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IV Encontro Nacional da Anppas 4,5 e 6 de junho de 2008 Brasília - DF Brasil

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IV Encontro Nacional da Anppas

4,5 e 6 de junho de 2008

Brasília - DF – Brasil

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Interações entre a Cidade e Paisagem ao longo da Sub-Bacia do

Barbado, Cuiabá – MT.

M.Sc. Yara da Silva Nogueira Galdino Arquiteta e Urbanista, mestre em Ecologia e Conservação da Biodiversidade pela Universidade Federal de Mato Grosso. Professora do Departamento de Arquitetura e Urbanismo da Universidade do Estado de Mato Grosso. yayanog@hotmail.com.br M.Sc. Liza Maria Souza de Andrade Arquiteta e Urbanista, mestre em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade de Brasília. Pesquisadora do Grupo de Pesquisa “A Sustentabilidade na Arquitetura e no Urbanismo”. Professora do Curso de Especialização Lato Sensu – REABILITA: Reabilitação Ambiental Sustentável Arquitetônica e Urbanística, FAU/UnB; e do centro Universitário UNIEURO. lizaandrade@uol.com.br

Resumo

As ocupações humanas desenvolveram com água uma relação de dependência, envolvendo variados aspectos, como: abastecimento, saneamento, controle de território, oferta de alimentos, possibilidade de circulação de pessoas e bens, energia hidráulica e lazer. Com o crescimento das cidades, essa relação foi se tornando cada vez mais conflituosa, e problemas como poluição dos cursos d água, falta de água potável, enchentes urbanas e conflitos espaciais começam a surgir e se agravar. Cuiabá, como muitas outras cidades brasileiras, fundamentou seu crescimento a partir de processos de desmatamento de matas ciliares para implantação de vias e edificações, impermeabilização do solo, lançamento de efluentes sanitários sem tratamento nos cursos d'água, implantação de obras de drenagem urbana tradicionais e canalização de seus córregos. Dessa forma, o ciclo da água foi alterado e paralelamente a paisagem urbana foi se modificando. Dentre os 17 córregos presentes no perímetro urbano da cidade, apenas 4 não apresentam nenhuma obra de drenagem urbana ou intervenção física em seu curso. Os demais possuem canalizações abertas ou fechadas em variados trechos, todos situados em áreas de ocupação urbana consolidada, de grande densidade demográfica e impermeabilização intensa do solo. O presente trabalho avalia a interação entre o Córrego do Barbado, sua APP e a cidade, levantando as ocupações formais e informais ao longo de seu curso, e a condição de interferência física em seu leito natural.

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1. Introdução

Alterações ambientais tais como retirada da cobertura vegetal e impermeabilização de grande parte da cobertura do solo são intrínsecas ao estabelecimento das áreas urbanas (PELLEGRINO et al,2006). Neste processo os rios e córregos urbanos comumente passam por sucessivas obras de engenharia hidráulica, como retificações e canalizações, que alteram sua fisionomia e os transformam em um sistema de drenagem subterrânea, ou seja, alteram o ciclo natural da água.

Tratar os corpos d' água como receptáculo de esgoto doméstico é uma atitude observada em várias cidades brasileiras. Segundo relatório elaborado pelo Ministério das Cidades (2003), os sistemas de drenagem urbana em loteamentos novos são muitas vezes implantados quando se implementa a pavimentação de vias, antecedendo, os sistemas de esgotamento sanitário. Quando a área urbana ainda apresenta pequena densidade populacional, são geralmente utilizadas as fossas sépticas para disposição do esgoto, à medida que a área se adensa e não se promove a implantação de um sistema de esgotamento sanitário, a saída do esgoto das propriedades é muitas vezes ligada à rede de esgotamento pluvial, sem tratamento prévio algum. Esse esgoto escoado converge para os cursos d’água urbanos e daí para o sistema fluvial a jusante, gerando impactos na qualidade da água.

Em Cuiabá este quadro ilustrado pelo Ministério das Cidades é observado tanto em loteamentos irregulares, quanto regulares. O lançamento de esgoto sem tratamento em corpos d’água, é um dos grandes problemas vivenciados pelos corpos hídricos da cidade.

Deste modo a paisagem urbana vem sofrendo, grandes alterações ambientais, que afetam tanto a qualidade e a integridade do ambiente como a vida de seus habitantes. Assim não há mais como pensar a qualidade de vida sem pensar no equilíbrio ambiental de nossas cidades.

A Constituição Federal Brasileira (1988) estabelece que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. Mas como alcançar ou até mesmo medir este equilíbrio ambiental? O Código Florestal (1965) estabeleceu algumas diretrizes na busca de um ambiente mais equilibrado. Neste código surge o conceito de Área de Preservação Permanente (APP), como área essencial á conservação de sistemas frágeis (cursos d’água, nascentes, alagados, lagoas e encostas), localizados em área urbanas e rurais.

As contradições em relação ao tratamento das APPs urbanas se intensificam com a promulgação da Lei de Parcelamento do Solo Urbano (Lei 6.766/1979), que estipula que sejam deixados 15m de faixa non aedificandi as margens de cursos d’ água urbanos, contradizendo o Código Florestal que prevê uma faixa mínima de 30m.

Com a pressão que se estabeleceu entre a cidade e essas áreas ditas “preservadas”, é promulgada a Resolução CONAMA N.369 (2006) onde são apresentadas as seguintes

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possibilidades de uso das APPs: utilidade pública, interesse social ou baixo impacto ambiental. No centro das discussões ambientais e sociais das cidades brasileiras estão, portanto as APPS, estas que podem ser tanto a solução como o entrave para conciliação entre os diferentes pontos de vista sobre a cidade.

Para Bordest (2003) a ocupação de bacias hidrográficas, em zonas urbanas, tem gerado situações ambientais críticas, que deterioram a qualidade de vida de seus habitantes e exigem soluções cada vez mais complexas e onerosas para a sociedade. Segundo Metzger (2001) para compatibilizar o uso de determinado território e a sustentabilidade ambiental, social e econômica é necessário planejar a ocupação e a conservação da paisagem como um todo.

Esta pesquisa parte do princípio que a manutenção de Áreas de Preservação Permanente e dos serviços ecológicos que nelas se estabelecem, pode trazer vitalidade e sustentabilidade aos fragmentos verdes presentes na matriz urbana. Desta forma, pretende-se fazer uma leitura do diálogo que pretende-se estabelece entre a cidade e a paisagem natural, diagnosticando as características da ocupação urbana na sub-bacia do Barbado.

2. Área de Estudo

O crescimento de Cuiabá veio acompanhado de processos de desmatamento das matas ciliares para implantação de vias e edificações, impermeabilização do solo, lançamento de efluentes sanitários sem tratamento nos cursos d' água e implantação de obras de drenagem urbana convencionais (canalizações e retificações). Processos estes que, segundo PELLEGRINO et a (2006), desencadeiam problemas, como aumento da velocidade de escoamento das águas para seu curso principal, contribuindo com a poluição difusa das águas e agravamento das inundações.

Dentre os 17 córregos presentes no perímetro urbano apenas 4 não apresentam nenhuma obra de drenagem urbana ou intervenção física em seu curso. Os demais possuem canalizações abertas ou fechadas em variados trechos, sendo que os mais modificados são os córregos Prainha, Mané Pinto, Engole Cobra, Barbado e Gambá, todos situados em áreas de ocupação urbana consolidada, de grande densidade demográfica e impermeabilização intensa do solo.

A sub-bacia do córrego do Barbado vem passando por rápida transformação, principalmente devido à ocupação desordenada do solo, resultante da inoperância local das leis ambientais e de parcelamento do solo urbano e ao modelo econômico imediatista que regula o mundo atual (BORDEST, 2003).

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O Córrego do Barbado, tributário do Rio Cuiabá, possui 9.400 metros de extensão (BORDEST, 2003), e tem sua sub-bacia totalmente inserida no perímetro urbano (Figura 1).

Centro Político Administrativo

UFMT

Figura 1: Bacia do Córrego do Barbado e bairros: 1) Centro Político Administrativo; 2) Morada do Ouro; 3) Jd. Aclimação; 4)Terra Nova; 5) Bela Vista; 6) Dom Bosco; 7) Canjica; 8) Campo Verde; 9) Bosque da Saúde; 10) Jd. Itália; 11) Pedregal; 12) Jd. Leblon; 13) Universidade Federal de Mato Grosso – UFMT; 14) Jd. Das Américas; 15) Pico do Amor; 16) Jd. Tropical; 17) Jd. Petrópolis, 18) Grande Terceiro; 19) Jd. Califórnia; 20) Praeiro; 21) Praeirinho. Fonte: IPDU – Instituto de Planejamento e Desenvolvimento Urbano, Prefeitura Municipal de Cuiabá.

A ocupação da sub-bacia do Barbado ocorreu principalmente a partir da construção do Centro Político Administrativo (CPA), na porção nordeste da cidade, na região das cabeceiras do córrego em 1970; e a instalação da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) na porção sudeste da cidade, na área central da sub-bacia, em 1972 (BORDEST, 2003).

A construção desses dois pólos de expansão urbana e a chegada das frentes pioneiras vindas das mais variadas regiões do Brasil impulsionou a urbanização da sub-bacia do Barbado. A abertura de loteamentos regulares afastados do centro e próximos ao CPA e UFMT é seguida pelo surgimento de loteamentos irregulares ao longo dos vazios urbanos deixados entre a região central e essas novas ocupações.

Na bacia do Córrego do Barbado vivem 51.320 pessoas distribuídas em 22 bairros, onde 11 bairros são regulares e 11 são oriundos de invasões (IPDU, 2002).

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O córrego do Barbado originalmente era alimentado por várias pequenas nascentes. Atualmente sobrevivem 3 nascentes localizadas: na Reserva Ecológica Massairo Okamura, nas proximidades do Centro Político Administrativo e no bairro Canjica. Estes afloramentos naturais drenam pela sub-bacia nas áreas de baixada, ao longo de locais densamente urbanizados e povoados.

A mata ciliar ao longo do córrego do Barbado se encontra com diferentes níveis de intervenção. Em alguns trechos a mata ciliar foi completamente retirada para implantação de vias, e em outros a vegetação natural convive com habitações sub-normais1. A retirada da vegetação da APP do Barbado trouxe para a área problemas ambientais como: erosões, assoreamento, redução da infiltração e aumento do escoamento superficial, poluição do córrego através da poluição difusa e carreamento de sedimentos e resíduos sólidos pelas enxurradas.

3. Metodologia

Entre outubro de 2007 e fevereiro de 2008 foram realizadas visitas de campo no Parque Massairo Okamura, na Universidade Federal de Mato Grosso e nos seguintes bairros pertencentes à sub-bacia do Barbado: Renascer, Pedregal, Praerinho, Dom Bosco, Canjica, Bosque da Saúde e Jardim das Américas. Mapas oficiais e reportagens a respeito da área de estudo foram coletados no Instituto de Planejamento e Desenvolvimento Urbano da Prefeitura Municipal de Cuiabá.

A análise dos dados da Sub–bacia do Córrego do Barbado está relatada, seguindo a classificação proposta por Bordest (2003): cabeceira do barbado, alto curso, médio curso, baixo

curso e foz do Barbado.

4. Referencial teórico

A discussão que há muito tempo persegue o planejamento urbano sobre a definição de unidades de referência para análise e intervenção em cidades, atualmente, recai sobre a bacia hidrográfica (FERREIRA et al, 2006). Em estudos sobre planejamento urbano e ecologia urbana adotar a bacia hidrográfica como unidade de referência possibilita reconhecer a presença de marcos da natureza sobreviventes na cidade – córregos, rios, nascentes, matas ciliares, áreas alagáveis, brejos – permitindo deste modo, a leitura dos diálogos e conflitos entre o meio ambiente natural e o construído.

Segundo Schlee et al (2006) o tratamento da paisagem em contextos urbanos, a partir da bacia hidrográfica é interessante, pois nesta abordagem o espaço é delimitado pela topografia, a qual define a área de convergência de fluxos d’ água, de sedimentos e de elementos solúveis que

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convergem para uma saída comum. Enquanto para Costa (2006) olhar para as relações entre as cidades e os rios a partir de sua bacia nos permite expandir e entrelaçar suas dimensões culturais e ambientais.

Os cursos d’ água e as unidades de paisagem associadas aos mesmos (nascentes, matas ciliares, áreas alagáveis, várzeas, etc) são de fundamental importância para as cidades. Essa relação de intimidade entre os rios e as cidades brasileiras fez com que, segundo Costa (2006) as paisagens fluviais fossem paulatinamente se transformando em paisagens urbanas.

O estabelecimento das cidades trouxe consigo alterações que influenciaram diretamente o ciclo hidrológico. Segundo Andrade (2005) a urbanização modifica o ciclo hidrológico através da: impermeabilização do solo (aumentando o escoamento superficial e redução da infiltração); poluição e assoreamento dos rios (causados pelo carreamento de detritos lançados nas ruas pelo sistema de drenagem tradicional); e diminuição do tempo de concentração da água, com graves reflexos nos cursos de drenagem natural.

A problemática da água se faz evidente na cidade, não só com relação ao abastecimento, ao saneamento e à qualidade da água, mas também com destaque às enchentes urbanas, uma vez que as planícies naturais de inundação dos rios são hoje áreas que se encontram sob forte ocupação (AMANTE, et al , 2006).

Segundo o Tucci (2002) as obras de drenagem tradicional aceleram a retirada da água das planícies de inundação através da canalização dos trechos críticos. Esse tipo de solução focaliza um trecho da bacia, sem levar em conta às conseqüências das intervenções para o restante da mesma. A canalização dos pontos críticos acaba apenas transferindo a inundação de um lugar para outro na bacia.

Nas cidades contemporâneas, uma das principais funções desempenhada pelos rios e córregos é a de coletor de lixo e esgoto doméstico e industrial. Para Britto & Silva (2006) as obras tradicionais de drenagem, além de mudar a fisionomia e retirar a visibilidade dos rios e córregos fez com que eles se transformassem em um sistema de drenagem subterrânea, cuja função inicial seria evitar enchentes e facilitar a ocupação urbana de um determinado território sujeito a inundação, enquanto a função subseqüente seria servir como receptáculo de efluentes. Segundo os mesmos autores as obras de saneamento urbano, ao longo de várias décadas, priorizaram a construção de sistemas de coleta de esgoto e relegaram a segundo plano a questão do tratamento destas águas servidas.

A poluição dos rios e córregos e a degradação ambiental de unidades de paisagem associadas aos ambientes aquáticos, fizeram com que as áreas ribeirinhas fossem consideradas espaços desvalorizados, desprezados pelos processos formais de urbanização, transformando-se em paisagem residual, sujeita a ocupações irregulares (BRITTO & SILVA, 2006).

Estas áreas situadas em regiões desvalorizadas e rejeitadas pelo mercado imobiliário privado e pelas políticas públicas são, então, ocupadas pela população excluída do mercado formal: beiras de córregos, encosta de morros, terrenos sujeitos as enchentes ou outro tipo de

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risco, regiões poluídas ou áreas de proteção ambiental, onde a vigência da legislação de proteção e a ausência de fiscalização definem a desvalorização (MARICATO, 2001).

Trabalhos em planejamento urbano sustentável reconhecem que os ambientes aquáticos e as áreas de preservação permanente, desempenham papéis fundamentais para a qualidade do ambiente urbano, por isso buscam formas de conservar e garantir a sustentabilidade destes territórios.

Segundo Pellegrino et al (2006) as funções ambientais que os fragmentos verdes desempenham no tecido urbano são: 1) proteção e controle da densidade das áreas edificadas, contribuindo para o conforto ambiental e a saúde pública; 2) contribuição com a qualidade das águas urbanas, através da conformação de um sistema de drenagem que propicie uma maior retenção, filtragem e sedimentação dos resíduos difusos que seriam lançados diretamente nos canais principais; 3) conexão entre fragmentos de vegetação – corredores ecológicos entre os fragmentos verdes urbanos; 4) proteção da diversidade de espécies; 5) fluidez da drenagem hídrica, através da permeabilidade do solo; 6) conservação dos espaços rurais de produção; 7) recreação lazer e educação ambiental.

5. Desenvolvimento

A sub-bacia do Barbado possui toda sua área inserida no perímetro urbano, e apresenta diferentes níveis de intervenção e degradação ao longo do curso do córrego do Barbado. Para desenvolvimento do trabalho será usada a abordagem proposta por Bordest (2003), que dividiu a bacia em cinco trechos: cabeceira do barbado, alto curso, médio curso, baixo curso e foz do

Barbado .

A região da cabeceira do barbado apresenta um terreno acidentado, com as altitudes mais elevadas da bacia (225m). Originalmente a sub-bacia era alimentada por várias pequenas nascentes, mas atualmente muitas delas estão extintas. Três nascentes permanecem em atividade, estando localizadas no parque Massairo Okamura, no bairro Canjica e próximo ao Centro Político Administrativo. Segundo Bordest (2003) a retirada da vegetação e a impermeabilizarão do solo, contribuíram com a degradação da bacia e diminuição da infiltração da água da chuva no subsolo, com a conseqüente diminuição de afloramento de olhos d’água.

O alto curso possui cotas entre 200 e 175m de altitude, e compreende os bairros: Morada do Ouro, Terra Nova, Jardim Aclimação, Bela Vista, Canjica, Bosque da Saúde, Dom Bosco e parte do Pedregal.

O médio curso possui cotas variando de 175 a 160m de altitude. Neste trecho estão localizados: o campus da UFMT, os bairros Jardim das Américas, Jardim Itália (com Condomínio Alphaville ocupando parte do bairro), Jardim Leblon, parte do Pedregal, Renascer e 21 de Abril (os dois últimos ainda não regularizados, inseridos dentro da área do Jardim Itália).

O baixo curso está localizado entre a Avenida Fernando Correa da Costa a 160m de altitude e a Avenida Beira Rio a 150 m de altitude. Deste trecho fazem parte os bairros Jardim

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Petrópolis, Pico do Amor, Jardim Tropical, Grande Terceiro, Jardim Califórnia, Jardim Shangrilá, Campo Velho e Jardim Europa. No baixo curso o Córrego do Barbado encontra-se canalizado e a sua APP encontra-se ocupada por vias nas duas margens (Figura 2a).

Segundo Bordest (2003), a baixa declividade e a decaptação de pequenos afluentes geram no baixo curso, inundações nos meses de chuva, quando o lençol freático aflora e as águas pluviais não encontram vazão. Estes fenômenos se intensificaram a partir da intensa ocupação a que a área foi submetida. Este é o trecho da sub-bacia que sofreu mais intervenções e que vivencia mais fortemente os problemas decorrentes da retirada da vegetação e impermeabilização da APP.

A foz do Barbado localizada entre a Avenida Beira Rio e o rio Cuiabá não foi canalizada e apresenta alguns trechos com vegetação ciliar e várzeas. Segundo Bordest (2003) este trecho se configura como uma planície inundável, de aspecto brejoso durante todos os meses do ano, portanto uma grande área de preservação permanente. Este trecho possui um bairro residencial de origem informal – o Praeirinho, ocupando APP do Barbado e do Rio Cuiabá (Figura 2b).

a b R io C uia bá AP P d o R io C uia bá Praeirinho

Figura 2: a) Trecho canalizado do córrego do Barbado. b) Bairro Praerinho situado entre a APP do Barbado e do rio Cuiabá. Fonte: adaptado de Google Earth.

5.1. Ocupação e Expansão Urbana ao longo da Bacia do Barbado

A expansão urbana sobre a sub-bacia do Barbado ocorreu em função da construção do Centro Político Administrativo e da Universidade Federal de Mato Grosso. A ocupação da parte mais alta da bacia (cabeceiras e alto curso) se deu a partir da construção do CPA, que trouxe valorização para a região nordeste da cidade. O segundo eixo de expansão ocorreu em função do estabelecimento da UFMT no médio curso do córrego na porção sudeste da cidade, seguida da construção da Avenida Fernando Correa da Costa que liga a área central a região sul.

Como esses dois pólos de expansão são localizados em regiões afastadas da área central, foram deixadas ao longo do perímetro urbano, grandes manchas de vazios urbanos, onde

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inicialmente foram abertos loteamentos residenciais de classe média e média alta e posteriormente algumas áreas foram invadidas para uso residencial de famílias de baixa renda. O padrão de ocupação urbana na bacia do Barbado é portanto, caracterizado pela co-existência de bairros para pessoas de alto poder aquisitivo e assentamentos irregulares ocupados por população de baixa renda.

No processo de ocupação da sub-bacia do Barbado as manchas desocupadas foram “naturalmente” invadidas pela população de baixa renda, que impossibilitada de entrar no mercado formal de moradia ocupou os vazios urbanos de cunho especulativo e as áreas protegidas ao longo da sub-bacia.

Dos bairros presentes na sub-bacia do Barbado, muitos tiveram sua origem em ocupações irregulares. Os bairros Bela Vista, São Roque, Dom Bosco, Carumbé, Canjica, Campo Verde, Pedregal, Jardim Leblon, Campo Velho, Jardim Paulista, Grande Terceiro, Praeiro e Praeirinho surgiram a partir da invasão de vazios urbanos e APPs ao longo da sub-bacia do Barbado (Tabela 1). O bairro regular Jardim Itália, teve parte de seu território invadido para a implantação dos Loteamentos Renascer e 21 de Abril (Figura 3).

Pedregal Renascere 21 de Abril Alphaville Campo Verde Jardim das Américas

Figura 3: Área invadida para implantação do loteamento Renascer e 21 de Abril. Fonte: Adaptado de Google Earth.

As ocupações irregulares das APPs de nascentes, do córrego e de várzeas, ocorreram sem que houvesse cumprimento as legislações ambientais e urbanísticas. Para Maricato (2001) na maioria das cidades brasileiras, padrões urbanistas modernistas registrados em leis de zoneamento, códigos de obras e leis de parcelamento do solo, convivem com a gigantesca cidade ilegal em que a contravenção é regra.

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Tabela 1: Sub-bacia do Córrego do Barbado: bairros, características ambientais, posição geográfica na sub-bacia, estimativa da população e domicílios.

BAIRRO ORIGEM CARACT. AMBIENTAIS POSIÇÃO GEOGRÁFICA NA SUB-BACIA (BORDEST, 2003)

POPULAÇÃO DOMICÍLIOS PESSOAS /DOMICÍLIO Centro político Administrativo Planejamento formal – pólo de expansão Nascente do Córrego do Barbado Cabeceira do Barbado 445 153 2,90 Morada do Ouro Planejamento formal Parque Massairo Okamura Alto curso 3.913 1.323 2,96 Jd. Aclimação Planejamento formal Alto curso 1.492 511 2,92

Terra Nova Planejamento formal

Alto curso 2.779 1.260 2,21

Bela Vista Proveniente de invasão Nascente do Córrego do Barbado – Parque Massairo Okamura Alto curso 3.831 1.059 3,62

Dom Bosco Planejamento formal com área invadida

APP ocupada por habitações sub-normais Alto curso 2.035 594 3,43 Canjica Proveniente de invasão Nascente do Córrego do Barbado Alto curso 2.858 864 3,31

Campo Verde Proveniente de invasão

Alto curso 1.878 532 3,53

Bosque da Saúde

Planejamento formal com área invadida

Alto curso 3.030 1.082 2,80

Jd. Itália Planejamento formal com área invadida: Bairros Renascer e 21 de Abril APP parcialmente conservada (entre as invasões Renascer e Pedregal) Médio curso 2.103 889 2,37 Alphaville Planejamento formal

Médio curso As casas ainda se encontram em construção – não há moradores Pedregal Proveniente de invasão

Alto curso / Médio curso 7.087 1.912 3,71 Jd. Leblon Proveniente de invasão Médio curso 1.689 492 3,44 UFMT Planejamento formal – pólo de expansão Médio curso 52 22 2,36 Jd. Das Américas Planejamento formal APP parcialmente conservada, presença de várzeas. Médio curso 2.960 951 3,11

Pico do Amor (origem deconhecida)

Baixo curso 2.086 821 2,54

Jd. Tropical Planejamento formal Baixo curso 1.686 586 2,88

Jd. Petrópolis Planejamento formal Baixo curso 1.433 535 2,68

Grande Terceiro Proveniente de invasão Baixo curso 4.876 1.512 3,22 Jd. Califórnia Planejamento formal Baixo curso 1.466 395 3,71 Praeiro Proveniente de invasão Baixo curso 1.517 409 3,71 Praeirinho Proveniente de invasão Foz do Barbado 2.103 513 4,10

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Os contrastes sociais estão presentes ao longo de toda a sub-bacia, que acomoda habitações de alto padrão, condomínios fechados como o Alphaville e dois shopping centers, em bairros com infra-estrutura de água, energia, linha de ônibus, pavimentação asfáltica, assim como bairros informais sem pavimentação e onde o abastecimento de água e energia é precário. Um espaço, portanto heterogêneo e marcado por fortes contradições sociais. O que segundo Victorino (2004) se configura como o perfil característico do espaço urbano brasileiro.

5.2. Ocupação de várzeas e áreas alagáveis

As irregularidades quanto à forma de ocupação da bacia se iniciaram com os loteamentos regulares, como o Jardim das Américas, localizado no médio curso do córrego do Barbado próximo a UFMT. Segundo Bordest (2003) na implantação do loteamento durante a década de 1980, o leito do córrego foi desviado e retificado, e uma área alagável foi aterrada para ampliação da área a ser comercializada pelos empreendedores (Figura 3a).

A segunda etapa do bairro Jardim das Américas foi construída sobre uma várzea localizada entre dois braços do córrego do Barbado. Da área aterrada sobreviveram dois pequenos trechos brejosos, um deles cortado pela Av. Arquimedes Pereira Lima entre o Renascer e o 21 de Abril e o outro margeando o córrego ao lado do Jardim das Américas (Figura 2b). a Jardim das Américas Jardim das Américas Segunda Etapa -área aterrada Campus da UFMT Zoológico da UFMT Renascer b Jardim das Américas Primeira etapa Jardim das Américas Segunda etapa Campus da UFMT Zoológico da UFMT Renascer

Figura 3: a) Área alagável aterrada para ampliação do loteamento Jardim das Américas. b) várzeas remanescentes localizadas no médio curso do córrego do barbado. Fonte: Adaptado de Google Earth.

As várzeas são espaços protegidos pelo Código Florestal Brasileiro (1965), pela Lei 6.766 (1979) e pela Resolução CONAMA 303 (2002). Estas unidades de paisagem se constituem como zonas de transição entre as regiões mais altas e mais baixas das bacias hidrográficas, funcionando como verdadeiros filtros de poluição difusa, retendo e transformando sedimentos, absorvendo nutrientes e purificando a água (DUNNETT, N. & CLAYDEN, A. 2007). A preservação dessas unidades de paisagem contribui com a redução das inundações à jusante, pois esses

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ambientes funcionam como bacia de retenção e de infiltração, reduzindo as vazões e os volumes das cheias.

5.3. Invasões urbanas: o caso do Renascer e 21 de Abril

O loteamento Renascer localizado no médio curso da sub-bacia do Barbado na Avenida Archimedes Pereira Lima, entre os bairros Pedregal, Jardim Itália, abriga atualmente 1.400 pessoas, em um terreno com 52 hectares. A ocupação do terreno ocorreu em 1997 quando cerca de 300 famílias invadiram a área de propriedade privada. Em 1998 uma área adjacente ao Renascer é ocupada por novas famílias que fundam o bairro 21 de Abril.

Como o bairro Renascer tinha parte de sua área inserida dentro da APP do Barbado, projetos de loteamento e regularização do bairro foram negados pela Prefeitura e Ministério Público. Em 2006 ocorreu a retirada de 54 famílias que viviam na APP do Barbado. As famílias foram transferidas para habitações de interesse social, com 30m² em um loteamento popular localizado no bairro Sucuri, em outra sub-bacia. As casas situadas na APP foram demolidas, mas a área não foi requalificada (Figura 4). A saída desses moradores ocorreu de forma consensual, principalmente por que a desocupação da APP facilitaria a negociação da regularização do loteamento.

Na sub-bacia do Barbado a ocupação da APP e de suas áreas adjacentes, por loteamentos irregulares, vêm trazendo grande impacto ambiental para o córrego, uma vez que essas ocupações não possuem infra-estrutura de água, esgoto, coleta de lixo, etc.

Figura 4: Famílias sendo retiradas da APP do Bairro informal Renascer. Fonte: Jornal Folha do Estado (29/01/2006)

5.4. Vazios Urbanos e a pressão sobre as áreas protegidas

A implantação do Centro político Administrativo, Parque Massairo Okamura e Shopping Pantanal trouxeram valorização às regiões das cabeceiras e alto curso do Barbado. Em virtude

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desta valorização, vazios urbanos de cunho especulativo são mantidos em vários pontos neste trecho da sub-bacia.

Em visita de campo foi verificado que o bairro Dom Bosco possui a maioria de seus lotes formais, desocupados, enquanto as margens do córrego do Barbado estão ocupadas por edificações sub-normais (Figura 5). Como estas edificações só possuem infra-estrutura para abastecimento de água e energia, não são passíveis de regularização fundiária sustentável (Resolução CONAMA 369/2006). Portanto a população que vive neste trecho da APP deveria ser remanejada para uma outra área. Para que a remoção da população fosse feita sem desvinculá-los da área em que já estão vivendo, poderiam ser construídas edificações de interesse social verticais de alta densidade em terrenos destinados a equipamentos públicos (praças, escolas, igrejas, etc) no próprio bairro Dom Bosco.

Apesar de o Plano Diretor prever o estabelecimento de uma Política Municipal de Habitação que priorize o adensamento populacional em áreas já atendidas por rede de água e esgoto, a maioria das habitações de interesse social construídas pelo Governo do Estado do Mato Grosso, estão localizadas em áreas de expansão urbana, distantes da infra-estrutura de água, esgoto, energia, asfalto, educação e saúde. Deste modo, enquanto a cidade se expande a partir de políticas públicas insustentáveis, vazios urbanos são mantidos em áreas consolidadas da cidade. Dom Bosco Canjica Bosque da Saúde Terra Nova Vazios urbanos Vazios urbanos Shopping Pantanal Parque Massairo Okamura

Figura 5: Bairro Dom Bosco constituído principalmente de lotes residenciais desocupados (vazios urbanos) com APP ocupada por habitações sub-normais. Fonte: Adaptado de Google Earth.

5.5.

Escoamento, drenagem e enchentes na sub-bacia do Barbado

O córrego do Barbado possui em seu curso diferentes níveis de intervenção (Figura 6 e 7). O baixo e médio curso são as áreas mais afetadas pelas obras de drenagem urbana convencionais, possuindo grande trecho com canalização aberta e canalização fechada. Na

cabeceira e no alto curso o córrego do Barbado ainda se encontra com seu leito em condição

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A ocupação urbana ao longo da sub-bacia e consequentemente a impermeabilização de seu território, favoreceramm o escoamento superficial e o aumento da velocidade e da quantidade do fluxo das águas precipitadas. As obras de drenagem presentes no baixo curso agravaram as enchentes na foz do Barbado, causando danos não só ao ambiente físico, mas principalmente à população, afetando a segurança, a saúde e trazendo prejuízos materiais. Para Amante et al (2006) ao impor modificações estruturais nas calhas dos rios e córregos e em todo o regime hidrodinâmico das bacias, o homem está desenvolvendo uma nova realidade, intensificando muitas vezes os processos naturais.

Figura 6: Mapa hidrográfico do córrego do Barbado (azul: leito natural; amarelo: canalização aberta; vermelho: canalização fechada, círculo azul claro: nascentes). Fonte: adaptado de Instituto de Planejamento e Desenvolvimento Urbano de Cuiabá.

a b

Figura 7: a) Córrego do Barbado com leito natural no trecho lindeiro ao loteamento irregular Renascer – médio curso da bacia do Barbado; b) Córrego do Barbado com canalização aberta no trecho compreendido entre os loteamentos regulares Jd. Petrópolis e Jd. Tropical – baixo curso da bacia do Barbado; Fotos: Yara Galdino – dez. 2007

A cheia é um fenômeno natural no regime dos cursos d’ água. Todos os rios e córregos têm sua área natural de inundação. Segundo Amante et al (2006) as enchentes passam a ser um problema para o homem quando este deixa de respeitar os limites naturais dos cursos d‘ água, principalmente devido ao processo de ocupação e urbanização das áreas de inundação dos mesmos.

O baixo curso e a foz do Barbado possuem a cota mais baixa da bacia e várias áreas são naturalmente alagáveis. Essa região engloba os bairros formais Jardim Petrópolis, Jardim Tropical

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e Jardim Califórnia, e os bairros oriundos de invasões: Praeiro, Praeirinho e Grande Terceiro. Os loteamentos irregulares estão localizados justamente na região mais baixa e mais suscetível a inundações naturais e à inundações agravadas pela urbanização (Figura 8).

a B

Figura 8: a) Desabrigados devido inundação no Grande Terceiro. Fonte: Jornal A Gazeta (24/03/2005); b) Morador do Bairro Praeirinho com casa inundada devido enchente no Córrego do Barbado. Fonte: Jornal Diário de Cuiabá (03/01/1995).

Para Tucci (2002) à medida que a cidade se urbaniza, são verificados os seguintes impactos quanto à drenagem: 1) aumento das vazões máximas, devido à impermeabilização das superfícies e da rede de condutos; 2) alteração do escoamento total, em função do aumento do volume de escoamento superficial; 3) o aumento da produção de sedimentos, e por conseqüência o seu acúmulo no sistema; 4) e deterioração da qualidade da água, devido à lavagem das ruas, ao transporte de material sólido e às ligações clandestinas de esgoto local. Todos esses fatores ampliam a ocorrência das inundações nas áreas urbanizadas, com o agravante desta água muitas vezes estar contaminada pelo esgoto lançado nos corpos d’ água, aumentando o risco de transmissão de doenças a população que entra em contato com a mesma (Figura 8).

a b

Figura 8: a) Av. Brasília em dia de chuva – situação decorrente das impermeabilizações e do sistema de drenagem no Bairro Jardim das Américas; b) rua do bairro Renascer alagada devido as características naturais do terreno e proximidade com a APP. Fotos: Yara Galdino – dez. 2007

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Para Amante et al (2006) a enchente urbana é um fenômeno que não deve ser observado apenas sob a ótica corretiva dos canais atuais dos rios e do sistema de drenagem pluvial: “Há de

se ter um olhar mais amplo sob a presença da água em todas as esferas – desde a entrada da água nesse ambiente, como recurso e como escoamento, até a sua saída - a fim de se entender quais mudanças o processo de urbanização trouxe para a circulação da água na cidade”.

As mesmas autoras destacam que o meio urbano é dinâmico e que está em constante modificação, portanto a cidade vai inserindo transformações através da abertura de vias, construção de novos loteamentos, aumento da rede de drenagem e/ ou abastecimento - e dessa maneira o sistema de circulação das águas está em constante processo de adaptação.

O trecho compreendido entre Av. Fernando Correa e a Av. Beira Rio é o único trecho canalizado do curso principal do Barbado. Como a desocupação completa da APP seria complicada e cara, propomos a retirada do concreto que reveste as laterais e fundo do canal, para colocação de taludes de pedras entremeados de áreas vegetadas. Tal medida traria uma melhoria estética; permitiria a permeabilidade da água; e aumentaria a rugosidade do canal, desacelerando o escoamento nos picos de cheia, constituindo uma medida de prevenção de enchentes e inundações à jusante.

Estas alterações estão de acordo com o plano diretor que pretende desenvolver medidas de prevenção de enchentes e inundações. Tais medidas permitiriam a recarga do aqüífero, redução do volume e velocidade do escoamento e redução das erosões na foz do barbado; com isso trariam benefícios para a população que vive nos bairros compreendidos neste trecho do córrego e principalmente para a população que vive no bairro Praeirinho, localizado a jusante da área.

5.6.

Esgotamento Sanitário: Conseqüências Ambientais no Meio Urbano

As invasões urbanas ocorrem tipicamente em locais sem qualquer infra-estrutura, mas na bacia do Barbado tanto as ocupações regulares quanto as irregulares não possuem rede de esgoto. A ocupação urbana da sub-bacia do Barbado trouxe consigo o despejo de dejetos no córrego, e o aumento do escoamento superficial, contribuindo para o aumento da poluição difusa.

Segundo Reani e Segalla (2006) a ausência de esgotamento sanitário gera vários impactos no ambiente urbano, como poluição das águas, propagação de doenças e vetores, tendo conseqüências na saúde, no abastecimento de água e na qualidade de vida da população.

O próprio lançamento de efluentes na água é para Pellegrino (2007) um fator que contribuiu para que os córregos urbanos fossem canalizados e confinados em galerias subterrâneas. Como as águas não apresentam boa condição sanitária recorre-se a técnicas de drenagem tradicionais que escondem a água poluída em canalizações fechadas ou aceleram a retirada dessa água com canalizações abertas revestidas de materiais de baixa rugosidade, que

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permitem maior capacidade de descarga, diminuindo as cheias locais, transferindo-as para regiões a jusante.

6. Conclusão

A legislação ambiental e urbana valoriza e preconiza a sustentabilidade das ações do planejamento urbano. O instrumental legal e teórico encontra-se em um bom estado de evolução, mas na prática, o que se observa em Cuiabá é a inoperância da lei e dos conhecimentos científicos produzidos e discutidos nos meios acadêmicos. A paisagem urbana ainda é manejada de forma fragmentada e pontual. Analisar a paisagem urbana sob um recorte físico natural – a bacia hidrográfica, e não sob um recorte social estabelecido pela cidade, proporciona às ações e políticas urbanas melhores condições para alcançarem a sustentabilidade.

Adotar a bacia hidrográfica como unidade de análise permite trazer a tona a discussão dos marcos ambientais (rios, córregos, nascentes, matas, várzeas, morros) inseridos na cidade, unindo a dimensão social e ecológica desse sistema. Tal perspectiva se mostra adequada à mudança de paradigma que se estabelece entre a cidade e o ambiente. Ao reconhecermos que muitos dos conflitos ambientais que se desenvolvem na cidade têm origem em conflitos sociais – desigualdade social, déficit habitacional, políticas públicas imediatistas – estamos dando mais um passo em direção a cidade sustentável, almejada pelo Estatuto das Cidades.

O Estatuto das Cidades é um instrumento eficiente na sobreposição das condicionantes ambientais, sociais e políticas que co-habitam a cidade. Assim como, a Resolução CONAMA 369/2006 é um marco na associação dos aspectos sociais e ambientais, que antes eram tratados como aspectos antagônicos e dissociados. Águas e cidades são unidades de paisagem com características muito distintas, mas que estabelecem uma relação indissociável. As APPs por sua vez se configuram como elemento de transição e ligação entre as cidades e suas águas. A integridade das APPs garante que as mesmas desempenhem um papel de intermediação no diálogo cidade x águas urbanas. Neste papel as APPs protegem a água, da cidade (retendo a poluição difusa, reabastecendo o lençol freático, filtrando sedimentos e desacelerando o escoamento superficial); assim como protegem a cidade, de suas águas (manifestadas em inundações e enchentes).

As águas urbanas por mais que se pareçam apenas condutores de efluentes, são elementos dinâmicos, essenciais ao equilíbrio ambiental das cidades. A dinâmica da água e os processos desenvolvidos no ciclo hidrológico fazem com que as melhorias realizadas no ambiente tragam reflexos rápidos na qualidade da água e do ecossistema urbano como um todo.

Ao analisar a sub-bacia do Córrego Barbado pudemos perceber os diferentes níveis de intervenção a que o ambiente foi submetido. Na cabeceira do barbado temos uma grande área de proteção ambiental, que garante a sobrevivência das nascentes, através da recarga do aqüífero que esta mancha verde desenvolve. O alto curso é o trecho mais valorizado da sub-bacia, por isso

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ainda são presentes grandes vazios urbanos de cunho especulativo. Neste trecho o córrego ainda não foi canalizado e a APP sofre com a ausência de vegetação, que gera a erosão das margens do córrego, e o carreamento de sedimentos. No alto curso inicia-se o lançamento de esgoto e poluição difusa que segue ocorrendo por toda a sub-bacia.

No trecho subseqüente – médio curso – os vazios urbanos já foram ocupados por loteamentos irregulares, que por não possuírem rede de esgoto, lançam seus efluentes no córrego. Este trecho conta com APP e várzea parcialmente conservada, além de uma mancha verde composta pelo campus da UFMT.

O baixo curso é o trecho mais modificado da sub-bacia. Grande parte do solo deste trecho é impermeabilizado, e o córrego é canalizado. Estas alterações ambientais aumentam a velocidade e o volume do escoamento superficial, agravando as inundações nos bairros compreendidos neste trecho e no bairro à jusante. A foz do barbado por sua vez, teve sua APP ocupada irregularmente há muitos anos, e é uma área sob constante ameaça de inundação.

Este trabalho nos levou a perceber que em Cuiabá, as APPs ainda se configuram como paisagens residuais, descaracterizadas e abandonadas pela população e pelas políticas publicas. O que tem gerado a ocupação das mesmas pela população excluída do mercado imobiliário formal. Diagnosticar os conflitos sócio-ambientais presentes na sub-bacia do Barbado permite a proposição de intervenções que beneficiem a sub-bacia como um todo, aumentando a sustentabilidade das paisagens fluviais, assim como aumentando a qualidade de vida das pessoas que vivem na área.

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