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Duração de Sílabas Pós-tônicas Finais e Domínios Prosódicos no Português Brasileiro

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Duração de Sílabas Pós-tônicas Finais e Domínios Prosódicos no Português Brasileiro

Eneida Goes LEAL – Universidade de São Paulo Raquel Santana SANTOS – Universidade de São Paulo

0. Introdução

Neste artigo, discutimos a influência dos domínios prosódicos na duração de sílabas pós-tônicas finais em português brasileiro. Trabalhos anteriores sobre o português apontam que a duração é o principal correlato do acento primário (cf. Fernandes 1976, Moraes 1987, Massini-Cagliari 1992); apontam também que, em diferentes processos fonológicos que envolvem o apagamento de sílabas (como a elisão, a degeminação e a haplologia), a sílaba a ser apagada é aquela "menos proeminente" (cf. Bisol 1996). Outros estudos sugerem que o alongamento de sílabas desambigüiza sentenças estruturalmente ambíguas (cf. Fonseca & Magalhães (2007)). Finalmente, trabalhos em aquisição apontam que as crianças percebem, no input, pistas que lhe permitem estabelecer qual o algoritmo acentual de sua língua, e sugerem que entre estas pistas está a duração das sílabas átonas (cf. Santos & Fikkert 2006).

Se por um lado há uma série de estudos sobre duração, sobre proeminências perceptuais, não há, até onde sabemos, um estudo sistemático, controlado e detalhado sobre estas proeminências, nem sobre a influência dos diferentes domínios prosódicos na duração das sílabas.

1. Estudos Prévios

Nas seções abaixo, chamamos a atenção para os estudos prévios que apontam para a duração como o parâmetro acústico mais saliente para a marcação de acento primário, a duração de sílabas átonas, e o processo de alongamento de sílaba.

1.1. O parâmetro da duração e o acento em português brasileiro

Dado que nossa discussão trata do alongamento de uma sílaba fraca, e a duração é considerada o principal correlato acústico do acento primário em português brasileiro, cumpre revermos um pouco o que se diz sobre este parâmetro e a noção de sílaba acentuada.

De acordo com Fry (1965), o acento é a codificação lingüística dos correlatos acústicos: (1) freqüência fundamental, (2) duração, e (3) intensidade. Tratando do inglês, até os anos 30, assumia-se que o correlato acústico básico do acento era a intensidade; Fry propõe que a freqüência fundamental seja o elemento mais importante, Crystal (1969) assume uma relação entre os três, e Allen (1983) assume a intensidade como principal variável para acento de palavra, ao passo que Cruttenden (1986) defende que a altura é o correlato mais importante enquanto que a intensidade a menos importante para a percepção de acentuação. Finalmente, Kent & Read (1992) defendem que a duração é a pista mais consistente na atribuição acentual.

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Se as análises não parecem coincidentes para o inglês, o quadro é um pouco mais promissor para o português brasileiro. Fernandes (1976) mostra, analisando 200 enunciados, que a duração é o principal correlato de marcação de acento primário (74,5%), seguida da freqüência fundamental (62,7%) e depois a intensidade (59%).

Moraes (1987) também chama a atenção de que, embora tradicionalmente o acento lexical seja analisado como um acento de intensidade, e controlando a posição da sílaba tônica da palavra na sentença e da modalidade da sentença, o autor chega à conclusão de que as variáveis mais constantes para o acento primário são intensidade e duração, enquanto a variável mais dominante parece ser a freqüência fundamental.

Finalmente, Massini-Cagliari (1992) conclui que o acento lexical é caracterizado por uma duração maior da sílaba tônica, acompanhada de uma queda de intensidade nas sílabas pós-tônicas, e influenciado também pela qualidade vocálica (em uma ordem decrescente de importância).

Em resumo, os estudos acústicos sobre acento primário no português brasileiro são concordes que a duração é o principal parâmetro acústico para sua marcação.

1.2. A duração das sílabas átonas em português brasileiro

O primeiro trabalho de que temos notícia que analisa acusticamente os parâmetros de duração, altura e intensidade nas sílabas é o de Fernandes (1976), observando estes parâmetros nas vogais-núcleo das sílabas. A Tabela 1 a seguir (adaptada de Fernandes 1976:48) ilustra tanto os resultados encontrados como sua metodologia, para as medidas de [e], [], [a] e [], produzidas por 4 informantes, na sentença Tenha calma:

Sentença

Informantes

tônica pós-tônica tônica pós-tônica

te  kaw m

Int. Dur. Alt. Int. Dur. Alt. Int. Dur. Alt. Int. Dur. Alt.

1 17 11 12 13 8 15 12 19 9 0 7 8 2 15 9 8 18 10 13 10 19 6 5 6 7 3 26 9 17 16 5 11 16 19 8 15 11 11 4 22 4 20 20 6 23 23 13 6 5 6 0 Médias de sílabas 20 8,25 14,25 16,75 7,25 15,5 15,25 17,5 7,25 6,25 7,5 6,5 Médias int./dur./alt. 14,17 13,17 13,33 6,75 Tabela 1

De acordo com Fernandes, os valores para duração/intensidade/altura da pós-tônica são maiores se ela estiver no interior da frase: há uma média de 13,17 para a vogal pós-tônica de tenha e a média da vogal final do enunciado (calma) é de 6,75. Os valores de duração e intensidade são, geralmente, maiores na pós-tônica dentro da sentença do que em pós-tônica final: “apesar disso, acreditamos que perceptivamente, essas diferenças sejam irrelevantes” (Fernandes 1976: 52).

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Alguns problemas, no entanto, colocam-se para esta análise. Como o trabalho de Fernandes insere-se numa proposta teórica de que a vogal era portadora do acento, a autora compara sílabas com consoantes diferentes. Numa perspectiva não-linear, o acento passa a ser definido como uma unidade supra-segmental; ou seja, diferentemente de traços fonológicos (que são características internas de segmentos), o acento deixa de ser considerado como uma propriedade individual de segmentos (das vogais), e passa a ser definido como uma cadeia de segmentos – as sílabas.

Um segundo problema que se coloca é que a autora não controlou os segmentos analisados (as vogais) das palavras, ou seja, não houve controle de variações intrínsecas aos segmentos no experimento: a duração intrínseca de uma vogal [i] é menor do que a de um [a].

Uma terceira questão é que, no exemplo acima (paradigma de toda a metodologia da autora), a sílaba tônica da segunda palavra /kal/ compromete os valores (principalmente) de duração, uma vez que, comparando-se, por exemplo, a tônica /ka/ de casa, os valores (intrínsecos) dos dois [a] são diferentes: o primeiro /a/ de /ka.za/ tem parâmetros acústicos necessariamente maiores do que o primeiro /a/ de /kal.ma/, pois a organização interna de uma sílaba CV é diferente da de uma sílaba CVC.

Finalmente, um último problema é que Fernandes prepara um corpus de 50 palavras, inseridas em frases declarativas como em (1)-(2) abaixo – para a análise de [i] e [ i], o que mostra que a autora não controlou os ambientes (mesmo que sintáticos) em que as palavras ocorriam.

(1) Titia quis ficar aqui.

(2) Vim limpar essa linda casa.

A autora também analisa os parâmetros acústicos de duração, intensidade e altura de modo a observar se eles podem ser utilizados para delimitar os grupos fônicos, definidos como “um conjunto de diversas unidades acentuais, hierarquizadas, cuja delimitação formal é possível a partir de fatos acentuais” (Fernandes 1976: 67). Os limites dos grupos fônicos podem variar de um enunciado para outro e de uma produção para outra, a depender do tamanho dos grupos e do ritmo de fala: uma frase curta é geralmente produzida num único grupo fônico, enquanto que frases maiores tendem a ser divididas em grupos menores (como se pode notar, um grupo fônico pode corresponder à frase fonológica ou à frase entoacional de Nespor & Vogel 1986). Segundo Fernandes, a duração é o principal parâmetro acústico utilizado nestes casos.

Dez anos depois, Major voltou a discutir a duração das sílabas em português. Em Major (1985), o autor aponta que, em um experimento com o logatoma lalala, as sílabas pós-tônicas são uma vez e meia mais curtas (1,48) do que as sílabas pré-tônicas, nas sentenças em (3):

(3) Repita a palavra lalala de novo.

Na sentença acima, o logatoma está em fronteira de frase fonológica, nos termos de Nespor & Vogel (1986), em ambos os lados. Isto é, tanto a sílaba pré-tônica quanto a pós-tônica são sílabas de mesma fronteira, são segmental e estruturalmente iguais, o que resulta em melhor controle para a comparação.

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Resumidamente, os resultados dos estudos acima apontam que a duração das sílabas fracas varia nas diferentes posições que ocupa. Fernandes aponta para um alongamento em fronteira de grupo fônico, enquanto Major aponta que, no que se interpreta como frase fonológica, a sílaba pré-tônica é mais curta do que na pré-tônica. Estes resultados podem ser contraditórios se o que Fernandes chama de grupo tônico for também a frase fonológica.

1.3. O alongamento de sílabas

O alongamento na produção de sílabas em fronteiras prosódicas não é o único fenômeno descrito. De acordo com Cho & Keating (2001) e Keating, Cho, Fongerong & Hsu (2003), os contrastes fonêmicos maximizados (consoantes) são melhor realizados no começo dos limites prosódicos. Assim, quanto mais alto o limite prosódico, melhor a produção. Isto significa que num par de sentenças como (3)-(4), a sílaba 'ca' de cavalo é melhor produzida na segunda sentença (em que está na fronteira de uma frase entoacional) do que na primeira sentença (em que está dentro de uma frase fonológica).

(4) [I [o menino ] [no cavalo ][caiu ][quando pulava ] I]

(5) [I [cavalo ][é um bicho ][ muito bonito ] I]

São muitos os estudos que apontam que um processo comum na fronteira de sintagmas é o alongamento, tanto final (cf. Oller 1973, Klatt 1976, Wightman et al 1992, Fougeron & Keating 1997), quanto inicial (Oller 1973). Outros estudos também apontam que o alongamento aumenta à medida que os domínios prosódicos são mais altos. Isto é, alongamentos em fronteira de palavra são menores do que em fronteira entoacional. Byrd & Saltzman (1998), Cho & Keating (2001), Fougeron (2001), Cho (2006), Tabain (2003) e Keating et al (2004) mostram este efeito para a fronteira inicial dos domínios, enquanto que Byrd & Saltzman (1998), Byrd (2000), Cho (2006), Tabain (2003), Tabain & Perrier (2005) apontam este efeito para a fronteira final dos domínios.

Fougeron & Keating (1997) mostram também que em fronteira final de enunciado, tanto a sílaba tônica (por carregar também o acento entoacional) e a última sílaba são alongadas. Finalmente, Byrd, Krivokapic & Lee (2006) apontam que a distribuição do alongamento estende-se de uma a três sílabas antes da fronteira, e este efeito diminui à medida que a distância em relação à fronteira aumenta.

Não há trabalhos específicos sobre o português brasileiro, mas dada a documentação deste fenômeno em diferentes línguas, testaremos a hipótese de que ele também ocorre em português brasileiro.

2. Quadro Teórico

Na primeira metade dos anos 80, diferentes propostas surgiram, defendendo que muitos dos processos fonológicos tinham como domínio de aplicação, domínios gerados pela interface com outros componentes gramaticais. Selkirk (1984) propõe 5 níveis: sílaba, pé, palavra prosódica, frase fonológica e frase entoacional. Nespor & Vogel (1986) propõem 7 níveis: sílaba,

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pé, palavra fonológica (w), grupo clítico (C), frase fonológica ( ), frase entoacional (I) e sentença (U). Como nosso objetivo é lidar com as sílabas pós-tônicas, interessam-nos os níveis acima da palavra. O que Selkirk chama de palavra prosódica é o que Nespor & Vogel denominam grupo clítico. A diferença entre a palavra fonológica e o grupo clítico (palavra prosódica) é que se entende cada palavra fonológica como, no mínimo, uma palavra morfológica,1 e o grupo clítico (ou palavra prosódica) é a união de uma palavra independente mais as palavras clíticas a eles. No caso do português brasileiro, são clíticos os artigos, possessivos monossílabos e oblíquos. Os artigos e possessivos adjungem-se à esquerda (cf. (6)), enquanto que os pronomes oblíquos adjungem-se à direita (cf. (7)):

(6) [c [w o w] [w menino w]c]

(7) [c [w chamou w] [w o w]c]

Há defensores tanto da proposta de Nespor & Vogel (1986), de distinguir os níveis de palavra fonológica de grupo clítico, quanto de Selkirk (1984) de que o nível de palavra fonológica não existe, ou que palavras individuais comportam-se da mesma maneira que palavras mais clíticos, por isso a existência de um único domínio, a palavra prosódica. No entanto, não há estudos sistemáticos sobre processos que ocorrem em fronteiras de palavras versus fronteiras de clíticos, de modo a poder fazer um julgamento sobre a relevância de propor dois domínios ou um. Neste caso, como se assumir a proposta de dois domínios, o máximo que se pode ter de conseqüência é a reduplicação dos resultados (os resultados de W serão os mesmos que de C), e por outro lado, a soma dos dois ambientes pode mascarar diferenças, neste artigo tomamos o caminho mais seguro e assumimos a proposta de que há dois domínios.

3. Hipóteses

A partir dos resultados de Fernandes (1976), Major (1985), Fougeron & Keating (1997) (entre outros), perseguiremos, neste trabalho, a hipótese de que as sílabas pós-tônicas são mais alongadas nos domínios de frase fonológica e de frase entoacional, do que no domínio de grupo clítico.

Pode-se levantar a questão de por que não testar, também, a duração da pós-tônica em fronteira de palavra fonológica (nos termos de Nespor & Vogel 1986). Ocorre, no entanto, que não é possível criar contextos em que se distinga os domínios de palavra fonológica e grupo clítico, com nomes. Observe em (8) que a fronteira de palavra fonológica é também fronteira de grupo clítico, que só pode ser dissociada na pré-tônica com nomes. Para que a fronteira de palavra fonológica não coincida com a de grupo clítico, é necessário haver um clítico sufixado à palavra teste, como ocorre com verbos – cf. (9).2

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É possível que uma palavra morfológica seja formada por mais de uma palavra fonológica, em casos em que o sufixo, por exemplo, apresenta características fonológicas de radicais. Em português brasileiro, podemos exemplificar a questão com os sufixos de diminutivo ({-zinh-}, {-inh-}), que são considerados como palavras fonológicas (cf. Lee 1995).

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(6)

6

(8) a menina quieta >> [ [c [w a w] [w menina w] c] [c[w quieta w]c] ]

(9) chamamo-lo >> [ [c [w chamamo w][w lo w] c] ]

Uma outra hipótese a ser testada, a partir dos estudos de Fernandes (1976), Moraes (1986) e Massini-Cagliari (1992) sobre correlatos acústicos do acento, é que mesmo que a sílaba pós-tônica seja alongada, ela não será maior do que a sílaba tônica. Se fosse este o caso, anular-se-ia a distinção entre a sílaba tônica e a átona, que é baseada na duração, em português brasileiro.

Finalmente, embora não haja nenhuma hipótese a ser testada, investigaremos se o tipo de vogal que preenche a sílaba pós-tônica pode, de alguma forma, afetar a variação da duração destas sílabas.

4. Metodologia

Neste estudo, analisamos a produção de palavras e logatomas trissílabos, com acento medial, produzidas por adultos falantes de português brasileiro como primeira língua. Foram 22 informantes, entre 22 e 69 anos, nascidos no estado de São Paulo ou que já moram no estado há mais de 20 anos.

Foram utilizadas 3 palavras (madama, lapela, sumiçu) e 7 logatomas (fonofo, xumoxu, zutuzu, mutumu, jataja, fadufa, vapava) em que controlou-se a estrutura silábica (todas sílabas CV), os segmentos utilizados (a primeira e terceira sílabas eram iguais, para possibilitar a comparação entre elas), o tipo de segmento consonantal (todos [+contínuo] para facilitar o estabelecimento do início da sílaba) e o tipo de segmento vocálico (cinco palavras em que a vogal átona era [+baixa] e cinco em que a vogal átona era [+alta]).

As palavras-alvo foram inseridas em três sentenças, onde preenchiam a fronteira de três domínios prosódicos: grupo clítico (ou palavra prosódica, nos termos de Selkirk 1984) – cf. (10), frase fonológica – cf. (11), e frase entoacional - cf. (12). Às 30 sentenças-teste foram incluídas 30 sentenças distratoras no teste.

(10) eu vi [ [c[w aquela w] c] [c[w lapela w]c] [c[w branca w]c] ]

(11) diga [ [c[w lapela w]c] ] [ [c de novo c] ]

(12) [I[ [c[w lapela w]c] ] I]

As sentenças foram apresentadas uma a uma para os informantes (de modo a evitar a entoação de lista) no computador. Os informantes foram instruídos a lerem silenciosamente as sentenças e depois lerem em voz alta, de forma mais natural possível. Antes de começarem o teste, foi pedido que os informantes lessem as novas palavras, de modo a que se familiarizassem com elas e evitássemos as hesitações.

O total inicial de sentenças geradas para análise foi de 660, das quais foram excluídas 22 sentenças da análise pelos seguintes motivos: hesitação e produção incorreta da palavra alvo. O total final para análise foi de 638 sentenças, das quais extraíram-se 638 sílabas pós-tônicas, 319 delas preenchidas por vogais [+baixa] e outras 319 por vogais [+alta].

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7 4. Resultados

Os resultados encontrados são apresentados nas Tabelas 1-3 abaixo. Na tabela 1, podemos observar a média da duração, em milisegundos, das sílabas pós-tônicas. Como é possível observar, as sílabas em fronteira de frase entoacional são mais longas do que as que estão em fronteiras de grupo clítico ou frase fonológica. De fato, a média da duração da sílaba em fronteira entoacional é 1,37 maior do que a que preenche a fronteira de grupo clítico, ou 1,42 maior do que a que preenche a fronteira imediatamente inferior, a de frase fonológica.

Tabela 1

Na tabela 2, abaixo, comparamos a média de duração das sílabas pós-tônicas com a média de duração das sílabas tônicas. Como é possível observar, em todos os domínios as sílabas tônicas são mais longas do que as sílabas pós-tônicas, mesmo aquelas que estão em fronteira entoacional. Em domínio de grupo clítico, a sílaba tônica é 1,40 maior do que a pós-tônica; em domínio de frase fonológica, a sílaba tônica é 1,48 maior do que a pós-tônica. Finalmente, em fronteira de frase fonológica, as médias de duração são bem parecidas, e a tônica é apenas 1,17 maior do que a sílaba pós-tônica. Assim como as sílabas pós-tônicas só são significativamente mais alongadas em domínio de frase entoacional, podemos perceber que o mesmo ocorre (porém não com a mesma relação) com a sílaba tônica. Elas têm uma duração semelhante nos domínios de grupo clítico e frase fonológica, mas são mais longas no domínio de frase entoacional. A tônica em fronteira entoacional é 1,12 maior do que a tônica em frase fonológica.

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Tabela 2

Finalmente, a Tabela 3 apresenta os resultados da duração das pós-tônicas separados pela altura das vogais da sílaba. Como podemos observar, em todos os casos as sílabas pós-tônicas com vogal [+alta] são mais longas do que as sílabas pós-tônicas com vogais [+baixa]. A diferença é pequena (menos de 0,02 ms), mas fica um pouco maior quando em fronteira entoacional (0,03 ms).

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9 6. Discussão

Os resultados encontrados são interessantes, na medida em que confirmam alguns fatos que vêm sendo notados na descrição de diversas línguas, mas por outro lado não confirmam alguns resultados sobre o próprio português brasileiro.

Como pudemos observar na tabela 1, a sílaba pós-tônica final é alongada em fronteira entoacional, como apontam Oller (1973), Klatt (1976), Wightman et al (1992) e Fougeron & Keating (1997). O alongamento também ocorre com a sílaba tônica, corroborando a afirmação de Fougeron & Keating (1997) e Byrd, Krivokapc & Lee (2006) de que não só a sílaba final, mas a tônica (ou a penúltima sílaba) também sofre alongamento.

Os resultados, no entanto, não corroboram as análises de Byrd & Saltzman (1998), Byrd (2000), Cho (2006), Tabain (2003) e Tabain & Perrier (2005) de que, quanto mais alto o domínio prosódico, mais longa será a sílaba final. Como pode se observar na Tabela 2, tanto as sílabas pós-tônicas quanto as tônicas, em fronteira de grupo clítico e frase fonológica têm quase a mesma duração. As tônicas vão de 0,22907 em C para 0,23417 em , com uma diferença de apenas 0,00051 ms. As pós-tônicas vão de 0,16285 em C para 0,15795 em , numa redução de 0,0049 ms.

Assim, a hipótese de que há um alongamento final não pode ser negada, mas a hipótese de que o alongamento é maior quanto mais alto for o domínio prosódico pode.

A tabela 2 também traz uma outra informação relevante: por maior que seja o alongamento, ele não chega a igualar-se à duração da sílaba tônica. É assim que a sílaba tônica de fronteira de frase entoacional dura 0,26341 ms enquanto a pós-tônica dura 0,22445 ms. Uma vez que a duração é o principal correlato acústico do acento, se a sílaba pós-tônica alongasse-se igual ou mais do que a sílaba tônica, poderia haver um problema de identificação da sílaba portadora de acento primário na palavra. Como vimos, isso não ocorre. Assim, a segunda hipótese não é negada também.

Finalmente, a Tabela 3 traz informações sobre a qualidade da vogal da sílaba pós-tônica e o alongamento. Massini-Cagliari (1992) já havia chamado a atenção para o fato de que a qualidade da vogal deve ser considerada na análise sobre o acento primário. Barbosa (1996) estudou a duração das vogais em posição tônica e pós-tônica, trabalhando com um corpus de 1195 logatomas. O autor mostra que as vogais pós-tônicas ([ɐ,ɪ,ʊ]) têm duração menor do que as mesmas tônicas ([a,i,u]), e que, das vogais anteriores para as posteriores, quanto mais alta for a vogal, menor é sua duração. Interessantemente, vimos aqui que sílabas com vogais [+alta] são em geral mais longas do que aquelas com vogal [+baixa]. Mais pesquisas precisam ser conduzidas para explicar esta discrepância.

7. Considerações Finais

O trabalho aqui desenvolvido trabalhou com o processo de alongamento de sílabas finais em diferentes domínios prosódicos. Os resultados apontaram que a única fronteira onde há um alongamento significativo é na fronteira entoacional, e que se aplica não só para as sílabas pós-tônicas como para as pós-tônicas (em penúltima posição na fronteira). Também demonstrou-se que

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não há uma relação entre o tamanho do alongamento e a altura do nível prosódico na hierarquia: não houve diferença no alongamento nos níveis de grupo clítico e frase fonológica. Mostrou-se também que, embora haja alongamento, ele não se iguala à duração da sílaba tônica do mesmo domínio. Finalmente, mostrou-se que há uma diferença na duração (e alongamento) a depender da qualidade da vogal da sílaba pós-tônica.

Os resultados aqui apontados devem ser levados em conta em outros tipos de pesquisa. Apenas para citar um exemplo, Fonseca & Magalhães (2007), ao manipularem sentenças estruturalmente ambíguas do tipo ‘o jornalista abraçou o amigo suado’, alongam a sílaba tônica da palavra amigo, de forma a testar se, com isso, a ambigüidade é desfeita. Os resultados dos autores apontam que esta manipulação não faz com que a leitura principal seja que o jornalista esteja suado. Ora, como vimos, não há um alongamento significante neste contexto (de duas frases fonológicas, em uma estrutura em que o jornalista estava suado), e por isso o resultado não é surpreendente.

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