os homens nascem livres e iguais em dignidades e direitos”.

E quando esse pseudo-cidadão que deveria nascer livre e igual em dignidade e direitos, não é capaz desde o momento do seu nascimento a ter todo esse direito em que se baseia a nossa constituição, ou seja, não terá a consciência de decidir ou percepção do que se passa ao seu redor mesmo com avançar nos anos de vida (se é que chegará a horas ou semanas de vida), e ficará sempre a mercê de alguém para lhe ajudar nas condições mínimas de higiene, de alimentação e locomoção ad eternum, passamos a nos questionar se não seria mais justo dar lhe o direito de não viver indignamente e sem menor chance de ter consciência ou discernimento do que seria uma vida?

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Anomalias Congênitas não compatíveis com a Vida 29

Nesta apresentação de algumas e mais comuns anomalias congênitas, citaremos as que são totalmente incompatíveis com a vida extra-uterina.

Temos então anencefalia, holoprosencefalia, trissomia 13, síndrome de Edward, agnesia renal bilateral entre outras.

A maioria dessas anomalias diz se respeito ao tubo neural, sendo, portanto de suma importância que este esteja totalmente bem desenvolvido para que o nascituro tenha chances de sobrevivência e de desenvolvimento total em sua vida extra-uterina.

Figura 1 - Anencéfalo.

Iniciaremos com a mais comum e o mais atual problema no direito que é o feto anencéfalo ou anencefalia. A anencefalia é malformação relativamente comum, ocorrendo em 1:1000 nascimentos.

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Anomalias Congênitas não compatíveis com a Vida 30

espinha dorsal do embrião. Anencefalia ocorre quando o fim “cefálico" ou de cabeça do tubo neural não se fecha, enquanto resultando na ausência de uma porção principal do cérebro, do crânio, e do couro cabeludo.

É caracterizada pela ausência da abóbada craniana ou calvária, sendo que os hemisférios cerebrais e as estruturas diencefálicas encontram-se substituídas por uma massa vascular e neural amorfa e achatada. As estruturas faciais e as órbitas estão presentes e é muito comum associar-se a outras malformações, mesmo extraneurais. Portanto, crianças com esta desordem nascem sem ambos: uma calota (a parte dianteira do cérebro) e um cérebro (o pensamento e coordenações da área do cérebro).

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Anomalias Congênitas não compatíveis com a Vida 31

Figura 2 – Anencefalo 2.

Algumas pessoas defendem o fato de que os fetos anencéfalos poderão servir como doadores de órgãos para outros bebês com anomalias graves e não letais. Até que ponto seria justo submeter uma gestante aos riscos próprios deste período e ao desconforto físico e emocional para beneficiar outros bebes?

Outro tipo de má formação não compatível com a vida tem os bebes com holoprocenfalia que constitui uma má-formação craniofacial devido a uma anormalidade complexa do desenvolvimento do cérebro; acontece devido a uma falta da segmentação do prosencéfalo nos hemisférios, que origina uma alteração na clivagem deste.

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Anomalias Congênitas não compatíveis com a Vida 32

Figura 3 - Holoproencefalia 1.

Outras causas podem estar relacionadas com infecções intra-útero virais, diabetes, ingestão de alcalóides, aspirina.

Alguns podem ter uma apresentação dominante ou autossômica recessiva. A holoprosencefalia é o resultado da falha da rachadura do prosencéfalo. Prosencéfalo é a maior das três vesículas cerebral primitivas e que dá origem aos hemisférios cerebrais e ao diencéfalo que inclui a neuro-hipófise, o talamus, o terceiro ventrículo e o bulbo olfatório. Pensa se que esse processo de diferenciação é induzido pelo mesênquima que se interpõe entre o teto da boca e o prosencéfalo. Ele mesmo é o responsável pelo desenvolvimento norma das estruturas da face e da parte do nariz, na estrutura interorbital e do bordo superior. Uma interferência na atividade de desenvolvimento do mesênquima faria aparecer defeitos em ambas as áreas da cabeça até a face.

As anomalias cerebrais são de graus diferenciados e variam de acordo com a falha da rachadura do prosencéfalo, como conseqüência ocorre a divisão incompleta dos hemisférios cerebrais e das estruturas subjacentes.

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Anomalias Congênitas não compatíveis com a Vida 33

Alobar: é apresentação mais severa, de modo que há ausência da fissura inter-hemisférica, do terceiro ventrículo, da neuro-hipófise, do bulbo olfatório e do tracto olfatório. É possível que venha como apresentação ciclopía (Figura 4).

Figura 4 – Holoproencefalia.

Semilombar: nesse tipo de apresentação, ambos os hemisférios são parciais, existem, mas separados por um único ventrículo. Apresentam portanto, hipotelorismo, micro-oftalmia, coloboma, bordo medial leporino e tem característica plana por ausência do septum nasal. Se sobrevivem apresentam retardamento mental acentuado.

Lobar: nesse caso, mais leve, a fissura inter-hemisférica está bem constituída, mas existe um determinado grau de fusão das estruturas. O pellucidum do septum está ausente e tracto, olfatorio do bulbo e o corpo duro podem ser hipoplásicos ou ausente. A cara é normal e pode aparecer retardamento mental.

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O Aborto e as Legislações Brasileira e Estrangeira 35

6.1 Legislação Brasileira

Dentro da Legislação Brasileira o aborto encontra-se tipificado no texto dos seguintes artigos do Código Penal:

“Aborto provocado pela gestante ou com seu consentimento”

Art. 124 - Provocar aborto em si mesma ou consentir que outrem lho provoque:

Pena - detenção, de um a três anos.

“Aborto provocado por terceiro”

Art. 125 - Provocar aborto, sem o consentimento da gestante: Pena - reclusão, de três a dez anos.

Art. 126 - Provocar aborto com o consentimento da gestante: Pena - reclusão, de um a quatro anos.

Parágrafo único. Aplica-se a pena do artigo anterior, se a gestante não é maior de quatorze anos, ou é alienada ou débil mental, ou se o consentimento é obtido mediante fraude, grave ameaça ou violência.

Forma qualificada

Art. 127 - As penas cominadas nos dois artigos anteriores são aumentadas de um terço, se, em conseqüência do aborto ou dos meios empregados para provocá-lo, a gestante sofre lesão corporal de natureza grave; e são duplicadas, se, por qualquer dessas causas, lhe sobrevém a morte.

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O Aborto e as Legislações Brasileira e Estrangeira 36

Aborto necessário

I - se não há outro meio de salvar a vida da gestante;

Aborto no caso de gravidez resultante de estupro

II – “se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal”.

No Código Penal brasileiro, o crime de aborto é classificado no Título “Dos Crimes Contra a Pessoa” e no capitulo “Dos Crimes Contra a Vida”. Assim o objeto da tutela penal é a vida do feto. Não se trata de vida independente, mas se considera que o produto da concepção vive o que é suficiente para haver proteção.

Diante do Direito Civil, o feto não é pessoa, mas spes personae, de acordo com a doutrina natalista (a aquisição da personalidade se dá com o nascimento com vida). É considerada expectativa de ente humano, possuindo expectativa de direito. Entretanto, para efeitos penais, é considerada pessoa. Tutela-se, então, a vida da pessoa humana. A ação de provocar o aborto tem por objeto interromper a gravidez e eliminar o produto da concepção. Isto significa que a mulher grávida e o fruto da concepção constituem objeto material da ação de provocar aborto, sendo consumado o crime com a morte do mesmo, independente de ter ocorrido no ventre materno ou fora dele.

6.2 Legislações Estrangeiras

Prestando atenção à legislação de alguns países, vemos que atualmente, há basicamente três linhas de pensamento a respeito da permissão ou não do aborto.

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O Aborto e as Legislações Brasileira e Estrangeira 37

aborto. Havendo o consenso entre ambos, o aborto poderá ocorrer. Esta é a conduta adotada por países como Rússia, o Japão e a Hungria. Que ao primeiro olhar deveria causar aumento da incidência, mas pelo contrário, resultou na diminuição do número dos mesmos. Isso foi encarado como uma política de prevenção.

Na linha de legislações mais liberais, como do Canadá (país que permite o aborto por livre escolha da mulher), a permissão obtém-se para realização do aborto por diversos motivos, que vão desde fatores sócio-econômicos (em casos de prole numerosa, controle de natalidade, impotência patrimonial do casal), até a escolha livre da mulher, dando mais ênfase na autonomia da mesma. Já na China (que conta com a maior população do planeta), o aborto serve inclusive como medidas extremas de controle de natalidade. No ordenamento jurídico de países também considerados liberais, como da Suécia e da Islândia, estabelece-se o aborto social.

A grande maioria dos países, caso do Brasil, Israel, Espanha, França, Chile, Argentina, entretanto, encontra-se na terceira tendência relativa ao aborto: permitem-no apenas em algumas situações, como, por exemplo, em caso de estupro, de risco de vida à gestante e de má-formação do feto. Mesmo entre os países que aderem a esta linha, não há uma homogeneidade, pois existem divergências quanto aos motivos que podem ser considerados para se efetivar um aborto legal.

Nos Estados Unidos, país regido pelo Common Law, a situação é diferente, enquadrando-se em nenhuma das três tendências. Em todos os estados americanos, o aborto era ilegal até que um caso no início dos anos 70 gerou um processo que acabou na suprema corte.

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O Aborto e as Legislações Brasileira e Estrangeira 38

todos os estados. No segundo trimestre, entretanto, os estados que assim desejassem poderiam proibir tal prática desde que apresentassem justificativas plausíveis, geralmente relacionadas à garantia da saúde da gestante. Já no terceiro trimestre, o aborto não seria permitido em Estado algum, desde que a gravidez não colocasse em risco a vida da gestante, baseando-se como vimos em critério da viabilidade (OLIVEIRA, 2003).

Tabela 1 - Países e permissão do aborto

Motivos Aborto

terapêutico

Aborto eugênico

Aborto honroso

França sim sim não

Brasil sim não sim

Peru sim não não

Israel sim sim sim

Suíça sim não não

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Jurisprudência 40

Estima-se que mais de três mil pedidos judiciais já foram concedidos para autorizar interrupções seletivas da gestação no país, a grande maioria realizada em hospitais públicos.

A CNTS (Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde) entrou com a ação de Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental número 54 junto ao Supremo Tribunal Federal, pretendendo que não houvesse mais o impedimento da antecipação terapêutica do parto em casos de gravidez de feto anencefálico mediante a declaração da inconstitucionalidade da interpretação dos artigos 124, 126 e 128, incisos I e II, do Código Penal como forma impeditiva.

Para que provisoriamente se dissipasse a nuvem de insegurança jurídica, no dia 1° de julho de 2004, o Ministro Marco Aurélio concedeu a medida liminar para reconhecer "o direito constitucional da gestante de submeter-se à operação terapêutica de parto de fetos anencefálicos, a partir de laudo médico atestando a deformidade".

No dia 20 de outubro de 2004, todavia, o Supremo Tribunal Federal, em sessão plenária, por maioria de votos, revogou parcialmente a aludida medida liminar, para afastar o reconhecimento do direito constitucional das gestantes de se submeterem à operação terapêutica de parto de fetos anencefálicos, mas para mantê-la no que tange ao sobrestamento de processos e decisões não transitadas em julgado envolvendo a imputação de crime de aborto por conta de tal operação, até prosseguimento do julgamento para apreciação de questão de ordem acerca do cabimento da argüição de descumprimento de preceito fundamental no caso e, em seguida, do mérito.

Na retomada do julgamento, os ministros do STF analisaram, no dia 27 de Abril subseqüente, o cabimento da ADPF 54. Por sete a quatro, os ministros resolveram dar seqüência à tramitação do processo no Supremo, para posterior decisão quanto à legalidade da interrupção de gravidez de fetos anencefálicos.

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Jurisprudência 41

gravidez em caso de anencefalia já foram concedidas no país nesses últimos anos, mas para cada autorização concedida várias outras são negadas, criando assim uma insegurança jurídica inadmissível". Também favorável, Gilmar Mendes argumentou que a própria insegurança jurídica pode ser vista como descumprimento de preceito fundamental. Para ele, o que a CNTS questiona é a necessidade de se respeitar um preceito fundamental da Constituição brasileira, que é o princípio da dignidade da pessoa humana, da liberdade e do direito à saúde. "A existência ou não da violação de tais preceitos será objeto de exame quando do julgamento de mérito. Mas cabe enfatizar, nesse ponto, que este requisito legal para a admissibilidade da ADPF me parece completamente cumprido", observou Mendes. Assim, o tribunal, por maioria, entendeu admissível a Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental e, ao mesmo tempo, determinou o retorno dos autos ao relator, para apreciar o mérito. (texto copiado de Aborto uma abordagem jurídica e social de Hélio Roberto Cabral de Oliveira).

Outros pareceres:

Ementa: recurso em sentido estrito. Aborto provocado por terceiro. Negativa de autoria. 1. Existência do delito de aborto comprovado através da ficha ambulatorial, registro de ocorrência e prova testemunhal, supre o exame de corpo de delito, artigo 167 do CPP. 2. A sistemática dos delitos de competência do tribunal do júri determina que o juiz singular, uma vez demonstrada a existência do crime e havendo indícios da autoria, remeta o processo a julgamento para que os jurados pronunciem-se sobre o mérito da acusação. Improviso o recurso defensivo (recurso em sentido estrito nº 70012109617, Terceira Câmara Criminal, TJRS, Relator: Elba Aparecida Nicolli Bastos, julgado em 21/07/2005).

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Jurisprudência 42

Pareceres emitidos por Conselhos Regionais de Medicina

Assunto: Interrupção da gravidez nos casos previstos por lei ou aborto legal Relator: Conselheiro Cristião Fernando Rosas

Ementa: O médico exerce a medicina de forma ética, quando respeita a lei e os direitos reprodutivos de seu paciente, sendo de seu direito recusar-se à realização de atos médicos que embora permitidos por lei sejam contrários aos ditames de sua consciência. O consulente Dr. M.C.F., solicita parecer do CREMESP sobre interrupção de gravidez nos casos previstos por lei ou aborto legal.

Parecer:

Assim sendo, considero que exerce a medicina de forma ética, o médico que, em respeito à lei, atende a este direito reprodutivo, que há 58 anos está inscrito no Código Penal Brasileiro, seguindo as orientações normatizadas pelo Ministério da Saúde. Também entendo ser um direito do médico, conforme estipulado no artigo 28 do nosso diploma legal, recusar-se à realização de atos médicos, que embora permitidos por lei, sejam contrários aos ditames de sua consciência. Todavia, isto não o exime da responsabilidade de aconselhamento, informação, orientação e o devido encaminhamento a serviço que dê este tipo de atendimento, se este for o interesse da paciente. Este é o nosso parecer, s.m.j. Conselheiro Cristião Fernando Rosas.

Assunto: Eutanásia passiva. Recém-nascidos com menos de 400 gramas, os anencéfalos e os que apresentam trissomia 13 ou 18 confirmadas.

Relatores: Conselheiros Henrique Carlos Gonçalves e Marco Segre. O consulente, Dr. E.T.N., faz as seguintes indagações:

"1) Se o médico aceitar o procedimento de não intervir nas condições relatadas estará infringindo o Código de Ética Médica?

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Jurisprudência 43

3) A atitude de não intervir configura uma eutanásia passiva?

4) Supondo que as considerações do AAP e da OMS sejam referentes a recém nascidos com índice de APGAR igual a zero. Um recém-nascido nestas condições pode ser considerado como morto? Nesse caso a não ressuscitação ou reanimação infringe a lei penal e/ou a ética?

5) No caso de APGAR 1 ou 2 a não reanimação é ilegal ou antiética?"

Parecer

A expressão eutanásia não consta de qualquer norma ética ou jurídica, atualmente, em nosso País. Assim, não se pode falar em "eutanásia permitida", seja ela ativa ou passiva.

O que vai se firmando, isto sim, é a percepção da inutilidade de se manter um doente "vivo" a todo custo, infringindo-lhe, a ele e à sua família, infindável sofrimento.

Com relação a casos de morte encefálica já é consensual, em termos éticos, que se considere a situação de morte. Entendemos válido (e até aconselhável) que se dê o atestado de óbito, mesmo que a função cardio-respiratória esteja sendo mantida artificialmente, mormente quando se vá realizar a retirada, do corpo, de órgãos para transplantes.

O consulente indaga sobre "eutanásia passiva", isto é a não imposição, ao paciente, de medidas que lhe prolonguem a vida que, já se sabe, está inapelavelmente condenada a curtíssimo prazo - isto, em casos pediátricos, referindo-se ele à normatização da OMS e da FIGO (Federação Internacional de Ginecologia e Obstetrícia). Embora, repita-se, não haja normatização especifica a esse respeito, no Brasil, fere claramente a visão humanista da Medicina a "manutenção da vida a todo custo". Acrescente-se que, para os bebês anencefálicos já existe até jurisprudência autorizando o aborto, a pedido da mãe - dai defluindo o reconhecimento que essa "vida" não precisa ser preservada.

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Jurisprudência 44

"pensar" e "sentir" dos Membros desta Casa, e que reflete o "pensar" e "sentir" de boa parte da categoria médica, bem como da sociedade em geral - nem sempre tem o aval pleno da Legislação. E que esta - conforme se vê no caso dos bebês anencefálicos - vai, se adequando, num primeiro momento através da jurisprudência, às características culturais, dinâmicas, da sociedade. Remete-se o encaminhamento de cada situação em espécie ao senso ético de cada profissional, mantendo o máximo de obediência possível à norma ainda vigente.

Isto posto, proponho as seguintes respostas para as questões formuladas pelo consulente:

Resposta 1) Não sendo, essas situações explicitadas no Código de Ética Médica, não.

Resposta 2) É o Código Penal que estabelece penalidades, e, no caso, tudo dependerá do como for interpretada cada situação específica.

Resposta 3) Conceitualmente, até sim, tendo em conta as considerações supra-expostas.

Respostas 4 e 5) O índice de APGAR tem o objetivo de avaliar a vitalidade do recém-nascido nos primeiros minutos após o parto. O médico atribui notas que variam na escala de 0 a 2 para 5 sinais clínicos observados no neonato. Assim, o índice de APGAR, medido no 1º, 2º (em desuso), 5º e 10º minuto (às vezes), servem de indicadores para procedimentos imediatos ou futuros a serem realizados na criança. Assim, um recém nascido, fruto de uma gravidez de risco, cuja intervenção obstétrica se deu de forma adequada e oportuna, pode ter um índice de APGAR de zero ou muito baixo (1, 2, 3) no 1º minuto, revertido para índices satisfatórios após manobras corretas e bem sucedidas no pós parto imediato.

Nestes termos, o uso do índice de APGAR como indicador da reanimação ou não do recém-nascido é equivocada, se usado de forma isolada.

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Jurisprudência 45

Este é o nosso parecer, s.m.j. Conselheiro Henrique Carlos Gonçalves; Conselheiro Marco Segre.

Aprovado na 2.925ª Reunião Plenária, realizada em 28.03.2003. Homologado na 2.928ª Reunião Plenária, Realizada em 01.04.2003.

Consulta nº 1.444-25/83

Assunto: A constatação de anencefalia não tem amparo legal para prática de abortamento

Relator: Conselheiro Pedro A. Azevedo Marque

O Dr. R.M.N. em vista das atividades que vem sendo desenvolvidas no município de Cubatão e das inúmeras indagações que lhe são formuladas por colegas da região da Baixada Santista, consulta-nos sobre a possibilidade, do ponto de vista ético, de se proceder o abortamento quando forem diagnosticadas, nos exames pré-natal, certas anomalias, notadamente anencefalia.

Informa, outrossim, que a conseqüência invariável desse diagnóstico intra-uterino é o desejo manifesto pelo casal de interromper a gestação, visto que a anencefalia é incompatível com a vida.

O Código Penal no artigo 128, prevê as hipóteses em que o aborto praticado por médico deixa de ser punido. Por outro lado, de acordo com o Código de Deontologia Médica, o médico não pode deixar de cumprir a legislação existente.

Assim sendo, em vista da legislação vigente, encontra-se o médico impedido de realizar o referido aborto.

O CREMESP, presentemente, encontra-se discutindo e propondo mudanças na atual legislação.

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Jurisprudência 46

Resumo do embasamento da sentença judicial ocorrido em alguns pedidos favoráveis de aborto

Tabela 2 - Embasamento jurídico da sentença judicial e do parecer da promotoria favorável a pedido de aborto seletivo

Embasamento jurídico no deferimento Juízes MP

Inexibilidade de conduta diversa 1 2

Artigo 5o. da Constituição 3 4

Preservar a higidez psíquica da gestante 63 41

Inexibilidade de conduta diversa + Preservar a higidez psíquica da

gestante 1 2

Inexibilidade de conduta diversa + Artigo 5o da Constituição + Preservar

a higidez psíquica da gestante 7 5

Preservar a higidez psíquica da gestante e autoriza o aborto pelo art. 128 17 5

No Artigo 5o. da Constituição + art. 3o, Código de Processo Penal e princípios gerais do direito nos princípios de jurisdição voluntária e art. 1104 e seguintes do Código Penal

78 32

Estado de Necessidade + Aplicando-se anologia "in bonam parte"

usando art. 124 CP c/c o Art. 128,I e II + Artigo 5o. da Constituição 1 4

Autoriza o aborto nos termos do art. 128,I e II do CP 39 24

Aplicando-se anologia ïn bonam parte" usando art. 124 CP c/c o Art.

128,I e II 13 29

No Artigo 5o. da Constituição + art. 3o, Código de Processo Penal e

princípios gerais do direito nos princípios de jurisdição voluntária 6 5

Não há crime em realizar o aborto pois o feto não tem mais vida a ser

tutelada 6 3

Não encontra amparo no direito normativo 3 2

Sem acesso à informação / julgado na 2a. Instância 12 43

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Jurisprudência 47

Tabela 3 - A argumentação de juízes e promotores contra a autorização do aborto seletivo

Embasamento jurídico no indeferimento Juízes MP

Não se opões desde que haja risco de vida materno 0 1

Não configura estado de necessidade 4 5

Não encontra amparo no direito normativo 9 53

Invisibilidade do direito à a vida 0 3

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Considerações Finais 49

As principais conclusões alcançadas no trabalho apresentado são.

1. Mostramos que de acordo com relatos históricos, durante grande parte do tempo e de forma geral, era o aborto uma prática comum e amplamente aceita com ausência de recriminação concreta.

2. A recriminação e a criminalização do aborto tiveram início junto com o advento do cristianismo

3. Atualmente, com o desenvolvimento da medicina, vem-se criando um novo conceito sobre o início da vida, considerando-o a partir do momento em que se dá a atividade cerebral. Até então, o feto seria tido somente como um prolongamento do corpo da mulher, um conjunto de células. Tal conceito já tem tido certa aceitação, principalmente a partir do texto da Resolução n° 1.480/97 do Conselho Federal de Medicina, editada conforme o artigo 3° da Lei 9.434/97, que, por sua vez, dispõe sobre a retirada de órgãos, tecidos e partes do corpo humano post mortem para fins de transplante e tratamento. 4. Através da genética, em especial no segmento medicina fetal, criou novos

desafios para a Bioética e a Justiça, a partir do momento que as más-formações fetais são bem mais facilmente identificadas do que há algumas décadas.

5. Sabendo que a lei evolui com o tempo e com o pensamento da comunidade, que para tal as normas são feitas é nítido que o Código Penal atual, datado de 1940, não acompanha e nem exprime o desenvolvimento da sociedade e seu pensamento.

6. Nos países considerados de primeiro mundo, há, em geral, uma vasta gama de previsões legais para o aborto, quase todos deixando na mão da mulher o poder de decisão quando se trata de gestações até o 1º trimestre.

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Considerações Finais 50

8. Presume se que haja cerca de um milhão de abortos sendo praticados no país todos os anos, segundo estimativas do próprio Ministério da Saúde. O aborto é uma realidade, principalmente para as pessoas de baixa renda, sendo comum encontrar mulheres nas regiões periféricas que já abortaram mais de uma vez.

9. Dar informação e o acesso da população de baixa renda a métodos anticoncepcionais temporários (pílulas, Diu etc.) ou permanentes (laqueadura) que só a população de nível de renda maior tem, evitariam o alto número numero de abortos e infecções por aborto clandestino.

10. Projetos de Leis tramitam pelo Congresso Nacional, sendo que sua maioria propõe, ao menos, aumentar o leque de permissivos legais para o aborto, quando não desejam legalizar o aborto como um todo.

11. Apesar do Brasil se caracterizar como um Estado laico, onde o setor religioso, principalmente a Igreja Católica, influencia, de forma acentuada, as mais variadas questões nacionais, dificultando principalmente qualquer avanço nos debates em relação ao aborto. Nota-se que está tendo grande aceitação a possibilidade de interromper a gravidez nos casos em que a gestante apresente um feto anencéfalo ou com má formação não compatível com a vida extra uterina. A partir do HC 84025, houve uma grande polêmica, tendo a discussão sobre o aborto seletivo alcançado repercussão nacional. 12. Vale lembrar que, em se tratando de aborto, não se pode pensar

unicamente no feto, o qual não é uma pessoa em sua plenitude, mas sim uma expectativa de ser humano. Importante se torna levar em consideração – também – a posição da gestante.

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Considerações Finais 51

14. No caso, como há princípios constitucionais contrastantes, o sistema deverá fazer atuar um mecanismo de harmonização que submeta o princípio de menor relevância ao de maior valor social.

15. Sabemos também que em alguns países onde o aborto é legalizado para fetos com má-formação muitas mães optam por tê-los e sempre com uma dose de sofrimento e de resignação pelos relatos ocorrido, os recém nascidos duram muito pouco. Aqueles que têm respaldo de tecnologia permanecem com um tempo de vida maior, prolongado por essa tecnologia, mas sem qualquer perspectiva de algum dia terem consciência ou manifestação própria de sua condição de ser humano.

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Referências 53

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Comparato, Fábio Konder. A Afirmação Histórica dos Direitos Humanos. Editora Saraiva: São Paulo, 2005.

Holanda, Aurélio Buarque de. Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa, 2a ed. Revista e Ampliada. São Paulo: Editora Nova Fronteira, 1994.

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Muraro, Rose Marie. El aborto y la fe religiosa en America latina: México: Fontamara, 1989.

Oliveira, H.R.C. Aborto: Uma abordagem jurídica e social, 2003

Platão. A República. Introd. e trad. Maria Helena Rocha Pereira. 8.ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, ano.

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Bibliografia Consultada

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Dicionário Houaiss de Língua Portuguesa. Rio de janeiro: Objetiva; 2002. Dictionary of English Language and Culture. 2nd ed. England: Addison Wesley Longman; 1999.

Gomes, Hélio. Medicina Legal. 33. ed, Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2003 Magalhães Filho, G.B. Hermeutica e Unidade Axiológica da Constituição. 3 ed. Mandamentos, 2004.

MINISTÉRIO DA SAÚDE. Disponível em: http://portal.saude.gov.br/saude. Acessado em dezembro 2006,

Imagem

Figura 1 - Anencéfalo.
Figura 2 – Anencefalo 2.
Figura 3 - Holoproencefalia 1.
Figura 4 – Holoproencefalia.
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Referências

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