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A PESQUISA HISTÓRICO-EDUCACIONAL SOBRE AS INSTITUIÇÕES EDUCACIONAIS BRASILEIRAS: REFLEXÕES TEÓRICO-METODOLÓGICAS

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Academic year: 2021

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A PESQUISA HISTÓRICO-EDUCACIONAL SOBRE AS INSTITUIÇÕES EDUCACIONAIS BRASILEIRAS: REFLEXÕES TEÓRICO-METODOLÓGICAS

Décio Gatti Júnior1

Trata-se da comunicação das reflexões teóricas realizadas a partir do percurso traçado em investigação coletiva no âmbito da História da Educação, especificamente, na área da História das Instituições Educacionais, no período de 1994 a 2000, acerca dos processos de constituição e desenvolvimento das Instituições de Educação primária e secundária, na região do Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba, no período de 1880 a 1960.

O recorte espacial restringiu o âmbito da investigação, inicialmente, as cidades de Uberlândia, Uberaba e Araguari, motivado tanto pelas dificuldades do grupo de pesquisa em manter sua atuação investigativa em cidades mais distantes de Uberlândia como pela centralidade que estas cidades possuem nesta região. Ficaram de fora, por enquanto, cidades importantes como Araxá, Patos de Minas, Patrocínio, etc.

Quanto a delimitação temporal, optou-se por iniciar em 1880, época do surgimento das primeiras escolas nestas cidades e mesmo na região e finalizar em 1960, época do boom quantitativo do número de escolas e da explosão do número de alunos nas escolas já existentes, dada as dificuldades de trabalhar com um leque tão ampliado de instituições novas que, nesse momento, interessam menos que o estudo sobre aquelas fundadas no final do séc. XIX.

Desse modo, é reforçado nosso objetivo geral de, por meio da análise particular das instituições de ensino mais antigas destas cidades, aprender o complexo processo de

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Doutor em Educação: História e Filosofia da Educação pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Professor de História da Educação do Centro Universitário do Triângulo e da Universidade Federal de Uberlândia.

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constituição do ensino escolar na região e, sobretudo das representações sociais construídas em torno desse processo de escolarização.

Nas últimas décadas, a pesquisa histórica passou por um intenso processo de renovação teórico-metodológico, no qual vem sendo valorizada a utilização tanto dos aportes teóricos oriundos do campo da História quanto das evidências, sendo que estas não se limitam mais aos documentos escritos, mas abarcam fontes orais, iconográficas, etc.

Nesse sentido, o processo de construção de interpretação acerca da vida das Instituições Educacionais beneficia-se, sobretudo dos avanços significativos dos estudos sobre representações sociais, cultura escolar, elite, trabalho, grupos e classe sociais, bem como da constituição de tradições historiográficas mais sólidas no campos da História Oral, História da Imprensa, História do Pensamento Educacional, História das Idéias, etc.

Para a elaboração dessa reflexão teórica foram consultadas diversas fontes de informação, tais como: a ainda pequena bibliografia nacional e internacional sobre o assunto, seja por meio da leitura de textos mais teóricos ou mesmo resultados de investigações sobre a temática instituições educacionais publicados em forma de livro. Além disso, é importante ressaltar que foram utilizados os resultados já alcançados em pesquisa nesse campo temático provenientes das investigações realizadas pelo Núcleo de Estudos e Pesquisas em História e Historiografia da Educação do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Uberlândia, que é coordenado por cinco doutores da área de História da Educação, com a inclusão de diversos bolsistas de iniciação científica, aperfeiçoamento e mestrandos, ao longo dos últimos seis anos.

As inovações paradigmáticas, leia-se, de procedimentos investigativos no campo da História, impactaram sobre a produção da História da Educação, que se desvencilhou, nos últimos anos, da influência abstrato-filosófica, dos clérigos que ocupavam a cena acadêmica

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desta área de conhecimento e da influência macro-estrutural, operada pela Sociologia de base economiscista.

A História da Educação que, no Brasil, nasceu de "mãos dadas" com a Pedagogia, finalmente, posiciona-se, pelo menos, do ponto de vista paradigmático, na órbita da História e não mais da Educação. Sinal desse processo de mudança é o fato da Associação Nacional de História, em 1997, ter aprovado a criação de um Grupo de Trabalho dedicado à temática, mesmo que um grupo de trabalho da mesma natureza já exista há muitos anos entre os educadores em sua principal reunião anual, na ANPEd.

De certo modo, há um afastamento da produção proveniente do campo História da Educação do caráter prescritivo e justificador de antes e um redirecionamento no caminho da elaboração de interpretações sobre o passado educacional brasileiro em sua concretude, mediante consulta a uma série enorme de fontes primárias e secundárias que não mais apenas a legislação educacional.

Há um duplo movimento que tem beneficiado esse processo de inovação paradigmático e conseqüentemente temático no âmbito da História da Educação. De um lado o afluxo de pesquisadores qualificados (entre os quais estão muitos historiadores) para as diversas regiões brasileiras, que não estavam interessados em desenvolver pesquisas ancoradas nos grandes centros, mas sim, estudos voltados para à temática regional.

Por outro lado, estes mesmos pesquisadores - historiadores ou não - estavam sob o impacto das novas tendências da pesquisa histórica, nas quais as especificidades e singularidades regionais, ou mesmo, locais, passaram a ser consideradas como importantes objetos de estudo e, mais, são pesquisadores que promovem suas investigações sobre o passado apropriando-se de um corte eminentemente histórico, abandonando, deste modo, as imposições advindas, primeiro, do campo filosófico, em que prevalecia a concepção de que o

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pensamento educacional se sobrepunha à própria realidade da educação e, em segundo, do campo sociológico, já caracterizado acima.

A orientação teórica presente atualmente defende que o processo de construção de interpretações sobre o passado se faz no diálogo necessário entre nossas idéias e concepções e os indícios que conseguimos agrupar para corroborar nossas assertivas.

Nesse sentido, a História das Instituições Educacionais almeja dar conta dos vários atores envolvidos no processo educativo, investigando aquilo que se passa no interior das escolas, gerando um conhecimento mais aprofundado destes espaços sociais destinados aos processos de ensino e de aprendizagem. Parece-nos que a ênfase dada às análises mais sistêmicas cedeu lugar às análises que privilegiam uma visão mais profunda dos espaços sociais destinados aos processos de ensino-aprendizagem.

Nesse sentido, Justino Magalhães defende que

Compreender e explicar a existência histórica de uma instituição educativa é, sem deixar de integrá-la na realidade mais ampla que é o sistema educativo, contextualizá-la, implicando-a no quadro de evolução de uma comunidade e de uma região, é por fim sistematizar e (re)escrever-lhe o itinerário de vida na sua multidimensionalidade, conferindo um sentido histórico. 2

De fato, o que convencionamos chamar de História das Instituições Educacionais, tem ocupado cada vez mais espaço no cenário da pesquisa histórico-educacional, envolvendo uma série de pesquisadores.

No Brasil, ainda que com diversas dificuldades, devido à inexistência de repertórios de fontes organizados, alguns historiadores e educadores têm-se lançado à tarefa de historiar a educação escolar brasileira, através da construção de interpretações acerca das principais instituições educativas espalhadas pelas diversas regiões brasileiras3.

2

Justino MAGALHÃES. Contributo para a História das Instituições Educativas - entre a memória e o

arquivo. Universidade do Minho (mimeo.), p. 2. 3

Dentre os principais autores brasileiros podemos destacar: Ester BUFFA e Paolo NOSELLA. Scholla

Mater: A Antiga Escola Normal - São Carlos, 1911-1933 e Industrialização e Educação: A Escola Profissional de São Carlos, 1932 - 1971, Universidade Federal de São Carlos (ambos no prelo). E numa perspectiva um

pouco diferente podemos citar também o texto de Gilberto Luiz ALVES. O Pensamento Burguês no Seminário

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De modo geral, tanto as interpretações construídas por pesquisadores estrangeiros, quanto por brasileiros, têm seguido um roteiro de pesquisa bastante similar, em que se destacam preocupações com:

- os processos de criação e de desenvolvimento (ciclo de vida) das instituições educativas;

- a configuração e as mudanças ocorridas na arquitetura do prédio escolar; - os processos de conservação e mudança do perfil dos docentes;

- os processos de conservação e mudança do perfil dos alunos;

- as formas de configuração e transformação do saber veiculado nestas instituições de ensino, etc.

Desta forma, busca-se a apreensão daqueles elementos que conferem identidade à instituição educacional, ou seja, daquilo que lhe confere um sentido único no cenário social do qual fez ou ainda faz parte, mesmo que ela tenha se transformado no decorrer dos tempos.

Em um texto sobre historiografia brasileira o historiador Carlos Guilherme Mota entende que, enquanto a História do Brasil caminhava, nos anos setenta, em direção a constituir-se enquanto Ciência da História, a História da Educação tomava o caminho inverso, o de converter-se em uma disciplina de caráter utilitário e atendendo a objetivos de interpretar e explicar os processos históricos objetivos, visando obter justificativas para o presente4. Se levarmos em conta a data do referido escrito poderemos aquilatar a gravidade da afirmação.

A professora Mirian Jorge Warde, depois de proceder uma avaliação parcial dos trabalhos de pós-graduação na área de Educação, afirma que parcela considerável destes escritos dedicava espaço à História da Educação através da utilização de fontes secundárias, com a predominância dos estudos antecedentes, isto é, a História é chamada para justificar algo.

Silva Passos, A Educação das Virgens: um estudo do cotidiano do Colégio Nossa Senhora das Mercês, da cidade de Salvador, BA, noticiada pela Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, Brasília, 75(179-180-181):301-306, jan./dez. 1994.

4

Carlos Guilherme MOTA. A historiografia brasileira nos últimos quarenta anos: tentativa de avaliação crítica. Debate e Crítica. 5: 11-26. São Paulo. Mar. 1975.

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Segundo ela, os pesquisadores recuavam para períodos históricos passados com o objetivo de mostrar que o presente tem o contorno atual devido ao fato de o passado ter sido o que foi. Em período mais recente, um pequeno número de trabalhos de pós-graduação (8%) dedica-se integralmente ao estudo histórico da Educação Brasileira. Estes debruçam-se sobre temas estruturais e desencadeiam uma crítica corrosiva de conceitos, categorias, personalidades. Coincide a emergência desses trabalhos com a incidência de menor número de títulos referidos à História da Educação.5

Dermeval Saviani, em artigo publicado nos anos 70, entende que a Educação ficaria subsumida no termo História (em História da Educação), enfatizando que essa História não estaria melhor caracterizada uma vez que seria uma mescla de acontecimentos gerais com desfiar de doutrinas pedagógicas descontextualizadas e seu programa (enquanto disciplina curricular) traria um ecletismo de tal ordem que trata desde as instituições educacionais e doutrinas pedagógicas do período clássico até a época contemporânea. Propunha, o referido autor, uma saída para o impasse: os docentes deveriam propor seminários e grupos de estudos que permitissem superar a mesmice até então vigente.6

A produção de textos de História da Educação nos anos 1980 parece ter sido influenciada pelos textos acima referidos, em que pese ter diminuído em quantidade, em termos qualitativos houve ganhos substantivos.

Os anos noventa parecem apontar para a necessidade dos pesquisadores, se não abandonar, ao menos minimizar, as análises de fontes secundárias para centrar a pesquisa diretamente sobre as fontes primárias, na descoberta ou mesmo geração de documentos e de objetos para a História da Educação.

5

Mirian Jorge WARDE. Contribuição da história para a Educação. Em Aberto.. 9 (47): 3-11, Brasília. jul.-set. 1990. p. 9-10.

6

Dermeval SAVIANI. Função do Ensino de Filosofia da Educação e de História da Educação. In: Educação: do senso comum à consciência filosófica. 5ª Ed. São Paulo. Cortez. 1985.

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Assim sendo, a criação de núcleos dedicados à atividade de “garimpar” a matéria-prima da pesquisa num locus privilegiado por ser onde ocorre o fenômeno educativo, qual seja, as instituições educacionais, parece-nos muito promissora.

Percebe-se, por fim, que a pesquisa histórico-educacional beneficiou-se muito da renovação historiográfica recente, sofisticando suas ferramentas de trabalho e ampliando seu leque temático. Neste sentido, há uma série de procedimentos historiográficos que vem se tornando comuns no trato das instituições educacionais, estabelecendo, dessa forma, condições mais favoráveis para o entendimento dos processos de escolarização vivenciados no país.

Referências Bibliográficas

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São Carlos/SP. EDUFSCar. 1998.

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Referências

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