• Nenhum resultado encontrado

Repositório Institucional UFC: Sinuosa viagem ao tempo com o ajuntador de coisas

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2018

Share "Repositório Institucional UFC: Sinuosa viagem ao tempo com o ajuntador de coisas"

Copied!
27
0
0

Texto

(1)

C

h r i s t i a n o

C

â m a r a

Sinuosa viagem ao tempo

com o “ajuntador” de coisas

’JL’:

a ,

V i X?>T \

* * -v-

v

r

j m . f

1

f *

j í

w

.

_

.

Christiano (amara# um apaixonado pela música brasileira dos décadas

de 30, 40 e 50, nóo transigindo quanto aos seus gostos.

Ent revist a com Christ iano

Câm ar a, em 0 5 / 01/ 06.

Produção, redação e edi­

ção f inal:

An a Flávi a Gom es,

Cl a u d ie n e Cost a e Kar ll a

Gad elh a.

Text o d e Abert ura:

Cr i síia n e Pim ent e l.

Par t icipação: An a Flávia Gom es, An d r e h

Jo n at h as, Br u n o Pereira,

Cl au d ie n e Cost a, Cr i síian e

Pim ent e l, De n ise M a i a ,

Gu st a vo Colar es, Jo an ice

Din iz, Kar ll a Gad e lh a,

Let f cia Lopes, Lucint h ya Gom e s, Na a r a Vale ,

Ro f o e l a Pr im o, Rebeca Cavalc an t e e Vo n e ssa

Lim a.

Fot o:

Igo r Gr azi an n o

m n o e s p írito d e c o m o s e fo ss e p o ssív e l v ia -

I i ja r e m u m a m á q u in a d o te m p o , p e rsc ru ta n - P d o v e lo z m e n te um tu rb ilh ã o d e d ia s, m e se s - I — e a n o s, c h e g o à rua B a tu rité , C e n tro d e F o r­

ta le z a . A a n tig a R u a d a E sc a d in h a a b rig a na sim p le s e c u rio sa c a sa . n ú m e ro 162, o c o n d u ­ to r d e s s a in c rív e l jo rn a d a : o m isto d e m u se ó lo g o - p e s q u i s a d o r - a j u n t a d o r d e c o i s a s , C h r is tia n o C â m a ra .

N a m in h a im a g in á ria m á q u in a , m in im u se u e ta m b é m re s id ê n c ia d e C h ris tia n o , tu d o re m e te a te m p o s p re té rito s ; c o n s ta ta ç ã o fe ita lo g o n a e n tra ­ d a . N u m p o rtã o a n tig o d e ferro , a re c e p ç ã o s o rri­ d e n te e a c o lh e d o ra d a c o -p ilo to , D o n a D o u v in a , su a e sp o sa . C o m u m a r d e a v ó e p a ssa n d o c om d e lic a d e z a a m ão s o b re m in h a c a b e ç a , c ia a m e n i­ z a o p e s o em m e u s o m b ro s d o a tra so p a ra a e n tre ­ v ista . “ F ui a p re m ia d a !” , d isse . “ O i m in h a filh a , e n tre ” , c o n v id o u d o c c m e n te .

C o m o p a s s a p o rte e m m ã o s, e n tro . N as p a re ­ d e s, so rris o s e o lh a re s a m a re la d o s d e a rtista s de o u tro ra m e re c e p c io n a m . D is p o sto s em u m a c a ó ­ tic a o rg a n iz a ç ã o , a té q u a se o te to , re tra to s d e c a n ­ to re s , a to re s e fig u ra s de d e sta q u e do B ra sil e d e o u tro s p a ís e s. E m v e lh a s e s ta n te s, d is c o s; c e rc a de 2 0 .0 0 0 d e c e ra e 10 .000 d e vinil, re v e la n d o a

v o z , m e io e m b ru lh a d a , d e c o s tu m e s , h á b ito s e m o d o d e p e n s a r em um p a ís d o p a ss a do .

M ó v e is , o b je to s e a té o to q u e d o te le fo n e , com u m “ triiiim ” pe cu liar, rem ex em a s m in h a s le m b ra n­ ç a s d a s p o ltro n a s re c lin á v e is de c o u ro s in té tic o e d o s to q u e s d e c e lu la r p o lifô n ic o s . O p a p a g a io fa la s trã o , a p la q u e ta c o m o s d iz e re s “ c a n tin h o do s n e to s ” e a fra s e , e m g ra n d e s le tra s v e rm e lh a s, p in ­ ta d a n o m u ro : “ Q u e re r se r b o m j á é s e r b o m ” , m e d ã o s e n s a ç ã o d e c o n fo rto . “ V ia g em a g ra d á v e l” , p e n se i.

F a s c in a n te in ic ia lm e n te , a jo r n a d a lo g o se m o s tra tu rb u le n ta , e se u co n d u to r, um ho m em de i d é i a s i n f l e x í v e i s . O r o s t o g r a d a t i v a m e n t e a v e rm e lh a n d o -s e , a a lte ra ç ã o c o n sta n te no to m de vo z e a d ig re s s ã o n o ra c io c ín io d e C h ris tia n o , fa­ z e n d o re m e x e r n a s c a d e ira s o s trip u la n te s. A c ad a p e rg u n ta , o c u id a d o d o “ a ju n ta d o r” em e sc o n d e r o s a u d o s is m o p o r um te m p o n o q ua l n ã o te v e a o p o rtu n id a d e de viver.

E m nã o m u ito , a m á qu ina a m ea ça desgo ve rn ar. C h ristia n o a b a n d o n a o vo lan te, saca su a líng ua fe­ ro z e p a ssa a a tira r em to d a s as d ireç õe s. C om g ra ­ v id a d e n a s p a la v ra s, d e sp e ja suas c rític a s aos m e io s de c o m u n ic a ç ã o , p o lític o s e p o lític a s d e cu ltu ra do s g o v e rn o s, m ú sic a e a rtis ta s a tuais, ce n tro s c ulturais e - p o r q u e nã o d iz e r ? - à so c ie d a d e d e a g ora co m o um to d o . N e m N oe l R osa, L uis G o nz a ga , C hic o B u a rq u e e T om Jo bim esc a p a m . A trip ula ç ã o , in ­ q u ie ta , re sp o n d e a o fogo a m ig o bo m b arde an d o com pe rg untas.

A q u e d a p a re c ia v e rtig in o sa . M a s C h ris tia n o a o s p o u c o s c o m e ç a a s e d e sv e la r, m a is do q u e um c rític o v o ra z , um se n h o r d e 7 0 a n o s, com um a â n ­ sia d e s e r o u v id o , boa d o se d e v a id a d e , o d e se jo d e a lc a n ç a r o O lim p o do re c o n h e c im e n to pe lo tr a ­ b a lh o com o m u se u e, a c im a d e tu d o , u m a d e lic io ­ s a e r o m â n t i c a n o s t a l g i a . A c o n tr a d iç ã o n a s se n te n ç a s c o m o re fle x o d e um se r em si c o n tra d i­ tó rio , q u e s e m a m e sm a d e s in ib iç à o a o d is trib u ir fa rp a s, a b ra n d a a s fe iç õ e s e sorri tim id a m e n te ao fa la r d e fa m ília .

(2)

Christiano Câmara

Na p

rim eira el eição a f im

d e escol her o s ent r evist a­

d o s p ara est a ed ição da

revist a, Chr ist iano Câm a­

ra t eve seu n o m e cit ado.

M a s n ão f oi escolhid o.

A t ur m a se ar r ependeu da

prim eira vot ação f eit a. Na

se g u n d a o p o r t u n i d a d e ,

com n o m e s su ge r i d o s por

cat egoria, ele f oi o esco­

l hi d o ent re d oze opções.

26

Ana Flávia -

Seu Chris­

tiano

,

de onde surgiu o inte­

resse de m o n ta r esse m

ini-museu na sua casa?

Christiano

- S urgiu q u a n ­ do eu p a s s e i a v e r a d e s tru i­ çã o . P o rq u e n a re a lid a d e eu e ra u m a ju n ta d o r... E ra com o q u a lq u e r um o u tro , no c o m e ­ ço. A fig u ra do c o le c io n a d o r é, no m ín im o , p ra d iz e r b a ra ­ to, e x ec ráv el. P o rq u e e le c o ­ leciona p o r colecionar, p e la ra ­ r id a d e d a c o i s a . E le é u m eg o ísta. A liá s, te m um film e a té d ra m á tic o a e s s e re sp eito , “ O C o le c io n a d o r”

(film e de

William Wyler, 1965

,

baseado

no romance de John Fowles

e e stre la d o p o r Terence

Stamp, conta a história de

um colecionador de borbo­

letas que mantém prisionei­

ra a sua amada).

E n tã o o c o le c io n a d o r c m si n ão tem f u n ç ã o s o c ia l n e n h u m a .

(en fá tico )

É u m a fu n ç ã o p u ra m e n te p e s s o a l e v a id o ­ sa. “ O lh a , eu te n h o isso. N in ­ guém tem , v iu ? ” E só. P o r isso é q u e e u n ã o m c ju lg o um c o ­ le cio nad or.

O p ro b le m a ... D e v id o ao descaso d as autoridades, quem , de d ireito, era p ara colec io na r p ra q u a lq u e r b ra sile iro , q u a l­ q u e r u m d o s p re s e n te s p e s ­ q u isar ou h isto ria r - q u alq ue r dos senhores ou senhoritas aqui po d eria ser p esq u isa d o r ou h is ­ toriador. Q uem tinh a a o b rig a ­ ção dc co le c io n a r era o p o d er pú b lico . C o m o na E urop a se fa z . B ib l io te c a , d i s c o t e c a , vide oteca, he m ero te ca , cdteca, e tod a c o isa q u e co m e ç a com cca

(na verdade ele quis dizer

que termina com eca)

e que é coleção, qu em tinh a a o b rig a ­ ção d e te r é o p o d e r público. N a falta dele, o s co le c io n a d o ­ re s te n ta m faz e r as v e z e s de g ua rd iõ es da história.

N a re a lid a d e , m u ita s ve ze s d isto rc e m . P o rq u e n e m se m ­

p re o c o le c io n a d o r te m a v i­ sã o d e p e s q u is a d o r e m u ito m e n o s d e h isto ria d o r. E le dá u m a v is ã o sau d o sista . E le dá u m a v isã o da ra rid a d e . M u i­ ta s v e z e s u m a p e ç a , p o r ser ra rid a d e , n ã o q u e r d iz e r q u e te nha valor, não. Já foi p ro lixo d a h istó ria. E o u tra s q u e e s tã o e s q u e c id a s , c o m o e u te n h o in ú m eras aqu i, p re c isa v a m ser re a v a lia d a s.

Claudiene -

E com o o se­

nhor fe z para conseguir todo

esse material?

Christiano - (

interrom pe)

A h, isso foi ao longo d o s anos.

( Começou quando)

E u tin h a

"Q u e m t i n h a a o b r i ga ç ã o de

co l e c i o n ar e r a o Po d e r Pú b l i c o . (...)

N a f al t a del e, o s c o l e c i o n ad o r e s

t e n t am f a ze r a s v e ze s de g u a r d i õ e s

d a h i st ó r i a . "

17 anos. F oi e m 52. J á v a m o s p r a 5 4 a n o s ... E u tin h a 17 a n o s, e n tã o levei m a is o u m e ­ n o s uns d ez an os c o m o s im ­ p le s co le cio n ad or. A p a rtir d aí e u c o m e c e i a p e s q u is a r. P ra v o c ê ver, tu d o te m seu s p rin ­ cíp io s, né?

C h e g a v a m aqui e q u e ria m u m a m ú sic a d o v e lh o

(enfa­

tiza)

S ílv io C a íd a s

(cantor e

c o m p o sito r carioca,

1908-1998).

E u d ig o : “ N ã o , m e u D e u s. S ílv io C a íd a s q u a n d o g ra v o u isso n ão era v e lh o ” . A í q u e eu vi a n e c e ssid a d e de a li­ a r a m ú s ic a q u e era n o v a , do S ílv io C a íd a s c o m v o z d e no vo, a in d a no v o, ao retra to . U m a c o isa p u x a a o u tra. D aí n asce u a ga le ria .

Lucinthya

- E m que ano?

Christiano

- Isso foi p o r v o lta de 62. V ocês e s tã o m u i­ to R ed e G lo b o ... E sse n e g ó c io de...

(querer saber)

O s d ad os assim . M as é bo m . P o is b em ,

eu p ro c u re i aliar... A liá s,

(de)

u m a fo rm a até in fan til. P o r­ q u e , q u a n d o e u o u v ia u m a m ú sic a q u a n d o c ria n ça , q u a n ­ do jo v e m , eu q u e ria v e r o re ­ tra to de q u e m es ta v a c a n ta n ­ do. M as n a é p o c a

(enfatiza)

em q u e e s ta v a can ta n d o. P o r isso é q u e a p e sso a p e n s a que e s s e p e s s o a l, p o r se r a n tig o h o je , j á n a sc e u velho.

E eu fa lo d e p e ç a s q u e fo ­ ram e sq u e c id a s, te m u m a d e ­ la s q u e é d e 1931.

(De)

31 pra 2 0 0 6 , q u a n to s an o s faz? S e­ te n ta e c in c o anos, n é? A p e ç a te m 75 anos, e s tá novíssim a! M a s n ão é n o e s ta d o físic o ,

não . É n o tem a.

Gustavo -

Que música é

essa?

Christiano

- E u m sa m ­ ba c h a m a d o “ B e n e d ito ” , de um a u to r to ta lm e n te d e sc o ­ n h e c id o . N u n c a foi av a lia d a e n u n c a fo i analisada! O c a n ­ to r é o p ró p rio autor: P au lo R o d rig u e s, 1931. “ B e n e d ito / P o r q u e jo g a s no b ic h o ? / T u n ã o v ê te u d in h e ir o ir p ro lix o ?/ B e n ed ito, d eix a d isso / P re c is a m o s se m u d a r d e s s e c o rtiç o ” . A lin g u ag em toda ... M e sm o d e um a n alfab eto .

F ix o u a in u tilid a d e de se jo g a r no bicho, a ân sia que o b r a s ile ir o te m d e fic a r ric o sem trabalhar, da noite pro dia. Q u e r d iz e r, e s s a h is tó ria de m e n s a lã o

(referência ao su ­

p osto suborno recebido pelos

políticos do legislativo fe d e ­

(3)

Christiano Câmara

gurado, apartamentos).

T udo en ga ve tad o . O que é u m a ilu­ são, p o rq u e o fulano c h e g a e a s s a lta p o r a ta c a d o

(C hris­

tiano se refere a fu la n o para

dizer qualquer pessoa).

E ntão ele fixa: se saísse lá da favela, do c ortiço , e fo sse pro ap artam ento, a c o isa era outra. Q uem m orava em a p a r­ ta m e n to não e ntra v a no d is tri­ to, não era preso. P o rq u e tinh a u m sta tu s bem m a is a lto . O sa m b a m e re ce tod a u m a a n á ­ lise sociológ ica.

Ana Flá via -

Essa é a peça

m ais importante?

Christiano -

(interrompe)

N ã o , não, pera í! N ã o tem negó cio dc m ais im p o rta n ­ te, não. É po rq ue vo cês não tiveram oportunidade de ver u m a p a le stra m inh a, m o s ­ trando e sse tipo de coisa.

Karlla -

N ão tem ne­

nhum a m ais im p o rta n te,

que m ereça um destaque

-maior?

Christiano

- N ã o , te m n ã o lQ u e m e re ç a d e s ta q u e , não. M esm o p o rq u e a vid a é m u ito fac ética , n é ?

(cria um

term o para substituir m

ulti-facetada).

É m u ito c h e ia d e

rarida de.

Claudiene -

Tem alguma

peça aqui que tenha dado bas­

tante trabalho para conseguir?

Christiano

- N ão , q u a n d o dá traba lho eu desisto. N e n h u ­ m a pe ç a va le ta n to trab a lh o . M e s m o p o rq u e , se a p e s s o a está se ap eg an do , c p o rq u e ela tá da ndo um a visão a rg e n tá ria de coleciona do r. N ã o é c o m i­ go não. T em ou tro s q u e dão a v id a p o r e ssa s coisa s, e m e n ­ te m , e ro uba m , fazem o d ia ­ bo. E u não, pelo c o n trá rio .

A n d ou aqui um c o le c io n a ­ d o r há u n s an os atrá s... N ã o fo i, D o u v in a ?

(vira-se p a ra

dona Douvina, na porta)

A trás d e um d is c o ra ro d e C h ic o A lv es

(Francisco Alves, fa m o ­

so representante da m úsica

p o p ular brasileira que canta­

va faxes, tangos, paródias, o

que se lhe pusesse na frente,

1898-1952)

e e n c o n tro u ali. C h e g a tre m ia o rapaz . E u d is ­ se: “M a s o que é is so ? ” O d is ­ c o b o n itin h o e ta l, m a s n ã o d iz ia n a d a .

{Eu fa le i:)

“ V á, le v e o d isc o p ra v o c ê ” .

{E ele:)

“N ã o é p o ssív el! Isso é ra ro ” .

(Eu respondi:)

“ E d a í? É raro m a s n ã o m e d iz n ad a

(eleva a

voz, exaltado)

e n em s o c ia l­ m e n te d iz n a d a . N ã o fa z a m e n o r an á lise so cial, não tem o m e n o r e m b a s a m e n t o d e nada! V ocê tá q u e re n d o só p o r

"N

e n h u m a p eça v a l e t an t o

t r a b a l h o . (...) Tem o u t r o s q u e d ã o a

v i d a p o r e ssa s coisas, e m e n t e m , e

r o u b a m , f aze m o d i ab o . Eu n ão,

p e l o c o n t r ár i o . "

sau da d e. L e v a q u e n ão m e dá s a u d a d e n e n h u m a , r a p a z ” .

(ainda exaltado) (D. D ouvina

acrescenta: “E le f e z f o i um

seguro no hotel que ele tava

”,

e Christiano completa:

o tal pesquisador.^

V eja a m e n te d is to rc id a do p e s q u is a d o r !

(ele va a voz)

A g o ra , o q u e tô ac h a n d o p io r

(enfático)

s ã o o s jo rn a lis ta s q u e se m e te m a h is to ria r sem o d e v id o em b a sa m e n to c u ltu ­ ral.

(D. D ouvina assente com

a cabeça, na nossa direção:

“Ó ó iF )

Andreh -

Na verdade, a

sua casa se transform ou no

museu ou o museu se transfor­

m ou na sua verdadeira casa ?

Christiano

- N ão , a c asa é q u e se tra n sfo rm o u no m u ­ seu. P o rq u e eu p ro c u ro a je ita r as c o is a s d e a c o rd o c o m as m in h a s c o n v e n iê n c ia s . P o r e x e m p lo , q u a n d o c h e g a um neto... N ão te m c o isa m ais pre­

c io sa d o q u e a fa m ília . A fa­ m ília é a c é lu la da so cied a de .

Andreh -

Como associar

essa questão de m orar dentro

do museu?

C hristiano

- T r a n s f o r - m o u -s e em m u se u p o r ca us a d o d e s c a s o d as a u to rid a d e s !

(eleva a voz)

E ssa c a s a v iz i­ n h a

(aponta)

faz m a is d e 30 a n o s q u e e s tá d e s o c u p a d a . N ã o te v e u m ó rg ã o c u ltu ra l p a ra c o m p ra r p ra b o ta r e sse m u s e u d e n tro e p ra e u fic a r c u id a n d o aqu i, n u m a p o n te . E vig ilân cia e tu d o m a is. N ã o m e deu a ju d a n en h u m a!

(exalta­

do)

N ã o h á u m a p o lític a c u l­ tu ra l no B ra sil, não . S e h o u ­ v esse, n ão te ria m n o m e a d o e sse p a lh a ç o p ra M in is tro da C u ltu ra

(refere-se a G ilber­

to G il

), p o rq u e isso é um a p ia d a dc m a u go sto.

Ana Flávia -

D a q u i a

p o u co a gente vai...

Christiano

- A h, pois é.

(ainda exaltado)

T á v en d o , u m a c o isa p u x a a ou tra , e vai ou tra , e v ai outra. T á tudo in­ te rlig a d o . É p o rq u e n ã o há! N ã o h á um n e gó cio assim , ra ­ paz. N ão há! E u g o s ta ria até q u e v o cês v issem un s tópicos só, d o p e n ú ltim o p ro g ra m a de rádio q u e e u fiz. E u faz ia um p rogram a pra rádio C ultura dos Inh am u ns

(em Tauá, município

localizado numa das regiões

m ais secas do Ceará, de 1989

a 1994).

G ra v a v a aq u i, aqu i m e sm o n e ssa sala

(apontapra

dentro da casa),

e m a nd av a pra lá

(foram 99 program as entre

1989 e 1994).

Gustavo -

A lém do F ran­

cisco Alves, e de outros artis­

tas que a gente vê na parede,

o senhor p oderia citar alguns

que o senhor mais gosta...

Christiano -

(interrompe)

N ão , m a s n ã o é p ro b le m a de gosto pessoal. A í é q u e está a diferença! A g o ra m esm o tá sa­ indo um negócio crim inoso, que

A al u n a Let ícia deu o n ú ­

m ero do t elef one à p r od u­

ção e Kar lla f oi r esp onsá­

vel pelo cont at o inicial com

Ch r i st ian o , q u e ac e i t o u

p ront am ent e o convit e.

Ele ap r oveit ou e con vid ou

a e q u i p e d e p r o d u ç ã o

por a assi st ir su a p al est r a

no Cent ro Cul t ural B N B . O

Prof . Ro n al d o encer rou a

aul a um p ouco m ai s cedo.

(4)

Christiano Câmara

A p

r od ução f oi diret o paro

o Cent ro. Tem a da p al e s­

t r a: "A m ú si c a p o p u l ar

q u a n d o r egist rava a h i s­

t o r i o ". Com eçou t ard e e

t e r m i n o u m a i s at r asad a

ai n d a.

A s a l u n a s n ão t i n h a m a

f i si o n o m i a de Ch r ist ian o

b em gu ar d ad a. Chegar om

e sent ar am n as escad as do

se gu n d o o n d ar e n q uant o

a sa l a ai n d a est ava f echa­

da.

está nas prateleiras das livrari­ as pra se r ven dido e m a ndaram pra m im . E u estive olhando...

Karlla -

E q u a l é a d ife­

rença?

Christiano

- H e in ?

Karlla -

D e que não é gos­

tar...

Christiano

- Q u e n ã o é o quê?

Karlla

-

E le

( G u s ta v o )

p e rg u n to u se te ria a lgum a

peça que o senhor destacaria

e o senhor disse que o proble­

ma não é gostar.

Christiano

- N ã o , é p o r­ q u e eu g o s to é d o c o n ju n to da coisa. A s v e z e s te m um d e s ­ c o n h e c id o q u e c a n ta com ta n ta a lm a ... A té a c a rte - liza çã o d a e c o n o m ia , as ar­ te s se r e c ic la v a m d e u m m o d o . A p a r ti r d a c a r te - liza çã o da e c o n o m ia , as a r­ te s p a s s a ra m a se r re c ic la ­ d as p e lo s q u e d o m in a m os m e io s d e co m u n ic a ç ã o , que e s tã o a lia d o s a o s g ra n d e s c a rté is . Q u a n d o a s re d e s de te le v is ã o ... V ocê v ê q u e elas, a p a re n te m e n te , b rig a m u m a s com as o u tra s, m a s n a h o ra de c o m e r o b om p e d a ç o , e la s c o ­ m e m tu d o ju n ta s . N ã o p e n s e q u e u m a te m u m a v isã o d ife ­ ren te d a o u tra, não. T oda s têm a v isã o d o rico.

T anto é q u e m e u irm ã o que m o ra e m S ã o P a u lo h á 4 0 an os, H éld er, ele m e d is se que m orad or d a m e g aló po le , q u a n ­ do c p o litiz a d o , e le faz p o r e li­ m in a ç ã o . E le s p e r g u n ta m : “ E sse a s s u n to aí, a te le v is ã o está c o n tra ou a fa v o r? ” .

(Res­

pondem :)

“E s tá a fa v o r.”

(O

p o litiza d o c o n c lu i

:)

“ E n tã o

n ão se rv e p ara o p o b re ” .

Denise -

Com relação ao

seu acervo, o senhor tem todo

esse material catalogado?

C hristiano

- T e m n ã o . T udo isso m e falta. C atalogado, não. E u tenh o p o sto num c a n ­ to que eu sei on d e estão. P o r

épocas, p o r autores, p o r c a n to ­ res, p o r im p ortância . P a ra c a ­ talogar, v o cê vai ju n ta r alh o e bugalho. V ocê vai ju n ta r u m a p e ç a im po rtante com u m a peça que está ali p o rq u e foi gravada.

Denise -

M as o senhor dis­

se que não havia p e ç a m ais

importante. E então?

Christiano

- N ã o h á , não. H á p e ç a s im p o rta n te s e o u tras q u e n ão tê m a m e n o r im p o r­ tân cia! (

eleva a voz)

E só isso. N ã o é m a is im po rta nte.

Rafaela -

M as o que é im ­

portante?

Christiano

- O q u e é im ­ po rta n te é a q u e le q u e visa ao

"A p ar t i r d a c a r l e l i za ç ã o d a

e c o n o m i a, as ar t e s p a ssa r a m a se r

r e ci cl ad as p e l o s q u e d o m i n a m o s

m e i o s de com u n i c aç ão , (...) a l i a d o s

ao s gr a n d e s car t é i s. "

ser hum a no , é aq uele q u e visa à m elhora da sociedade, é aqu e­ le que traz u m a m e n sa g e m p o ­ sitiva.

(se exalta)

O q u e n ão é im po rta n te é e x atam e n te o q u e estã o d an do im p ortância . C o ­ m o ficam o s m eio s de c o m u n i­ ca çã o a en d e u sa re m do is der­ ru bados: N oe l R o sa

(cantor e

c o m p o sito r ca rio ca ,

1911-1937)

e L u p ic ín io R o d rig u e s

(artista gaúcho, 1914-1974).

M e ap resen te u m a v is ã o sadia q u e o N oel tenha dado da vida! A vida não presta, a m ulher não p re sta e o a m o r n ão existe. E é d eb o ch e p ra lá, e d e bo ch e pra acolá. Lupicínio R odrigues não c o n h ec ia um a m o ç a decente.

Vanessa -

Seu Christiano,

o que cham a m ais a ten çã o

quando as pessoas visitam seu

acervo?

Christiano

- E a alienação.

Vanessa -

Não. O que elas

procuram mais em relação...

Christiano

— A h, é o q u e a

m íd ia m a nd a. E x atam e n te . É a a lie n a ç ã o , o q u e a m íd ia m a nd a. Q u an d o vem q u a lq u e r e q u i p e d e t e l e v i s ã o , e u p ro c u ro tira r da p a re d e L u ís G o n z a g a

(cantor, com positor

e instrum entista de acordeão,

pernam bucano de Exu -

san-foneiro - é o sím bolo m aior da

música nordestina em todos os

tempos e p o r conseguinte, um

dos grandes expoentes de nos­

sa m ú sic a p o p u la r, s e n d o

denom inado de Rei do Baião,

1912-1989),

D o riv al C ay m m i

(com positor baiano, influen­

ciou várias gerações de m úsi­

cos brasileiros. Foi cantor de

rádio, e com o co m p o sito r

ganhou um concurso de mú­

sicas de carnaval em 1936.

A fa m a chegou com a inclu­

são de sua música “O Que E

Q ue a Baiana Tem ” no film e

“Banana da Terra

”,

estrela­

do p o r C arm en M iranda),

N oe l R osa... N ã o é que não p re ste , não. É p o rq u e eles fi­ ca m b a ta lh a n d o só em cim a d isso ... p á, pá, p á, p á, pá , pá... C o m o se a m ú sic a se re s u m is ­ s e s ó n is s o . E a A r a c y de A lm e id a (7

944-1988; atriz e

cantora carioca de sambas e

marchinhas),

q u e cantav a com a lá g rim a na voz, está e sq u ec i­ da. F ran cisc o A lves, que era o p ro fe sso r de le s ‘tu d im ’, tá e s­ quecido. E outros m ais. É o que eles querem .

E o tal negócio: a gente não pod e ter essa visão idealista de que a coisa se autofaz. Eu vi a visão que estão dando da Inter­ net. C om o se a Internet fosse a pró pria natureza, dando todos os conhecim entos. U m colegia- do de doutores, e tal. Q ue nada! Tem inform ações erradíssim as nessa Internet.

Claudiene -

O senhor dis­

se que não tem apego a essa

questão de gostar, m as sim a

im portância que dá. Na sua

casa, tem vários aparelhos de

(5)

Christiano Câmara

rádio. E n tã o o rá d io f o i o

m otivador da sua pesquisa?

Christiano

- N a c e rta o a p a re lh o d e rádio m e lh o r q u e tinha aqui d eram fim . E ra um T ransg lobc

(aparelho de rádio

montado no Brasil capaz de

captar grande quantidade de

estações, resistiu até os anos

80),

que pe ga va ex atam e n te as o n d a s cu rta s, p e g a v a a E u ro ­ p a tod in ha... U m a vez, eu fui d a r um a no tícia q u e eu tinh a v isto na B B C

(British

Broad-casting Corporation

,

rede de

comunicação inglesa)

e o fu ­ lano, que eu pe n sa v a que p e n ­ sa sse algu m a coisa, d is se q u e não qu is dar. P o r q u ê ? P o r­ q ue a te le visão n ão deu . A B B C d eu , e s ta v a lá fora. M as aqui, na hora da te le ­ visã o dar a no tícia, ela fil­ tro u . C o m o filtro u a g o ra u m a n o tícia q ue e ra p ra te r sid o dada, que eu ac re d ito q u e não te nh a sido: o

(atu­

a l presidente venezuelano

Hugo)

C h á v e z m a n d o u u m a a ju d a p ara os p o b res de N o v a Y ork; ele m a ndou p ra a c in ta r o

(presidente dos Estados Uni­

dos, George)

B u s h

(ri).

O s p o b res de N ov a Y ork, se p re ­ c isa re m de ajuda, é o p ró p rio p resid en te que m tem a o b rig a ­ ç ã o de d a r

(rindo).

M a s e le m a nd ou . N em isso aí

(eleva a

voz)

a te le v is ã o no ticiou .

Ana Flávia -

O sen h o r

ressalta algum período como

a era de ouro da música?

Christiano

- N ã o , e s p e re lá. M as n ã o fo i só da m ú s ic a , n ã o . V o cê s n u n c a v ir a m o doc um en tá rio que tem aí, não, n é ?

((

R e fe r e s e ao c u r ta

-m etrage-m

" Rua da E

scadi-nha 1 6 2 ”(2003), de M árcio

Câmara, que m ostra C hris­

tiano e seu acervo)

A m ú s ic a é um re fle x o d a in fra -e stru tu - ra. E la re fle te o m o m e n to em q u e é feita... A m ú sic a , a p in ­ tu ra , a a rq u ite tu ra , e s c u ltu ra ,

tu d o isso. A s a rte s n u m a m a ­ n e ira g eral.

A m ú s ic a e r u d it a tin h a a q u e le liam e co m un ic ativ o até q u a n d o o c o m p o sito r de m ú ­ sic a eru d ita p a sso u a te r status q u a se de rei. E le era fam o so, ele e ra re q u isita d o . M as a ju ­ d a m a te ria l,

(não tinha)

q u ase n en h u m a. V ocê vê que M o z a rt

(austríaco, principalm ente um

com positor de óperas, em bo­

ra tenha sido prolífico em to­

dos os gêneros, 1756-1791)

m o rre u na m isé ria . O M o z a rt q u e este ano está c o m p le ta n ­ do 25 0 an o s d a m o rte dele. D o n a sc im e n to , aliás. E le n asce u

"(

.• • ) Po st o n u m cant o q u e e u sei

o n d e est ão. Po r é p ocas, p o r au t or e s,

c at al ogar , você vai j u n t ar a l h o e

b u g a l h o . "

em 1756, salv o eng an o. M o r­ reu em 1791. V iveu p o u c o d e ­ m ais.

P o is b e m , v iv e u p ra tic a - m e n te po b re . O q u e g a nh av a era d a s a p re s e n ta ç õ e s c o m o p ia n is ta . E o q u e e le fez c o n ti­ nua p o r aí. E n tã o, q u a n d o os co m p osito re s com eça ram a ser m u ito o lh a d o s e a m ú sic a c o ­ m e ço u a d a r dinhe iro... P o rq u e é o tal neg óc io : sem d in h e iro a c o isa n ã o an d a, e com ex c e s­ so

(de dinheiro)

a coisa d e s a n ­ d a. P o rq u e n ã o é q u e te n h a d in h e iro o u d e ix e de te r d i­ n h e iro . P rin c ip a lm e n te n u m a e s tru tu ra a rg e n tá ria d essa. É p re c is o c e rto d in h e iro . M a s um ce rto

(enfatiza)

din h eiro . P o rq u e d e m e n o s faz fa lta e d e m a is faz fa lta ta m b ém . F az falta n o o u tro se n tid o, d o fu­ lano fic a r to ta lm e n te alien ado .

E n tã o , q u a n d o a m ú s ic a p a s s o u a d a r sta tu s d e d in h e i­ ro , e la c o m e ç o u a d e ix a r de se

c o m u n ic a r, p o rq u e fu la n o já co m p u n h a p a ra g a n h a r d in h e i­ ro . Q u a n d o d iz q u e M o z a rt ve n d ia m ú sic a, que B e eth ov en

(m aior com positor alemão de

música clássica, 1770-1827)

v e n d ia m ú s ic a , v e n d ia m e s ­ m o! O q u e j á ta v a feito!

(ele­

va a voz)

O q u e e s ta v a e s p o n ­ ta n e a m e n te j á fe ito . E le s só faziam as a d a p ta ç õ e s. M en tia, d iz e n d o q u e tin h a sid o fe ito p o r e n c o m e n d a de fulan o de ta l. Q u e n a d a ! T a n to é q u e m u ita s v e z e s o c a m a ra d a p e ­ d ia u m a c o isa e a m ú sic a, vo cê ouvind o, tem um a sen saç ão to ­ ta lm en te d ife re n te d aq u ilo que

o rig in a lm e n te fo i ped id o.

Gustavo -

S eu C h ris­

tiano, voltando um p o u c o

p ra quando o senhor com e­

m orava com p a i e mãe?

C hristian o

- F o i. E u s e m p re fui um e s tra n h o no n in h o , p o rq u e n u n c a tiv e a v isã o p rá tic a d a v id a . E u c o ­ m e cei a tra b a lh a r com 15 anos. N a m in h a e d u c a ç ã o m e d eram a n o ç ã o d e ser, ao in v é s de ter. E n tã o , e u n u n c a a m b ic io n e i ter, e u s e m p re a m b ic io n e i ser. E isso, p ra q u em q u e r c o n s ti­ tu ir fam ília, p ra q u e m q u e r se suste nta r, é u m a m o rte .

M eu pai, explorando o nom e do irm ã o fa m o so , D . H é ld e r

(Pessoa Câmara, 1909-1999,

fundador da CNBB

-

Conferên­

cia Nacional dos Bispos do Bra­

sil - e d e outras entidades, era

arcebispo emérito de Olinda e

Recife e atuou contra o regime

militar no Brasil

),

arranjou-m e u m e m p re g o d e c o n tín u o no B an co d o B rasil. N ão! A ntes disso. M eu pai era d elegado do In s titu to d e A p o s e n ta d o ria e P e n sã o do s Industriários. M il novecentos e cinquenta. E u com 15 anos. E le disse: “M eu filho, vo cê tem essa m ania, sua m ãe v iv e lh e d a n d o d in h e iro p ra

p o r can t or e s, p o r i m p o r t ân c i a. Pa r a

çou a montar 0 acervo, o

senhor tinha irm ãos? Ainda

Todo e q ual quer se n h or de

m elh or idade que p assava

diant e d o s gar ot os d o pro­

d ução ch om avo o at enção

e era olvo de especulação.

"Se r á q ue é e sse ?"

Um a gr eve d e q u o se t r ês

m e se s i nt er r om p eu o a n ­

d am e n t o d o proj et o e o s

cont at os com o ent r evist a­

do. M o s a p e sq u i so d e

m at er ial na int ernet c o n ­

t inuou.

(6)

Christicino Câmara

Com o

ret or no d o s aul as,

vol t ar am t am b é m o s con­

t at os com Christ iano. In ­

t ensif icou-se a preparação

p ar o a ent revist a, acel e­

r an d o o rit m o de t rabalho.

0 p r e m i ad o d ocum ent ár io

cu r t a-m e t r age m "Ru a da

Esc a d i n h a , 1 6 2 " , d e

M á r c i o Cam ar a, f oi um a

d a s n o ssa s por t as d e e n ­

t r ad a p ar a o m u n d o de

Christ iano.

30

você ir atrás dessas coisas c o u ­ vir m úsica. N ão era bom que você já tivesse um dinheiro p ró ­ prio?” E u disse: “ E ra b om ”.

(E

ele:)

“P o is eu vo u lhe colocar com o co ntínu o lá no Instituto em que eu so u o presiden te” . D elegado, cham ado na época. Ele m e bo tou aí.

E u le v e i 5 a n o s. Q u a n d o fo i cm 55 e le , e x p lo ra n d o o n o m e d o irm ã o fa m o s o , m e a rra n jo u o u tro lu ga r, ta m b é m d e c o n tín u o - q u e n a q u e la é p o c a n ã o p o d i a , n ã o e r a c o m o h o je q u e v o c ê n o m e ia q u a lq u e r c o is a p ra c h e fia . E n is s o fiq u e i, eu n u n c a tiv e a m b iç ã o de s u b ir c o is a n e ­ n h u m a . N u n c a g o s te i d e - m a te m á tic a . E n tre i e m 55 no b a n c o , j á c o m 5 a n o s de P re v id ê n c ia , de c o n trib u i­ ç ã o e tu d o , j á co m c a rte ira a s s in a d a , c tra b a lh e i m a is 25 a n o s. Q u a n d o c o m p le ­ te i 30 a n o s, saí. A s p ira n d o a a p o s e n ta d o ria p a ra p o d e r fa z e r o q u e eu , na re a lid a d e , q u e ria . E u n ã o m e c o m p le te i no e m p re g o .

Gustavo -

O senhor tem

acervo de outros países, como

Itália e M éxico. Como com e­

çou a m ontar o que era de fo r a

do Brasil?

Christiano

- E u co m ece i a p eg ar de coleções de estra ng ei­ ros. E o u tra coisa: ta m b ém eu fui cria do num a m b ie n te nada prático. Se v oc ês q u erem cria r os filhos direitin ho , é tu do di- rcitinh o, m a s não façam o que fizeram com igo . P elo am or de D eus. E u n ão do u v a lo r a d i­ nheiro. N u n c a a n d e i com d i­ nheiro. M eu m e d o de a ssa lta n ­ te é q u e ele n ão vai ac re d ita r que cu não tenho celular, eu não te n h o d in h e iro , n u n c a a n d e i com dinheiro. E u só ando em canto conhecido, que m e conhe­ cem . D epois telefona, cobra e a m ulher vai pagar. Eu não lido com dinheiro, não! O dinheiro

vem no fim do m ês. “O lhe, você tem tanto na con ta ” . E u digo: “O lhe, D ouvina, você pod e che­ ca r tanto” , e tal. E ntão, d in h e i­ ro pra m im sem p re foi secun­ dário. A gora m esm o, antes de vocês chegarem , eu ta va traba­ lhando num c d p ra dar.

Gustavo

-E n tã o , como fo i

que começou a montagem do

acervo internacional?

Christiano

- Sim , p o r c a u ­ sa da v iv ê n c ia q u e eu j á tin h a em casa! M in h a m ã e fa la v a 5 lín g u as. M e u p ai fala v a 6 lín ­ gu as. E u era u m alie n ad o ! E co n tin u o alie n a d o , n a re a lid a ­ de. P o rq u e eu n ão a cre d ito que

"A ge n t e n ã o p o d e t er e ssa v i sã o

i d e al i st a d e q u e a coisa se au t o - f a z .

(...) Co m o se a In t e r n e t f o sse a

p r ó p r i a n at u r e za, d a n d o t o d o s os

c o n h e c i m e n t o s. "

um se r h u m a n o p o ssa m a ta r o o u tro p o r c a u s a de d in h e iro . P e lo a m o r d e D eus.

Naara -

O senhor pegava

esses discos dos am igos dos

seus pais? Ou era doação?

Christiano

- N ão , ao lo n ­ go do s anos... E sp e re aí. S ão 53 anos! A m aioria eu c o m p ra ­ va. D e u s sa b e c o m o c o m p ra ­ va. O dinhe iro que eu pegava ... Is s o a n te s d e c a s a r. D e p o is a c o c h o u m a is u m p o u c o . E d e p o is... E le s se m p re d o a ra m o q u e v ai fic a n d o d e fa s a d o . P o r e x e m p lo ,

(discos de)

c e ra foi d o ado q u a n d o surg iu o v i­ n il, o LP. Isso foi a p a rtir de 64. P orque o cera durou até 64. C o m e ç a ra m a a b rir as p o rta s d as rád io s, q u e a g e n te p o d ia v e r lá.

Naara -

M esmo tendo essa

atitude de procurar discos ra­

ros em outros países, outros lo­

cais, o senhor não se considera

um colecionador?

Christiano -

(com ênfase)

N ão!

Naara -

O senhor se con­

sidera um ajuntador?

Christiano

- U m p e s q u i­ sado r. P e lo c o n trá rio . E u era u m a ju n ta d o r a n te s. O c o le ­ c io n a d o r é um a ju n ta d o r de d is c o s . U m p e s q u is a d o r é d i­ fe re n te . E le v ai p e s q u is a r e v a i, d e a c o rd o c o m a v is ã o q u e te m , q u e te m q u e s e r s o ­ c io ló g ic a ...

(nesse m om ento

ele p á ra a entrevista p ra p e ­

dir silêncio ao papagaio f ê ­

mea, que estava aos

‘berros )

T em trê s tip o s d e h is to ria ­ dor. O fa c tu a l, o q u e a p e n a s

a n a lis a o fato em si, sem a - m e n o r c o n o ta ç ã o h is tó ric a ,

s e m a m e n o r c o n o ta ç ã o s o ­ c io ló g ic a . N a d a . “N o d ia ta l, p ê -p ê -p ê ...

(disfarça a voz)

A c o n t e c e u i s s o , a q u i l o , a q u ilo o u tro . F u la n o e s ta v a lá. A h , a b lu s a ... E ra u m a - m u lh e r q u e ta v a c o m e la .

U m a b lu s a a ssim , as sa d a , o v e s tid in h o a ssim a s s a d o .” E o f a c t u a l . N ó s t e m o s u m e x e m p lo c lá ss ic o a q u i o B ra ­ sil: H é lio S ilv a (

historiador,

1904-1995).

E o que v isa ao so cial, ao co letivo . T em os ta m b ém ou tro e x e m p lo c lá s s ic o n o B ra sil: N e ls o n W em ec k S o dré (

histo­

riador carioca, 1911-1999).

E ra até um co ro n e l do E x é rc i­ to. F ab u lo so ! E le tem

(o livro)

“ H is tó ria d a Im p re n sa no B ra ­ sil” . U m neg ó cio fabulo so, em q u e e le d á a visão s o c io ló g i­ ca, a b a se d o d e s e n v o lv im e n ­ to , co m o v e io e a s c o n se q u ê n ­ c ia s d a q u ilo ... E n tã o, e sse c o v álid o.

(7)

-Christiano Câmara

tor).

U m hom em daq uele é u m crim in o so . L e v a no d e b o c h e aqu i, leva no d e b oc h e acolá.

Gustavo -

O senhor chegou

a ir ao lixo de alguma casa, de

alguma fam ília que estava se

mudando e pegar alguma rari­

dade que eles deixaram ?

Christiano -

(Dá uma gar­

galhada e chama dona D

ou-vina, que aparece na porta)

D o u v in a an dou fa la n d o a lg u ­ m a c o is a ? É p o rq u e n o P i- r a m b u

(b a irro p r ó x im o à

praia, conhecido p ela s suca­

tas e depósitos de recicláveis),

eu fui atrá s d e uns d isc o s ra ­ ro s q ue tin h a lá. E u ia v e r a p e ç a em si... O fu la n o foi m e m o s tr a r u m a s c o is a s - b e m cu id adinha s. E u digo: “ N ã o é b em isso , n ã o . É c o is a a n tig a ” . “ A h , u m a s c o isa s ve lh as? Jo g u e i lá na a re ia ” . A í cu fui lá n o b u ra ­ co

(rindo).

E as ra rid a d e s q u e eu en co ntre i foi lá.

Gustavo -

Que rarida­

des o senhor encontrou lá?

Christiano

- A h, a ssim d e c o r... E u m e le m b ro b e m ...

{dona D ouvina ajuda: “H ele­

na, H elena

”) 0 “H e le n a , H e ­ l e n a ”

(m ú sic a de A n tô n io

Almeida e Constantino Silva,

cantada p o r “Anjos do Infer­

n o

"

no Carnaval de 1941)...

“ S e u O s c a r”

(com posta p o r

Ataulfo Alves e Wilson Batis­

ta em 1940, cantada p o r Ciro

M onteiro).

É a q u ilo q u e eu falei da conotação social. “ Seu O s c a r” é um sam b a so b re o a b a nd o no que a m u lh e r faz ao m a rid o qu and o o m a rid o n ão q u e r to m a r je ito de g e n te

{rin­

do).

E le q u e r c o n tin u a r na o r­ gia. E ele

(o autor)

in v e rte a coisa. E le diz lá:

(canta)

“ C h e­ g u ei ca n sa d o do tra b a lh o ...” M e n tira ! E ra um m a la n d ro . “ L o g o a viz in ha m e falou: ‘O , se u O scar, está faz en do m eia- h o ra que sua m u lh e r foi e m ­ b o ra e um b ilh e te d e ix o u / O

b ilh e te a ssim d iz ia : ‘N ã o p o s ­ so m a is. Eu q u ero é v iv e r na o rg ia ’” . M en tira . E la n ão p o ­ d ia m a is e ra co m aq uela org ia que ele tinha. P o rq u e havia um e n d e u s a m e n to m u ito g ra n d e da o rg ia , da m a la n d ra g e m . A v is ã o q u e o s c o m p o s ito r e s se m p re d eram e ra a d ic o to m ia e n tre o tra b a lh o e o n ã o -tra b a ­ lh o . O q u e t r a b a lh a v a e r a o tá rio . O q u e n ão tra ba lh av a era m a la n d ro , era sab ich ão .

Gustavo -

Q uais são os

artistas, cantores e cantoras,

de quem o senhor tem m ais

discos? E xiste algum a cole­

ção completa?

"A m ú

si c a é u m r e f l exo d a i n f r a -

e st r u t u r a. El a ref l et e o m o m e n t o em

q u e é f eit a. . . A m ú si ca, a p i n t u r a, a

ar q u i t e t u r a, escu l t u r a, t u d o i sso . "

Christiano

- E ssas estatís­ tica s e u n u n c a le v e i a sério , não .

{sorrindo)

D e m a io r n ú ­ m e ro é e x a ta m e n te o s q u e m a is g rav aram .

(Vira-se para

a filh a Wanda, que está na

sala e lhe p ed e um fa vo r)

Vanessa -

Quantas p eças

tem no acervo?

C hristian o

- D e v e te r u m a s 2 0 m il p e ç a s de c e ra c 10 m il de vin il. E liv ros tem u m a p o rç ã o . A g o ra é o tal n e ­ gócio: isso n ão é nem os p é s do q u e era e ssa casa.

(eleva a

voz)

E p o rq u e q u a n d o c u m c a p a ix on ei (ri), eu tive que pas­ sar n o v e m e se s fora e m e u s irm ãos ap ro v e ita ra m p ra esba- g a ç a r o q u e era d e v elh aria.

E u m n e g ó c io im p re s sio ­ nante! O a n tig o aqui no B ra ­ sil se m p re fo i v isto co m o v e ­ lha ria. O an tig o só é cu ltu ra lá fora, p ra quem tem cultura, pro eu ro p e u . O m e sm o a rq u ite to que faz q u e stã o d e ser fotogra­

fado ao la d o de u m a c a s a c e n ­ te n á ria em P a ris - “ O lh a , q u e b e le z a . B a te aí p ra e u m o s ­ tr a r ! ” - e c h e g a , m o s tra n d o aqu i a rarid a d e. S c cie v ir um a c a s a d a q u e la id a d e a q u i e le m a n d a p ô r abaixo! C o m o v e ­ lh a ria u ltra p a s sa d a ,

(indigna­

do)

C o m o p u se ra m ab aix o a Ig re ja d a S é em 1938. U m a ig re ja q u e v in h a d e s d e 1854, foi ond e p ra tic a m c n te c rio u -se F o rta le z a , ao re d o r de la . T an­ to fize ram q u e

(o então bispo

da diocese de Fortaleza)

D om M anu el

(da Silva Gomes)

c o n ­ se n tiu , p u s e ra m a b a ix o , a le ­ g a n d o q u e tin h a p a re d e ra c h a ­ d a . S e v o c ê s s o u b e s s e m o q u e te m d e ra c h a d u ra n essa c a sa, v o c ê s n ão e s ta v a m e m ­ b a ix o d ela.

Gustavo -

O senhor tocou

nas rachaduras que devem ter

aqui no museu. Como é fe ita

a m anutenção dele?

Christiano

- E co m m u i­ to sacrifício. É p o rq u e ... eu tô q u eren d o d a r u m a v isã o so c io ­ ló gica e v o cês estã o qu eren d o d a r u m a v isã o p rá tic a

(ri um

pouco),

de co m o é isso, com o é aquilo. E n tã o v am os lá.

Gustavo

- É o senhor e a

dona D ouvina que fa zem ?

Christiano

- É, so z in h o . P o rq u e g en te e stra n h a não se r­ ve. N ã o dá c erto , m e sm o p o r­ q u e a p e s s o a n u n c a v a i te r a q u e le c u id a d o . E u n ã o a c re ­ d ito em p e s q u is a d o r d e h o rá ­ rio . O lh e : “ E u tr a b a lh o n o M u se u d a Im a g e m e d o S om ; sã o 4 h o ra s da ta rd e; d a q u i a 2 h o ra s e u vo u te r q u e b a te r o p o n to p o rq u e c h e g o u m in h a h o r a ” . A í e le p e s q u is a até 6 h o ra s da n o ite . E u n ão a c re d i­ to em p e s q u is a d o r d e s s e tipo. P o rq u e ,q u a n d o v o c ê co m e ç a a p e sq u isa r, c o m e ç a a d e s c o b rir u m a s é rie d e c o isa s e as lig a ­ çõ es q u e aq u ilo tem com o u ­ tras c o isas q u e v o cê p re c isa ir atrás. V ocê levanta a cabe ça, é

M a s para conseguir al u gar

o dvd, f oi necessária um a

viage m d e "t o p i c " lot ada

at é a Dist rivídeo, no f in al

d a avenida Ant ônio Sales.

E locar out ro f ilme.

0 l o n ga ero "M u i t o b e m

a c o m p a n h a d a ". T r at ava-

se d e u m a co m é d i a r o ­

m ânt ica com um a at riz de

ser iad o am e r i can o (W i l l &

Gr ace) e o at or De r m o t

Mu l r on e y.

(8)

Christiano Câmara

Da A

n t ôn i o So l e s f oi pre­

ciso ca m i n h a r so b o v i a ­

d ut o d a Vi a Expr essa para

c h e gar na Av. W ash i n gt o n

Soar e s. De lá, out r a v i a ­

ge m at é a cosa da Karlla.

Ch e go n d o em Me sse j an a,

o n d e a a l u n o m o r a , a

e q u ip e de p r od ução assi s­

t iu a o docum ent ár io. De­

p ois, An a Fl ávi a insist iu

e m ver o t al com éd ia ro­

m ânt ico.

32

lh o ra d a m anhã! P esq u isad or com h o rário de e n tra r e d e sair, isso não existe , rapaz! O p e s ­ q u is a d o r é um g e rm e , é u m a pa ix ão da c o isa em si.

Andreh -

E quais os p la ­

nos p a ra que as p róxim as ge­

rações tenham acesso a esse

museu?

Christiano

- N ã o , isso vai s e r d c stru id o . F a ta lm e n tc vai s e r d e s tru íd o . C o m o fo ra m d e s tru íd o s os m u se u s q u e eu h e rd e i p ara fo rm a r e sse m u ­ seu . A m a io ria d e s s a s p e ç a s que eu a d q u iri foi d e v iú v a , q u e a p e n a s c o n s e n tiu q u e o fulan o tiv e sse a q u e la s v e lh a ­ ria s d e n tro d e ca sa. B a sto u e le fe c h a r o s o lh o s , e la , vupt, se desfez .

Andreh -

N ã o e xiste

m aneira de conservar?

Christiano

- C o m o ? O q u e e x is tiria ... A m a n e ira era a S ec u lt

(Secretaria da

Cultura e do D esporto)

d ar u m a a ju d a b o a a q u i. M as não . S e vai d a r u m a aju d a , v ai e x ig ir isso, aq u ilo , aq u ilo o u ­ tr o . “ Q u e m c o m e d o m e u pirão, p ro v a do m e u c in tu rã o ” , n ão é isso?

Ana Flávia -

O sen h o r

p a ssou a colecionar também

coisas referentes ao cinem a

p o r conta da m úsica? Foram

coisas paralelas ou a música

puxou a coleção relacionada

ao cinema?

Christiano

- E , p o rq u e u m a c o is a p u x a a o u tra , n é ? E u v ia , p o r e x e m p lo , m ú s ic a c o m t e r m o s ... (

c a n ta r o la

) “ E u te d a re i tu d o isso e o c é u ta m b é m ” . E u d ig o : “ R a p a z , e u j á o u v i f a l a r n is s o a í ” . N e g ó c io d e um film e a n tig o q u e t i n h a e s s e t í t u l o , “ S e v o c ê fo s s e s in c e r a ...” . “ R a ­ p a z , ‘ S e v o c ê f o s s e s in c e r a ’ é o títu lo d e u m a r e v is ta m u ­ s ic a l d o

(G eorge)

G e rs h w in

(co m positor n o rte-a m erica ­

no, 1898-1937

) ,

d e

(19)22".

E ra a m ú s ic a , e o s m u s ic a is in flu in d o n a m ú s ic a .

Karlla -

E qual o estilo

de film e m ais com um nessa

época?

Christiano

- O s film e s, tal co m o as m ú sic as, to d o s e ram ric o s. N ã o tin h a e s tilo , não . A té no g â n g s te r v o cê d e s c o ­ b ria crític a so cial. O g â n g s te r era ap re se n ta d o co m o filh o le­ g ítim o d a m ãe m isé ria , da m ãe v io lê n c ia , d a m a rg in a liz a ç ã o q u e d esd e cria n ç a o fu la n o era tido. M as h o je não.

Gustavo -

O senhor lem ­

bra de títulos de film e s dessa

época?

"Eu se m p r e f ui u m e st r a n h o no

n i n h o , p o r q u e n u n c a t ive a v i sã o

p r át ica d a v i d a. (...) Na m i n h a

e d u c aç ão m e d e r a m a n o ç ão d e ser,

a o i n v é s d e t er . "

Christiano -

(Pensa um

pouco)

M e le m b ro .”0 In im i­ g o P ú b lic o ”

(film e de William

Wellman, 1931)

é um deles. Eu m e lem bro b e m do ator, P au l B u n n in g . T in h a o u tro . S alv o e n g a n o e ra o G e o r g e H a rt.

(Após a entrevista, Christiano

fe z a correção: fo i estrelado,

na verdade, p o r Jam es Carney

e Jean Harlow).

P o rq u e tem u m a série d e le ... É o c h a m a d o film e n o ir

(film es de suspense

policial

,

com im agem em

pre-to-e-branco),

q u e e le s faziam dem ais. E les pro cu ra v am se m ­ p r e d e n tro d e u m a v id a d e t r a g é d i a d a r u m a c e r t a p c rs p e c tiv a a o fin a l. O q u e e le s p ro c u ra v a m fazer, fo sse qu al o te m a ab o rd ad o , e ra d a r ao final do film e um a p e rsp e c - tiv a de v id a tal c o m o n o s so instinto de c o n serv aç ã o no s dá tod a hora, todo instante. Q u a n ­ d o e le d e ix a de n o s d a r p e rs- p e c tiv a de vida, o q u e a c o n te ­

ce ? N ó s no s suicidam os.

(N)

A p io r v id a , p o r p io r q u e seja, o fu la n o te m se m p re a q u e la e s ­ p e ra n ç a d e v e r u m a lu z ao fim do tún el. O q u e é o s u ic id a ? É o fu la n o q u e p o r um seg u nd o a c h o u que não tin h a m a is j e i ­ to e e le p ró p rio q u e r d a r fim ao so frim e n to dele.

Rcbcca -

Seu Christiano,

eu gostaria de voltar um p o u ­

co à p ergunta anterior, em re­

lação ao apoio fin a n c e iro .

Como o senhor sugeriria que

fo s s e fe ito esse apoio gover­

nam ental aos trabalhos cultu­

rais, sem que esse governo

interferisse na liberdade de

pensam ento?

Christiano

- É d if íc il p o r q u e e le s

(o G o vern o )

ag em p o r in te resse de grup os e eu c ritic o essa m a n e ira de agir. C o m o eles v ão d a r a s ­ s is tê n c ia a u m fu la n o q u e lh e s e s tá c ritic a n d o ? E les só p o d e m d a r a s s i s t ê n c i a a q u e m p u x a o s a c o d e le s ! T o m a lá, dá cá. N e g ó c io im ­ p re ssio n a n te . E u so u in d e p e n ­ d ente. T á errad o ? T á erra do. E eu c ritic o dem ais.

Naara -

Então qual seria

a m aneira ideal de viabiliza­

ção desse financiam ento?

Rcbcca -

Se não houver

esse apoio do Governo, se f i ­

car dependendo de uma p e s ­

soa, vai acabar o que as p e s ­

soas possuem . Então precisa

de uma coisa maior. A inicia­

tiva privada é mais dependen­

te ainda. O Governo é teori­

cam ente o mais isento.

Christiano

- E ra p re c iso q u e o m e n to r d a q u e le a c e rv o n ão tiv e s s e a lín g u a gran de . F o sse c eg o p o litic a m e n te , pra d iz e r am ém com o va ca d e p re ­ sé p io

(se exalta).

Rcbcca

— A i daí perdia a

capacidade de crítica dele?!

(9)

C h rístia n o C â m ara

d o e r ” . F a z u m a c r ít ic a d a n a d a s ó n o s p e q u e n o s . É c o m o u m c h a r g i s ta . H o u v e u m a é p o c a e m q u e o s c h a r g is ta s d e i ta v a m e r o la v a m e m c im a d o s p o d e ­ r o s o s , q u a n d o e le s f a z i a m c o i­ s a e r r a d a . V o c ê j á v iu a l g u m a c h a r g e d o jo r n a l (fo rta le ze n se )

O P o v o , (o c a rio c a ) J o r n a l d o B r a s il J o r n a l O G l o b o (do R io d e J a n e iro

),

o u q u a l q u e r o u ­ tr o , q u e m e ta o p a u n o s p o d e ­ r o s o s ?

(

e le v a a vo z)É n a d a ! É s e m p r e m e t e n d o o p a u e m q u e m j á tá e m b a ix o . D e p o is d o b o i m o r t o é m u i to f á c i l p e g a r n o c h i f r e . E n t ã o , f u la n o n ã o p o d e te r e s s a v is ã o . P o r is s o é q u e o ta l d o c u m e n tá r i o q u e o m e u s o b r i n h o ( M á r c io C â m a ra )f e z c o m ig o c o r r e u o m u n d o e o n d e p a s s a r e c e ­ b e p r é m io (receb eu a té a g o ­ ra 2 6 p r é m io s e m f e s t i v a i s n a c io n a is e in te rn a cio n a is),

p o r c a u s a d a s c r ít ic a s q u e s ã o f e ita s . A g o r a , s ã o f e it a s a s c r ít ic a s , “ E , in te r e s s a n te e tu d o ” (d isfa rç a a v o z). N ã o to m a p r o v i d ê n c i a n e n h u m a ! B o t a u m a c o is a q u e a t é d á p r é ­ m i o e p r o n to .

Ana Flá via -

D a q u i a p o u ­ c o a g e n te v a i e x p lo r a r e ss a q u e s tã o d o d o c u m e n tá rio . N a s u a c a sa a p r e s e n ç a d e o b je ­

to s a n tig o s é o q u e s a lta a o s o l h o s d a g e n t e . P o r o u t r o la d o , o s e n h o r ta m b é m te m c o i s a s m o d e r n a s

,

c o m o d e c o d ific a d o r d e T V p o r a s s i­ n a tu r a e t e le fo n e s e m f i o . . . Q u e ria s a b e r c o m o o s e n h o r c o n c ilia o u so d o m o d e r n o e d a s c o isa s m a is a n tig a s.

Chr

ístiano - É

(B a la n ç a a c a b e ç a , a firm a n d o ). Q u a n d o e le s n ã o in t e r f e r e m n a m i n h a p e s q u is a e u o s a c e ito . E u n ã o p o s s o a c e ita r é c e lu la r , q u e v a i i n t e r f e r ir n a m i n h a p e s q u is a . P o r q u e e le e s tá a li c o m ig o , e u tô p e s q u is a n d o , tr iiii m (im ita o to q u e d e u m te le fo n e

),

b a h , i n t e r r o m p e tu d o p r a a t e n d e r .

E u n ã o f a ç o u m n e g ó c i o d e s ­ s e d e j e i t o n e n h u m . U m c a r r o ir i a c o m e r n a m e s a c o m ig o . E u , p r a t e r c a r r o , e r a p r e c is o t e r d in h e ir o s o b r a n d o p r a te r c a r r o , m o t o r is ta e tu d o . M a s n ã o c o m o e u v e j o a s p e s s o a s a í. S e s a c r if i c a m , f a z e m o d i­ a b o , p e n s a n d o q u e te m o c a r ­ r o . N a r e a l id a d e , o c a r r o é q u e te m a p e s s o a .

Bruno -

E n tã o o s e n h o r te r i a a lg u m a r e s is tê n c i a à s n o v a s te c n o lo g ia s ?

Chrístiano

- D e m a n e i r a n e n h u m a . C o n t a n t o q u e e la s a j u d a s s e m o p e s q u i s a d o r , e n ã o f o s s e m a t r a p a lh a r . V o c ê

r

" E um n egó cio im p re ssio n an t e ! 0

a n t igo aq u i n o Br asil sem p re foi

vist o co m o v e lh a r ia . 0 an t igo só é

cu lt u ra lá f o r a, p ra q u em t em

cu lt u ra, p ro e u ro p e u ."

j á p e n s o u e u m e m e t e r n u m c o m p u t a d o r , d o j e i t o q u e a q u i lo é a p a i x o n a n te ? P e s q u i­ s a r a q u i , a c o l á e ta l. E a o p i ­ n iã o d e u m , e d e o u tr o . D e ­ p o i s c o t e j a r , l o g i c a m e n t e . O n d e é q u e f i c a v a o t e m p o p r a e u i r a t r á s d a s p e s q u i s a s e i r a t r á s d i s s o q u e e u j á e n ­ c o n t r e i ? É p o r is s o q u e e u q u e r o q u e v o c ê s o u ç a m u m p o u q u i n h o d o q u e e u f a z i a . ..

Bruno -

C o m o é q u e o s e ­ n h o r r e a liza s u a s p e s q u is a s ? Q u a l é a m eto d o lo g ia utilizada?

Chrístiano

- N a m e d i d a e m q u e e u o u ç o é q u e e u v e j o o q u e f o i p o s to , o q u e e s tá s e n ­ d o v e n t il a d o , a q u e l e a s s u n to a li e q u a l a v is ã o q u e o p r ó ­ p r io c o m p o s i to r e s tá d a n d o . O p r o b l e m a é o s e g u i n t e : n ó s a p r e n d e m o s d e s d e p e q u e n o s a o u v ir m ú s i c a m e c a n ic a m e n t e e c o n t i n u a - s e o u v in d o m ú s ic a m e c a n ic a m e n t e . M e f a l a v a m m u i to n u m a m ú s ic a q u e ti n h a

u m a m e n s a g e m q u e e r a e x a ­ ta m e n te a s u b s t i t u i ç ã o d e u m i n s t r u m e n t o , s u b s t i t u í a u m i n s t r u m e n t o m u s i c a l p o r u m i n s t r u m e n t o d e m o r t e . E e u p r o c u r a v a e n u n c a c o n s e g u i c a p t a r a n u a n c e d a q u e l a le tr a , e x a t a m e n t e p o r q u e n ã o e n t e n ­ d ia . E r a u m g r u p o , n ã o s e i s e e r a o s I n c r ív e is (u m a d a s m a is p o p u l a r e s b a n d a s d a j o v e m g u a r d a q u e s u r g i u e m 1 9 6 2 a tr a v é s d a c a r r e ir a n o rád io, s e n d o d e s m e m b r a d a n a d é c a ­ d a d e 70), q u e c a n t a v a m .

Ana Flávia -

Q u a l o n o m e d e s s a m ú s ic a ?

Chrístiano

- A í é q u e e s tá , u m d i a m e d e r a m a le tr a d e s ­ s a m ú s ic a . E r a u m n e g ó c i o d r a m á ti c o . E r a u m n e g ó c i o im p r e s s i o n a n te ! A g o r a , e s ta ­ v a b a t e n d o c a b e ç a a f o r m a e o c o n t e ú d o . O c o n t e ú d o q u e ­ r e n d o g r i t a r e d e n u n c i a r , e a f o r m a q u e r e n d o d e b o c h a r . N ã o p o d e ! A f o r m a te m q u e s e c a s a r c o m o c o n t e ú d o . S e a f o r m a é d r a m á ti c a , é n ã o s e i o q u ê , o c o n t e ú d o ta m b é m te m q u e s ê - lo . E r a u m a q u e d iz ia a s s im : “ E r a u m g a r o to / q u e c o m o e u / a m a v a o s B e a t l e s e o s R o l l i n g S t o n e s ” ( c a n t a n ­ d o ). D e p o is b o t a v a , o u t i r a v a d a m ã o d e l e a g u i t a r r a p a r a b o t a r u m i n s tr u m e n to q u e s ó f a z ‘r a t a t a t a t á r a t a t a t a t á ’, m a ­ ta n d o g e n t e . M a s n a m a n e ir a c o m o e r a c a n t a d a ( fa z o m a i­ o r b a r u lh o im ita n d o c o m o era c a n ta d a) , e r a o m a i o r d e b o ­ c h e . D ia b o é is s o , r a p a z , a f o r ­ m a e s tá b a t e n d o c a b e ç a c o m o c o n te ú d o !

Lctícia —

O s e n h o r d is s e q u e p e s q u i s a a g o r a a d é c a d a d e 3 0 e 40, p o r q u e n ã o a s d é c a d a s d e 5 0 e 6 0 ?

Chrístiano

- P o r q u e e la s v o lt a r a m a s o f r e r a s i n f l u ê n ­ c ia s e c o n ó m ic a s d e é p o c a s a n ­ te r io r e s , d a s d é c a d a s d e 2 0 , d e 1 0 , d e (1 8 ) 9 0 . É o q u e e u f a ­ le i d a c a r t e l i z a ç ã o d a e c o n o

-0 p ró xim o p asso do t r a ­ b alh o fo i co n t act o r M árcio Câ m a r a , d ir et o r do d o cu ­ m e n t á r io e so b r in h o d e Ch r ist ian o . Ele fo i m u it o at en cio so com a prod ução .

0 b a t e -p a p o com M árcio a co n t e ce u n u m e st ú d io q u e f ica n o s f u n d o s d a casa d ele, q u e t em u m jar ­ d im lin d o . Q u em n o s r e­ cebeu na casa foi a e sp o ­ sa d e le .

Referências

Documentos relacionados

Nessa situação temos claramente a relação de tecnovívio apresentado por Dubatti (2012) operando, visto que nessa experiência ambos os atores tra- çam um diálogo que não se dá

3 O presente artigo tem como objetivo expor as melhorias nas praticas e ferramentas de recrutamento e seleção, visando explorar o capital intelectual para

Nas primeiras incursões no domínio das artes, as ilustrações do pos- tal mantinham ainda grande afinidade com a temática paisagista, muito do agrado dos álbuns da época. As faces

As etapas que indicam o processo de produção do milho moído são: recebimento da matéria prima pela empresa, transporte manual, armazenamento, elevação mecanizada do produto,

Este trabalho buscou, através de pesquisa de campo, estudar o efeito de diferentes alternativas de adubações de cobertura, quanto ao tipo de adubo e época de

O objetivo do curso foi oportunizar aos participantes, um contato direto com as plantas nativas do Cerrado para identificação de espécies com potencial

Além da implementação de ações governamentais de saúde pública direcionadas para a orientação em higiene bucal desde a infância, bem como a produção de

No sentido de verificar a estabilidade do efeito corona, foram preparadas 2 amostras de tecido engomado de algodão para cada tempo de tratamento corona (1 a 25 min.), sendo que