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As contribuições da justiça restaurativa na execução das medidas socioeducativas de privação e restrição de liberdade no município de Ponta Grossa - PR

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PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS

DOUGLAS DAL MOLIN

AS CONTRIBUIÇÕES DA JUSTIÇA RESTAURATIVA NA EXECUÇÃO DAS MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS DE PRIVAÇÃO E RESTRIÇÃO DE LIBERDADE

NO MUNICÍPIO DE PONTA GROSSA-PR

PONTA GROSSA 2019

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AS CONTRIBUIÇÕES DA JUSTIÇA RESTAURATIVA NA EXECUÇÃO DAS MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS DE PRIVAÇÃO E RESTRIÇÃO DE LIBERDADE

NO MUNICÍPIO DE PONTA GROSSA-PR

Dissertação aprovada como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre no Programa de Pós-Graduação em ciências Sociais Aplicadas, setor de Ciências Sociais Aplicadas da Universidade Estadual de Ponta.

Área de concentração: Cidadania e Políticas Públicas. Linha de pesquisa: Estado, Direitos e Políticas Públicas. Orientadora: Prof.ª Dra. Silmara Carneiro e Silva

Co-orientadora: Profª. Dra. Dircéia Moreira

PONTA GROSSA 2019

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Ficha catalográfica elaborada por Maria Luzia Fernandes Bertholino dos Santos- CRB9/986 CDD: 341.5

Molin, Douglas Dal

As contribuições da justiça restaurativa na execução das medidas socioeducativas de privação e restrição de liberdade no município de Ponta Grossa - PR / Douglas Dal Molin . Ponta Grossa, 2019.

191 f.

Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais Aplicadas - Área de Concentração: Cidadania e Políticas Públicas), Universidade Estadual de Ponta Grossa.

Orientadora: Profa. Dra. Silmara Carneiro e Silva. Coorientadora: Profa. Dra. Dircéia Moreira.

1. Política pública de socioeducação. 2. Justiça restaurativa. 3. Adolescente em conflito com a lei. 4. Medidas socioeducativas. I. Silva, Silmara Carneiro e. II. Moreira, Dircéia. III. Universidade Estadual de Ponta Grossa. Cidadania e Políticas Públicas. IV.T.

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À meus pais, que não pouparam esforços para me

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O período de graduação e de mestrado é um momento prazeroso, mas ao mesmo tempo difícil. Muitas alegrias, momentos bons e dias difíceis, que fazem com que eu valorize cada pessoa e situação que passou pela minha vida, sobretudo nesses últimos oito anos de caminhada.

Agradeço imensamente a meus pais, Celso Dal Molin e Márcia Pereira Dal Molin, que sempre me ajudaram emocional, amigável e financeiramente. Vocês me deram todo o suporte necessário para conquistar o que conquistei e ainda vou conquistar. Foram vocês que me ajudaram a chegar onde estou e sem vocês não conseguiria nada do que almejei ao longo dos anos. Outra pessoa da família, minha irmã, Dayane Dal Molin, também foi uma pessoa importante, que nos momentos de brigas, amizade, conselhos, sempre fez parte dos dias que foram construídos em todo esse tempo. Com o mais sincero amor, eu agradeço a vocês por tudo que me foi dado e ensinado em toda a minha vida. Estendo esse agradecimento a outros familiares, minhas avós e avô, tios e tias. Amo vocês.

Agradeço aos amigos de longa data que escutaram meus devaneios, angústias e felicidades. Vocês, André Cordeiro Frutuoso, Bruno Miranda Minski, João Henrique Dorneles Papi, Lucas Zolinger Mendes, Luis Henrique Silverio Rocha, Mariana Papi, Thairine Guimarães Cachuba e William Hass Zanoni são as pessoas que desde criança ou adolescência participaram das correrias mais loucas e me ajudaram a ser quem eu sou. Também à Bruna Heerdt, que neste ano de conclusão dessa etapa, com seu amor, amizade, incentivo e compreensão, colabora para meu crescimento pessoal e profissional; Está sempre disponível para me escutar, me ajudar e demonstrar orgulho – Meu bem, você é lar. A vida não é nada sem bons amigos e eu tenho certeza que encontrei na minha os melhores que poderia ter.

Ao Lobo Bravo Rugby, que foi onde encontrei um lugar fraterno com pessoas loucas e que dividem uma mesma paixão. São nos jogos e nas confraternizações que eu tiro o estresse, dou risadas e construo histórias que pra sempre serão lembradas. Em especial ao Aurélio Spegel, Paulo Jorge Harmuch Slompo, Zé Renato de Oliveira Miranda e Marcos Sung Il Jo, que gastaram madrugadas adentro em conversa, cerveja e incentivo. Vocês não fazem ideia de como foram importantes no meu processo de crescimento durante os nove anos de família LBR.

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processo que é fazer pesquisa e escrever uma dissertação. Dilermando Aparecido Borges Martins, João Guilherme Pereira Chaves, Maria Raquel Bacovis, Nara Luiza Valente, Paloma Graf e Paulo Pereira, muito obrigado por terem entrado na minha vida. Vocês todos são minha família também e sei que por onde eu andar levarei os ensinamentos e a certeza que terei pessoas incríveis para qualquer momento.

Agradeço à minha orientadora, Silmara Carneiro e Silva. Sem você não conseguiria desenvolver o trabalho que apresento aqui e não teria o conhecimento necessário para esse momento e para os que estão por vir. Dividiu angústias e felicidades ao longo desses meses de mestrado. Me incentivou, corrigiu e dividiu momentos importantes durante essa etapa. Sempre disposta a tirar dúvidas, sempre sorridente, sempre presente. Orientadora e amiga.

Aos membros da banca examinadora. Professora Doutora Elizabeth Trejos-Castillo, que tive a honra de conhecer, dividir viagens e experiências acadêmicas. Com certeza a senhora somou de forma acadêmica e também pessoalmente. Demonstrou grande comprometimento com o estudo de adolescentes em conflito com a Lei, receptividade a novos amigos e pesquisadores que encontrou no Brasil e carinho por todos a sua volta. Ainda, Professora Doutora Jussara Ayres Bourguignon que desde o início da pós-graduação abriu portas de seus grupos, projetos e eventos acadêmicos para que eu pudesse participar e ajudar. Consegui fazer muito da minha carreira acadêmica durante o período em que a auxiliei como bolsista CAPES e senti a retribuição pelos elogios e disposição em me ajudar no que fosse preciso. Você, assim como as outras professoras, também será lembrada durante toda minha vida profissional e pessoal.

Obrigado, também, à CAPES, que me deu suporte financeiro durante o mestrado e tornou possível esse momento.

Agradeço as pessoas que tornaram a pesquisa possível, diretora do Centro de Socioeducação de Ponta Grossa, diretor da Casa de Semiliberdade de Ponta Grossa e aos responsáveis pelas práticas restaurativas no Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania de Ponta Grossa. Vocês abriram as portas para que eu pudesse fazer tudo que era necessário no processo da pesquisa.

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Esta pesquisa trata dos temas socioeducação e Justiça Restaurativa. Focado na aplicação da Justiça Restaurativa na execução da medida socioeducativa de privação e restrição de liberdade. Busca responder à pergunta: como a Justiça Restaurativa tem sido recepcionada e incorporada pela política pública de Socioeducação no município de Ponta Grossa, a partir da Lei do SINASE, no âmbito da execução das medidas socioeducativas de privação e restrição de liberdade? Seu objetivo geral é analisar se a Justiça Restaurativa tem contribuído para o desenvolvimento da política pública de socioeducação, a partir da Lei do SINASE, no âmbito do processo de execução das medidas socioeducativas de privação e restrição de liberdade, no município de Ponta Grossa-PR. A metodologia empregada é de natureza qualitativa. A pesquisa se caracteriza como um estudo de caso. É composta pelas fases exploratória, bibliográfica, documental e de campo. Se utiliza dos seguintes instrumentais de coleta e análise de dados: análise documental, observação participante, entrevista semiestruturada e análise de dados por categoria. No decorrer do projeto serão abordadas as seguintes categorias: Adolescência, Estado, Políticas Públicas, Socioeducação e Justiça Restaurativa, os dois últimos focados não apenas no Brasil, mas também no Paraná e no município de Ponta Grossa. Foi realizado um mês de observação participante nos locais que compõem a pesquisa, sendo eles o Centro de Socioeducação, a Casa de Semiliberdade e o Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania. Na sequência foram realizadas entrevistas com sete sujeitos que formam a amostra. Os resultados obtidos mostraram que a Justiça Restaurativa está sendo recepcionada pela política pública de socioeducação, tanto nível jurídico-formal como em suas práticas de atendimento. No contexto da execução das medidas socioeducativas de privação e restrição de liberdade em Ponta Grossa a JR foi retratada como uma ferramenta que está contribuindo para o alcance dos objetivos da política pública de socioeducação, porém ainda é necessário maior investimento em estrutura física, recursos humanos e na formação de facilitadores no âmbito do sistema socioeducativo. Busca-se com esta pesquisa, contribuir para o debate acadêmico em torno do necessário aprimoramento da política pública de socioeducação no Brasil, partindo de uma análise aproximativa desta com o modelo de Justiça Restaurativa.

Palavras-chave: Política Pública de Socioeducação; Justiça Restaurativa;

Adolescente em conflito com a Lei; Medidas socioeducativas de privação e restrição de liberdade.

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This research deals with the themes of socioeducation and Restorative Justice. Focused on the application of Restorative Justice in the execution of the socio-educational measure of deprivation and restriction of freedom. It seeks to answer the question: how has the Restorative Justice been received and incorporated by the public policy of Socioeducation in the municipality of Ponta Grossa, based on the SINASE Law, in the scope of the execution of socio-educational measures of deprivation and restriction of freedom? Its general objective is to analyze if the Restorative Justice has contributed to the development of the public policy of socio-education, based on the SINASE Law, within the scope of the socio-educational measures of deprivation and restriction of freedom, in the city of Ponta Grossa-PR. The methodology used is qualitative in nature. The research is characterized as a case study. It is composed of the exploratory, bibliographic, documentary and field phases. The following data collection and analysis instruments are used: documentary analysis, participant observation, semi-structured interview and data analysis by category. During the course of the project, the following categories will be addressed: Adolescence, State, Public Policies, Socioeducation and Restorative Justice, the last two focused not only in Brazil, but also in Paraná and Ponta Grossa. One month of participant observation was carried out at the sites that comprise the research, being the Socioeducation Center, the Semiliberdade House and the Judicial Center for Conflict and Citizenship Resolution. Interviews were carried out with seven subjects who formed the sample. The results obtained showed that the Restorative Justice is being approved by the public policy of socio-education, both at the legal-formal level and in its care practices. In the context of the execution of the socio-educational measures of deprivation and restriction of liberty in Ponta Grossa, JR was portrayed as a tool that is contributing to the achievement of the goals of the public policy of socioeducation, but more investment in physical structure, human resources and in the training of facilitators within the socio-educational system. This research seeks to contribute to the academic debate about the necessary improvement of the public policy of socio-education in Brazil, starting from an approximate analysis of this with the Restorative Justice model.

Keywords: Public Policy of Socioeducation; Restorative Justice; Adolescent in conflict with the Law; Socio-educational measures of deprivation and restriction of freedom.

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CEJUSC – Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania CENSE – Centro de Socioeducação

CF/1988 – Constituição Federal de 1988

DSM-5 – Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais 5 DUDC – Declaração Universal dos Direitos da Criança

DUDH – Declaração Universal dos Direitos Humanos ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente

JR – Justiça Restaurativa

ONU – Organização Mundial das Nações Unidas PLS – Projeto de Lei do Senado

QI – Quociente de Inteligência

SINASE – Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo UEPG – Universidade Estadual de Ponta Grossa

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Quadro 1.1. – Especificações dos sujeitos de pesquisa...09

Quadro 1.2. – Critérios para o diagnóstico do Transtorno da conduta, segundo o DSM-5...27

Quadro 1.3. – Critérios para o diagnóstico do Transtorno da personalidade antissocial, segundo o DSM-5...29

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INTRODUÇÃO...13

CAPÍTULO 1 – A ADOLESCÊNCIA E O ADOLESCENTE EM CONFLITO COM A LEI: EXPRESSÕES CONTEMPORÂNEAS NO BRASIL...27

1.1. A ADOLESCÊNCIA E O ADOLESCENTE EM CONFLITO COM A LEI: ANÁLISE MULTIFATORIAL...27

1.1.1. Fatores biológicos...34

1.1.2. Fatores psicológicos...43

1.1.3. Fatores culturais...48

1.1.4. Fatores sociais...55

1.2. DADOS SOBRE OS ADOLESCENTE EM CONFLITO COM A LEI NO BRASIL...63

CAPÍTULO 2 – A POLÍTICA PÚBLICA DE SOCIOEDUCAÇÃO NO BRASIL: IMPLEMENTOS DA JUSTIÇA RESTAURATIVA À LUZ DO SINASE...69

2.1. A POLÍTICA PÚBICA DE SOCIOEDUCAÇÃO NO BRASIL E SUAS PRERROGATIVAS NO ECA E NO SINASE...79

2.1.1. O ECA e o SINASE no contexto do sistema de garantias de direitos...86

2.2. A JUSTIÇA RESTAURATIVA COMO INSTRUMENTO DE JUSTIÇA NA SOCIOEDUCAÇÃO...88

2.3. O DEBATE ATUAL SOBRE A REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL E O AUMENTO DO TEMPO DA MEDIDA SOCIOEDUCATIVA DE INTERNAÇÃO...98

CAPÍTULO 3 – PRÁTICAS RESTAURATIVAS NO ÂMBITO DAS MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS DE PRIVAÇÃO E RESTRIÇÃO DE LIBERDADE NO MUNICÍPIO DE PONTA GROSSA...106

3.1. RECEPÇÃO DA JR NA POLÍTICA PÚBLICA DE SOCIOEDUCAÇÃO NO PARANÁ E A INCORPORAÇÃO DE SUAS PRÁTICAS NO MUNICÍPIO DE PONTA GROSSA...107

3.2. ARTICULAÇÕES DA JUSTIÇA RESTAURATIVA NO CONTEXTO DA EXECUÇÃO DAS MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS DE PRIVAÇÃO E RESTRIÇÃO DE LIBERDADE...120

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DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE...136

3.4. AS CONTRIBUIÇÕES DA JUSTIÇA RESTAURATIVA NA EXECUÇÃO DAS MEDIDAS PRIVATIVAS E RESTRITIVAS DE LIBERDADE E SEUS DESDOBRAMENTOS PARA O DESENVOLVIMENTO INTEGRAL DO ADOLESCENTE NO MUNICÍPIO DE PONTA GROSSA...145

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS...154

REFERÊNCIAS...160

APÊNDICES...170

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INTRODUÇÃO

As sociedades estabelecem condutas consideradas ideais para o convívio social. Isto vale para os adolescentes, da mesma forma que para os adultos, enquanto membros da respectiva sociedade. Tais condutas são convencionadas social e culturalmente, ao passo que o seu desvio é regulamentado pela norma jurídica. Nesta interpretação, o desvio da norma, quando não solucionado dentro do seu ambiente familiar ou de apoio, pode receber intervenção estatal (SHECAIRA, 2015).

No Brasil, desde a Constituição Federal de 1988 (CF/1988) (BRASIL, 1988) e, consequentemente, com a promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) (BRASIL, 1990), o atendimento ao adolescente em conflito com a lei foi tomando corpo em meio às políticas públicas de atendimento à criança e ao adolescente, de forma diferente do que se tinha antes a partir deste marco.

Em 2012 foi sancionada a Lei do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE). Esta, “[...] regulamenta a execução das medidas destinadas a adolescente que pratique ato infracional” (BRASIL, 2012a, p. s/n) e amplia os meios apresentados pelo ECA (BRASIL, 1990) para responsabilizar e socioeducar os adolescentes que apresentam comportamentos, tidos como desviantes, reconhecidos pela lei penal, como crime ou contravenção penal. O SINASE, e junto o ECA e a Constituição Federal, normatizam o atendimento aos adolescentes em conflito com a lei no Brasil. Tais legislações fundamentam juridicamente a constituição e desenvolvimento das políticas públicas, voltadas a esse público no país. Política pública é “[...] ação pública, na qual, além do Estado, a sociedade se faz presente, ganhando representatividade, poder de decisão e condições de exercer o controle sobre a sua própria reprodução e sobre os atos e decisões do governo” (PEREIRA, 2008, p. 94).

A política pública é uma política de ação, que “[...] expressa, assim, a conversão de demandas e decisões privadas e estatais em decisões e ações públicas que afetam e comprometem a todos” (PEREIRA, 2009, p. 174). Nesse sentido, a Política Pública envolve o planejamento e execução do passo a passo voltados para a satisfação de necessidades comuns a população (PEREIRA, 2009).

O ECA em conjunto com o SINASE assume um novo compromisso com a população compreendida como criança e adolescente no Brasil. Em especial, o

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tratamento do adolescente em conflito com a lei, encontra no SINASE a sua previsão legal. Se tratando, sobretudo, do indivíduo que comete ato infracional, o SINASE promove um salto na política pública de atendimento ao adolescente em conflito com a lei no Brasil. A socioeducação, enquanto política pública compõe o conjunto de ações de atendimento a este público no país. Baseada na realidade nacional e nos tratados internacionais, busca-se formas menos danosas para o adolescente que cometeu ato infracional e que deem sentido para o que se está fazendo, visando a reinserção deste na sociedade.

No conjunto de suas previsões legais, o SINASE prioriza “[...] práticas ou medidas que sejam restaurativas [...]” (BRASIL, 2012a, s/n). Dessa forma, a Justiça Restaurativa (JR) e suas diferentes práticas tem ganhado espaço como meio de responsabilização e atendimento do adolescente em conflito com a lei, visando o novo compromisso da política de socioeducação apontado no parágrafo anterior. Porém, a JR ainda não está consolidada no âmbito do atendimento e da execução da medida socioeducativa. Conquanto, no Paraná, a JR iniciou sua incorporação, em algumas das instituições socioeducativas de privação e ou restrição de liberdade geridas pelo Estado, em 2015.

Considerando tal pressuposto legal, sobre a incorporação da JR na política de socioeducação no país e o elemento contextual sobre a recepção de algumas práticas de JR em instituições socioeducativas do Estado do Paraná, destaca-se em meio a tais, a importância do movimento de incorporação da JR no âmbito do sistema socioeducativo, em particular, no processo de execução das medidas socioeducativas aplicadas ao adolescente em conflito com a lei. Em especial, nesta pesquisa, pretendemos focar nas repercussões desse processo, em que se verifica uma aproximação da política pública de Socioeducação com a JR, no município de Ponta Grossa. Diante do exposto, a primeira pergunta que se pretendia responder no decorrer da nossa pesquisa se constituía em: Como a política pública de socioeducação, a partir da Lei do SINASE, tem recepcionado e incorporado a Justiça Restaurativa na execução das medidas de privação de liberdade no Centro de Socioeducação (CENSE) de Ponta Grossa?

Entretanto, após um contato preliminar com o objetivo de se aproximar do objeto de estudo e verificação da pertinência da pergunta de pesquisa, elencada acima, foi percebido que analisar apenas o CENSE não seria suficiente. Pois a instituição trabalha na aplicação da JR com apoio do Centro Judiciário de Solução

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de Conflitos e Cidadania (CEJUSC). Além disso, também não desenvolve, atualmente, práticas de JR suficientes para que forneçam material de estudo exclusivo da execução de internação. Verificou-se ainda, através de artigo publicado pela equipe da Casa de Semiliberdade do município, que a instituição faz uso de práticas restaurativas na execução da medida socioeducativa de regime de semi-liberdade (MONTEIRO et al., 2016), sendo necessário ampliar o foco de análise. Dessa forma, optou-se por ampliar a pergunta de partida da pesquisa. Portanto, a etapa exploratória, utilizada aqui, foi essencial para desenvolver o problema de pesquisa a seguir. A pergunta, problema desta pesquisa, que se forjou através desse processo de maior aproximação com a temática, no decurso da etapa exploratória, que se pretende, então, responder ao final da presente pesquisa é: Como a Justiça Restaurativa tem sido recepcionada e incorporada pela política pública de Socioeducação, a partir da Lei do SINASE, no âmbito da execução das medidas socioeducativas de privação e restrição de liberdade no município de Ponta Grossa?

Esta pesquisa foi motivada pelo estudo acadêmico realizado desde a graduação do pesquisador, da experiência profissional em práticas restaurativas com adolescentes que cumprem medidas socioeducativas e da possibilidade em discutir sobre o tema no Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais Aplicadas da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), percebe-se que há muito que se aprimorar na execução das medidas socioeducativas, em conformidade com o disposto no SINASE e que, ainda, é necessário construir novos métodos em face da efetividade da respectiva lei e divulgar seus resultados para a sociedade.

Dados coletados dos levantamentos quantitativos do SINASE, também incentivaram e mostram a necessidade de se pensar a respeito da socioeducação e sua execução. Abordando as formas de se aplicar a medida e os instrumentos que podem auxiliar para a melhoria do que se busca com a socioeducação.

O “Levantamento anual dos/as adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa” (BRASIL, 2013a), traz os dados referentes ao ano de 2012, ano em que o SINASE (BRASIL, 2012a) virou Lei. O levantamento aponta que, em 2012, haviam 20.532 adolescentes em restrição e privação de liberdade no Brasil, que corresponde à 0,10% do número total de adolescentes no país. Sendo, desses, 13674 em internação, e; 1860 em semiliberdade. Quanto ao sexo dos adolescentes,

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95% é masculino e 5% feminino. No estado do Paraná, o número de adolescentes em internação e semiliberdade, era, respectivamente: 643, e; 47. (BRASIL, 2013a).

Em 2018 foi publicado o último levantamento referente ao ano de 2016 (BRASIL, 2018b). Esse último levantamento mostrou que de 2012 para 2016 houve aumento no número de internação e decréscimo no número de internação provisória e semiliberdade no país. Ou seja, os adolescentes passaram a receber mais medidas de privação e menos de restrição de liberdade ou, ainda, permanecem internados por um período de tempo maior do que nos anos anteriores.

O levantamento tocante ao ano de 2016 (BRASIL, 2018b) mostra que no Brasil existem 26.450 adolescentes e jovens (dos 18 aos 21 anos de idade) atendidos pela política de socioeducação. Desses, 70% (18.567) estão em medida de internação e 8% (2.178) em medida de restrição de liberdade. Os dados históricos, mostram que na medida de internação havia nos respectivos anos: 2012 – 13.674 adolescentes; 2013 – 15.221 adolescentes; 2014 – 16.902 adolescentes; 2015 – 18.381 adolescentes, e; 2016 – 18.567 adolescentes. Na internação provisória, tem-se: 2012 – 4.998 adolescentes; 2013 – 5.573 adolescentes; 2014 – 5.553 adolescentes; 2015 – 5.580 adolescentes, e; 2016 – 5.184 adolescentes. E na semiliberdade: 2012 – 1.860 adolescentes; 2013 – 2.272 adolescentes; 2014 – 2.173 adolescentes; 2015 – 2.348 adolescentes, e; 2016 – 2.178 adolescentes. (BRASIL, 2018b).

Ainda, o estado do Paraná atendeu em toda a socioeducação, na época do último levantamento, 1062 adolescentes, ou seja, um aumento de 9,7 no número de adolescentes em cumprimento da medida do ano de 2015 para 2016. (BRASIL, 2018b). Ainda segundo o último levantamento do SINASE (BRASIL, 2018b), o estado do Paraná teve 856 adolescentes em privação ou restrição de liberdade em 2016. O que coloca o estado com um dos maiores índices de adolescentes no sistema socioeducativo.

Desses dados pode ser pensado que as medidas socioeducativas de privação e restrição de liberdade podem não ser eficazes como planejado e não trazem o resultado esperado. Pois, há indícios de que a medida de internação está sendo aplicada de forma indevida e essa, que deveria ser a última medida a ser tomada, virou regra e é utilizada em casos em que outras medidas seriam mais adequadas (BRASIL, 2016a). Indicando, assim, a necessidade do aprimoramento do sistema

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socioeducativo. Reforça-se a importância de se fortalecer ações que melhor amparem o processo de execução das medidas socioeducativas no país.

Assim vê-se a necessidade de utilizar o que já está disposto na Lei do SINASE (BRASIL, 2012a), que dispõe da execução de práticas restaurativas no item de sua execução:

Art. 35. A execução das medidas socioeducativas reger-se-á pelos seguintes princípios:

I - legalidade, não podendo o adolescente receber tratamento mais gravoso do que o conferido ao adulto;

II - excepcionalidade da intervenção judicial e da imposição de medidas, favorecendo-se meios de autocomposição de conflitos; III - prioridade a práticas ou medidas que sejam restaurativas e, sempre que possível, atendam às necessidades das vítimas;

IV - proporcionalidade em relação à ofensa cometida;

V - brevidade da medida em resposta ao ato cometido, em especial o respeito ao que dispõe oart. 122 da Lei no8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente);

VI - individualização, considerando-se a idade, capacidades e circunstâncias pessoais do adolescente;

VII - mínima intervenção, restrita ao necessário para a realização dos objetivos da medida;

VIII - não discriminação do adolescente, notadamente em razão de etnia, gênero, nacionalidade, classe social, orientação religiosa, política ou sexual, ou associação ou pertencimento a qualquer minoria oustatus; e

IX - fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários no processo socioeducativo (s/n, grifo nosso).

As possibilidades que os itens da legislação acima elencados apresentam, são importantes elementos, assegurados pelo legislador, para o desenvolvimento da política pública de socioeducação, em especial, para âmbito da execução das medidas socioeducativas. As disposições do SINASE colocam o adolescente como agente da própria mudança e de suas decisões. Ele é empoderado1; pode decidir e colaborar sobre como resolver o conflito e mostrar que tem capacidade de ser independente nas escolhas para seu futuro, estabelecendo novas conexões com a família, com sociedade e com o próprio Estado. Com a autocomposição2 de conflitos pode-se evitar que determinada situação chegue a se tornar um processo judicial. Ainda que se torne, uma vez incorporadas as práticas de JR no âmbito processual, desde o julgamento até a execução das determinações judiciais, os sujeitos envolvidos no processo podem ainda se beneficiar das práticas de JR para, entre

1

O empoderamento permite que a vítima, o infrator e ou a comunidade participem do processo de resolução do conflito e satisfaçam suas necessidades (BRASIL, 2015b).

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outras questões, dirimir possíveis conflitos oriundos de situações pessoais, familiares, educacionais, disciplinares e ou sociais, vivenciadas pelos sujeitos envolvidos.

Dessa forma, chega-se ao objetivo geral, que é analisar se a Justiça Restaurativa tem contribuído para o desenvolvimento da política pública de socioeducação, a partir da Lei do SINASE, na execução das medidas socioeducativas de privação e restrição de liberdade no município de Ponta Grossa-PR.

Para atingir o objetivo geral é preciso passar por objetivos específicos durante o procedimento da pesquisa. Os objetivos específicos que darão conta de elencar todos os pontos necessários para o alcance do objetivo geral, são:

 Compreender o Estado e, a partir dele, o que são Políticas Públicas e Socioeducação;

 Refletir sobre a Justiça Restaurativa no Brasil em sua relação com as Políticas Públicas e a Socioeducação no país;

 Refletir se o sistema socioeducativo, em Ponta Grossa – PR, faz uso dos métodos autocompositivos assegurados pelo SINASE;

 Compreender se as práticas restaurativas são aplicadas com a responsabilidade necessária aos métodos autocompositivos nas medidas de privação e restrição de liberdade, e;

 Analisar o processo de recepção e incorporação das práticas restaurativas no âmbito da execução das medidas socioeducativas no município de Ponta Grossa, seus limites e possibilidades.

Ao falar de adolescente em conflito com a Lei e medidas socioeducativas, é importante pontuar e esclarecer o que é a socioeducação. Primeiramente, é uma Política Pública, que acordado entre sociedade e Estado procura resolver problemas atuais e demandas sociais. A Política de Socioeducação é composta por plano, estratégias, programas, executores e fundos que possibilitem sua função enquanto política pública e social (VIEIRA, 2009). A história do Estado brasileiro e a condição da população fez com que fossem necessárias formas políticas específicas (VIEIRA, 2009), como a da socioeducação para adolescentes autores de atos infracionais.

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Também é uma “política educacional” (SILVA, 2012, p. 112). Isso quer dizer que é uma educação para o adolescente desenvolver ou reconstruir seus diversos laços sociais nas diferentes esferas da vida em liberdade (SILVA, 2012). A individualidade do adolescente é elevada a uma necessidade de se entrelaçar aos interesses sociais adequados que serão reforçadores das suas boas condutas. Essa educação para as relações sociais envolve a família, a sociedade e o Estado em torno do bem-estar físico, psicológico e social dos adolescentes, dispondo-lhes educação, lazer, saúde e demais direitos, promovendo-lhes meios para a sua socialização nos aspectos mais amplos (BRASIL, 1990; BRASIL, 2012a; SILVA, 2012).

Ao se abordar sobre Socioeducação, Justiça Restaurativa e instituições de execução das medidas socioeducativas, é necessário olhar para o que são e para o que podem oferecer; compreender como interagem entre si e a que ponto um se entrelaça ao outro. Nesse sentido, o estudo desenvolvido caracteriza-se como uma pesquisa qualitativa que busca apreender diferentes elementos, nuances e dimensões desses processos que perpassam a relação da Justiça Restaurativa com a Socioeducação.

Com a pesquisa qualitativa, a análise está centrada no conteúdo das informações obtidas; nas diferentes percepções sobre o assunto. Busca-se avaliar as relações feitas sobre os temas e conseguir informações amplas a respeito do problema (DUARTE, 2002). Esta pesquisa, além de qualitativa, também se caracteriza como um estudo de caso. A metodologia de estudo de caso, em compatibilidade com a pesquisa qualitativa, procura obter dados da realidade através de questionários, entrevistas e documentos com conteúdo direto dos sujeitos ligados ao objeto de estudo (DUARTE, 2002; QUIMELLI, 2009).

Segundo Gil (2002, p. 54), o estudo de caso permite o “[...] amplo e detalhado conhecimento” sobre o objeto de estudo. Essa metodologia tem ganhado espaço nas ciências sociais, que buscam, entre outras coisas, evitar o distanciamento do fenômeno e do contexto em qual é estudado (GIL, 2002). Os principais propósitos do estudo de caso são:

a) explorar situações da vida real cujos limites não estão claramente definidos;

b) preservar o caráter unitário do objeto estudado;

c) descrever a situação do contexto em que está sendo feita determinada investigação;

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e) explicar as variáveis causais de determinado fenômeno em situações muito complexas que não possibilitam a utilização de levantamentos e experimentos (GIL, 2002, p. 54).

Quando se fala em estudo de caso, “o ‘caso’ pode ser: ‘Situação; Indivíduo; Grupo; Organização; ou qualquer coisa que nos interessemos [...]’ (ROBSON, 2002, p. 177 apud QUIMELLI, 2009, p. 64) em pesquisar” (QUIMELLI, 2009, p. 64). Nesse sentido, o caso desta pesquisa permeia as relações entre Socioeducação e Justiça Restaurativa na execução das medidas socioeducativas de privação e restrição de liberdade, no município de Ponta Grossa.

“O estudo de caso tende a realizar a pesquisa sobre múltiplos métodos e fontes de coleta de dados” (ASHLEY, 1994, p.116, tradução nossa). Por isso, essa pesquisa se valerá de consulta a fontes bibliográficas e de informações obtidas através de documentos, como Leis federais, estaduais e ou municipais e artigos publicados. E, ainda, de pesquisa de campo, com a utilização de entrevistas semiestruturadas aplicadas junto a sujeitos ligados a execução das medidas socioeducativas que experimentaram em sua atuação alguma relação com as práticas de Justiça Restaurativa. Para seguir com a pesquisa foi delineado um caminho metodológico, apresentado a seguir.

Primeiro foi necessário realizar uma etapa exploratória (OLIVEIRA JUNIOR et al., 2012), visitando o CENSE e o CEJUSC e, também, conhecendo as práticas realizadas nos locais. Dessa forma, foi possível reestruturar a problematização da pesquisa, para se chegar ao objetivo geral apresentado anteriormente. Importante destacar que as informações coletadas durante a pesquisa exploratória não serão usadas como dados de análise, mas serviram para reconhecimento e aproximação com o campo de pesquisa (OLIVEIRA JUNIOR et al., 2012).

Depois da etapa exploratória e da elaboração dos objetivos, foram delimitados o campo e os sujeitos da pesquisa.

O universo da pesquisa se configura pelas instituições/órgãos que compõem o sistema socioeducativo nas medidas de privação e restrição de liberdade do município de Ponta Grossa, sendo eles o CENSE e a Casa de Semiliberdade. Além do CEJUSC, considerada uma instituição importante para alcançar o objetivo desta e que desenvolve Práticas Restaurativas na cidade de Ponta Grossa.

A amostra da pesquisa é formada por: a) Profissionais ligados diretamente as instituições socioeducativas da privação e restrição de liberdade da cidade de Ponta

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Grossa; b) Profissionais ligados ao CEJUSC; c) Juíza de Direito que determina a aplicação das medidas socioeducativas, lançando mão da JR em suas sentenças, e; d) Promotora de Justiça que se inscreveu nesse contexto de implementação da JR em Ponta Grossa e atualmente manifesta-se favorável à aplicação de JR na Socioeducação. Serão parte da amostra, duas pessoas de cada instituição (CENSE, Casa de Semiliberdade, CEJUSC), uma juíza e uma promotora de justiça. O número de pessoas por instituição foi decidido após a etapa exploratória, em que se percebeu a necessidade de englobar na pesquisa profissionais de diferentes áreas de atuação.

O critério de seleção para os sujeitos serão: a) Sujeitos atuantes nas instituições/órgãos que lançaram e ou lançam mão de práticas de Justiça Restaurativa no âmbito do processo de execução das medidas socioeducativas de privação ou restrição de liberdade no município de Ponta Grossa; b) Sujeitos que tiveram ou tem contato com a JR nas instituições; c) Sujeitos que fizeram o curso de facilitadores em JR; d) Sujeitos que recorreram e ou recorrem às práticas de Justiça Restaurativa durante o desenvolvimento do processo socioeducativo, junto dos adolescentes, e; e) Sujeitos que representem a equipe técnica e a de segurança, quando das instituições de execução da medida socioeducativa.

Seguindo aos critérios acima declarados a amostra foi definida da seguinte forma: dois facilitadores de JR no CENSE, um facilitador de JR na Semiliberdade, dois facilitadores de JR no CEJUSC, uma juíza de direito e uma promotora de justiça. Conforme quadro a seguir.

Quadro 1.1. – Caracterização dos sujeitos de pesquisa.

Profissional Instituição Setor/Função

CENSE 1 CENSE Equipe técnica

CENSE 2 CENSE Equipe de segurança

Semi 1 Casa de Semiliberdade Equipe Técnica CEJUSC 1 Centro judiciário de

solução de conflitos e cidadania

Responsável pela distribuição dos

processos CEJUSC 2 Centro judiciário de

solução de conflitos e cidadania Execução de práticas restaurativas com adolescentes na medida Poder Judiciário Tribunal de Justiça do

Estado do Paraná – CEJUSC/PG

Juíza de Direito

Promotoria Pública 14ª Promotoria Pública, Estado do Paraná

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Fonte: Dados da pesquisa. Org.: O autor.

Após a delimitação do campo e da amostra, foi realizada a primeira etapa de coleta de dados, a etapa de observação participante nos locais que compõem a pesquisa: CENSE, Casa de semiliberdade e CEJUSC. Foram coletados dados através da observação, que nesta pesquisa, obteve caráter participativo. A observação participante é uma das técnicas que o pesquisador pode lançar mão para obter informações de análise. Nela o pesquisador entra em contato direto com o fenômeno observado e seus aspectos, envolvendo sujeitos e espaço físico. Também, segundo Minayo (1994, p. 59), “[...] nesse processo, ele, ao mesmo tempo, pode modificar e ser modificado pelo contexto”. Nesse modelo de observação, se estabelece uma interação plena e direta com o que ou quem é observado. A observação participante oferece vantagens e informações que não são possíveis apenas com a entrevista e as respostas obtidas dela. Ou seja, é possível perceber se os sujeitos, no momento da entrevista, estavam, aparentemente, incomodados, envergonhados, contentes, se o espaço físico era favorável, sigiloso, entre outros aspectos. (MINAYO, 1994).

Para realizar as observações, seguiu-se um cronograma, com dias e horários específicos para serem seguidos, autorizado pelos diretores das unidades e pela responsável pela JR no CEJUSC. As observações participantes ocorreram entre os dias 01 e 28 de março de 2018. No CEJUSC: Dias 1, 2, 9, 14, 19 e 20; Das 12h às 18h. Na Casa de Semiliberdade: Dias 5, 6, 13, 21 e 22; Das 13h às 17h. No CENSE: Dias 7, 8, 15, 16, 23 e 26; Das 08h às 17h, com intervalo para almoço das 12h às 13h. Na semiliberdade e no CEJUSC as observações foram no período da tarde, pois era o horário em que havia atividades nas instituições. No CENSE as observações duraram o dia todo, porque havia atividades de diferentes tipos nos períodos da manhã e tarde. O cronograma completo está especificado em tabela nos apêndices da pesquisa.

Com a observação participante foi possível acompanhar as atividades das instituições, conhecer o trabalho das equipes, participar das práticas restaurativas realizadas e observar a execução das medidas e proposições da política pública de socioeducação. As informações coletadas e observadas foram registradas em diário de campo, especificado adiante. Essas informações serão incorporadas no decorrer

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do trabalho, servindo como suporte para a apresentação, análise e considerações apresentadas sobre os locais, sujeitos e tema desta pesquisa.

Em conjunto com as observações participantes também foi feita análise documental das Leis, projetos e diretrizes do Estado e do município que tratam da temática. Dessa forma, foi possível embasar, a partir dos documentos oficiais, as etapas de coleta de dados e dar suporte para a posterior análise.

A terceira forma de coleta de dados, realizada após a observação participante, é a entrevista. Como parte da metodologia empregada e da padronização do instrumento de coleta de dados, a entrevista (em apêndice) foi composta por perguntas que evidenciam a aproximação do sujeito com o local envolvido no estudo, com as práticas e questões que permeiam o objeto desta pesquisa, opiniões sobre o tema, etc. A pesquisa é composta por dois modelos de entrevista semiestruturada: Modelo I – Para os profissionais das instituições de execução da medida socioeducativa e CEJUSC, e; Modelo II – Para juiz e promotor.

Para a realização das entrevistas e contato com os sujeitos, para coletar informações que fazem parte do objeto de estudo, foi apresentado um termo de consentimento livre e esclarecido. Nesse termo, o sujeito de pesquisa ficou ciente do que se trata a pesquisa, para que servirão suas informações e, entre outras coisas, sobre sua voluntariedade na participação. O termo citado foi retirado da página do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais Aplicadas da Universidade Estadual de Ponta Grossa. O mesmo também está disponível em apêndice.

As entrevistas realizadas tiveram entre 17 minutos (a mais curta) e 1 hora e 09 minutos (a mais longa). Foram transcritas e a transcrição foi devolvida para os entrevistados, assim puderam fazer a conferência e destacar nomes ou falas que não desejavam que aparecessem na pesquisa, por questões éticas, com o cuidado de não alterar as respostas das perguntas. O arquivo destacado foi devolvido para o pesquisador, que retirou o conteúdo que os entrevistados apontaram.

Para análise dos dados coletados, recorre-se à análise de dados por categoria. Que, segundo Minayo (1994), é uma técnica que busca dar respostas a perguntas preestabelecidas, confirmar ou refutar afirmações e retirar informações úteis de dados coletados de forma ampla, como ocorre em uma entrevista.

Segundo Quimelli (2009) a formulação das perguntas deve favorecer a análise dos dados e obter o máximo de informações válidas possíveis. Com a coleta já realizada, a autora especifica que é necessário refletir a respeito das perguntas e

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dos dados; podendo-se reorganizar as perguntas e encontrar relações entre as informações que foram fornecidas. Minayo (1994), propõe um dos possíveis modelos de análise de dados que se pode utilizar em uma análise de conteúdo. Esse modelo de análise é aquele que se faz através de categorias.

Analisar dados usando categorias envolve duas faces da mesma moeda: as categorias são criadas a partir dos dados coletados. No entanto, este processo é guiado pela referência teórica elaborada pelo pesquisador. Isto significa que, primeiro, o pesquisador descontextualiza e reduz os dados, mas, em seguida, os dados são recontextualizados em forma abstrata (por interpretação). Um exemplo de redução e descontextualização se dá quando o pesquisador resume as notas de observação e as reconstrói numa tabela mais precisa (QUIMELLI, 2009, p. 79).

As informações coletadas através das entrevistas precisam ser filtradas, para então serem recontextualizadas e reestruturadas dentro de categorias precisas e criadas conforme as respostas obtidas.

Para isso, e usando como base o modelo apresentado por Quimelli (2009), serão seguidos os seguintes passos: 1) Ler várias vezes e atentamente todas as respostas/informações coletadas; 2) Identificar o que é relevante para a pesquisa e para atingir o objetivo geral proposto para esta; 3) Selecionar e separar o que foi identificado como essencial; 4) Elaborar categorias relacionadas as informações separadas dentre as informações coletadas; 5) Refinamento das categorias, que pode ser feito pelo número de vezes que uma mesma resposta aparece ou pela aproximação das mesmas; 6) Juntar ou separar informações nessas categorias especificadas e refinadas, seguindo uma sequência lógica que favoreça a análise, e; 7) Montar categorias finais com as informações já totalmente especificadas, separadas e organizadas, para, assim, conseguir fazer a análise e obter um resultado fiel e sistemático das informações coletadas nas entrevistas. Esses passos poderão ser realizados por tabelas, colunas, quadros ou outra forma de organização. A escolha dependerá de qual se adequará melhor as informações que estão sob domínio do pesquisador.

Além do modelo citado acima, também poderá ser usado, para montar categorias de análise, o sistema Sphinx (FREITAS, 1997). Trata-se de um programa de computador, disponível ao pesquisador pelo Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais Aplicadas da UEPG, que oferece, através da análise da transcrição das entrevistas, informações como: Categorias; Temas; Número de vezes que

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palavras aparecem nas transcrições, destacando sua relevância, e; Variáveis que podem ajudar na análise qualitativa dos dados (FREITAS, 1997). Integrando as possibilidades do sistema à pesquisa, é possível maximizar as inferências e aumentar a qualidade da análise do conteúdo.

Somando os dados obtidos e analisados das entrevistas, com os dados da observação e, ainda, os dados coletados através de fontes bibliográficas e documentais, o modelo de análise, de forma geral, desta pesquisa, se caracteriza como uma triangulação de dados (MINAYO, 2010). Ou seja, a soma das informações das três técnicas de coleta (entrevistas, observação e documentos), fornecerá uma análise mais próxima do real e completa sobre o objeto de estudo.

Os capítulos do trabalho foram estruturados da seguinte forma: o capítulo um foi desenvolvido para formar uma compreensão da adolescência e do adolescente na contemporaneidade brasileira. A pesquisa se trata da JR aplicada na execução da medida socioeducativa, portanto diz respeito ao trabalho realizado com adolescentes que cometeram ato infracional. Assim fez-se necessário pontuar o que é e o que forma a fase da adolescência e o adolescente. Será apresentado durante o capítulo alguns dos fatores que formam e compõem a vida do adolescente, sendo: Fatores biológicos, psicológicos, culturais e sociais. Portanto, o primeiro capítulo apresenta uma reflexão sobre o adolescente a partir de uma perspectiva de desenvolvimento multifatorial. Ainda neste capítulo foi apresentado um conjunto de dados sobre os adolescentes em conflito com a lei no Brasil, a partir dos relatórios da Secretaria Nacional de Atendimento Socioeducativo.

O segundo capítulo busca apresentar a implementação da JR à luz do SINASE. Discute-se o papel e objetivos da JR, bem como sua contraposição e semelhanças ao sistema retributivo3, convencional. É mostrado como a prática da JR se desenrola e apontado o encorajamento do seu uso pelo SINASE. É especificado o que é a política pública e, especificamente, a política pública de socioeducação. Também neste capítulo mostra-se os dados da socioeducação no Paraná, que colaboram para a discussão da necessidade de se repensar a execução da medida socioeducativa. Os dados documentais mais as informações

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A Justiça Retributiva é o modelo convencional de justiça no Brasil. Está fundamentado em uma lei universal de liberdade. Tem esse nome porque atua sobre uma ação passada, sem considerar o presente ou o que está por vir. Fundamenta-se “na culpa e no castigo” (SLAKMON et. al., 2005, p. 59) que as pessoas devem receber. É uma forma de retribuição que os outros têm pelo sofrimento que a eles foi causado (SLAKMON et. al., 2005).

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coletadas com as observações participantes puderam fornecer meios para caracterizar o uso da JR nas unidades de privação e restrição de liberdade no município de Ponta Grossa e, também, no CEJUSC. Além disso, foram apresentados os projetos de Lei que pretendem endurecer a aplicação da medida socioeducativa de privação de liberdade, que colabora para um retrocesso nas conquistas do ECA e do SINASE. E, ainda, foram apontados dados referentes a medida socioeducativa no Brasil, que sustentam as informações e análises feitas posteriormente.

O capítulo três é dedicado à análise das informações coletadas durante a pesquisa. São apresentados, no item 3.1, dados específicos do município de Ponta Grossa, necessários para caracterizar os locais de pesquisa e dos quais as informações das observações e das entrevistas dizem respeito. São mostrados os dados referentes aos locais, bem como número e sujeitos, atividades realizadas, caracterização do lugar físico e práticas restaurativas realizadas, com seus roteiros.

O terceiro capítulo apresenta três categorias de análise: 1 - Articulações da Justiça Restaurativa no contexto da execução das medidas socioeducativas de privação e restrição de liberdade; 2 - Os desafios da execução das medidas socioeducativas privativas e restritivas de liberdade frente ao sistema de garantia de direitos da criança e do adolescente, e; 3 - As contribuições da Justiça Restaurativa na execução das medidas privativas e restritivas de liberdade e seus desdobramentos para o desenvolvimento integral do adolescente no município de Ponta Grossa. Por último, são apresentadas as considerações finais, com principais apontamentos e conclusões a partir da análise realizada.

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CAPÍTULO 1

A ADOLESCÊNCIA E O ADOLESCENTE EM CONFLITO COM A LEI: EXPRESSÕES CONTEMPORÂNEAS NO BRASIL

O primeiro capítulo desta pesquisa discorre sobre um conjunto de elementos que são importantes para o entendimento do tema e do objeto de pesquisa e, também, para sustentar, teoricamente, a análise das informações feitas posteriormente. Este capítulo tem por objetivo refletir sobre a adolescência e o adolescente em conflito com a lei no Brasil, em suas expressões contemporâneas.

O capítulo foi estruturado de maneira que possa se ter uma compreensão global do assunto proposto. Apresenta: A adolescência e o adolescente em conflito com a lei em suas expressões contemporâneas, a partir de um conjunto de fatores que fazem parte do desenvolvimento humano e que compõe essa fase da vida; importantes para se entender o adolescente ao qual a política pública de socioeducação é voltada. Os principais autores utilizados para embasar este capítulo, foram: Bock et al. (2001); Gallahue et al. (2013); Barlow e Durand (2017); Sales (2007), e; Baldwin et al. (2006, tradução nossa).

Uma abordagem global sobre o objeto da presente pesquisa se faz necessária, considerando os múltiplos fatores que o compõe. Para tanto, o capítulo apresenta uma análise dos fatores biológicos, psicológicos, culturais e sociais. Assim, o capítulo apresenta elementos para uma compreensão ampla da adolescência e do adolescente em conflito com a lei, como pressupostos para a formação de um entendimento e análise críticos da política pública de socioeducação e dos debates que a cercam na contemporaneidade brasileira, o que será objeto de atenção no segundo capítulo.

1.1 A ADOLESCÊNCIA E O ADOLESCENTE EM CONFLITO COM A LEI: ANÁLISE MULTIFATORIAL

De forma global, a partir do século XX4, a adolescência passou a ser objeto de estudo, na tentativa de se compreender os motivos pelos quais se constitui uma fase da vida na qual os indivíduos, em sua maioria, adotam comportamentos, como:

4

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se voltam contra as regras estabelecidas pela família ou outros grupos, buscam independência financeira e iniciam sua vida sexual, por exemplo. Neste contexto, a história, a cultura e as características de ordem individual e social passaram a ser consideradas, em modelos teóricos científicos, para a compreensão da adolescência. (SENNA; DESSEN, 2012). Ainda segundo Senna e Dessen (2012), a adolescência passou a ser estudada, nesta perspectiva, como uma fase necessária para a vida do indivíduo, despertando interesse em diversos estudiosos, como Piaget, Skinner e Freud. As teorias do desenvolvimento humano passaram a ser, portanto, indispensáveis para o estudo e compreensão da adolescência, enquanto uma fase da vida.

Os primeiros estudos citados pelos autores Sposito e Carrano (2003) mostram que, no início do século XX, os fatores herdados geneticamente eram levados em consideração, como prioritários, com certa influência do meio. A transgressão e a desobediência ganharam ênfase, nesse primeiro momento, como elementos característicos da fase da adolescência. A partir da segunda metade do respectivo século, em tais estudos, passou-se a considerar o convívio com pares diretos, como família, professores e amigos, como fatores determinantes do desenvolvimento humano. Esses são os chamados fatores filogenéticos e ontogenéticos. Com isso, o adolescente passou a ser visto como um indivíduo contextualizado. De tal consideração, constrói-se a compreensão do adolescente como um sujeito biopsicossocial. A partir desta visão, o sujeito é tido como um ser em constante mudança, independente do momento da vida, considerando suas capacidades biológicas, suas possibilidades, tempo, contexto histórico em que está inserido e grupo cultural ao qual pertence. (SPOSITO; CARRANO, 2003).

O final do século XX e início do século XXI é um período em que ocorreram construções e desconstruções acerca das compreensões sobre a adolescência. Desconstruções sobre a causa de seus comportamentos do adolescente e de suas interações; e construções acerca de como é visto, como precisa ser assistido pela sociedade e pelo Estado (SPOSITO; CARRANO, 2003).

Especialmente, a partir da segunda metade do século XX, o período da adolescência e, até mesmo, a juventude5, como fase posterior, eram tomados como

5

Muitas vezes os termos adolescência e juventude são utilizados como sinônimos, porém com o ECA e o Estatuto da Juventude, há diferenças entre eles. O adolescente é considerado como tal até os 18

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um problema. A adolescência era interpretada como fase de conflito, desobediência e transgressões. Eram as peças principais quando se pensava em desconstrução social e cultural. (PAIS, 1993; ABRAMO, 1997 apud SPOSITO; CARRANO, 2003).

Quando se compara a fase da adolescência em relação à fase da infância, tem-se no senso comum que

[...] ser criança ‘é viver um mundo de sonhos e fantasias, gostar de comer bolo de chocolates, é o melhor momento da vida’. Ao mesmo tempo, a compreensão da adolescência é permeada pela ideia de ‘aborrescência, rebeldia e atrevimento’. De um modo geral, existe a compreensão de que ser criança resume-se em ser feliz, alegre, despreocupado, ter condições de vida propícias ao seu desenvolvimento, ou seja, a infância é considerada o "melhor tempo da vida". Já a adolescência se configura como um momento em que, naturalmente, o indivíduo torna-se alguém muito chato, difícil de se lidar e que está sempre criando confusão e vivendo crises. Deste modo, existe uma leitura de senso comum que costuma colocar a criança vivendo o melhor momento da vida e o adolescente, uma fase difícil para ele e para quem convive com ele (FROTA, 2007, p. 148).

Neste sentido, o adolescente é visto, também, como aquele que questiona ou resiste ao instituído pela família, pela escola e ou pelo Estado. Há um imaginário socialmente construído em torno do ser adolescente na sociedade moderna. Pode-se dizer, que a adolescência é um período construído historicamente, não há como se ter uma verdade absoluta sobre o que é ser adolescente, como este se insere na sociedade moderna e qual é o papel do adolescente, nesse contexto. (FROTA, 2007). O adolescente é esse, que pode ser cobrado para estudar, trabalhar, assumir responsabilidades, mas que não é totalmente autônomo; necessita do amparo e retaguarda de outro sujeito, que imbuído de condições pessoais, sociais e legais, tem o dever para com a sua proteção e desenvolvimento.

Por esses motivos, ao discutir sobre a adolescência, é necessário abranger todas as esferas e aspectos que a cerca. Para tanto, uma compreensão global da fase da adolescência perpassa pela consideração dos múltiplos fatores que a determinam e a constituem, como uma fase particular da vida do sujeito, em formação.

A compreensão de que o desenvolvimento humano é histórico e processual, implica na consideração de que a adolescência, tal como outras fases da vida, sofre com as determinações do passado da vida do sujeito e é entrecortada ainda pelas

anos incompletos e juventude dos 18 anos completos até os 21 anos de idade completos. (BRASIL, 1990; BRASIL, 2012a).

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condições do presente e pelas suas perspectivas de futuro. Assim, para compreender a adolescência, enquanto, uma fase do desenvolvimento humano e, o adolescente em particular, enquanto um sujeito histórico e social, faz-se necessário retomar as fases que a antecedem, desmistificando as questões inerentes aos múltiplos fatores que a envolvem.

Por mais que existam diferenças entre uma pessoa e outra, uma criança ou adolescente e outro, todos passam por fases etárias com características iguais e ou muito semelhantes; têm dificuldades e podem encontrar formas parecidas de solucionar seus problemas, considerando a fase do desenvolvimento em que se encontram.

Dado tal pressuposto, antes de dar continuidade à reflexão sobre a adolescência e iniciar a discussão sobre o adolescente autor de ato infracional, serão destacadas as fases do desenvolvimento humano pregressas, pois estas são determinantes para a sua compreensão global, histórica e social.

Refletir sobre o desenvolvimento humano é tratar de uma globalidade de aspectos, que ocorrem em conjunto e constituem possibilidades e/ou limites uns para os outros, de forma mútua, nas suas diferentes fases. Esses aspectos, aqui, serão divididos de forma didática para facilitar o entendimento. Segundo Bock et al. (2001), existem quatro aspectos básicos e essenciais para compreender o desenvolvimento humano: 1) Físico-motor, que diz respeito ao desenvolvimento biológico orgânico e da maturação neurofisiológica, que possibilita manipular objetos e o uso do próprio corpo; 2) Intelectual, ligado aos aspectos cognitivos, como raciocínio, memória e pensamento; 3) Afetivo-emocional, que é como o indivíduo vê sua situação, como se sente ou sente o que está ao seu redor e como se apropria das experiências, e; 4) Social, que é a relação que o indivíduo estabelece com outras pessoas, lugares, grupos e como estes influenciam o sujeito, nos seus comportamentos, pensamentos, etc. (BOCK et al., 2001). Considera-se a pertinência de tais aspectos para a compreensão da teoria do desenvolvimento propriamente dita. Piaget, ao perceber essas características e aspectos, passou a estudar o desenvolvimento humano, sobretudo infância e adolescência, se consolidando como um dos grandes teóricos do desenvolvimento humano da modernidade. (BEE, 1977). O referido teórico “[...] divide os períodos do desenvolvimento humano de acordo com o aparecimento de novas qualidades do pensamento, o que, por sua vez, interfere no desenvolvimento global.” (BOCK et al., 2001, p. 101).

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Segundo Bock et al. (2001), na visão piagetiana se estabelecem quatro períodos do desenvolvimento, são eles: Sensório-motor, pré-operatório e o de operações concretas. O primeiro período, chamado sensório-motor vai dos 0 aos 2 anos de idade e é caracterizado pelas habilidades possibilitadas hereditariamente (sugar com a boca ou chorar, por exemplo) e também pela capacidade de utilizar o corpo para descobrir o ambiente ao seu redor, pegando, puxando, etc. É o período em que há o desenvolvimento mais rápido no corpo e que a criança começa a fazer a distinção do seu eu com o ambiente. (BOCK et al., 2001). O segundo período é o Pré-operatório, que vai dos 2 aos 7 anos de idade. A principal característica é o aprendizado da linguagem. A criança passa a exteriorizar seus pensamentos e vontades que antes estavam apenas internalizadas. Nessa fase o aprendizado é basicamente por imitação, fazendo com que o contexto em que a criança está inserida exerça grande influência em que aprende naquele momento e no futuro. Suas regras, valores, moral, são desenvolvidos a partir dos seus principais grupos, que normalmente são a família e a escola. A habilidade motora fina também se desenvolve, possibilitando novos aprendizados. (BOCK et al., 2001).

O próximo período é o das Operações Concretas, que vai dos 7 aos 11 ou 12 anos de idade. Nessa fase a criança já é capaz de aceitar opiniões diferentes das suas e estabelecer relações com outras crianças, conseguindo formar e trabalhar em pequenos grupos. As operações propriamente ditas são as organizações de atividades físicas e mentais dirigidas para um determinado fim. Ainda é importante pontuar que, no exemplo de um homicídio, o fim pode não ser necessariamente tirar a vida de alguém, mas acabar com um sofrimento, uma violência ou outra situação que só foi possível mediante o homicídio. Consegue solucionar problemas que antes eram abstratos e desenvolver habilidades de pensamento a partir de objetos concretos. Também é muito característico a criança desenvolver pensamentos ou ações baseadas em experiências antecedentes, prevendo o resultado que deseja alcançar. (BOCK et al., 2001).

O último e quarto período é o das operações formais, que vai dos 11 ou 12 anos adiante. Nessa fase o indivíduo já passa do pensamento concreto para o abstrato, formulando pensamentos a partir dele, sem que seja necessária a presença do objeto concreto. Consegue trabalhar com termos que antes não eram palpáveis, como justiça, que não tem uma única definição ou objeto concreto específico que a represente. Esse é o período que ao mesmo tempo em que o

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sujeito deseja ser independente e ter sua vida, também precisa do apoio dos pais. O indivíduo normalmente se distancia da família e busca outros pares, se vinculando a pessoas que compartilhem de seus ideais, vontades, gostos e, assim, formando novos grupos predominantes de convívio. (BOCK et al., 2001).

Diante dos fatores, a que os adolescentes são expostos durante as diferentes fases de seu desenvolvimento, existe grande probabilidade dos mesmos terem sido confrontados por situações de risco, das mais diversas origens e naturezas. Nestes casos, há fatores que podem condicionar um desenvolvimento negativo no adolescente, resultando entre outras questões, no cometimento de um ato infracional (WEBSTER-STRATTON, 1998 apud GALLO; WILLIAMS, 2005). Os fatores influenciadores no processo de desenvolvimento dos sujeitos e que repercutem na fase da adolescência são, portanto, de diferentes naturezas. São fatores de ordem biológica, psicológica e ou social e encontram-se determinados ainda pela cultura de cada grupo, etnia e ou classe social. Estes se constroem de forma histórica e processual, levando-se em consideração as diversas experiências e o conjunto de fatores a que os sujeitos são expostos nas diferentes fases da vida. Tais fatores interagem entre si nas mais diversas formas possíveis compondo o itinerário da vida dos sujeitos, de forma particular. Cada um constrói a sua história, enquanto uma unidade de multiplicidades.

Levando-se em conta as diferentes fases de desenvolvimento vivenciadas pelo indivíduo, considera-se que os fatores de proteção e risco perpassam pela sua interação com a família, escola, sociedade e, como tais, fazem parte do contexto de seu desenvolvimento ao longo de sua história de vida, determinando o processo de constituição de sua identidade como sujeito e como ser histórico-social.

A adaptação ou não do adolescente a determinada situação pode influenciar no seu modo de encontrar uma ou mais soluções para problemas ou situações aversivas, podendo tais serem positivas ou negativas para seu desenvolvimento. (GALLO; WILLIAMS, 2005).

Os comportamentos ditos ‘indisciplinados’, os atos de ‘rebeldia’, a recusa do instituído, das regras e ou convenções sociais e ou o cometimento de atos infracionais devem ser interpretados à luz dos múltiplos fatores determinantes que compõem a trajetória do sujeito, em suas diferentes fases de desenvolvimento. Tais manifestações, na fase da adolescência, são resultantes das causas e condições em

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que o sujeito, subjetivo e socialmente, se desenvolveu e se desenvolve, na sua relação com o Estado, com a sociedade, com a família e consigo mesmo.

No Brasil, ao se referir sobre o adolescente em geral e ao adolescente em conflito com a lei, de acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA, Lei 8.090/1990, adolescente é aquele que possui idade entre 12 e 18 anos. E, nessa fase da vida, se cometer algum ato infracional, está sujeito a aplicação de sanções judiciais, denominadas pelo ECA, de medidas socioeducativas.

Antes de atingir a fase da adolescência, o sujeito passou pela infância e, no âmbito desta, pelas fases características de seu desenvolvimento humano, que articuladas aos múltiplos fatores que a cerca, resulta em sua constituição em si – o adolescente como ele é – enquanto singularidade, em sua subjetividade e experiências de socialização.

Considerando as questões acima apresentadas, ao se reportar à adolescência como parte do objeto do presente estudo, faz-se necessário levar em consideração os diversos fatores que a compõem para a compreensão do adolescente em conflito com lei. São os fatores biológicos, psicológicos, sociais e culturais imprescindíveis para se compreender a adolescência enquanto uma expressão particular da trajetória do sujeito, a partir das suas experiências, enquanto um ser historicamente determinado.

À luz de tais pressupostos, almeja-se neste capítulo, o alcance de um entendimento mais amplo e global da adolescência, em face do conjunto de fatores e experiências que cercam a vida e o desenvolvimento do adolescente como sujeito em condição peculiar de desenvolvimento, tal como preconizado pelo ECA. Tratar, portanto, do conflito com a lei como uma de suas expressões, implica um olhar que considere, além dos aspectos jurídicos que envolvem a relação direta do cometimento do ato infracional e da responsabilização do adolescente pelo Estado, os aspectos de cunho biológicos, psicológicos, sociais e culturais, atravessados pela trajetória de vida dos adolescentes como sujeitos históricos que são.

A seguir o texto trará todos os aspectos citados no parágrafo anterior, de forma esmiuçada, para que, assim, seja possível se aproximar do tema abordado na pesquisa, de modo mais didático – ou seja, busca-se compreender a multiplicidade de fatores que cercam o estudo sobre a adolescência e o adolescente em conflito com a lei.

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