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AS QUATRO PAREDES DE UMA SALA DE AULA: EXPERIÊNCIA COMO PROFESSORAS DE PFOL

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Academic year: 2021

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AS QUATRO PAREDES DE UMA SALA DE AULA: EXPERIÊNCIA COMO PROFESSORAS DE PFOL

Viviane Bagio Furtoso (Universidade Estadual de Londrina) Ivone SANTANA (Graduação-Universidade Estadual de Londrina) Maria José Inácio COSTA (Graduação-Universidade Estadual de Londrina)

ABSTRACT: This paper aims at presenting some reflections on the experience of teaching Portuguese to Asians. It will cover: 1. aspects of both teacher education and teaching-learning process; 2. analysis of linguistic aspects and 3. contributions to the area of Portuguese to Speakers of Other Languages teacher education. KEYWORDS: teacher; teaching; Portuguese; speakers of other languages.

0. Introdução

Dentre as línguas estrangeiras estudadas no Brasil, a língua portuguesa para estrangeiros vêm surpreendendo as pessoas, as quais desconhecem e ficam surpresas ao ouvir falar; ao mesmo tempo que, considerada ainda uma área recente, vem recebendo cada vez mais atenção de professores e pesquisadores devido ao aumento da procura pela aprendizagem desta por: alunos universitários envolvidos em programas de intercâmbios interinstitucionais, funcionários de empresas estrangeiras com filiais no Brasil, pessoas que vêm morar, permanentemente, ou não, no Brasil, e, interessados em conhecer a língua, aprofundar-se em aspectos da cultura.

Com isso, fica evidente que aumentou a necessidade de professores, especialmente com formação específica para ensinar Português para Falantes de Outras Línguas (PFOL).

Cabe frisar que as universidades, normalmente, não oferecem formação específica para o futuro professor de PFOL na Graduação; isto acontece, geralmente, mais tarde, na especialização, mestrado ou doutorado.

Apesar do nosso curso de graduação (Letras) não ofertar na grade curricular, disciplinas que contemplassem aspectos do ensino de PFOL, tivemos a oportunidade de participar de cursos, projetos de pesquisa e extensão que, conseqüentemente, permitiram o acesso à sala de aula.

A experiência com a prática de sala de aula possibilitou-nos o contato com filhos de imigrantes nas escolas públicas e, mais tarde, com universitários acadêmicos que vieram para o Brasil através de programas de intercâmbio entre a Universidade Estadual de Londrina (UEL) e universidades do Japão, dentre outras.

Por influência do processo de imigração em Londrina e região, a maioria de nossos alunos, durante o período de participação nos projetos e cursos acima mencionados, foram de origem asiática, mais especificamente, japoneses e chineses. Sendo assim, o objetivo desse artigo é relatar nossas experiências como professoras de PFOL para falantes de língua japonesa nos diferentes contextos vivenciados.

Num primeiro momento, abordaremos aspectos da formação do professor e do processo de ensino-aprendizagem, tais como, conhecimento da língua materna do aluno, ensino de gramática, material didático e espaço físico. Já no segundo momento, trataremos dos aspectos lingüísticos destacados no processo de ensino/aprendizagem dos alunos, especificamente, os fonético prosódico e morfossintático. E, finalmente, concluiremos este artigo com reflexões sobre a contribuição que essa experiência pode oferecer à formação do professor de PFOL.

1. Professor: aspectos da formação e do processo de ensino-aprendizagem

Nesta seção do artigo apresentaremos alguns dos aspectos mais discutidos e questionados por nós durante a participação em projetos de pesquisa como alunas de iniciação científica e em cursos de caráter extensionista. Ressaltamos que essas reflexões foram provocadas por leituras e discussões teóricas, tendo sido de suma importância a experiência prática para complementar e alimentar as implicações teóricas de nosso trabalho.

1.1 Conhecimento da língua materna do aluno

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Questionamentos como ter conhecimento ou não da língua materna do aluno para o ensino/aprendizagem de PFOL sempre estiveram presentes em nossas discussões. A princípio pensávamos ser necessário saber a língua do aluno para podermos ministrar as aulas. Mas com a prática percebemos que o ensino é possível mesmo sem o conhecimento da mesma. Uma justificativa para tal conclusão foi que, em um determinado contexto, as aulas foram divididas entre duas de nós, sendo que uma falava a Língua Materna (LM) do aluno, no caso, a japonesa, e a outra não. Analisando o andamento das aulas observamos que a falta de conhecimento da LM do aluno por uma das professoras dificultou um pouco a comunicação em sala de aula, pelo menos no início, o que não impediu o entendimento e progresso dos alunos, que se comunicavam entre si em sua língua materna para tirar dúvidas quando não entendiam o que a professora falava. Assim, pudemos constatar que essa diferença não interferiu no aprendizado dos alunos.

Um outro fator importante neste processo inicial de contato com a sala de aula, partindo da premissa de que acreditávamos que o conhecimento da LM do aluno era imprescindível para ensinar PFOL, foi a influência de nossas experiências como aprendizes de língua estrangeira (LE) para entender as dúvidas e os caminhos percorridos pelos estrangeiros para aprender uma outra língua. Ensinar uma LE não demanda apenas conhecimento lingüístico por parte do professor.

Neste sentido, corroboramos o posicionamento de Bizon (1992) quando afirma que não há necessidade do professor de PFOL ser bilíngüe, isto é, dele ser proficiente na sua língua materna e na do aluno. No entanto, é importante que ele tenha versatilidade e conhecimento de uso de recursos extralingüísticos, fator esse muito importante, principalmente no início do processo de interação com o aluno.

1.2 Ensino de gramática

Temos observado que para a maioria dos estrangeiros aprender a língua portuguesa significa aprender a gramática. Em geral eles têm uma grande preocupação em fazer uso da língua de acordo com a norma culta.

Especificamente, nossos alunos também compartilhavam dessa visão, embora encontrassem dificuldades para se comunicar.

Nesse contexto, trabalhamos a gramática de forma contextualizada, através de textos, discussões sobre temas sócio-culturais, etc., evitando falar de aspectos da gramática que não fossem lhes servir para nada. Esse foi um momento em que eles expressavam suas idéias, falavam sobre suas experiências no país de origem, e assim, aos poucos, muitas vezes eles mesmos iam descobrindo onde se encaixavam partes dos aspectos gramaticais que não sabiam como usar, principalmente os verbos.

Os objetivos dos alunos quanto ao aprendizado da língua portuguesa, especificamente a “gramática normativa”, ajudou-nos a definir o que abordar com profundidade, e com isso, alcançarmos o sucesso.

Desse modo, as aulas se tornaram mais produtivas à medida que abordávamos assuntos de interesse dos alunos. Esta abordagem permitiu que os próprios alunos sugerissem mudanças para as próximas aulas, demonstrando-se interessados e identificando suas próprias estratégias de aprendizagem.

Sendo assim, concluímos que não devemos ignorar a preferência dos alunos pela aprendizagem da gramática, uma vez que ela é realmente importante, mas permitir a eles que experimentem um contato com a língua em uso, isto é, de forma contextualizada.

1.3 Material didático

Apesar de termos conhecimento do material didático da área de PFOL existente no mercado, não foi possível a adoção de um livro devido ao contexto. No caso dos intercambistas, por estarem de passagem por um período curto pelo Brasil, enquanto os filhos de imigrantes matriculados em escolas públicas apresentavam dificuldades específicas em níveis de aprendizagem diferenciados, além da incompatibilidade de horário para atendimento em grupos. Sendo assim, o material utilizado nas aulas foi elaborado por nós de acordo com o estágio de aprendizagem do aluno.

Em sala de aula, utilizamos recursos audiovisuais diversos e esporadicamente, trabalhamos também em ambientes diferentes, tais como museus, feiras, festas, shopping e supermercados, de modo a contextualizar determinados textos e possibilitar maior naturalidade nas discussões sobre aspectos culturais.

Entretanto, reconhecemos que a adoção de um livro didático é importante tanto para o professor como para o aluno. Isso não quer dizer que devemos segui-lo com rigidez, pois, concordamos com Morita (1992) que nenhum material didático supre 100% aos interesses e necessidades dos aprendizes, não satisfazendo totalmente o professor, visto que, por melhor que seja o livro didático adotado pelo professor, esse deve ser a enriquecido com materiais alternativos dependendo da necessidade de seu aluno.

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Neste sentido, destacamos as palavras de O’Neil que defende o uso do material didático em sala de aula e assegura que nenhum livro é tão hermético que não permita que o professor faça suas adaptações e crie ou acrescente outras atividades que sejam necessárias (apud FURTOSO,2001, p.91).

1.4 Ambiente físico

Falar sobre esses assuntos parece até óbvio, pois acontece em geral e não só em PFOL; porém, percebemos que faltou um espaço físico adequado e recursos para o ensino de línguas. O ambiente onde lecionamos dificultou bastante o ensino/aprendizado, pois o excesso de claridade prejudicava tanto a nós, professoras, quanto à visualização do quadro por parte dos alunos, além do espaço ser pequeno e as carteiras desconfortáveis.

Ainda, a partir da experiência, achamos relevante destacar a falta de equipamentos, como TV, vídeo e som em sala de aula. Quando precisávamos, sempre tínhamos que improvisar de alguma forma; levar de casa, levar os alunos a outro lugar, no caso da TV e vídeo.

Todos esses fatores nos fizeram encontrar muitas dificuldades em manter a qualidade do processo de ensino/aprendizagem durante as 3 horas de aula por dia que tínhamos, que multiplicadas por 3 encontros semanais totalizavam 9 horas de aula por semana. Percebemos que foi muito cansativo tanto para nós professoras quanto para os alunos, pois a situação exigia muito mais empenho de nossa parte, principalmente pelas limitações do espaço físico.

2. Alunos: aspectos lingüísticos

No decorrer das aulas, os estrangeiros apresentaram, na aprendizagem da oralidade e da escrita do português, várias trocas na sua interlíngua, especificamente no que diz respeito aos aspectos lingüísticos, como fonético prosódico e morfossintático.

Com base nos estudos da área da Lingüística Contrastiva e Análise de Erros, reconhecemos que o “erro” tem um papel importante no processo de aprendizagem. Essa fase de transição entre a LM e a língua alvo, chamada de interlíngua, permite a intervenção do professor como facilitador do processo. Para a análise dos aspectos lingüísticos tomamos como base o trabalho de Lunardelli (2000).

2.1 Fonético prosódico

Durante as aulas foram detectados fonemas recorrentes que faziam alterar a pronúncia da palavra. Os japoneses, na expressão oral e na leitura, apresentam grande recorrência de rotacismos = a troca de /l/ por /r/: praca, bicicreta. Também se percebe a troca /lh/ por / r/: orera, maraviroso. Ainda há a recorrência da troca /ão/ por /on/: pon, japon. Percebeu-se ainda uma freqüência de vogais fechadas /ê/ e /ô/ no lugar das vogais abertas /é/ e /ó/: bóla (bôla). Os alunos tendem a ter uma preferência por oxítonas, no lugar de paroxítonas e proparoxítonas.

2.2 Morfossintático

Verificamos uma presença significativa em relação à concordância nominal, casos de gênero – uso do masculino no lugar do feminino: um xícara, o massa, meu irmã, e número – uso do singular no lugar do plural: dois cadeira, três pão.

Todas as trocas, nos contextos em que trabalhamos, foram observadas pelos próprios aprendizes, os quais achavam que estavam cometendo um grande “erro”; para eles tudo teria que ser conforme a gra mática normativa.

Geralmente, ao escrever, os alunos perguntavam se estavam errados, demonstrando medo de errar. Diante de tal atitude, procurávamos agir de forma com que o aluno não ficasse constrangido, com mais medo. Nós voltávamos a pergunta para ele, como: O que você acha? Assim, ele mesmo acabava encontrando a forma “certa”; quando não conseguia, é que interferíamos apresentando mais de uma alternativa para que ele escolhesse. Caso não conseguisse, falávamos a forma mais “correta”, explicando que essa era utilizada em determinadas ocasiões.

Quando, especialmente na fala, o aluno fazia trocas do tipo “lalanja”, bastava repetir a palavra em forma de pergunta (laranja?) para eles perceberem que havia algo de diferente e sem perguntas repetiam com vontade de aprender.

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Para corrigir a escrita, anotávamos discretamente alguns erros cometidos por eles no quadro, em forma de frases erradas e certas para que optassem por uma. Caso não conseguisse marcar a “correta”, mostrávamos por meio de questionamentos, explicando também porque as outras não estavam adequadas. Logo, fazíamos dos erros deles uma fonte para preparamos as próximas aulas. Nossa atitude, fosse na escrita ou na fala, era sempre de fazer primeiro com que o próprio aluno percebesse e tomasse a decisão de modificar sua produção oral e escrita e como fazê-la.

3. Considerações finais

Na prática de sala de aula, constatamos a relevância da participação em projetos os quais contribuíram para a nossa formação inicial como professoras de PFOL. Através dessa experiência pudemos nos conscientizar da importância de uma preparação específica para uma tarefa diferenciada daquela experimentada com o ensino de português para brasileiros. Além disso, nos colocou em contato com nossa própria cultura, nos fez olhar de forma crítica para nossas tradições, costumes, nos fez refletir a respeito do processo de ensino e levou-nos a concluir que tudo que fizemos ou passamos em sala de aula é diferente e é semelhante a outras formas de aprendizagem, visto que nenhum contexto é igual a outro e nem totalmente diferente, mas cada qual merece atenção especial. O professor de PFOL passa por dificuldades como qualquer outro professor, como problemas com o ambiente físico, alunos com níveis diferentes de aprendizagem e também sentem dúvidas nos momentos em que têm que prepararem suas aulas. Diante de tudo isso, houve algumas mudanças referentes as nossas crenças quanto ao ensino/aprendizagem de PFOL, o que pode ser visualizado no quadro abaixo.

.Quadro 1: Crenças sobre o ensino de PFOL.

ANTES DEPOIS

O professor teria que ser proficiente na língua materna do aluno.

Não precisa necessariamente ser proficiente na língua materna do aluno.

Haveria necessidade de se ensinar a gramática da forma tradicional.

Antes de mais nada, há a necessidade de conhecer seu aluno, ou seja, saber qual a sua nacionalidade, idade e, principalmente, seu objetivo com a Língua Portuguesa para então analisar como contextualizar o ensino de gramática.

Qualquer livro poderia ser utilizado para se ensinar português, inclusive os utilizados para se ensinar a língua materna.

É necessário adotar um livro preparado para estrangeiros, com textos que abordem a cultura brasileira e, mesmo assim, há a necessidade de complementá-lo com assuntos do cotidiano, expressões atuais, etc.

O ambiente físico poderia desfavorecer o ensino- aprendizagem.

O ambiente físico pode prejudicar o ensino-aprendizagem, mais do que imaginávamos.

Sendo assim, acreditamos que este trabalho tenha contribuído para desestabilizar algumas crenças que tínhamos antes de ir para a sala de aula, apontando, assim, caminhos para uma formação pautada na necessidade do professor pesquisar sua própria prática. Os aspectos levantados no quadro 1 não devem ser tomados como únicos e muito menos como soluções para o processo de ensino-aprendizagem de PFOL, mas como reflexões significativas no processo de nossa formação incial de professoras de PFOL. Diferente de um processo acabado, entendemos que isto é só o começo de um longo caminho a ser percorrido quando o lema é transitar livremente entre teoria e prática.

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RESUMO: Este artigo apresenta reflexões a partir da experiência de ensinar português para asiáticos. Serão abordados: 1. aspectos sobre a formação de professores e o processo de ensino-aprendizagm; 2.análise de aspectos lingüísticos e 3. algumas contribuições dessa experiência para formação inicial de professores de Português para Falantes de Outras Línguas.

PALAVRAS-CHAVE: professor;ensino; português; falantes de outras línguas.

REFERÊNCIAS BILIOGRÁFICAS

BIZON, A. C. C. Aprender conteúdos para aprender língua estrangeira: uma experiência de ensino alternativo de PE. In: ALMEIDA FILHO, J. C. P.; LOMBELLO, L. (Orgs.). Identidade e caminhos no ensino de

português para estrangeiros. Campinas: Pontes, 1992. p.17-48.

FURTOSO, V. B. Português Para Falantes de Outras Línguas: aspectos da formação do professor. Dissertação (Mestrado em Letras) – Programa de Pós – Graduação em Estudos da Linguagem, Universidade Estadual de Londrina, Londrina, 2001.

LUNARDELLI, M. G. Entre a Champs - Elysées e a Rua XV: um estudo dos aspectos interlingüísticos na aprendizagem do português para franceses em Curitiba/ Pr, 2000. Dissertação (Mestrado em Letras) - Programa de Pós – Graduação e Estudos da Linguagem, Universidade Estadual de Londrina, Londrina, 2000. MORITA, M. K. Diálogo à distância: uma extensão da sala de aula de língua estrangeira. In: ALMEIDA FILHO, J. C.; LOMBELLO, L. (Orgs.) Identidade e caminhos no ensino de português para estrangeiros. Campinas: Pontes, 1992. p. 49-57.

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