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O LUGAR DO NEGRO NA FORMAÇÃO DE LONDRINA: AULA-OFICINA NO MUSEU HISTÓRICO

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Academic year: 2021

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O LUGAR DO NEGRO NA FORMAÇÃO DE LONDRINA:

AULA-OFICINA NO MUSEU HISTÓRICO

Diego Barbosa Alves de Oliveira – oliveiradiegob@gmail.com Priscila Estevo de Oliveira – Priscila_estevo_oliveira@hotmail.com Universidade Estadual de Londrina Coordenadora: Prof.ª Dr.ª Márcia Elisa Teté Ramos – mtete@uel.br Universidade Estadual de Londrina

Resumo: Convencionou-se nos lugares de memória de Londrina, no norte do Paraná, a manutenção

e afirmação de uma perspectiva oficial da História da cidade. Esta concepção oficial tem preservado a memória dos ditos pioneiros: homens que prosperaram durante a ocupação da região e que são conhecidos por desbravarem as matas, e trazerem o progresso da cidade. Esta perspectiva é problemática porque, além de “silenciar” sobre o papel dos índios, mulheres, negros, nordestinos, sertanejos, e outros, na história, é mantida nas ideias dos alunos do Ensino Médio da cidade. Quando 65 foram questionados, em um instrumento de pesquisa que aplicamos, sobre os papeis dos negros em Londrina no início da construção da cidade, suas noções não foram além das ideias de escravidão, sofrimento e etc. Referenciados por autores como Isabel Barca, Peter Lee, Francisco R. L. Ramos, desenvolvemos uma aula-oficina no Museu Histórico da cidade, onde problematizamos, a partir da exposição de longa duração, e da cultura material, a história oficial e as ideias previas que os alunos mantinham sobre o negro nos anos de desenvolvimento da região. O objetivo, além de relacionar a pesquisa e o ensino, é desenvolver uma história da cultura, e da identidade afro-brasileira, fazendo com que os alunos entendam o negro para além da escravidão.

Palavras-chave: Ensino de História; História de Londrina; Aula-oficina; Museu Histórico de Londrina.

O Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência – PIBID – da Universidade Estadual de Londrina, sob coordenação da Prof.ª Dr.ª Márcia Elisa Teté Ramos, tem como desígnio preparar os estudantes da graduação para a prática docente no ensino de História. A partir da aula-oficina, de Isabel Barca (2004), e a literacia histórica, de Peter Lee (2006), procuramos trabalhar o ensino de história com discentes formadores de sua própria consciência histórica, entendia aqui como uma atividade mental da memória histórica, que a partir das interpretações sobre o passado, possibilita ao aluno entender as atuais conjunturas de vida, e a desenvolver perspectivas de futuro (RÜSEN, 2010, P.112); pois “Sem o ato de pensar sobre o presente vivido, não há meios de construir conhecimento sobre o passado” (RAMOS, 2004, p. 21). Através de um instrumento de pesquisa, aplicado aos alunos do Ensino Médio do Colégio de Aplicação da UEL, nos foi possível entrar em contato com a forma a qual os estudantes têm acesso à história do negro no Brasil, já que nosso objetivo dentro do projeto é trabalhar com vozes silenciadas na História de Londrina, aqui em específico aos negros, utilizando o Dr. Justiniano Clímaco da Silva, popularmente conhecido como Dr. Preto, primeiro médico negro da região, ainda nos anos de ocupação da cidade e que tem sido esquecido na construção historiográfica sobre a formação de Londrina.

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Segundo os alunos, na década de 1930 os negros ainda eram tratados como se fossem inferiores, o que não muda muito nos dias atuais, entretanto, o que chama a atenção no gráfico é que alguns alunos acreditam que esses ainda eram escravas (20%), o que indica uma dificuldade com a temporalidade, mesmo se a entendermos pela cronologia. A escravidão é o conceito que os estudantes ainda associam aos negros, o que significa que provavelmente não se vê a participação ativa dos negros na história. A análise das respostas nos possibilita criar hipóteses sobre como os conteúdos que abordam a história afro-brasileira são levados para a sala de aula, pois os alunos questionados tendem a enquadrar o negro apenas na sua condição de subalternidade. Por isso a relevância de se estudar não só o papel social ou cultural do negro na formação da cidade de Londrina, mas em toda a história, seguindo a lei 10.639, de 2003, que estabelece o ensino de História e cultura afro-brasileira e africana.

Gráfico obtido através de um instrumento de pesquisa de conhecimento prévio aplicado pelo PIBID

A história que os estudantes têm contato marginaliza o negro em suas páginas; os livros didáticos não tratam de sua ação, de seu papel ativo na sociedade. Os alunos precisam ter um contato maior com a História da África e da cultura afro-brasileira, para que compreendam a alteridade, o significado de uma cultura diferente que não deve ser vista como estranha, mas compreendida historicamente. Deve-se dar condições para os estudantes irem além da visão de que em 1930 ainda existiam escravos, pois não conseguem dessa forma ampliar seu horizonte quando se trata desta temática. Isso é um reflexo da maneira que construíram seus conhecimentos históricos.

Maltratado 20% Como escravo 20% Com preconceito 17% Injustamente 12% Como inferiores 11% Como trabalhador braçal 7% Não respondeu 6% Não sabe 7%

Como você acha que os negros eram

tratados na década de 30?

Maltratado Como escravo Com preconceito Injustamente Como inferiores

Como trabalhador braçal Não respondeu

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Gráfico obtido através de um instrumento de pesquisa de conhecimento prévio aplicado pelo PIBID

Quando questionados se conheciam alguma figura negra que teve importância na história da cidade, percebemos que os alunos não souberam citar muitas pessoas. Os que apontaram alguns nomes se referiam a pessoas próximas, como professores, colegas, entre outros. O que não deixa de ser relevante, já que os alunos estão dando significância a sujeitos “comuns”. A resposta relativa ao Zumbi dos Palmares como uma figura de importância pode indicar que foi a primeira pessoa que “passou pela cabeça” do estudante ao ler as palavras “negro”, “importante” e “história”, mesmo não conhecendo ninguém em Londrina, esse discente conseguiu lembrar-se de algum negro que fez parte da História do Brasil. Diante destes resultados, a proposta foi conhecer a história do Dr. Clímaco, popularmente conhecido como o Dr. Preto, para pensar que a definição do negro no Brasil não se restringe a um estereótipo.

O norte do Paraná, em específico a região de Londrina, começa a se desenvolver como cidade com a Companhia de Terras Norte do Paraná (CTNP), que dividia e comercializava as terras; além de fazer uma extensa propaganda sobre a região que era então conhecida como “a terra roxa e sem saúva”, e que chamou a atenção de brasileiros e estrangeiros que almejavam uma vida melhor, vendendo a imagem de uma cidade prospera e que precisava de mão de obra. O crescimento da cidade foi rápido nos anos que sucederam a segunda guerra mundial, “levando a construção das representações de Londrina e do norte do Paraná como terra da promissão e Eldorado, ou seja, como terra do progresso e dos homens e mulheres que para lá se dirigiam como pioneiros” (ARIAS NETO, 1995, p. 70). Com bastante diversidade, Londrina foi ocupada por europeus, negros, nordestinos, japoneses e outros; entretanto, convencionou-se na história oficial da cidade uma narrativa que trabalha com o “pioneiro”, que vem sendo entendido como o homem branco, europeu, e que conseguiu ascender social e financeiramente, ou seja, excluindo negros, mulheres, índios, nordestinos e outros.

A partir das análises que estamos fazendo sobre os questionários de conhecimento prévio dos alunos, podemos identificar que o que eles tomam como a história de Londrina, é a história oficial, provavelmente conhecida através das aulas

Não 66% Sim 12% Não respondeu 8% Zumbi dos palmar es 2% nome de pessoas próximas 12%

Você conhece alguma figura negra de

importância na história de Londrina?

Não Sim

Não respondeu Zumbi dos palmares nome de pessoas próximas

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de história, museu histórico, mídia e outros meios que divulgam a memória da cidade, e talvez, consequentemente, por este motivo eles não tenham uma visão mais ampla sobre os papeis ocupados pelos negros, mulheres, indígenas e outros grupos que tiveram suas vozes silenciadas, e que participaram da ocupação da cidade.

Em Londrina a memória oficial foi construída a partir da exaltação da imagem dos pioneiros. Essa ideia se reflete nas homenagens presentes nos monumentos, comemorações, nomes de logradouros entre outros suportes de memória espalhados pela cidade de Londrina. Esses personagens são tidos como exemplos da bravura e do empreendedorismo, pois são aqueles que chegaram primeiro e desbravaram as terras virgens. (SILVA; MORAES, 2010, p. 321)

Seguindo esta lógica, o Museu Histórico de Londrina Padre Carlos Weiss, com sua exposição de longa duração, constitui uma narrativa que, em suas galerias cria cenários que colaboram para a afirmação da perspectiva do homem pioneiro, do trabalho e progresso, rumo ao sucesso com as plantações de café. Seguindo as leituras de Gilberto Hildebrando (2010) sobre o MHL, a exposição fora composta seguindo um caráter narrativo (HILDEBRANDO, 2010, P. 50), e nesse sentido, para Myrian Sepúlveda dos Santos, em “A escrita do passado em museus históricos”, o

museu-narrativa é aquele cuja narrativa histórica domina a sua lógica aos discursos

dos objetos da cultura material. Nesses museus, há um distanciamento entre presente e passado, e o passado é exposto a partir de uma crítica neutra, ou com cores ideológicas especificas, e em ambos a exposição consegue desenvolver empatia com o público, um sentimento nostálgico, que causa identificação (SANTOS, 2006, P.22).

As exposições museológicas são sempre passíveis de diversas interpretações e críticas, e é importante ressaltarmos que, toda exposição museológica é um ato significativo para os estudos da cultura material, e deve ser pensada de modo que permita que o visitante perceba a problemática proposta pela instituição (RAMOS, 2004, p. 26), e pensada como uma exposição de seu tempo. Segundo Francisco Régis Lopes Ramos, em “A danação do objeto: O museu no ensino de história”, grande parte do público dos museus, na atualidade, é composto por estudantes, e o mesmo ressalta a importância de o museu assumir um caráter educativo, de educar a partir dos objetos, da cultura material, e assim, o museu estaria afirmando a sua preocupação com o mundo.

Para assumir seu caráter educativo, o museu coloca-se, então, como o lugar onde os objetos são expostos para compor um argumento crítico. [...] Antes de tudo, objetiva-se o incremento de uma educação mais profunda, envolvida com a percepção mais crítica sobre o mundo do qual fazemos parte e sobre o qual devemos atuar de modo mais reflexivo. (RAMOS, 2004, p. 20-21).

Fundamentados em autores como Barca, Lee, e Ramos, desenvolvemos uma aula-oficina com os alunos do Colégio de Aplicação, onde propomos uma problematização à exposição a partir de uma questão atual; um problema tanto para as construções de identidades londrinenses quanto para a historiografia produzida sobre a cidade, que parte da ideia da colonização e do pioneirismo – excluindo então as mulheres, os negros, os indígenas, e a população pobre em geral, visto que a ideia de pioneiro engloba o homem branco, forte, desbravador e que faz parte da elite da cidade. Pensando na exposição como uma construção do seu tempo e utilizando dos objetos do acervo do museu, e de figuras/vozes silenciadas pelo

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discurso tradicional, problematizamos junto aos alunos o discurso apresentado através da exposição do MHL, de modo que fosse questionado o pioneiro, e a história oficial da cidade, mostrando que a história possui diversas interpretações, que a forma de “ler” o mundo historicamente é plural e provisória, pois o conhecimento histórico é de natureza multiperspectivada (BARCA, 2001, p. 30). Neste sentido, ao criticarmos junto aos alunos a ausência da presença do negro na exposição de longa duração, pudemos inserir e debater com os alunos a vida do Dr. Preto, um homem que não se enquadrava nos estereótipos que não abrem espaço para pensarmos em um homem negro participando ativamente da vida política, social e cultural de uma cidade no século XX, afirmando assim, uma identidade e cultura negra, que não apenas “contribuiu”, atuou para a construção de uma história para além da escravidão.

Referências:

ABREU, Martha; MATTOS, Hebe. Em torno das “Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana”: uma conversa com historiadores. Estudos Históricos, Rio de Janeiro, vol. 21, nº41, p.5-20, janeiro-junho de 2008.

ARIAS NETO, Miguel. Pioneirismo: Discurso político e identidade regional. História e Ensino, Londrina, V.1, p 69-82, 1995.

BARCA, Isabel. Aula Oficina: do projeto á avaliação. IN: Para uma educação de qualidade: Atas da quarta jornada de Educação Histórica. Braga, Centro de

Investigação em Educação (CIED) / Instituto de educação e Psicologia, Universidade do Minho, p. 131-144, 2004.

BARCA, Isabel. Concepções de adolescentes sobre múltiplas explicações em História. In: BARCA, Isabel (Org.). Perspectivas em Educação Histórica. Actas das Primeiras Jornadas Internacionais de Educação Histórica. Centro de educação e Psicologia, Universidade do Minho, p. 29-43, 2001.

HILDEBRANDO, Gilberto. O museu e a escola: memórias e histórias em uma cidade de formação recente – Londrina/PR. Dissertação (Mestrado em História Social) – Universidade Estadual de Londrina.

LEE, Peter. Em direção a um conceito de literacia histórica. Educar, Curitiba, Especial, p. 131-150, 2006. Editora UFPR.

RAMOS, Francisco Régis Lopes. A danação do objeto: o museu no ensino de história. Chapecó: Argos, 2004.

RÜSEN, Jörn. O livro didático ideal. IN: Jörn Rüsen e o ensino de história. Org: SCHMIDT, M. A.; BARCA, I. ; REZENDE, E. M. Curitiba: Editora UFPR, 2010. Pg. 109-127

SANTOS, Myrian Sepúlveda. A escrita do passado em museus históricos. Rio de Janeiro: Garamond, Minc, IPHAN, Demu, 2006.

SILVA, M. N; PANTA, M. O doutor preto Justiniano Clímaco da Silva: A presença negra pioneira em Londrina. Londrina: UEL, 2010.

SILVA, Maria Nilza. O negro em Londrina: da presença pioneira negada à fragilidade das ações afirmativas na UEL. Revista Espaço Acadêmico, nº 82, p. 1-10, março de 2008.

Referências

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