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CINEMA MODERNO E CINEMA INDUSTRIAL: CONFRONTOS ESTÉTICOS E IDEOLÓGICOS DO CINEMA BRASILEIRO NAS DÉCADAS DE 50 E 60.

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CINEMA MODERNO E CINEMA INDUSTRIAL: CONFRONTOS ESTÉTICOS E IDEOLÓGICOS DO CINEMA BRASILEIRO NAS DÉCADAS DE 50 E 60.

Autor: Douglas Gasparin Arruda Orientador: José Roberto Braga Portella

Palavras-chave: cinema brasileiro moderno – historiografia cinematográfica –

cinema industrial.

O seguinte projeto monográfico procura analisar os discursos conflitantes e contraditórios presentes entre os autores que buscavam defender uma proposta estética diretamente influenciada pelo cinema moderno1 e aqueles que produziram seus filmes para a Indústria Cinematográfica Vera Cruz, em um modelo de produção semelhante ao utilizado pela indústria hollywoodiana. Para análise desses discursos, utilizarei como fundamentação teórica autores desses dois modelos cinematográficos, e como fonte primária serão observados os filmes Rio 40 graus, de Nelson Pereira dos Santos, filme bastante influenciado pelo neo-realismo italiano e realizado pelo diretor que, anos mais tarde, seria um dos representantes do Cinema Novo, e O cangaceiro, de Lima Barreto, um dos principais filmes produzidos pela Vera Cruz.

Esse trabalho também buscará observar como determinados intelectuais, pesquisadores de cinema e cineastas, analisaram esse contexto do cinema brasileiro da década de 50, criando uma historiografia cinematográfica que, de certa forma, privilegia uma determinada produção estética e deixa em segundo plano outros projetos cinematográficos, principalmente aqueles ligados à produção industrial com finalidade lucrativa. Procurei escolher principalmente autores que escreveram no período próximo a década de 50, como o cinemanovista Glauber Rocha, Ismail Xavier e Jean-Claude Bernardet.

Durante os primeiros anos da década de 60, o Cinema Novo foi marcado por uma tentativa de ruptura, acima de tudo, com um modelo industrial hollywoodiano. Segundo um dos principais teóricos do Cinema Novo, Glauber Rocha, a produção cinematográfica que estava sendo realizada no Brasil (referindo-se essencialmente aos filmes destinados ao entretenimento popular) reproduzia os moldes, técnicas e padrões do que se convencionava serem característicos das produções realizadas em Hollywood; produções com objetivos capitalistas, que acabavam servindo para a alienação popular. No epicentro dessas críticas encontrava-se a Companhia Cinematográfica Vera Cruz, produtora de diversos filmes principalmente nos anos 50, e que, por sua vez, rebate as críticas quanto ao seu caráter meramente industrial capitalista, afirmando ser conveniente para o Cinema Novo relacionar Vera Cruz e Hollywood, uma vez que identificava dois inimigos a serem combatidos: o cinema de entretenimento popular brasileiro e o cinema capitalista hollywoodiano.

Diante dessas discussões, relacionando-as com as influências exercidas pelo contexto sócio-político e cultural nas produções (essencialmente, a divisão do mundo entre o bloco capitalista e o bloco comunista), busca-se compreender as contradições

1

O surgimento e as características estéticas e ideológicas do cinema moderno são analisadas por Ismail Xavier em seu livro O discurso cinematográfico: opacidade e transparência. 3ª ed. São Paulo: Paz e Terra, 2005. Abordando especificamente o cinema moderno no Brasil temos o livro, também de Ismail Xavier, O cinema brasileiro moderno. São Paulo. Editora Paz e Terra S/A, 2001.

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implícitas nos diferentes projetos estéticos de cinema, utilizados tanto pelos cinemanovistas quanto pela Companhia, bem como as motivações tanto ideológicas quanto financeiras inseridas nessas críticas.

A Companhia Cinematográfica Vera Cruz surge em 1949, na cidade de São Paulo. Nessa época foram criadas mais cinco companhias cinematográficas, resultando, no período de três anos, em mais de duas dezenas de produções fílmicas. O nascimento dessas companhias está diretamente ligado com a relação existente entre a burguesia paulista, o mecenato cultural e a cultura cinematográfica que se desenvolvia na capital. Além dos fatores internos, pode-se inferir que fatores de ordem externa, como o renascimento do cinema pós-guerra em inúmeros outros países, além dos grandes produtores tradicionais, tiveram influência no aumento da produção cinematográfica em escalas mundiais. A produção internacional deixa, então, de ser privilégio dos clássicos centros produtores (Estados Unidos, França, Itália, Alemanha e União Soviética). A implantação dos grandes estúdios surge no bojo de uma ideologia nacional-desenvolvimentista de crença e euforia nas possibilidades, então vislumbradas, de desenvolvimento da indústria brasileira em setores antes não explorados – dentre eles, o cinema.

Pela primeira vez no Brasil nasce uma companhia cinematográfica que conta com o apoio de uma elite intelectual e econômica, onde o cinema deixa de ser considerado uma atividade marginal. As pretensões da companhia estavam em seu próprio lema: “Produção brasileira de padrão internacional2”. Nesse sentido o objetivo da Companhia era fazer filmes de alto nível técnico, pretensão essa que seria garantida por diretores e profissionais europeus, bem como a construção de estúdios gigantescos e caros (que, segundo Fernão Ramos, tomam como modelo os estúdios de Hollywood3), além da importação dos melhores equipamentos disponíveis no mercado internacional. A Vera Cruz tem seu star-system baseado em moldes hollywoodianos também, que são constantemente realimentados pelo Departamento de Propaganda.

Ao passo que a Companhia Vera Cruz passava por grandes dificuldades administrativas (apesar de todos os problemas financeiros, continua ativa até os dias de hoje), outros projetos de cinema ganham destaque no Brasil, incentivados por experiências cinematográficas que fugiam dos moldes hollywoodianos de produção e estética. Essas novidades do cinema internacional, em especial o italiano com seu neo-realismo, vão influenciar decisivamente cineastas brasileiros, principalmente após a segunda metade da década de cinqüenta.

No plano político, o fim dos anos cinqüenta e o começo dos anos sessenta foram marcados por uma crescente radicalização da esquerda revolucionária no Brasil, que objetiva implantar as reformas de base que trariam maior igualdade e justiça social para a população. Essa esquerda rivalizava diretamente com os interesses da burguesia, que se atrelava cada vez mais ao capital externo. De certa forma, a esquerda passou, cada vez mais, a considerar como alienante toda a cultura que não fosse engajada. O Cinema Novo, movimento surgido nesse período, se constitui como grupo enquanto oposição ao esquema industrial da produção cinematográfica desenvolvida em São Paulo nos primeiros anos da década de cinqüenta. “Queremos fazer filmes anti-industriais; queremos fazer filmes de autor, quando o cineasta passa a ser um artista comprometido com os grandes problemas do seu tempo; queremos filmes de combate na hora do combate e filmes para construir no Brasil um patrimônio cultural4”. Esse tipo de

2

RAMOS, Fernão (org). História do Cinema Brasileiro. São Paulo, Arte Editora, 1987.p. 205

3

Idem, p.205 4

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cinema, onde o engajamento político é o eixo fundamental na construção da narrativa, não é uma exclusividade do cinema novo brasileiro; a difusão dos chamados “cinemas nacionais” 5 ganha força em várias regiões do mundo, especialmente no cenário de disputa entre os blocos socialistas e capitalistas pela hegemonia mundial.

Na busca pelo desenvolvimento e evolução da problemática proposta, será feita uma investigação livros que condensam as propostas tanto do Cinema Novo e dos Cinemas Modernos quanto da Vera Cruz. Nesse sentido, se confrontar críticas de Glauber Rocha, presentes em seu livro “Revolução do Cinema Novo” com um livro recentemente publicado pela Vera Cruz, cuja visão apresenta o ponto de vista de funcionários da indústria, podemos observar a existência de contradições presentes nos discursos ideológicos; para os artistas e funcionários da Vera Cruz, os filmes que faziam não tinham como objetivo a mera reprodução de um padrão estético e ideológico, como denunciavam alguns cinemanovistas. A relação dos livros com outras referências bibliográficas teóricas sobre o tema permite questionar sob que parâmetros alguns teóricos, como Glauber Rocha, baseiam suas críticas, bem como quais ideologias influenciam suas proposta de cinema. Glauber Rocha, em sua explanação sobre o Cinema Novo, afirma que:

“Nosso cinema é novo porque o homem brasileiro é novo e a problemática do Brasil é nova e nossa luz é nova e por isso nossos filmes nascem diferentes dos cinemas da Europa. [...] Não existe na América Latina um movimento como o nosso. A técnica é haute couture, frescura para a burguesia se divertir. No Brasil o cinema novo é questão de verdade e não de fotografismo. Para nós a câmera é um olho sobre o mundo, o travelling é um instrumento de conhecimento, a montagem não é demagogia, mas pontuação do nosso ambicioso discurso sobre a realidade humana e social do Brasil! Isso é quase um manifesto6.”

Contrário ao cinema proposto pela Vera Cruz, uma vez que, segundo os cinemanovistas, era um cinema realizado por estrangeiros, esses autores também faziam críticas quanto à estrutura do estúdio, considerado uma matriz hollywoodiana emuladora de sua estética e meio de produção. Diante do engajamento social dos realizadores do Cinema Novo, também há criticas quanto a não preocupação em mostrar a realidade do país. O livro sobre Vera Cruz rebate as críticas ao modelo de estúdio, afirmando que a Vera Cruz jamais se espelhou nos grandes estúdios. As referências vieram da longa experiência européia, tendo um pouco da Cineccitá italiana e dos estúdios da Ealing britânica7. Analisando tais fontes, observa-se então que tanto Glauber Rocha e os intelectuais que defendiam as propostas de um cinema moderno quanto a companhia Vera Cruz são permeados por discursos ideológicos, e, portanto, dotados de interesses específicos. Analisar as intenções e as motivações implícitas nesses discursos, relacionando com as influências do contexto em que foram criados é essencial, portanto, para compreender essas contradições.

Através da leitura da bibliografia analisada nesse trabalho, é possível observar que existe uma tendência da historiografia do cinema brasileiro posterior a década de sessenta de representar o Cinema Novo e o Cinema Moderno e seus autores como providos de um senso crítico em relação aos problemas sociais do Brasil, ao passo que descrevem a Vera Cruz como uma indústria de cinema alienada e alienante, emuladora de uma indústria Hollywoodiana. Em defesa à Vera Cruz temos um livro, escrito por ex-funcionários da Companhia, que tenta se defender dessas acusações, mostrando outra versão da história dessa indústria. Porém, é preciso frisar que existe um longo período

5

HENNEBELLE, Guy. Os Cinemas Nacionais contra Hollywood. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1978. 6

ROCHA, Glauber. Revolução do Cinema Novo. Rio de Janeiro, Alhambra/Embrafilme. 1981. p. 17.

7

MARTINELLI, Sérgio (org). Vera Cruz. Imagens e História do Cinema Brasileiro. São Paulo, Abook editora, 2005 p.160

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entre a produção historiográfica de esquerda, engajada politicamente, que enaltecia as qualidades e benefícios do cinema militante, e o lançamento do livro Vera Cruz –

imagens e memória do cinema brasileiro, lançado pela Abook editora, em 2005. As

acusações dessa historiografia do cinema brasileiro são feitas em uma conjuntura política muito diferente, e seus autores estavam preocupados com problemas de ordem política (regimes ditatoriais de direita, luta pela hegemonia mundial entre os blocos capitalista e socialista, etc), específicos do seu período.

O estudo das diferentes interpretações sobre a história do cinema nacional

produzido nas décadas de cinqüenta e sessenta, com bases na análise de materiais tanto da Vera Cruz quanto do Cinema Novo e do Cinema Moderno, ajuda-nos a compreender melhor as motivações por trás dos discursos conflitantes na cinematografia brasileira. Não tentarei aqui buscar inocentes ou culpados, muito menos apontar quais projetos estéticos do cinema são “melhores” ou mais “artísticos” do que outros; quero, com esse trabalho monográfico, confrontar esses diferentes discursos para, ao final, perceber como e com que motivações eles são construídos.

Estruturalmente, esse trabalho monográfico será dividido da seguinte forma: em um primeiro momento, apresentarei uma análise fílmica das fontes Rio, 40 graus e O

Cangaceiro, observando as especificidades presentes tanto na estética quanto na

narrativa desses filmes. Os autores que utilizarei para fundamentar minha análise fílmica e estética serão, essencialmente: Peter Burke, Willian Guynn, Robert A. Rosenstone, Marc Ferro, Ismail Xavier e Jacques Aumont.

Em seguida, pretendo inserir as fontes em seus respectivos movimentos cinematográficos, observando como os diretores se utilizam das técnicas de cinema, já conhecidas em outros países, para criar, no Brasil, filmes inovadores. Partindo dessa análise, entrarei nas características específicas do contexto sócio-econômico e político e como elas interferem diretamente na forma como se fez (e como se tentou fazer) cinema no Brasil na década de cinqüenta.

Por fim, vou analisar como os autores escreveram a história do cinema brasileiro da década de 50, observando como os diferentes discursos foram construídos no interior dessas propostas cinematográficas e nesse contexto específico da Guerra Fria. Um dos problemas está no fato de existir uma grande distancia temporal entre os autores que denunciaram os problemas do cinema industrial hollywoodiano da Vera Cruz e aqueles que a defenderam, e, decorrente disso, os contextos onde surgem esses discursos acabam se mostrando completamente diferentes. Contudo, acredito ser fundamental para o trabalho observar o método utilizado pelos ex-funcionários da Vera Cruz para se defenderem, mesmo que muito tempo depois, até mesmo para compreender melhor a forma como os autores defendiam o Cinema Novo e, ao mesmo tempo, militavam contra o sistema capitalista e toda a cultura “alienante” nele contida, atacando filmes e diretores específicos.

As duas obras que serão analisadas no trabalho, Rio 40 Graus, do diretor Nelson Pereira dos Santos, influenciado diretamente pelo cinema neo-realista italiano (considerado por alguns como uma das raízes do cinema moderno), e O cangaceiro, de Lima Barreto, foram escolhidas por sua relevância dentro da história do cinema nacional. Este, produzido pela Companhia Cinematográfica Vera Cruz no ano de 1952, trata-se do primeiro filme realizado por Lima Barrento na Companhia, e é considerado um dos filmes mais importantes dessa indústria, e, também, um dos mais lucrativos do cinema nacional da década de 50. É, também, um filme com repercussão internacional, ganhando, inclusive, premiações no Festival de Cannes. Já Rio, 40 graus, lançado em 1955, inspirou o movimento do Cinema Novo, e, para os membros desse movimento, foi um filme inovador pelo fato de apresentar a realidade brasileira nos cinemas.

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Glauber Rocha, em seu livro Revisão crítica do cinema brasileiro, vai afirmar que este seria “o primeiro filme verdadeiramente engajado”, e diz que esse foi o filme decisivo para que decidisse iniciar sua carreira como cineasta. A novidade, contudo, não está na estética nem na tentativa de se contar no cinema histórias mais focadas nos problemas sociais ou políticos, já que isto já havia sido feito pelo cinema neo-realista italiano, mas sim no fato de se tentar construir no Brasil um tipo de cinema semelhante, capaz de denunciar as mazelas da sociedade brasileira.

Referências

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