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TRABALHOS TÉCNICOS Divisão Jurídica

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O SEGUNDO SUBSTITUTIVO AO PROJETO DE LEI (PL) Nº 6.301/2005 E AS ALTERAÇÕES NO CÓDIGO BRASILEIRO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

Letícia Mariz de Oliveira Advogada

No dia 26 de junho de 2010, a Comissão de Defesa do Consumidor (CDC) da Câmara dos Deputados aprovou o parecer complementar do Deputado Federal Dimas Ramalho (PPS-SP) e, no mérito, o Segundo Substitutivo que este, na qualidade de relator, apresentou ao Pro-jeto de Lei (PL) nº 6.301/2005, de autoria do Deputado Federal Celso Russomanno (PP-SP) e ao qual foram apensados os Projetos de Lei nºs 7.318/2006, 1.580/2007 e 5.597/2009.

O Segundo Substitutivo ao PL nº 6.301/2005, que “Altera os arts. 3º, 26, 39, 46, 51, 82, 102 e 106 da Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990, para ampliar os direitos do con-sumidor, estabelece disciplina especial para os contratos em relações de consumo, e dá ou-tras providências”, objetiva reintroduzir, no Código de Defesa do Consumidor (CDC), dispo-sitivos vetados pelo Presidente da República Federativa do Brasil, por ocasião da sanção da referida lei federal, mas reputados como “muito válidos e importantes para o aprimoramento do Código”, consoante a justificativa apresentada pelo Deputado Federal Celso Russomanno, considerando-se o “entendimento sustentado por vários estudiosos e especialistas, na área do Direito do Consumidor”, inconformados com os vetos em questão.

A garantia da tutela dos direitos metaindividuais (difusos e coletivos) e individuais homogêneos do consumidor está explícita no rol dos direitos e garantias fundamentais prescri-tos no Capítulo I (Dos Direiprescri-tos e Deveres Individuais e Coletivos) do Título II (Dos Direiprescri-tos e Garantias Fundamentais) da Constituição da República Federativa do Brasil (CF), ex vi do disposto no inciso XXXII, do seu artigo 5º:

“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantin-do-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: ... XXXII - o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor;

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Por sua vez, o artigo 170 e seu inciso V, inseridos no Capítulo I (Dos Princípios Gerais da Atividade Econômica) do Título VII (Da Ordem Econômica e Financeira) da CF, inclui a defesa do consumidor dentre os princípios cardiais da ordem econômica:

“Art. 170 A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:

... V - defesa do consumidor;

...” (in verbis) Foi com fulcro nesses dispositivos e no artigo 48 do Ato das Disposições Constitucio-nais Transitórias (ADCT) que foi elaborado o CDC, que ora se pretende alterar por meio do Segundo Substitutivo ao PL nº 6.305/2005, cujo texto é objeto de comentário no presente Trabalho Técnico.

Estabelece o artigo 1º do Segundo Substitutivo ao PL nº 6.305/2005 que:

“Art. 1º Esta lei altera e acrescenta dispositivos à Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990 – Código de Proteção e Defesa do Consumidor, para ampliar prazos, direitos e garantias em favor do consumidor; estabelece disciplina especial para os contratos em relação de consumo, inclusive os de natureza financeira, com atenção especial aos portadores de necessidades visuais e auditivas, e dá outras providências.” (in verbis) A redação do dispositivo supra visa delinear o foco do projeto de lei ordinária sob co-mento, no qual foram inseridos inclusive os propósitos do PL nº 7.318/2006, também de auto-ria do Deputado Federal Celso Russomanno, e que “Altera a Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990, para ampliar o conceito de fornecedor, aumentar os prazos para reclamação por vícios aparentes e determinar o reinício da contagem desses prazos, após o atendimento da reclamação pelo fornecedor”; estendidas para os contratos em geral as disposições contidas no PL nº 1.580/2007, de autoria dos Deputados Federais Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP) e Ré-gis de Oliveira (PSC-SP) e que “Dispõe sobre procedimentos a serem observados pelas insti-tuições financeiras e demais instiinsti-tuições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Bra-sil na contratação de operações com seus clientes e ao público em geral”; e também contem-pladas aquelas contidas no PL nº 5.597/2009, de autoria do Deputado Federal Bispo Gê Tenu-ta (DEM-SP) e que “Obriga os presTenu-tadores de serviços que celebrem contrato com o consu-midor por intermédio de centrais de atendimento a enviarem cópia impressa do contrato ao consumidor”.

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Prosseguindo, dispõe o artigo 2º da proposição legislativa em questão que:

“Art. 2º O caput do art. 3º e os incisos I e II do art. 26 da Lei nº 8.078, de 11 de se-tembro de 1990, passam a viger com a redação abaixo, acrescendo-se, à referida lei, o inciso I-A e os §§ 4º e 5º ao art. 26; o inciso XIV ao art. 39; os §§ 1º, 2º, 3º e 4º ao art. 46; o inciso XVII ao art. 51; o § 1º-A ao art. 82; o § 3º ao art. 102 e o inciso IX-A ao art. 106, com a redação abaixo:

Art. 3º Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos, novos ou usados, ou prestação de servi-ços.” (NR) (in verbis, grifo nosso)

A atual redação do caput do artigo 3º do CDC é convergente com a boa técnica legis-lativa, não se justificando a alteração pretendida, haja vista que o conceito de produto expres-so no § 1º do artigo 3º do CDC não enseja qualquer dúvida expres-sobre a possibilidade do objeto de interesse numa relação consumerista abranger qualquer bem (termo genérico) móvel ou imó-vel, material ou imaterial, seja novo ou não. O importante, diante de um caso concreto, é veri-ficar se a relação jurídica estabelecida entre as Partes interessadas é regida sob a égide do CDC ou da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002, que “Institui o Código Civil” (CC), ou seja, se as Partes se enquadram nos conceitos de consumidor e fornecedor fixados no artigo 2º e seu parágrafo único e no caput do artigo 3º do CDC, a seguir transcritos:

“Art. 2º Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.

Parágrafo único – Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que in-determináveis, que haja intervindo nas relações de consumo.

Art. 3º Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividades de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.

...” (in verbis) Nem todo destinatário final de uma aquisição de produto, seja novo ou usado, ou ser-viço é juridicamente consumidor, assim como nem toda pessoa, física ou jurídica, que exerce atividade de oferecimento de bens ou serviços ao mercado é fornecedor.

Não se configura relação de consumo quando, por exemplo, o comprador adquire um produto (ex.: automóvel usado) para uso próprio, mas o vendedor (ex.: profissional autônomo)

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não exerce atividade econômica destinada a suprir o mercado de veículos automotores usados. Diversamente, há relação consumerista entre o comprador que adquire automóvel usado para uso próprio e o comerciante de veículos automotores usados.

Da mesma forma, não se caracteriza relação de consumo quando o vendedor (ex.: co-merciante) exerce atividade econômica voltada para o oferecimento de produto (ex.: madeira) ao mercado, mas o comprador (ex.: fabricante) não o adquire para seu uso como destinatário final, mas sim como insumo para fabricação de móveis que serão ofertados ao mercado.

Examinemos, doravante, a redação proposta para o artigo 26 do CDC:

“Art. 26... I - sessenta dias, tratando-se de fornecimento de serviço e de produto não duráveis; II - cento e oitenta dias, tratando-se de fornecimento de serviço e de produto duráveis. ... § 2º ... ... I-A - a reclamação formalizada perante os órgãos ou entidades que integram o Sis-tema Nacional de Defesa do Consumidor, com poder de polícia, pelo prazo de 90 (noventa) dias.

... § 4º Atendida a reclamação pelo fornecedor, reinicia-se a contagem dos prazos pre-vistos nos incisos I e II, alcançando, no entanto, a garantia somente a parte ou as partes viciadas.

§ 5º O reinício da contagem dos prazos será determinado pela data de emissão da nota fiscal referente ao atendimento da garantia.” (NR) (in verbis, grifo nosso) O artigo 26 está inserido na Seção IV (Da Decadência e da Prescrição) do Capítulo IV (Da Qualidade de Produtos e Serviços, da Prevenção e da Reparação dos Danos) do Título I (Dos Direitos do Consumidor) do CDC.

O artigo 26 disciplina a extinção do direito do consumidor de reclamar por vícios apa-rentes ou ocultos que tornam os produtos ou serviços impróprios ou inadequados ao consumo.

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No caso de vícios aparentes, ou seja, de fácil constatação pelo consumidor, a contagem do prazo se inicia a partir da entrega efetiva dos produtos ao consumidor ou do término da execução dos serviços por este contratada. Tratando-se de vícios ocultos, o prazo somente se inicia no momento em que ficar evidenciado o defeito dos produtos ou dos serviços para o consumidor.

Os prazos previstos nos incisos I e II do referido artigo 26 são decadenciais.

Frise-se que a decadência é a perda do próprio direito (potestativo) pelo seu não exer-cício em determinado prazo, quando a lei estabelecer lapso temporal para tanto. Consoante estabelecido no artigo 207 do CC, “salvo disposição legal em contrário, não se aplicam à decadência as normas que impedem, suspendem ou interrompem a prescrição”.

Verifica-se, portanto que, por meio do Segundo Substitutivo ao PL nº 6.305/2005, o legislador pretende favorecer o consumidor. Esquece-se, todavia, que ao dobrar os prazos da responsabilidade do fornecedor pelos vícios dos produtos ou de serviços acabará obrigando o último a rever seus custos e a elevar os preços de seus produtos e serviços e/ou os termos de concessão da garantia contratual complementar (artigo 50 do CDC) porventura ofertada. A alteração proposta pelo legislador, na prática, não favorece o mercado de consumo.

Já o inciso I-A, acrescido ao § 2º do artigo 26, visa reinserir, no CDC causa obstativa (reclamação) de decadência com efeito suspensivo, pelo prazo de 90 (noventa) dias, similar àquela prevista em dispositivo que foi vetado pelo Presidente da República Federativa do Bra-sil, quando da sanção da Lei nº 8.078/90, por ser considerado como “ameaça à estabilidade das relações jurídicas ao atribuir à entidade privada função reservada, por sua própria natu-reza, aos agentes públicos”.

Extinta a causa obstativa, o prazo decadencial voltaria a correr, computando-se o período já transcorrido antes do evento suspensivo.

Ora, considerando-se que, nos termos do artigo 105 do CDC, integram o Sistema Na-cional de Defesa do Consumidor (SNDC) os órgãos públicos federais, estaduais, municipais e do Distrito Federal que, direta (ex.: Ministério Público) ou indiretamente (ex.: Instituto de Pesos e Medidas), detêm, dentre suas várias atribuições, funções voltadas à qualidade e segu-rança de produtos ou de serviços com reflexos importantes nas relações de consumo, bem como as entidades privadas de defesa do consumidor (ex.: Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor), apresenta-se como juridicamente inadequado o referido inciso I-A, haja vista que tais entidades privadas, desprovidas de vinculação com os entes públicos, não podem e-xercer funções inerentes ao exercício do poder de polícia que, conforme ensinamento do ilus-tre Professor e Mesilus-tre em Direito José dos Santos Carvalho Filho – em seu Manual de Direito

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Administrativo, 20ª edição revista, ampliada e atualizada até 15.07.2008, Editora Lumen Juris, Rio de Janeiro, 2008 – importa em “prerrogativa de direito público que, calcada na lei, auto-riza a Administração Pública a restringir o uso e o gozo da liberdade e da propriedade em favor do interesse da coletividade” e que tem a discricionariedade, a autoexecutoriedade e a coercibilidade como atributos.

A inclusão dos §§ 4º e 5º no artigo 26 do CDC busca assegurar às partes dos produtos (ex.: peças) substituídas ou serviços objeto de reparo, por força de vícios aparentes ou ocultos identificados, os mesmos prazos de garantia legal que foram fixados nos incisos I e II do cita-do artigo e cuja contagem seria reiniciada na data da emissão da nota fiscal referente ao aten-dimento da garantia pelo fornecedor.

Consequentemente, mais uma vez se amplia a responsabilidade do fornecedor pelos vícios dos produtos e serviços, enquanto a vida útil desses, até mesmo pelo desgaste de seu uso pelo consumidor, vai sendo naturalmente reduzida.

Mais uma inovação se apresenta no Segundo Substitutivo ao PL nº 6.301/2005 ao se tipificar nova prática abusiva, dentre as enunciadas no artigo 39 do CDC:

“Art. 39... ... XIV – deixar de entregar ao consumidor uma via do contrato relativo a operação ou serviço prestado.” (NR) (in verbis)

O contrato é um negócio jurídico bilateral ou plurilateral, que consubstancia um acor-do de vontades capaz de criar, modificar ou extinguir direitos, e para cuja validade devem ser atendidos os requisitos estabelecidos no artigo 104 do CC: agente capaz; objeto lícito, possí-vel, determinado ou determinável; e forma prescrita ou não defesa em lei.

A validade da declaração de vontade das Partes não depende de forma especial, salvo se expressamente exigido por lei, ex vi do disposto no artigo 107 do CC.

Ressalte-se que as relações jurídicas de consumo são reguladas pelo CDC e podem ser firmadas mediante contrato verbal ou escrito, seja de adesão ou não, observado o disposto nos artigos 104 e 107 do CC. Naquilo que o CDC for omisso são aplicáveis àquelas relações os dispositivos da legislação civil, comercial, penal, processual e demais leis extravagantes, por extensão ou analogia, desde que não contrariem o sistema de defesa e proteção do consumidor de que trata o artigo 1º do CDC.

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Por conseguinte, há que se interpretar o inciso XIV que se pretende acrescer ao artigo 39 do CDC como alusivo aos contratos escritos. Trata-se de medida convergente com o dis-posto no inciso IV do artigo 4º do Capítulo II (Da Política Nacional de Relações de Consumo) e no inciso III do artigo 6º do Capítulo III (Dos Direitos Básicos do Consumidor) CDC, que ora reproduzimos:

“Art. 4º A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimen-to das necessidades dos consumidores, o respeiatendimen-to à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios: (Redação dada pela Lei nº 9.008, de 21.3.1995)

... IV - educação e informação de fornecedores e consumidores, quanto aos seus direi-tos e deveres, com vistas à melhoria do mercado de consumo;

...” (in verbis, grifo nosso) “Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

... III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com es-pecificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem;

...” (in verbis, grifo nosso) A prática abusiva encerra uma presunção de lesividade ao consumidor.

A nosso ver seria mais adequado se tipificar como prática abusiva não o ato omissivo (deixar de entregar) por parte do fornecedor, mas sim o ato deste recusar a entrega da via do contrato firmado ao consumidor. Neste caso seria evidente a desconformidade com os padrões mercadológicos de boa conduta em relação ao consumidor, ensejando a aplicabilidade das sanções previstas em lei.

Vejamos os novos dispositivos acrescidos ao artigo 46 do CDC no âmbito do Segundo Substitutivo ao PL nº 6.301/2005:

“Art. 46... § 1º Os contratos não obrigarão os consumidores enquanto o fornecedor não compro-var a entrega de uma cópia a eles.

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§ 2º Os contratos, certificados de garantia, folhetos de divulgação e quaisquer meios de informação devem veicular conteúdos em linguagem clara e acessível, sendo obri-gatoriamente especificados, especialmente em relação aos valores totais a pagar, pra-zos, taxas de juros, de mora e de administração, comissão de permanência, encargos moratórios, multas por inadimplemento e demais condições peculiares que possam ensejar controvérsias, em formatação acessível à leitura e compreensão por pessoas de formação escolar básica.

§ 3º As informações e o conteúdo publicitário veiculados pelos fornecedores, referen-tes a termos e condições contratuais, assim como a operações e serviços oferecidos ou prestados, devem constar do contrato que vier a ser celebrado.

§ 4º No caso de o consumidor ser portador de deficiência sensorial, deverão ser obri-gatoriamente observados os seguintes procedimentos:

I - providenciar, na assinatura de contrato com portador de deficiência visual, exceto se por este dispensada, a leitura do inteiro teor do referido instrumento, em voz alta, exigindo, em qualquer caso, declaração do contratante certificada por duas testemu-nhas de que tomou conhecimento dos direitos e deveres das partes envolvidas, sem prejuízo da adoção, a critério do fornecedor, de outras medidas com a mesma finali-dade;

II - em caso de deficiente auditivo, deverá o fornecedor exigir declaração de que o consumidor efetuou a leitura do inteiro teor do contrato, antes de sua assinatura; III - na hipótese de pessoa que não compreende as disposições contratuais, o contrato somente poderá ser firmado em presença de pessoa por ele expressamente indicada, que declare ter explicado as condições a que o consumidor estará jungido ao firmar o instrumento, firmando-o conjuntamente.” (NR) (in verbis)

Um negócio jurídico válido produz efeitos imediatos, salvo se as Partes voluntaria-mente estabelecerem condição (artigos 121 a 130 do CC), termo (artigos 131 a 135 do CC) ou encargo (artigos 136 e 137 do CC) para a sua eficácia.

Diversamente, no § 1º que se pretende acrescer ao artigo 46 do CDC, nos deparamos com uma imposição legal que suspende a obrigatoriedade do consumidor cumprir com suas obrigações e responsabilidades contratuais, enquanto não tiver comprovadamente recebido cópia do contrato que, obviamente, for firmado por escrito.

A inovação é dissonante dos princípios da igualdade entre as Partes e da liberdade de contratar e importa em retrocesso para a dinâmica dos negócios jurídicos realizados no mundo moderno, não se justificando diante das amplas regras previstas nos incisos V e VIII do artigo 6º do Capítulo III (Dos Direitos Básicos do Consumidor), nos artigos 46 a 50 da Seção I

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(Dis-posições Gerais) e nos artigos 51 a 53 da Seção II (Das Cláusulas Abusivas) do Capítulo VI (Da Proteção Contratual) do Título I (Dos Direitos do Consumidor) do CDC, que protegem o consumidor ab initio do contrato, independentemente do recebimento da respectiva via.

Ademais vai de encontro ao preconizado no inciso III do artigo 4 º do CDC:

“Art. 4º... ... III - harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo e compa-tibilização da proteção do consumidor com a necessidade de desenvolvimento econô-mico e tecnológico, de modo a viabilizar os princípios nos quais se funda a ordem e-conômica (art. 170, da Constituição Federal), sempre com base na boa-fé e equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores;

...” (in verbis) Também não se justifica o acréscimo dos §§ 2º e 3º ao artigo 46 do CDC, eis que suas regras já se encontram abrangidas pelo disposto no inciso IV do artigo 4º e no inciso III do artigo 6º, anteriormente transcritos, bem como nos artigos 30 e 31 da Seção II (Da Oferta) do Capítulo V (Das Práticas Comerciais) do Título I (Dos Direitos do Consumidor) do CDC e no próprio artigo 46 em vigor.

Os incisos I e II do § 4º que o legislador visa acrescentar ao artigo 46 do CDC, para fazer valer em toda e qualquer contratação por consumidor portador de deficiência visual ou auditiva, reproduzem dispositivos da Resolução do Conselho Monetário Nacional (CMN) nº 2.878, de 26 de julho de 2001, que “Dispõe sobre procedimentos a serem observados pelas instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil na contratação de operações e na prestação de serviços aos clientes e ao público em geral”, alterada pela Resolução CMN nº 2.892, de 27 de setembro de 2001, ambas revogadas pela Resolução CMN nº 3.694, de 26 de março de 2009, que “Dispõe sobre a prevenção de riscos na contratação de operações e na prestação de serviços por parte de instituições fi-nanceiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil”.

A Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, adotada pela Organiza-ção das Nações Unidas (ONU) em 13 de dezembro de 2006, e seu Protocolo Facultativo, fo-ram assinados pela República Federativa do Brasil em 30 de março de 2007. Trata-se do pri-meiro tratado de direitos humanos tornado constitucional no País, nos termos do Decreto Le-gislativo nº 186, de 9 de julho de 2008, promulgado pelo então Presidente do Senado Federal,

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Senador Garibaldi Alves Filho, e do Decreto nº 6.949, de 25 de agosto de 2009, do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

São princípios gerais (artigo 3º) da referida Convenção, dentre outros: o respeito pela dignidade inerente, a autonomia individual, inclusive a liberdade de fazer as próprias esco-lhas e a independência das pessoas; a não discriminação; e a acessibilidade; tendo nosso País, juntamente com os demais Estados Partes, se comprometendo (artigo 4º) inclusive a adotar todas as medidas legislativas, administrativas e de qualquer outra natureza, necessá-rias para a realização dos direitos reconhecidos na referida Convenção; adotar todas as me-didas necessárias, inclusive legislativas, para modificar ou revogar leis, regulamentos, cos-tumes e práticas vigentes, que constituírem discriminação contra pessoas com deficiência; e tomar todas as medidas apropriadas para eliminar a discriminação baseada em deficiência, por parte de qualquer pessoa, organização ou empresa privada.

Nos termos da citada Convenção, todos os Estados Partes reconhecem que todas as pessoas são iguais perante e sob a lei e que fazem jus, sem qualquer discriminação, a igual proteção e igual benefício da lei (artigo 5º).

Ademais, tomarão todas as medidas apropriadas para assegurar que as pessoas com deficiência possam exercer seu direito à liberdade de expressão e opinião, inclusive a liber-dade de buscar, receber e compartilhar informações e ideias, em igualliber-dade de oportuniliber-dades com as demais pessoas e por intermédio de todas as formas de comunicação de sua escolha. No rol dessas medidas, destacamos a de fornecer, prontamente e em custo adicional, às pes-soas com deficiência, todas as informações destinadas ao público em geral, em formatos a-cessíveis e tecnologias apropriadas aos diferentes tipos de deficiência; urgir as entidades privadas que oferecem serviços ao público em geral, inclusive por meio da internet, a forne-cer informações e serviços em formatos acessíveis, que possam ser usados por pessoas com deficiência; e reconhecer e promover o uso de línguas de sinais (artigo 21).

Nesse sentido, encontram-se na contramão da história e opostas aos anseios das pesso-as com deficiência pesso-as regrpesso-as constantes nos incisos I e II do § 4º, que o legislador busca acres-cer ao artigo 46 do CDC por meio do Segundo Substitutivo ao PL nº 6.301/2005.

O inciso III do § 4º, que também se pretende acrescer ao artigo 46 do CDC, além de atribuir a terceiro (pessoa indicada pelo consumidor) uma responsabilidade (prestar todas as informações ao consumidor) que é do fornecedor, se revela discriminatória por deferir a pes-soa que não compreende as disposições contratuais um tratamento como se fosse legalmente destituída de sua plena capacidade para praticar os atos da vida civil, ainda que não se enqua-dre nas hipóteses previstas nos artigos 3º (incapacidade absoluta) e 4º (incapacidade relativa)

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do CC. Note-se que, apenas se o consumidor fosse analfabeto, o contrato poderia ser assinado a rogo e subscrito por duas testemunhas, ex vi do disposto no artigo 595 do CC.

Nos termos do CDC em vigor, são consideradas nulas as cláusulas abusivas porventu-ra inseridas nos contporventu-ratos de consumo. Tais cláusulas expressam verdadeiro desequilíbrio entre os direitos e obrigações assumidos entre fornecedor e consumidor e são notoriamente desfavoráveis a este último, como se pode depreender da leitura do artigo 51 do CDC.

Foi com a intenção de coibir a inclusão da chamada cláusula-surpresa nos contratos de consumo que o legislador entendeu como oportuno prever expressamente sua nulidade mediante o acréscimo do inciso XVII ao artigo 51 do CDC, a seguir transcrito:

“Art. 51... ... XVII - segundo a aparência global do contrato, venham, após sua conclusão, em ra-zão de dubiedade, obscuridade, contradição ou vício de linguagem na redação, a sur-preender o consumidor.

..." (NR) (in verbis) Quando da sanção do Projeto do CDC pelo Presidente da República, dispositivo dessa natureza foi vetado, sob a justificativa de que “reproduz, no essencial, o que já está explicita-do no inc. IV. É, portanto, desnecessário.”

Apesar da justificativa de veto, a cláusula-surpresa permanece inadmitida por desres-peitar o disposto no inciso II do artigo 6º, o artigo 46 e os incisos IV e XV do artigo 51 do CDC. Neste ponto, cumpre inclusive destacar que cabe ao fornecedor o ônus de provar a au-sência da surpresa extraordinária alegada pelo consumidor, consoante previsto no inciso VIII do artigo 6º do mesmo diploma legal.

A respeito do assunto, trazemos à colação os esclarecimentos do ilustre Professor Nel-son Nery Júnior, Mestre e Doutor em Direito, na obra Código Brasileiro de Defesa do Con-sumidor: comentado pelos autores do anteprojeto (Ada Pellegrini Grinover et al. 9ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2007):

“A surpresa do consumidor sobre determinada circunstância contratual pode decor-rer não só da má-fé do fornecedor na conclusão do contrato e da falta de esclareci-mento adequado sobre o conteúdo do contrato, mas também da redação obscura, dú-bia ou contraditória de uma ou mais cláusulas. A redação clara e de fácil compreen-são também é princípio que deve ser observado para que o contrato de consumo tenha eficácia relativamente ao consumidor (art. 46, in fine, CDC).

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A proibição da cláusula-surpresa tem relação com a cláusula geral de boa-fé, estipu-lada no inc. IV do art. 51 do CDC. Ambas configuram uma técnica de interpretação da relação jurídica de consumo, e, também, verdadeiros e abrangentes pressupostos negativos da validade e eficácia de contrato de consumo, quer dizer, as cláusulas con-tratuais devem obediência à boa-fé e equidade e não devem surpreender o consumidor após a conclusão do negócio, pois este contratou sob certas circunstâncias e devido à aparência global do contrato.” (in verbis)

Nosso próximo comentário cinge-se à redação do § 1º-A acrescido ao artigo 82 do CDC pelo Segundo Substitutivo ao PL nº 6.301/2005:

“Art. 82... ... § 1º-A Os órgãos públicos legitimados poderão tomar dos interessados compromisso de ajustamento de sua conduta às exigências legais.

... " (NR) Relativamente ao dispositivo supra, consideramos que seria mais adequado e oportu-no, para dar fim à controvérsia jurídica sobre a vigência do artigo 113 do CDC, adotar-se a mesma redação dada ao § 3º do artigo 82 do mesmo diploma legal e que, com fulcro nos §§ 1º e 2º do artigo 66 da CF, foi objeto de veto pelo então Presidente Fernando Affonso Collor de Mello, quando da sanção do Projeto do CDC, por entender que seria “juridicamente impró-pria a equiparação de compromisso administrativo a título executivo extrajudicial (CPC, art. 585, II).”

Tal veto tem sido bastante criticado pelos operadores do Direito, sob argumento de que inexiste qualquer impedimento de natureza técnica para que o CDC, como uma lei fede-ral, reconheça um novo título executivo extrajudicial, conforme permite o inciso VIII, do arti-go 585, do CPC. Argumenta-se, também, que “o compromisso de pagar certa quantia em dinheiro, a título de cominação, nada tem de incompatível como título executivo extrajudici-al”. Aliás, é o entendimento do ilustre Kazuo Watanabe também externado na obra Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto (Ada Pellegri-ni Grinover et al. 9ª ed. Rio de Janeiro: Forense UPellegri-niversitária, 2007).

Além disso, registra com propriedade o citado jurista que:

“Demais, o veto é de todo inócuo pelas mesmas razões alinhadas no item anterior. É que o artigo 113 das Disposições Finais do Código acrescentou o § 6º ao art. 5º da Lei nº 7.347/85, que tem a mesma redação do texto vetado: ‘§ 6º. Os órgãos públicos

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legitimados poderão tomar dos interessados compromisso de ajustamento de conduta às exigências legais, mediante cominações, que terá eficácia de título executivo extra-judicial’. E esse dispositivo não foi vetado. Assim, pela perfeita interação entre o Código e a Lei de Ação Civil Pública (Lei nº 7.347/85), nos termos dos arts. 90, 110, 111 e 117 daquele diploma legal, também o referido § 6º do art. 5º da Lei nº 7.347/85 é aplicável na tutela dos interesses e direitos dos consumidores.” (in verbis, grifo nosso)

Note-se, ainda, que ao se referir aos órgãos públicos legitimados, tal dispositivo está se referindo àqueles elencados nos artigos 5º da Lei de Ação Civil Pública (LACP), e no artigo 82 do CDC, ou seja: o Ministério Público; a Defensoria Pública; a União, os Estados, o Distri-to Federal e os Municípios; a autarquia, empresa pública, fundação ou sociedade de economia mista; a associação que, concomitantemente, esteja constituída há pelo menos 1 (um) ano nos termos da lei civil; e que inclua, entre suas finalidades institucionais, a proteção ao meio am-biente, ao consumidor, à ordem econômica, à livre concorrência ou ao patrimônio artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico.

O parágrafo único acrescido ao artigo 102 do CDC pelo Segundo Substitutivo ao PL nº 6.301/2005, de acordo com a redação abaixo reproduzida, tem função pedagógica e visa reintroduzir, no citado diploma legal, dispositivo que foi objeto de veto presidencial por não ter deixado expressamente claro que os crimes de responsabilidade (Lei nº 1.079, de 10 de abril de 1950) somente se configurariam por descumprimento de decisão judicial transitada em julgado em ação mandamental visando compelir o Poder Publico competente a proibir, em todo o território nacional, a produção, divulgação, distribuição ou venda, ou a determi-nar alteração na composição, estrutura, fórmula ou acondicionamento de produto, cujo uso ou consumo regular se revele nocivo ou perigoso à saúde pública e à incolumidade pessoal:

“Art. 102... Parágrafo único - O retardamento pela autoridade competente, por mais de 60 (ses-senta) dias, do cumprimento de decisão judicial transitada em julgado em ação de que trata este artigo configura crime de responsabilidade, nos termos da Lei." (NR) (in verbis)

O inciso IX-A que o legislador visa acrescer ao artigo 106 do CDC é fruto do aperfei-çoamento jurídico da redação dada ao inciso XII do artigo 106 do Projeto do CDC, que foi corretamente vetado por infringir a competência privativa da Presidente da República de cele-brar tratados, convenções e atos internacionais, conforme previsto no inciso VIII do artigo 84 da CF.

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Como se vê no dispositivo a seguir transcrito, com a redação proposta fica evidenciado que o Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor (DPDC), criado pelo Decreto nº 2.181, de 20 de março de 1997, que “Dispõe sobre a organização do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor – SNDC, estabelece as normas gerais de aplicação das sanções admi-nistrativas previstas na Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990, revoga o Decreto nº 861, de 9 de julho de 1993, e dá outras providências”, também tem como atribuição a de celebrar convênios com entidades nacionais:

“Art. 106... ... IX-A - celebrar convênios com entidades nacionais;

..." (NR) (in verbis) Por fim, o artigo 3º do Segundo Substitutivo ao PL nº 6.305/2005 estabelece que, no caso de aprovação desta proposição legislativa, nos termos da CF, sua vigência dar-se-á na data de sua publicação.

Referências

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