ncerramos a nossa edição com a reporta-gem sobre a Fortaleza de São João, pre-servando o mesmo modelo que tem pau-tado as edições da revista DaCultura, abordando os fortes e fortalezas espalhados em todo o território nacional. Por se tratar de uma edição em que o enfoque principal é o Patrono do Exército, no ano das comemorações do bicen-tenário do seu nascimento, buscamos e encon-tramos a Fortaleza de São João, de cuja história
o então Ministro da Guerra, Duque de Caxias, também faz parte.
O complexo começou a ser erguido na
épo-ca do desembarque de Estácio de Sá, em 1o de
março de 1565, por ocasião da fundação da Ci-dade do Rio de Janeiro, na várzea entre os mor-ros Cara-de-Cão e Pão de Açúcar. Inicialmente, eram instalações precárias, porém, com o passar do tempo, foi sendo ampliada e reforçada, trans-formando-se a primitiva fortificação num con-junto de obras espalhadas e que veio a ser cha-mado Fortaleza de São João.
A Fortaleza de São João talvez seja a única no país que é verdadeiramente uma fortaleza, pois
E
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Paulo Roberto Rodrigues Teixeira
Adler Homero Fonseca de Castro
72 ANO III / Nº 5 na Engenharia Militar antiga, tratava-se de um
conjunto de baterias, atualmente fortes, mas in-terdependentes. No caso de São João porém, o conjunto é formado por fortes independentes: São José (1578), São Teodósio (1572), São Martinho (1565) e São Tiago (1618), posteriormente refor-çados pelas baterias Mallet e Marques Porto (1902).
A razão dessa complexidade de construção é compreensível. Situada no local da fundação da Cidade do Rio de Janeiro, no Morro Cara-de-Cão, apresentava três frentes de atuação, a Praia de Fora, a Praia do Porto, além da entrada da Baía de Guanabara, o que dificultava sobremaneira a or-ganização da posição defensiva.
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Fotografia do século passado, aparecendo a Praia do Porto, e ao fundo o Forte São Tiago
As Baterias Mallet e Marques Porto foram construídas para
aumentar o poder de fogo da Fortaleza de São João em 1902
As Baterias Mallet e Marques Porto foram construídas para
aumentar o poder de fogo da Fortaleza de São João em 1902
Forte São Martinho (1565), localizado na Praia de Fora
Marco da Bateria Mallet
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Em 1715, o Governo português fez a seguinte recomendação: ... “que as for-talezas de Santa Cruz e São João sejam levadas a última perfeição e estejam sem-pre armadas e guarnecidas”.
Em 1831, por ocasião da Abdica-ção do Imperador D. Pedro I, a Forta-leza foi desativada e desarmada, perma-necendo apenas sete canhões no Forte São José, sem dispor de uma guarnição para operá-los.
Em 1855, foi criada a Escola de Aplicação do Exército que usou as ins-talações da Fortaleza, transferindo para o local a instrução prática, tanto de ma-terial de artilharia como de infantaria. Apesar da Escola ter sido transferida para a Praia Vermelha dois anos depois, a For-taleza continuou a ser uma de suas de-Canhões Whitworth de sítio, na entrada da fortaleza, adquiridos em 1863, para uso pela Escola de Aplicação do Exército, na instrução de tiro
Fortaleza de Santa Cruz
...que as fortalezas de Santa Cruz e São João sejam levadas a última perfeição e estejam sempre armadas e guarnecidas
pendências, com uma pequena guarni-ção, onde prosseguiu a instrução de tiro. Em 1862, após o episódio da Ques-tão Christie, pairava sobre o Imperador D. Pedro II uma grande preocupação pela segurança do Rio de Janeiro, em virtude do fácil acesso, pelo mar, dos estrangei-ros. Criou-se um projeto audacioso para aumentar a capacidade de defesa da Baía de Guanabara. Uma obra de porte, atra-vés da construção de 17 casamatas e que iria proporcionar ao Forte São José o au-mento do seu poder de fogo. Ao encer-rar a construção, os canhões Whitworth se posicionaram para barrar qualquer ten-tativa do invasor. Ficou registrada esta obra em placa alusiva, na entrada do For-te, até hoje, com a marca do Imperador.
Placa alusiva com a marca do Imperador D. Pedro II
Placa alusiva com a marca do Imperador D. Pedro II
Canhão Whitworth em posição
76 ANO III / Nº 5 Em 1875, foi construída uma
nova bateria sobre o Forte São Theo-dósio, preparada para receber o gi-gantesco canhão Armstrong de 11 po-legadas (280 mm), pesando 25 tone-ladas e cujo projetil pesava 550 libras (250kg). Era conhecido como “Vovô”. No mesmo ano, foi também instala-do no local o canhão mais moderno então em uso no Exército, um Krupp 75mm c.26, presenteado pela Casa Krupp ao Imperador. Pelas suas li-nhas esguias, foi apelidado como “Ca-nhão Cachorro” ou “Galgo”.
Em 1902, foram instalados qua-tro canhões Krupp 150mm – L/40, modelo 1895, nas “baterias mascara-das”, pois se destinavam à defesa apro-ximada do porto, ficando camufla-das até os alvos estarem bem pró-ximos. Foram parte do novo e
ambi-Canhão Krupp 75mm c.26, também conhecido pelo apelido de ambi-Canhão Cachorro ou Galgo
Canhão Vovô, na época da instalação
deter qualquer ataque feito por embarcações me-nores. Para guarnecer o novo material tinha sido criado um Batalhão de Artilharia de Posição, o
6o, que foi sendo sucessivamente transformado
no 2o Batalhão de Artilharia de Costa.
cioso plano de fortificação apresentado em 1898. A estas peças foram adicionadas mais um Krupp de 120mm e dois Armstrong de 95mm, tornan-do a fortificação em uma posição-chave no es-quema defensivo da capital, com a função de
Casamata de concreto, onde funcionava o Posto de Observação do Plano Prati de Aguiar (1940),
o último projeto de Defesa do Brasil
Canhão Krupp 150mm L/40,
modelo 1895, usado para a defesa aproximada ficando camuflado até
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Em 1938, o portão da Fortaleza foi tombado pelo Instituto de Patrimônio His-tórico e Artístico Nacional.
Em 1956, transferiram-se dois canhões Krupp de 150mm para a Fortaleza da Laje, deixando o forte equipado com apenas ou-tros dois e mais alguns canhões Vickers-Armstrong de 152,9mm, de artilharia de costa motorizada, até que o grupo foi ex-tinto em 1990, voltando a Fortaleza a ter seu papel de ensino, passando a ser adminis-trada pela Escola de Educação Física, de-pois pelo Centro de Capacitação Física/For-te São João e, atualmenFísica/For-te, pela Diretoria de Pesquisa e Estudo de Pessoal, cujo diretor é o General-de-Brigada Juarez Genial.
Caxias e os fortes
Após a Abdicação do Imperador D. Pedro I, vindo em seguida o período da
Fortaleza da Laje, para onde foram transferidos dois canhões Krupp de 150mm da Fortaleza de São João, em 1956
Portão da Fortaleza, tombado em 1938 pelo IPHAN
Regência, ocorreram mudanças no quadro político do país. Foi criada a Guarda Naci-onal e houve uma expressiva redução do efetivo de militares, para diminuir os gas-tos do governo. O Exército, que tinha um total aproximado de 28 mil homens, ficou reduzido a cerca de quatro mil, sendo im-possível manter uma defesa compatível com o efetivo disponível.
Caxias foi um dos oficiais que par-tilhava de uma corrente favorável à refor-mulação da doutrina militar do Império, na qual constava a desativação dos peque-nos e ineficientes fortes costeiros deixados pelos portugueses.
As antigas fortificações eram vistas como um dreno de recursos por exigir gran-de quantidagran-de gran-de material gran-de gran-defesa, além das guarnições que ficavam imobilizadas numa defesa precária, pois o litoral com mais de oito mil quilômetros de extensão não poderia ser efetivamente protegido pelo pequeno efetivo militar, como também pelo deficiente armamento.
Tal situação só se reverteria em 1855. Naquele ano, o Ministro da Guerra, Mar-quês de Caxias, visando aperfeiçoar o ensi-no militar, fundou ensi-nos terreensi-nos da Forta-leza a Escola de Aplicação do Exército.
Em 1875, agora agraciado com o tí-tulo nobiliárquico de duque, pelos relevan-tes serviços prestados na Guerra da Tríplice Aliança, e também, já promovido a mare-chal, empenhou-se na aquisição de armamen-tos mais modernos para reequipar o Exér-cito. Na Fortaleza de São João, instalou-se uma nova bateria; o Forte de São Theodósio
Entrada do Forte São José
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foi preparado para receber o canhão Armstrong e também um canhão Krupp 75mm c.26, presen-teado ao Imperador pela fábrica Krupp.
A Fortaleza de São João, pelo que represen-tava para a segurança da Cidade do Rio de Janei-ro, na visão estratégica do herói nacional, Du-que de Caxias, não foi esDu-quecida. O ilustre che-fe, ao contrário, empenhou-se – apesar das restri-ções orçamentárias – em manter a Fortaleza em condições de defender a Baía de Guanabara con-tra qualquer ameaça externa.
Paulo Roberto Rodrigues Teixeira Coronel de Infantaria e Estado-Maior, é natural do Rio de Janeiro. Tem o curso de Estado-Maior e da Escola Superior de Guerra. Atualmente é assessor do vice-presidente da FunCEB e redator-chefe da revista DaCultura. Adler Homero Fonseca de Castro, natural da cidade do Rio de Janeiro, é mestre em História. Pesquisador do IPHAN, vem realizando, há vinte anos, pesquisa sobre a história das armas e fortificações.
Atualmente é membro do Conselho de Curadores do Museu Militar Conde de Linhares e do Museu das Armas Ferreira da Cunha.
Com sua imponência e austeridade, o Forte São José é o mais importante do complexo São João pela sua posição estratégica
Professor Adler, do IPHAN, acompanhando o Redator-Chefe