• Nenhum resultado encontrado

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP ABIMAEL FRANCISCO DO NASCIMENTO

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2018

Share "PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP ABIMAEL FRANCISCO DO NASCIMENTO"

Copied!
138
0
0

Texto

(1)

PUC-SP

ABIMAEL FRANCISCO DO NASCIMENTO

A Teologia do Cordeiro no Evangelho Segundo João Jo 1,29.19,34-36

MESTRADO EM TEOLOGIA SISTEMÁTICA

(2)

PUC-SP

ABIMAEL FRANCISCO DO NASCIMENTO

A Teologia do Cordeiro no Evangelho Segundo João Jo 1,29.19,34-36

MESTRADO EM TEOLOGIA SISTEMÁTICA

Dissertação apresentada à Banca

Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Mestre em Teologia Sistemática, sob a orientação do Prof. Dr. Pe. Gilvan Leite de Araújo.

(3)

Banca Examinadora

__________________________________________

__________________________________________

(4)

“Ele [Jesus] celebrou a ceia pascal com seus discípulos; em vez, contudo, de imolar o tradicional cordeiro pascal, converteu-Se Ele próprio em cordeiro sacrificial. Como „nosso cordeiro pascal, Jesus foi imolado‟ (1Cor 5,7), para estabelecer, de uma vez por todas, a definitiva reconciliação entre Deus e a humanidade” (n. 95)

(5)

Em virtude da possibilidade do desenvolvimento desta pesquisa, agradeço ao bom Deus que me concedeu as virtudes necessárias para tal empenho; agradeço à minha família pelo apoio: meus pais, irmãos e cunhados. Manifesto também gratidão à Congregação dos Missionários do Sagrado Coração, ao Pe. Benedito Ângelo Cortez, msc e ao Superior Provincial Padre Manoel Ferreira dos Santos Júnior, msc e aos membros do Conselho Provincial, como também aos confrades que me animaram neste percurso.

Não poderia deixar de agradecer ao Professor Mathias Grenzer, então coordenador da Pós-graduação de Teologia, com sua paciência e escuta muito me ajudou. Agradeço a todos os docentes do Programa de Teologia de Pós-graduação da PUC-SP, aqueles que tive como professores. Em especial atenção ao Professor Gilvan Leite de Araújo, pela orientação na pesquisa e empenho no propósito de conclusão da mesma.

(6)

Apresente pesquisa pautou-se pelo método de pesquisa bibliográfica, com o fim de responder à questão lançada sobre o problema: qual a relevância e implicações da imagem do cordeiro, atribuída a Jesus, no Evangelho segundo João?- Desta interrogação surgem algumas considerações, tais como: a relevância se dá em virtude da formação da comunidade que está na base deste Evangelho, isto é, os grupos que formaram a comunidade joanina, aqueles da primeira hora, conheciam a vida cultual da tradição israelita e a aplicaram a Jesus por meio da tipologia do cordeiro.

Uma segunda consideração é que o cordeiro era no culto, seja para samaritanos ou para judeus, um elemento bastante presente, e cumpria desde a ação de graças até a expiação. No entanto, sua presença mais fixada na memória era aquela ligada à noite da saída do Egito, na qual Deus ordenou a imolação de um cordeiro pascal. Esta celebração lembrava, a cada ano, a intervenção divina e alimentava a esperança de um novo êxodo, que libertasse o povo do julgo dos impérios.

A terceira consideração é sobre a figura do cordeiro e a tradição profética do Segundo Isaías, que havia proposto uma substituição cúltica: agora um servo, semelhante a um cordeiro, seria o expiador dos pecados do povo (cf. Is 53,7). O servo de Isaías assume a função expiatória, algo que era reservado a rituais de sacrifício. Agora, o servo assume esta função. Diante disto, a saudação de João Batista a Jesus (cf. Jo 1,29) ganha outra vertente, mas com a possibilidade de aliar as duas ideias, isto é, a saudação Batista parece contemplar, tanto a perspectiva de Cordeiro Pascal, como de Servo Sofredor. De modo que o Jesus joanino assume a função de cordeiro, mas, não mais um cordeiro somente para Israel, e sim para todo o mundo. Com isto, a salvação do Cordeiro-Servo é universal. Ele cumpre a função de perdoar os pecados e de fazer passar para a vida eterna, visto que reconcilia, com o seu sangue, a humanidade com Deus.

A saudação de João Batista em Jo 1,29, a princípio se mostra pouco compreensível, no entanto, a partir de um percurso teológico que culmina no Gólgota, em Jo 19,34-36, faz-se compreensível o que João Batista havia anunciado na semana inaugural da atividade de Jesus. Agora, na Paixão, a Páscoa definitiva se realiza, o perdão pleno é dado, por meio da entrega voluntária do Cordeiro de Deus.

(7)

This research was guided by the method of literature review, in order to answer the question put on the problem: Which is the relevance and which are the implications of the image of the lamb, attributed to Jesus in the Gospel of John? - This question raises some considerations, such as: the relevance occurs due to the formation of the community that is the basis of this Gospel, as to say, groups that formed the Johannine community, those of the first hour, knew the cultic life of the Israelite tradition and applied it to Jesus through the typology of the lamb.

A second consideration is that the lamb was in the worship, either to Jews or Samaritans, an element very present, kept from thanksgiving to the atonement. However, their presence more fixed in memory was that linked to the night of the Exodus, in which God commanded to sacrifice a paschal lamb. This celebration reminded every year the divine intervention and cherished the hope of a new exodus, in which the people would be released from the judge of the empires.

The third consideration is on the figure of the lamb and the prophetic tradition of the Second Isaiah, who had proposed a cultic replacement: now a servant, like a lamb, would be the atoning of the sins of the people ( cf. Is 53:7 ). The servant of Isaiah takes the atoning function, something that was reserved for sacrificial rituals. Now, the servant assumes this function. Given this, the salutation of John the Baptist to Jesus (cf. Jn 1:29 ) gains another dimension, but with the possibility of combining the two ideas, as to say, the greeting of the Batista seems to address both perspective of the Paschal Lamb as well as the Suffering Servant. So that the Johannine Jesus assumes the role of lamb, but no more a lamb only to Israel but to the whole world. With this, the salvation of the Lamb-Servant is universal. He plays the role of forgiving sins and to make passing to eternal life, since He reconciles the mankind to God through his blood.

The greeting of John the Baptist in John 1:29, in principle shows somewhat understandable, however, from a theological journey that culminates on Golgotha, in John 19.34-36, it is understandable what John the Baptist had announced in the opening week of Jesus' activity. Now, in the Passion, the final Easter is accomplished, full forgiveness is given, through the voluntary surrender of the Lamb of God.

(8)

a.C.- Antes de Cristo

Ant- Antonianum

AT- Atualidade Teológica

Bib- Revista Bíblica

CD- Cuadernos Doctorales

DB- Dicionário Bíblico

DBU- Dicionário Bíblico Universal

d. C.- depois de Cristo

DCBNT- Dizionário dei Concetti Biblici del Nuovo Testamento

DCT- Dicionário Crítico de Teologia

DEB- Dicionário Enciclopédico Bíblico

DENT- Dicionário Exegético del Nuevo Testamento

DITNT- Dicionário Internacional de Teologia do Novo Testamento

DITAT- Dicionário Internacional de Teologia do Antigo Testamento

EstB- Estudios Bíblicos

EB-Estudos Bíblicos

GLNT- Grande Lessico del Nuovo Testamento

GLAT- Grande Lessico dell´Antico Testamento

NRT- Nouvelle Revue Théologique

PT- Perspectiva Teológica

CBQ- Catholic Biblical Quarterly

RB- Revue Biblique

(9)

INTRODUÇÃO...08

I CAPÍTULO: A TRADIÇÃO DO CORDEIRO...18

INTRODUÇÃO...18

1.1PONTOS COMUNS ENTRE JUDEUS E SAMARITANOS...19

1.1.1 A imolação do cordeiro como lugar da identidade e da memória...24

1.1.2 Jesus como cordeiro para judeus e samaritanos no interior da comunidade joanina...30

1.2 JOÃO BATISTA E O JUDAÍSMO DO PRIMEIRO SÉCULO...33

1.2.1 O Movimento de João Batista e sua relação com Jesus no Quarto Evangelho ...38

1.3 A PROFECIA E JOÃO BATISTA...42

1.3.1 A tradição do Servo Sofredor no Primeiro Século...45

1.3.2 A saudação do Batista e o ministério de Jesus...47

1.3.3 A declaração do Batista e o seu ministério...50

II CAPÍTULO: O CORDEIRO NO CULTO NO SEGUNDO TEMPLO E A INTERPRETAÇÃO JOANINA...54

INTRODUÇÃO...54

2.1 CORDEIRO COMO ELEMENTO CULTUAL...58

2.1.1 O cordeiro nas festas judaicas e a relação com o Quarto Evangelho...60

2.2 O CAMINHO TEOLÓGICO DE JO 1,29 A 19,34-36...66

2.3 NÃO LHE QUEBRARAM NENHUM OSSO ( Jo 19,36)...80

III CAPÍTULO: A COMUNIDADE E O CORDEIRO...89

INTRODUÇÃO...89

(10)

3.2 O CORDEIRO E SUA RELAÇÃO COM A EXPECTATIVA DO MESSIAS....100

3.2.1 O Cordeiro de Deus e tipologias samaritanas do Messias...106

3.3 CORDEIRO: A HUMANIDADE RECONCILIADA COM DEUS...111

CONSIDERAÇÕES FINAIS...122

(11)

INTRODUÇÃO

A presente pesquisa se pauta pela busca de compreender a imagem do cordeiro no Quarto Evangelho, uma vez que somente ele, entre os evangelhos, atribui a Jesus essa tipologia, pelo que esta investigação, por meio da pesquisa bibliográfica, procura sua aceitação e relevância para a comunidade joanina.

O Quarto Evangelho está profundamente marcado pela vida litúrgica de Jerusalém, levando a crer que tivéssemos no interior da comunidade joanina forte influência sacerdotal, aliás, segundo Simoens, este Evangelho possui grande simbolismo sacerdotal1, o que inclusive se desdobra em tipologias atribuídas a Jesus, como por exemplo, a tipologia de cordeiro. Por sua vez, a exegese levantou vários problemas em torno deste Evangelho, inclusive aliando-o mais à fonte helenista que judaica. Isto se tornou, no século XX, tema de muitas discussões e mereceu a atenção de grandes especialistas; junto ao tema da fonte helenista ou judaica se somaram as discussões sobre a comunidade joanina, sua localização e a problemática da redação do Evangelho. Na Igreja Primitiva, devido aceitação do Evangelho segundo João por círculos gnósticos, inicialmente ele sofreu rejeição por parte da Igreja Primitiva2, no entanto, já no final do século II d.C. personagens como Teófilo de Antioquia e Irineu de Lião fazem dele citações; também consta nas listas canônicas como Muratori e o Códice de Claromontanus3, demonstrando que, apesar do problemático uso pelos gnósticos, o

Evangelho joanino conseguiu provar sua identificação com a grande Igreja e compor o Cânon cristão.

1 SIMOENS, Yves. L´évangile selon Jean. RB, Paris, n. 4, 2000, p. 188: “quoi qu´on en dise à l´heure actuelle dans les rangs de la grande majorité des exégètes tant catholiques que protestants, cette symbolique est à dominante sacerdotale. C´est ce qui explique par example la place et l´importance prise par la scène au temple dès le début de la vie publique de Jésus à Jerusalem selon Jean (Jn 2,13-25). C´est

ce qui explique aussi que la prière de Jésus en Jn 17 soit à juste titre dénominée „sacerdotale‟.” [tradução nossa: “O que se diz no momento atual nas fileiras da maioria dos exegetas, tanto católicos quanto protestantes, é que este símbolo possui uma dominante sacerdotal. É isto que explica, por exemplo, o lugar e a importância tomada pela cena, no templo, desde o princípio da vida pública de Jesus, em Jerusalém, segundo João (Jo2,13-25). É isto que explica também que a oração de Jesus em Jo 17 seja, a

título justo, denominada „sacerdotal‟.”]

2 VIDAL, Senén. Los escritos originales de la comunidad del Discípulo “amigo” de Jesus: El Evangelio y las cartas de Juan. Salamanca: Ediciones Sigueme, 1997, p. 14: “su aceptación como escritura autoritativa („canônica‟) de la iglesia no fue producto de una decisión momentânea, sino un

lento processo a lo largo del siglo II d.C. [...] a la problemática de esa tradición eclesiástica sobre las orígenes de la literatura juánica (Jn y 1-3 Jn) apuntaban ya las fuertes voces opositoras que desde el comienzo se alzaron contra ella, especialmente en el caso del evangelio, y cuya dureza e insistência esta testificada hasta bien entrado el s. III d.C.: lejos de ligar el evangelio al „apóstol‟ Juan, lo hacían obra del gran hereje Cerinto. Detrás estaba la sospecha de una amplia corriente de la Igresia „ortodoxa‟ ante aquel

escrito incómodo, querido y utilizado por muchos cristianos heréticos de su tiempo, especialmente por los gnósticos valentinianos y por los montanistas.”

(12)

No século XX o tema gnóstico e o Evangelho segundo João voltariam a ocupar a pauta das discussões teológicas. Pois, ao se buscar o pano de fundo do Quarto Evangelho, alguns teóricos o viram como profundamente gnóstico. O grande nome a defender esta teoria foi Rudolf Bultmann.

Bultmann defende que o Evangelho joanino está enraizado na gnose mandea, sobretudo no mito do redentor4; ele desenvolve tal teoria ao realizar o paralelo entre alguns atributos do Jesus joanino e o referido mito: preexistência, luz versus trevas, revelar o Pai e o constante uso do verbo conhecer. No entanto, o mito levantado por Bultmann não está registrado antes do século II d.C., quando o Evangelho já estava concluído, isto é, não há registro de escritos que indiquem que o mito gnóstico do redentor existisse antes do II século5. Segundo Fuente, Bultmann aliou o Evangelho joanino ao gnosticismo mandeu, mas Lietzmann, por meio de pesquisas, demonstrou que o gnosticismo mandeu surgiu apenas no período árabe-bizantino6. Entretanto, a teoria bultmanniana ganhou adeptos e se cimentou por um tempo; um dos exemplos é Koester, que considera o Evangelho joanino como uma interpretação gnóstica dos ensinamentos de Jesus7.

Com as descobertas de Qumran, na década de quarenta, no século XX, os defensores do gnosticismo joanino sofreram um golpe, pois propunha que João seria absolutamente de matriz gnóstico-helenista; mas com as descobertas do Mar Morto, encontrou-se um grupo, radicalmente judeu, que trazia características semelhantes a algumas propostas

joaninas. De fato “a descoberta dos manuscritos de Qumran permitiu lançar nova luz

sobre as ligações entre João e o judaísmo palestinense”8.

Pela narrativa do Quarto Evangelho, a comunidade joanina se aproximou não só do

judaísmo sacerdotal, mas “a linguagem e as representações religiosas típicas do

Evangelho de João dão testemunho de um grande parentesco com o judaísmo

4 Cf. Idem ibidem,p. 455.

5 Cf. Idem ibidem, p. 456: “se este é o caso- e é o terceiro ponto-, é forçoso então constatar que os documentos literários gnósticos mais antigos que possuímos datam do século II (o mito do redentor, por exemplo, só aparece em uma fase ulterior do gnosticismo e de modo algum em suas origens). Esse diagnóstico se verifica para o evangelho de João; os documentos gnósticos mais intimamente ligados a ele (p. ex. o hino da Pronoia transmitido no Apocryphon de João) apareceram no século II, ou seja, depois da

redação do evangelho.”

6 Cf. FUENTE, Alfonso de la. Transfondo cultural del Cuarto Evangelio: sobre el ocaso del dilema judaísmo/gnosticismo. EstB, Madrid, v. 56, n. 4, 1998, p. 495.

7 Cf. KOESTER, Helmut. Introdução ao Novo Testamento: história e literatura do cristianismo primitivo. V. 02. São Paulo: Paulus, 2005, p. 197: “o Evangelho de João é, portanto um testemunho

importante do desenvolvimento inicial de uma compreensão gnóstica da tradição dos ditos de Jesus e de

uma interpretação espiritualizada dos sacramentos.”

(13)

heterodoxo (Qumran, samaritanos, círculos batistas)”9. De certo, que o entorno onde surgiu este evangelho é complexo e se mostra enriquecido por diversas contribuições10, o que retira a exclusividade gnóstica proposta por Bultmann, visto que a comunidade de Qumran11 trouxe uma nova perspectiva de leitura sobre a comunidade judaica e a influência que recebeu do pensamento grego. Na mesma linha, o pensamento de Filão de Alexandria contribui para aproximar o Logos joanino mais do judaísmo que do helenismo puro.

Entre Filão e o Quarto Evangelho, a idéia do Logos se difere e se identifica. Na ideia de Filão, o Logos é o ser intermediário, pelo qual, Deus criou tudo, é a “sabedoria, o espírito, a bondade e o poder”12; é exposto por Filão como um vigário, pelo qual Deus

cria e governa o mundo, “é um verdadeiro intermediário entre Deus e os homens”13. Partes destas características se encontram no Logos joanino, contudo, o Logos de Filão não é personificado, isto é, não se torna pessoa14, e aqui há uma grande novidade no

Evangelho segundo João: o Logos se encarna. Ele “se aproxima definitivamente dos

homens com sua graça. Dir-se-ia que na ideia da encarnação estaria encerrada toda a

obra da salvação”15.

O problema do entorno do Quarto Evangelho se mostra, deste modo, mais judaico que helenista, mas salvando a consideração de que o judaísmo contemporâneo a Jesus era mesclado, e se compunha de várias tendências que fugiam à ortodoxia do judaísmo das autoridades do Templo. Qumran é um exemplo de um judaísmo com um gnosticismo incipiente, ainda não desenvolvido16. Assim, o Quarto Evangelho pode sim

9 Idem ibidem, p. 467. 10 Idem ibidem, p. 467.

11 Cf. FUENTE, Alfonso de la. Transfondo cultural del Cuarto Evangelio: sobre el ocaso del dilema judaísmo/gnosticismo. EstB, p. 498: “pero los textos de Qumrán- que no por pertenencer a una rama heterodoxa del judaísmo dejan de ser judíos- permiten explicar mucho más. Entre Qumrán y el cuarto evangelio se dan semejanzas en puntos que no aparecen en la doctrina del judaísmo oficial: dualismo

luz/tinieblas, contraposición vida/muerte.”

12 LOHSE, Eduardo. Contexto e ambiente do Novo Testamento. São Paulo: Paulinas, 2004, p. 127. 13 Idem ibidem, p. 127.

14 Cf. SHREINER, Josef; DAUTZENBERG, Gehard. Forma e exigências do Novo Testamento. São Paulo: Editora Teológica, 2004, p. 296.

15 Idem ibidem, p. 296.

16 Cf. FUENTE, Alfonso de la. Transfondo cultural del Cuarto Evangelio: sobre el ocaso del dilema judaísmo/gnosticismo. EstB, p. 503: “ahora bien, hoy parece demonstrado que, en el siglo I d.C., esos

(14)

ter traços de um gnosticismo ainda nascente, mas recebido do mundo judeu, e não diretamente de movimentos gregos, como supõe Bultmann17.

A presente pesquisa parte do princípio de que a comunidade joanina se compôs por diversos grupos que estavam na região da Palestina, são eles: judeus advindos de círculos ortodoxos como fariseus e sacerdotes e vindos de círculos heterodoxos, como Batistas e gregos e ainda do meio samaritano18. A comunidade joanina é “um grupo de

cristãos de tradição diferente dos sinóticos, mas presente desde o tempo de Jesus até o

séc. II”19.

Pela fluência de temas complexos como o Logos e o dualismo, e levando-se em

consideração que “sua linguagem é de colorido semítico num grego correto”20, pode-se considerar que a comunidade joanina fosse composta também por mestres, isto é, pessoas que conheciam os temas judeus que estavam na ordem do dia no período da

redação do Evangelho e manuseavam fontes diversas para dar as razões da fé, assim, “a

comunidade joanina não era composta por um grupo de pessoas simples ou ignorantes. Pelo contrário! Tratava-se de um grupo com certas pretensões culturais”21.

Para a comunidade joanina, a morte de Jesus é o ponto onde se pode constatar a sua

obra, isto é, “a morte de Jesus constitui o pólo de atração de todo o relato da vida de Jesus”22, a tanto que é “possível viver como Jesus porque é possível morrer como ele:

dando a vida”23. Tendo a morte de Jesus como o ponto alto do Evangelho, a comunidade demonstra o sentido que dá à saudação Batista em Jo 1,29.36.

A localização da comunidade joanina ajuda a compreender o seu escrito e todos os recursos que ele utiliza, no entanto, esta não é uma tarefa fácil. Muitos pesquisadores já têm se debruçado sobre este tema de difícil consenso. A localização mais comum para esta comunidade está entre a Síria ou a Ásia Menor, mais especificamente em Éfeso24, contudo, não se pode negar que sua primeira etapa esteja na Palestina, donde provavelmente migrou na guerra de 7025.

Koester localiza a comunidade do Quarto Evangelho na Síria, onde teria tido contato com outras tradições cristãs, como a petrina:

17 Cf. idem ibidem, p. 493

18 Cf. MARGERAT, Daniel (Org). Novo Testamento, p. 467.

19 NEVES, Joaquim Carreira. Escritos de são João. Lisboa: Universidade Católica Editora, 2004, p. 61. 20 SCHREINER, Josef; DAUTZENBERG, Gehard. Forma e exigências do Novo Testamento, p. 306. 21 O´CALLAGHAN. José (Org). A formação do Novo Testamento. São Paulo: Paulinas, 2000, p. 61. 22 Idem ibidem, p. 61.

23 Idem ibidem, p. 61.

(15)

O evangelho de João é produto de uma tradição especial que deve ser situada na Síria, mas ele pressupõe um desenvolvimento de comunidades independente de outras igrejas sírias, pelo menos no princípio. São evidentes no curso de sua evolução contatos com outros círculos (petrinos) da Síria, especialmente na apropriação de histórias de milagre e da narrativa da Paixão. Uma dependência dos evangelhos sinóticos só é possível na última etapa da redação do Evangelho de João. Característica da tradição joanina é o material que resultou na formação dos diálogos e discursos que refletem a cristologia e a soteriologia especificamente joaninos.26

Zumstein considera que situar a comunidade na Síria é algo possível, mas que alguns fatores são determinantes para localizar a redação final do Evangelho na Ásia Menor, diz ele,

Para determinar o lugar provável em que foi composto o evangelho, é preciso levar em conta seis fatores. Deve ser: 1) um lugar onde a sinagoga dos fariseus tinha um papel importante e onde lhe fosse possível impor medidas disciplinares; 2) um lugar onde o judaísmo heterodoxo ainda era florescente; 3) um lugar onde os discípulos de João Batista veneravam seu falecido mestre; 4) um lugar onde a gnose iria poder se desenvolver; 5) um lugar onde o grego era de uso corrente; 6) um lugar onde as figuras de Pedro e de Tomé desempenhavam um papel eclesial de primeiro plano. A Síria constitui um espaço onde essas seis condições se reúnem, mas nem por isso se pode excluir a Ásia Menor [...] a eventual localização do Evangelho na Síria só valeria para o trabalho do evangelista; a redação final desse mesmo evangelho e a das epístolas joaninas devem ser situadas provavelmente na Ásia Menor.27

Levando em consideração a geografia palestinense presente no Evangelho e o fluente uso das tradições religiosas de Jerusalém, como as festas, a imagem do cordeiro, a piscina de Siloé e os debates acerca do sábado, não se deve abandonar a hipótese de que a comunidade do Quarto Evangelho tenha dado seus primeiros passos na Palestina, aliás, mais próxima à Judéia, uma vez que a atuação de Jesus está mais situada nesta região, para onde se dirige várias vezes em peregrinação.

Tuñí defende que a comunidade do Evangelho segundo João “surgiu provavelmente

nos círculos próximos a Jerusalém”28 e só com a guerra judaica contra Roma ela migrou para outras regiões, talvez para Síria e mais tarde para Ásia Menor. Migrando da região da Judéia, a comunidade levou seus primeiros registros, que foram se somando nas memórias e interpretações utilizadas pelo redator final, resultando no Evangelho que se tem hoje.

26 KOESTER, Helmut. Introdução ao Novo Testemento, p. 194. 27 MARGERAT, Daniel (Org). Novo Testamento, p. 459.

(16)

Enfim, como mencionado, localizar a comunidade joanina não é uma tarefa fácil, e nem definitiva, pois apesar de tantos esforços, ainda permanecem questões a serem postas, no entanto, é provável que aí na região da Judéia esteja a primeira fase da comunidade joanina e a base escriturística de seu Evangelho.

Ao lado da localização da comunidade joanina, outra dificuldade é demonstrar as etapas de redação do Evangelho. O que se nota em uma primeira leitura é que o Quarto

Evangelho possui “desacerto” na continuidade redacional, o que leva a crer que tenha passado por mais de um escritor e em épocas diferentes. Este “desacerto” é o que Neves

chama de aporias redacionais29.

Para Neves, as aporias “nos obrigam a concluir que o quarto evangelho não foi

escrito por alguém de maneira harmônica e com uma unidade estrutural e redacional

sem mácula”30, pelo contrário, o que se mostra é que a questão da autoria, atribuída ao Discípulo Amado (cf. Jo 21,24), como sendo o apóstolo João31, passa a ser uma atribuição moral, ao invés de factual, no entanto, isto não nega que o Discípulo Amado tenha sido um membro real na comunidade joanina32. O Discípulo Amado não deve ter

sido o João Apóstolo, mas “foi, com certeza, um discípulo de segunda importância para a tradição da Igreja dos Sinópticos, mas de primeira grandeza para a tradição joanina”33.

Quanto à redação, um texto que aponta etapas é a conclusão, isto é, “sem dúvida, 20,30-31 é uma conclusão. Mas encontramos outra em 21,24-25. Daí se pode concluir que o

cap. 21 é um acréscimo ulterior”34. Expondo já, ao menos duas redações no Quarto Evangelho.

A questão joanina da redação ocupou vários especialistas da área bíblica, que se esforçaram por desenvolver teorias para explicar como se deu o processo redacional do Quarto Evangelho. Konings utiliza a imagem de um templo para propor as várias etapas de redação do Evangelho joanino35 e a sua pretensão se somam outros autores.

29 Cf. NEVES, Joaquim Carreira. Escritos de são João, p.40. 30 Idem ibidem, p. 41.

31 Cf. BLANCHARD, Yves-Marie. São João, p. 20.

32 MARGERAT, Daniel (Org). Novo Testamento, p. 459: “levando-se em conta que em João existe uma certa rivalidade entre Pedro e o discípulo amado e, ainda mais, que a morte do discípulo bem-amado parece ter constituído um problema para os círculos joaninos, conclui-se que o discípulo amado não deve ser considerado uma figura puramente simbólica, sem consistência histórica; trata-se de uma figura conhecida nos círculos joaninos, mais precisamente como o fundador da tradição e da escola joanina.”

33 NEVES, Joaquim Carreira. Escritos de são João, p.46.

34 FABRIS, Rinaldo; MAGGIONI, Bruno. Os Evangelhos, v. II. São Paulo: Loyola, 1992, p. 253. 35 Cf. KONINGS, Johan. A memória de Jesus e a manifestação do Pai no Quarto Evangelho. PT, Belo

(17)

Sobre a teoria da redação levantam-se muitas teorias, entre elas seguem algumas: unidade da composição: essa hipótese defende que todo o Evangelho foi escrito por uma única pessoa, um único autor, segundo essa hipótese, as dificuldades encontradas no interior do texto se explicam pelo fato do autor ter feito várias revisões, como que reeditando com alterações. Ela foi defendida por nomes como Ruckstuhl, Schweizer e mais tarde por Lindars e Wilckens36.

Uma segundo hipótese considerada aqui é a defendida por Wellhausen e mais tarde por Richter, que defendia a existência de um evangelho primitivo, que estava na base do atual Evangelho, e chegou a tal, por uma série de ampliações37. Outra hipótese é aquela defendida por Bultmann: a teoria das fontes. Segundo a qual, o evangelista obteve uma fonte sobre a Paixão, uma sobre os relatos de milagres e uma terceira fonte sobre os ditos (logia). Com esse material, segundo Bultmann, o evangelista fez um primeiro

trabalho de redação, que seria ampliado pela redação final38. Mais recente ganhou grande aceitação a hipótese levanta por Brown. Ele defende a existência de cinco camadas redacionais,

A primeira situa-se no estágio da tradição oral; a segunda pertenceria à reelaboração deste material no meio dos círculos joaninos; a terceira seria a primeira redação propriamente dita do evangelho; uma quarta fase pertenceria à retomada que o mesmo autor da terceira redação faz, acrescentando elementos novos surgidos dentro da Igreja em tempos posteriores, e a redação final se constituiria numa revisão que um membro da escola do evangelista teria feito mais tarde.39

A teoria de Brown, segundo Moloney, foi revista e organizada pelo próprio Brown em três estágios, ao invés de cinco, como em 196640. Os três estágios apresentados por Brown, como revisão de sua obra, são: primeiro estágio, que consiste na fase testemunhal, isto é, como os demais evangelhos, também o de João teve uma

36 Cf. MARGERAT, Daniel (Org). Novo Testamento, p. 445. 37 Cf. Idem ibidem, p. 445.

38 Cf. idem ibidem loc. Cit.

39 MAZZAROLO, Isidoro. Leitura evolutiva dos Evangelhos: a integração de Lucas e João. AT, Rio de Janeiro, n. 19, 2005, p. 43.

40 Cf. MOLONEY, Francis J. Raymond Brow´s new introduction to the Gospel of John: a presentation- and questions. CBQ, Washington, n. 01, 2003, p. 3: “In the 1966 commentary, before his work on the

history of the johannine community, Brown suggested a five-stage theory for the development of the Gospel. He now associates a theory of composition with more recent speculations on the history of the community development that produced the gospel as we now have it. Brown´s modified theory suggests that the gospel´s development through three stages parallels the development of all four gospels.” [tradução nossa: “No comentário de 1966, antes de seu trabalho sobre a história da comunidade joanina,

Brown sugeriu uma teoria dos cinco estágios para o desenvolvimento do Evangelho. Ele, doravante, associa uma teoria da composição com especulações mais recentes sobre a história do desenvolvimento da comunidade que produziu o evangelho como nós o temos hoje. A teoria modificada de Brown sugere que o desenvolvimento do evangelho, em três estágios, faz paralelo com o desenvolvimento de todos os

(18)

testemunha no grupo dos discípulos41; o segundo estágio consiste na tradição oral, onde o Discípulo Amado teve grande importância, aqui alguns relatos já podem ter sido escritos, seriam décadas nas quais pesa o que o Discípulo Amado ensinou42; o terceiro

estágio possui dois momentos, um teria o que Brown chama de „evangelista‟, ele seria o

responsável por coletar as tradições do Discípulo Amado e organizá-las junto com outros materiais, de modo que seja o responsável pela organização teológica de sinais, discursos e narrativas43. Na segunda fase do terceiro estágio, Brown considera que há um redator44, aquele que trabalhou com o material deixado pelo evangelista e levou o Quarto Evangelho ao formato que se tem hoje. Ele teria acrescentado o Prólogo e o Epílogo, segundo Brown.

Contemporânea à revisão de Brown, levantada por Moloney, houve a publicação dos trabalhos de Vidal, os quais, segundo Neves, são relevantes para a discussão das fases da comunidade e a redação do Evangelho joanino45.

Vidal considera que há um princípio comum tanto para o Evangelho segundo João, como para os sinóticos (Mc, Mt e Lc). Todos teriam se formado de pequenas memórias (peças) guardadas a partir de relatos e ditos, que eram transmitidos pelas comunidades, até que chegaram a ser escritos, e desde aí passaram por interpretações e ampliações até cada tradição (sinótica e joanina) compilar estes escritos em evangelho46. Considerando

esta proposta é que Vidal desenvolve seu trabalho, realizando a análise de cada „peça‟

41 Cf. Idem ibidem, p. 4.

42 Cf. idem ibidem, p. 4: “Again, in a fashion similar the development of the synoptic tradition, for several dacades Jesus was proclaimed in the postresurrectional context of a christian community. It is at this stage that the beloved disciple played a crucial role. This figure, not one of the twelve but a disciple of Jesus, was the link between the frist and second stage. The bulk of this lengthy period (several decades) would have been marked by the oral transmission of the tradition of the beloved disciple, but there may have

been something written toward the end of his stage.” [tradução nossa: “Mais uma vez, de maneira similar

ao desenvolvimento da tradição sinóptica, por várias décadas, Jesus foi proclamado no contexto pós-ressureição de uma comunidade cristã. É neste estágio que o discípulo amado assume um papel crucial. Esta figura, que não é um dos doze, mas um discípulo de Jesus, foi o elo entre o primeiro e o segundo estágio. A maior parte deste longo período (décadas) teria sido marcado pela transmissão oral da tradição

do discípulo amado, mas pode ter sido algo escrito no final do seu estágio.”]

43 Cf. Idem ibidem, loc. Cit.

44Cf. Idem ibidem, p. 4: “Finally, 'the redactor' produced the gospel as we now have it. This figure is responsible for such features as the Prologue (1:1-18) and the Epilogue (21: 1-25) and for shifting certain blocks of material within the evagelist´s story from on place to another.” [tradução nossa: "Por último, „o redator‟ produziu o evangelho como nós o temos hoje. Esta figura é responsável pelos recursos, como o

Prólogo (1,1-18) e o Epílogo (21, 1-25), bem como, pela mudança, de um lugar para outro, de certos blocos de material, ao interno do relato do evangelista.”]

45 Cf. NEVES, Joaquim Carreira. Escritos de são João, p. 60.

(19)

dos textos atuais, na busca da origem da tradição e seu desenvolvimento até chegar ao texto que temos hoje47.

Todas estas teorias, com seus diversos acenos, contribuíram para o estudo do Quarto Evangelho e levam a compreender que este Evangelho surgiu de forma processual, não foi redigido por uma única pessoa e nem em um mesmo ano; outra ideia comum nas teorias é o início da comunidade na Palestina e a sua formação vinda de um judaísmo plural, haja vista a presença de Batistas e Samaritanos. É partindo das origens na Palestina e considerando que seus primeiros membros eram de grupos diversos do judaísmo do Primeiro Século, que a presente pesquisa busca elucidar a tipologia do cordeiro, atribuída a Jesus, como uma imagem que contribuiu para a identidade do grupo e para sustentar sua teologia da reconciliação em Jesus.

A imagem do cordeiro, que é aceita e acolhida pela comunidade joanina, leva-a a uma constatação: Jesus é o vínculo de reconciliação com o Pai. Ora, todo o Quarto Evangelho é uma revelação da unidade entre Jesus e o Pai (cf. Jo 14,8-11). O Filho veio fazer a vontade do Pai (cf. Jo 17,4), e se torna a oferta de reconciliação entre Deus e a humanidade, isto é, a humanidade decaída foi presenteada pelo Pai com a oferta amorosa do Filho, como um cordeiro, que se fez obediente, inclusive até a morte, com isto, sua entrega é a consumação do amor que há entre o Pai e o Filho, e de fato, só o amor tem a força necessária para reconciliar.

Para percorrer este caminho, a presente pesquisa se organiza em três capítulos que possuem subdivisões internas, no entanto, passar-se-á à macro divisão.

O primeiro capítulo busca elucidar a tradição do cordeiro e sua relação com os samaritanos e João Batista, partindo do pressuposto de membros oriundos destes grupos na comunidade joanina, procurando responder a pergunta: que sentido tem para samaritanos e batistas chamar Jesus de cordeiro? A memória da saída do Egito é comum a samaritanos e judeus. Levando a crer que a primeira memória samaritana referente a cordeiro seria a libertação do Egito e a formação de um único povo. Por sua vez, a relação com João Batista traz a problemática da fonte de sua saudação, se Is 53,7 ou o Cordeiro Pascal (Ex12). Em todo caso, a analogia feita pelo segundo Isaías é litúrgica, isto é, compara o servo com o cordeiro que expia os pecados, assim, é possível que o Quarto Evangelho tenha fundido já na saudação Batista, o rito pascal e o sacrifício de expiação.

(20)

A comunidade joanina, apesar da presença de gente oriunda de vários grupos da época, parece que predominava a tradição judaica, gente que freqüentava o Templo, que conhecia a vida litúrgica de Israel, e provavelmente vivia nas imediações de Jerusalém48. Pelo que, o segundo capítulo procura expor a vida litúrgica do Segundo Templo e nela a presença do cordeiro como elemento litúrgico. Nas festas listadas pelo Quarto Evangelho, todas guardavam sacrifícios de animais, entre eles o cordeiro, o que reforça o pano de fundo litúrgico à saudação Batista (cf. Jo 1,29.36). No segundo capítulo é também relevante a citação em Jo 19,36: não lhe quebraram nenhum osso. A

sua fonte é discutível, se o salmo 34 ou Ex 12, contudo, todo o contexto da morte de Jesus dentro da preparação pascal leva a entender que em Jo 19,36 se completa o que fora dito em Jo 1,29: eis o cordeiro de Deus.

Constatado, que entre os evangelhos, somente o Quarto Evangelho aplica a Jesus a tipologia de cordeiro, chega-se a compreender que esta imagem era importante para a comunidade joanina. Por isso, o terceiro capítulo expõe a singularidade desta tipologia entre os evangelhos, e liga tal imagem à esperança messiânica de Israel, mas, sobretudo, defende que Jesus é a oferta de reconciliação apresentada pelo Pai. E sua morte, antes de ser uma tragédia, é uma entrega voluntária e por amor, em favor da humanidade.

Portanto, os três capítulos da presente pesquisa estão colocados para evidenciar a propriedade do Evangelho joanino quanto ao tema do cordeiro e ressaltar a formação desta comunidade, como uma comunidade aberta, formada por diversos grupos, cultivando o diálogo e a esperança messiânica.

(21)

CAPITULO I

A TRADIÇÃO DO CORDEIRO

INTRODUÇÃO

A pesquisa bíblica sobre o Quarto Evangelho encontra diversas interpretações a respeito da pessoa de Jesus. Entre elas está a imagem do cordeiro que se revela envolta em muita complexidade, pois em si já traz duas possibilidades: Cordeiro Pascal e Servo de Deus. Nos textos neotestamentários existem referências à imagem do cordeiro49 que são aplicadas a Jesus, valendo-se de termos sinônimos, mas com uso cultural diferenciado, como se perceberá na sequência da pesquisa.

No Evangelho joanino há dois momentos que se referem ao cordeiro explicitamente: 1,29 (no dia seguinte João viu Jesus aproximar-se e disse: eis o cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo) e 1,36 (fixou a vista em Jesus que passava e disse: eis o cordeiro de Deus) – e ainda outro momento em que a referência é implícita – 19,36

(assim sucedeu para que se cumprisse a Escritura: não lhe quebrareis osso algum).

No capítulo primeiro do Evangelho segundo João, a imagem está associada a tirar o pecado do mundo50, e no capítulo dezenove, do mesmo Evangelho, há uma identificação com o sacrifício realizado no Templo51. Diante destes textos, levando-se em consideração que a comunidade joanina possui uma formação complexa e difícil para se reconstruir52, é importante supor que, para a comunidade, a identificação de Jesus como cordeiro fosse relevante, ou seja, como a imagem persiste em aparecer duas vezes no primeiro capítulo e ainda na narrativa da Paixão, leva a crer que a comunidade do Quarto Evangelho atribuía valor significativo para a imagem de Jesus como cordeiro.

49 COENEN, L.; BEYREUTHER, E.; BIETENHARD, H. DCBNT. Bologna: EDB, 1976, p 63: “Nel NT Gesù vienne chiamato 4 volte amnós (Gv 1,29.36; At 8,32; 1Pd 1,19). ; arén compare uma sola volta nel NT, in Lc 10,3 dove se dice che i discepoli saranno indifesi come le pecore in mezzo ai lupi. ; arnión in Gv 21,15 la comunità è proprietà di Cristo e abbisogna della fedeltà del discepolo che deve fungere da pastore.; oltre a Gv 21,15, arníon si trova esclusivamente in Ap (27 volte).” [tradução nossa: No NT Jesus é chamado 4 vezes de amnós (Jo 1,29.36; At 8,32; 1Pd 1,19). ; Arén aparece somente uma vez no NT, em Lc 10,3 onde se diz que os discípulos serão indefesos como as ovelhas em meio aos lôbos. ; arnión aparece em Jo 21,15 onde a comunidade é propriedade de Cristo e necessita da fidelidade do discípulo

que deve agir como pastor. Além de Jo 21,15, arnión se encontra exclusivamente no Ap (27 vezes).”]

50 Cf. LÉON-DUFOUR, Xavier. Leitura do Evangelho segundo João: palavra de Deus. V. I. São Paulo: Loyola, 1996, p. 134.

(22)

Alguns estudiosos, como Zumstein53, entendem que a comunidade joanina possuía membros vindos do grupo do Batista, bemcomoadeptos provenientesdapluralidade do judaísmo do primeiro século (fariseus, saduceus, essênios, sacerdotes e judeus da diáspora)54 e domeio samaritano55. Diante disto vale a pena uma pesquisa para verificar a relevância da imagem do cordeiro para cada um dos grupos que formaram a comunidade do Discípulo Amado, levando em consideração três matrizes grupais: Judeus, Batistas e Samaritanos56.

1.1.Pontos comuns entre judeus e samaritanos

No percurso da pesquisa sobre o cordeiro em João, faz-se necessário, como mencionado anteriormente, levar em consideração a composição da comunidade joanina. Para Vidal, a comunidade joanina é formada por diversos grupos, entre eles a comunidade de Sicar (cf. Jo 4,5-41)57, pelo que cumprerealizaruma retomada histórica

da relação entre judeus e samaritanos, destacando a relevância do cordeiro para as

“duas” tradições.

No tempo de Jesus havia entre judeus e samaritanos uma animosidade que fora construída ao longo da história e resistia mesmo diante da alegada origem comum: a saída do Egito.

Quando ocorre a libertação do Egito, os antepassados pertencentes ao povo de Israel são tratados na memória como sendo um clã, com sucessão harmônica, isto é, o texto bíblico veterotestamentário constrói uma descendência a partir de Abraão e segue-se às doze tribos como oriundas da mesma linhagem patriarcal, de onde veio o povo de Isreal (cf. Js 24). Assim, por longos anos, até a cisão entre o Reino do Sul e o Reino do Norte

53 Cf. MARGUERAT, Daniel (Org). Novo Testamento: história, escritura e teologia. São Paulo: Loyola, 2009, p. 452-456.

54 Cf. GASS, Ildo B. Uma introdução à Bíblia: as comunidades cristãs da primeira geração. São Paulo: Paulus, 2000, p. 45.

55 Cf. VIDAL, Senén. Los escritos originales de la comunidad del discípulo “amigo” de Jesús, p. 16:

“el relato de la fundación de la comunidad juánica de Sicar en Samaria (4, 5-41) sin paralelo en la tradición sinóptica, es una narración espléndida sobre la actividad misional de los grupos juánicos en sus

tiempos antiguos.”

56 Aqui poderíamos considerar João Batista como judeu, aliás o seu Movimento é um entre tantos no meio judaico do primeiro século, no entanto, considerando as particularidades deste Movimento, vale considera-lo em separado, também por sua relevância em relação à pesquisa sobre o Movimento de Jesus, como se verá ulteriormente.

(23)

(cf. 1Rs 12,1-33), Israel era um só povo58. Todavia,após a morte de Salomão e a subida de seu filho Roboão ao trono, o Sul e o Norte levaram a termo a tensão que já se instalara ao início da monarquia, ocasionando a separação entre os dois reinos,elevando ainda mais a animosidade já existente, emboranão tenhasido esteaindao momento da cisão radical.

Após a queda da Samaria, a Assíria povoou a região com gente vinda de várias partes, o que, segundo a Judéia, tornou a Samaria uma terra pagã (cf. 1Rs 17,24-41). A dificuldade de convivência se intensifica após o fim do Exílio da Babilônia59. Os repatriados de Judá requerem a pureza, causando grande dificuldade para a convivência com os samaritanos, os quais pleitearam o direito deconstruir um templo em Garizim, que foi erguido somente no começo da época grega, em 33260, e destruído por João Hircano, no período dos Macabeus, o que foi o ponto alto dos conflitos61.

Apesar da significativa existência de conflitos entre estes povos, a realidade histórica mostra também a presença de grande identidade entre um e outro. Prova disso consiste na figura dos patriarcas, visto que tanto judeus quanto samaritanos entendem que Abraão, Isaac e Jacó são seus pais, soma-se a isto várias manifestações religiosas que identificam a raiz comum a judeus e samaritanos.

No relacionamento com a Escritura, os samaritanos mantêm a tradição do Pentateuco, legitimando os cinco primeiros livros da Bíblia como sagrados62 e aceitando-os para o culto e para a instrução na fé63. Lohse entende que a unidade no Pentateuco se dá porque quando eles se separaram ainda não havia a compilação e aceitação geral de outros textos como sagrados, seja a literatura sapiencial ou

58 Cf. SCHMIDT, Francis. O pensamento do Templo de Jerusalém a Qumran. São Paulo: Loyola,

1994, p. 104: “os samaritanos são javistas como o são os judeus da Judéia; como eles, receberam de

Moisés a Torah, praticam a circuncisão, observam o sábado; como eles e com eles somente entre as

nações, são monoteístas. Como eles os samaritanos são filhos de Israel.”

59 Cf. MAIER, Johann. Entre os dois testamentos: história e religião na época do Segundo Templo. São

Paulo: Loyola, 2005, p. 55: “a tradição dos exilados de Judá censurou desde cedo (cf. 2Rs 18,24ss.) os moradores do território do norte de Israel, por se terem misturado com estrangeiros imigrados, adotando um sincretismo religioso, sem dúvida principalmente aquela religião popular que apareceu também em Kuntillad Adjrud em Elefantina. Contudo, depois da repatriação, os chefes do Templo não puderam manter plenamente essa posição polêmica, o que contrariou a linha exílica, que de fato por vezes interveio

com a ajuda de judeus da Babilônia.”

60 Cf. SCHMIDT, Francis. O pensamento do Templo de Jerusalém a Qumran, p. 105.

61 Cf. LOHSE, Eduardo. Contexto e ambiente do Novo Testamento. São Paulo: Paulinas, 2004, p. 14:

“no tempo em que os samaritanos obtiveram seu próprio santuário, reinava uma inimizade profunda entre

eles e os judeus. Tal animosidade finalmente os levou à guerra. No ano 128 a.C., os judeus, sob o

comando de João Hircano, destruíram o templo do monte Garizim.”

(24)

profética64. Para Maier, a opção pelo Pentateuco se insere dentro da tensão histórica entre os dois povos, assim,

os samaritanos adotaram o Pentateuco (com poucas variantes) como Revelação do Sinai e, como os saduceus mais tarde no judaísmo, consideraram-no a única base obrigatória da Revelação. É compreensível que eles não tenham conseguido aceitar a obra historiográfica deuteronomista, com sua apresentação crítica da história do reino do Norte.65

O Pentateuco66, traço comum entre judeus e samaritanos, abre um ponto de diálogo, pois alguns de seustrechos67 levavam grupos de um e outro povo a esperar a vinda do Messias. Para os judeus, há muitas interpretações sobre a figura do Messias68; já para os samaritanos, conforme tem apontado a pesquisa bíblica, a vinda do Messias estaria de acordo com o anunciado em Dt 18,15, isto é, “o Senhor teu Deus suscitará para ti, do meio de ti, dentre teus irmãos, um profeta como eu: é a ele que deverás ouvir”.

Sobre o Messias samaritano não há muitas informações; ao que parece, ele recebia o nome de Taheb. Seria um Messias semelhante a Moisés69. Para Léon-Dufour, o Taheb é mais bem compreendido a partir de um acréscimo que existe na versão samaritana do Pentateuco,

um notável adendo feito ao texto do decálogo (Ex 20,1-21) na edição samaritana do Pentateuco poderia confirmar a espera de um profeta. Ali se lê, imediatamente antes do Código da Aliança: „eu suscitarei entre teus irmãos um profeta tal como tu (Moisés) e darei minhas palavras em sua boca‟ (Ex 20,21b). Esse acréscimo, que equivale a Dt 18,15, provaria a crença na volta um profeta que revelaria os derradeiros segredos divinos.70

64 Cf. LOHSE, Eduardo. Contexto e ambiente do Novo Testamento, p. 14. 65 MAIER, Johann. Entre os dois testamentos, p. 55-56.

66

É importante pontuar que ao se falar de Pentateuco para Judeus e Samaritanos se faz necessária a consciência que há variações entre os dois pentateucos, sobre o que existe produção literária, a exemplo de Girón Blanc, em Revista de Ciencias de las Religiones, anejos 2002, VII e também Anderson, em Revue Biblique, n. 62, 1970.

67 Cf. SOUSA, Rodrigo F. de. O desenvolvimento histórico do messianismo no judaísmo antigo: diversidade e coerência. Disponível em http://www.usp.br/revistausp/82/02-rodrigo.pdf. Acessado em 22/01/13.p. 12: “Os textos relevantes para a construção do messianismo no corpus bíblico não se limitam aos que contenham o termo mashiach. Diversos textos, como Gn. 49:10, Nm. 24:17, foram interpretados messianicamente por grupos diversos no judaísmo do Segundo Templo, com um nível significativo na

coerência da interpretação.”

68 Cf. BAILÃO, Marcos Paulo. O nascimento do messianismo judaita. EB, Petrópolis, n.52, 1997, p. 09:

“no decorrer da história [de Israel] diversos movimentos foram classificados como „messiânicos‟, ou seja,

movimentos que esperavam a mudança na situação de grupos marginalizados pela chagada de um novo tempo. Este novo tempo se daria pela conjunção entre a ação da divindade e a dos adeptos do

movimento.”

69 Cf. KONINGS, Johan. O tema do messias no Quarto Evangelho. EB, Petrópolis, n. 52, 1997, p. 91:

“para os samaritanos o messias não seria um novo Davi, mas o novo Moisés que eles achavam estar

anunciado em Dt 18, 15.18.”

(25)

No diálogo com a samaritana, Jesus vai progressivamente assumindo as esperanças da Samaria, isto é, a mulher vai entendendo que Jesus se identifica com o Messias esperado, com o Taheb, aquele que pode revelar „os segredos divinos‟, tanto que a

surpresa da mulher não é com a “água viva”, mas porque “me disse tudo que tenho feito” (cf. Jo 4,29). A descoberta da mulher é progressiva, como propõe o diálogo de

Jesus: primeiro, Jesus é um judeu (cf. Jo 4,9), depois um profeta (cf. 4,19), até finalmente ser reconhecido como aquele que devia vir (cf. 4,25.39)71. A esperança é de tal modo assumida, que os samaritanos que vêm a Jesus por causa da mulher, agora espalham sua obra a todo o mundo (cf. Jo 4,42). Assim, os samaritanos rompem o exclusivismo soteriológico de alguns círculos do judaísmo: Jesus é o salvador do mundo72.

Para os escritos joaninos, o conceito de mundo73 compreende variantes na relação com Jesus, isso também está presente no episódio do Batista e dos samaritanos. O Batista saudou Jesus como cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo (cf. Jo 1,29) e os samaritanos o saudaram como salvador do mundo (cf. Jo 4,42).

No Quarto Evangelho, Jesus está muitas vezes em conflito com o mundo74. Essa categoria assume uma variante de não aceitação a Jesus (cf. Jo 14,30), mas, por outro lado, tanto a saudação do Batista, como dos samaritanos revelam a intensidade da relação de Jesus com o mundo. Com a saudação samaritana, Moloney entende que há uma confrontação entre Jesus e o imperador romano e os modelos helenistas de titularem seus imperadores75, isto é, o verdadeiro kyrios é Jesus. Para a saudação do

Batista, Léon-Dufour entende que ela recolhe a tradição dos judeus que tinham a consciência de que Deus redimiria o mundo76 e Israel seria o arauto da instalação da vontade de Deus. O movimento apocalíptico, como ícone desta tradição, põe o enviado de Deus como o salvador do mundo77. Com isto, a saudação samaritana e Batista expõem que Jesus é Senhor e Redentor do mundo.

71 Cf. MOLONEY, Francis J. The Gospel of John. V. IV. Minnesota: Michel Glazier Book, 1998, p. 126.

72 Cf. LÉON-DUFOUR, Xavier. Leitura do Evangelho segundo João. V. I,p. 300.

73 Cf. SARASA GALLEGO, Luis Guillermo. La filiación de los creyentes en el Evangelio de Juan.

Bogotá: D.C., 2009, p. 478: “el concepto bíblico de (en grego) de cosmos llega a su ponto cúlmen en los escritos juánicos. De las 185 veces que se usa en el NT, 105 en los escritos juánicos. En primer lugar se trata del mundo creado; pero tambiém puede significar algo más que el universo material en quanto dice

relación al hombre. Se trata del teatro en el cual se desarrolla el drama de la redención.”

74 Idem, Ibidem, p. 301

75 Cf. MOLONEY, Francis J. The Gospel of John. V. IV, p. 147.

(26)

Outro conceito rico à tradição joanina é o de água viva e a sua fonte. Os membros da comunidade conheciam o valor da água em regiões desérticas e semidesérticas. Mas a água pura, a água viva, que emana do poço da Torá é o Dom de Deus78, é ele que sacia a sede do ser humano, como prescrevia a tradição.

Entre os comentadores do Quarto Evangelho se encontram López Rosas, Richard Gúsman, e também Mateos e Barreto que identificam, segundo uma tradição antiga, que a fonte da água viva é o poço da Torá, poço do qual emana a sabedoria79. Konings segue

na mesma linha, identificando a água pura com o “simbolismo do AT, a água profunda (cf. Pr. 18,4; 20,5), a água viva (cf. Sr 21,13; 24,23-34), representa a Sabedoria e a Lei”80, assim, judeus e samaritanos identificam tirar água com o estudo da Torá81; portanto, Jesus ao dizer que dará a água viva (cf. Jo 4, 10.13) se apresenta como a fonte do culto, da moral e da fé e “ocupará permanentemente o lugar do antigo manancial”82. A tradição judaica e samaritana, como visto, entendem que “do poço da Lei brota a

água viva”83

. Além da imagem da Torá, como poço, diversamente as duas tradições

compreendem que do lugar sagrado emana a água da vida; com os samaritanos o poço está ligado a Jacó; para o mundo judeu a indicação mais corrente é da linhagem profética, que situa a fonte da água no Templo (cf. Ez 47; Zc 14,8), em Jerusalém84.

Entre a tradição samaritana e judaica há também o choque sobre a perspectiva da linhagem dos patriarcas. A Samaria, apesar de ser um povo misto, devido à ocupação Assíria, tem a firme convicção de ser descendente de Jacó, tradição que se mantinha fortemente pela presença do poço em Sicar. Por sua vez, a tradição do Sul, mesmo declarando-se descendente dos patriarcas, teve sua maior ocupação teológica na

78 Cf. LÓPEZ ROSAS, Ricardo; RICHARD GUSMÁN, Pablo. Evangelio y Apocalipsis de San Juan. Navarra: Verbo Divino, 2006, p. 103-104: “el desconocido regalo o don de Dios es un agua de calidad: água corriente, viva, no estancada. En AT sabe que Dios es la fuente de águas vivas (Sal 35,10; Jer 2, 13; cf. Sal 41, 2), y que esto se expresa en la Torá o Instrucción dada para vida de los fieles[...] igualmente, los rabinos emplean la metáfora referida al estudio de la Torá: „sea tu casa lugar de encuentro de los sábios, empólvate con el polvo de sus pies, bebe con avidez sus palabras‟ (mAB 1,4). De un buen discípulo se dice que es „una cisterna encalada que no pierde una gota de agua‟; „R. Eleazar, hijo de Araj,

es una fuente que cresce constantemente‟ (mAB 2,8).”

79 Cf. MATEOS, Juan; BARRETO, Juan. O Evangelho de João. São Paulo: Paulinas, 1989, p 220: “o poço, na tradição judaica, converteu-se em elemento mítico, que sintetiza os poços dos patriarcas e o manancial que Moisés abriu na rocha do deserto. É figura da própria Lei, que se considerava observada já

pelos patriarcas e formulada mais tarde por Moisés.”

80 KONINGS, Johan. Evangelho segundo João, p. 126.

81 Cf. LÓPEZ ROSAS, Ricardo; RICHARD GUSMÁN, Pablo. Evangelio y Apocalipsis de San Juan, p. 104.

82 MATEOS, Juan; BARRETO, Juan. O Evangelho de João, p. 221. 83 Idem ibidem, p. 220.

(27)

manutenção da teologia davídica85 e na espera de um rei segundo Davi86, embora conhecessem a tradição do poço de Sicar e do monte Garizim (cf. Gn 33,19; 48,22; Js 24,32).

1.1.1 A imolação do cordeiro como lugar da identidade e da memória

EmGarizim,lugar de culto e peregrinação. Que segundo o Pentateuco Samaritano, é um santuário antigo, onde Deus mandou erigir um altar para adoração87. Portanto, o lugar onde foi construído o Templo Samaritano no início da época helenista, já possuía sua longa tradição como santuário88. Todavia, com o projeto de um só Templo, o judaísmo pós-exílico não aceitou que se desse termo à construção de Garizim, haja vista

85 Cf. SOUSA, Rodrigo F. de. O desenvolvimento histórico do messianismo no judaísmo antigo:

diversidade e coerência, p. 13: “A promessa feita a Davi de uma “casa” eterna formou a base da

legitimação da dinastia davídica. Diversos textos do Antigo Testamento refletem essa promessa, dentre os

quais podemos ressaltar os chamados “salmos reais” (Salmos 2, 18, 20, 21, 45, 72, 89, 101, 110, 132 e

144), que exaltam o monarca da linhagem de Davi.”

86Idem ibidem, p. 13: “Diversos textos ecoam a esperança da restauração plena da casa de Davi (

Is. 11:1-9; Ez. 34 e 37; Mq. 5:1-3). Esses textos foram apropriados por diversos grupos no judaísmo antigo e embasaram a sua esperança messiânica.”

87 Cf. GIRÓN BLANC, Luís Fernando. La version samaritana del Pentateuco. Disponível em: http/revistadigital/index.php/revistainteracoes/article/viewFile/229/190. Acessado em 22 fevereiro 13, 14:25:30.: “Esta variante recibe su significado profundo en Dt 27,4, donde en lugar de Ebal de la version judia encontramos Garizim en la samaritana. Según esto, lo prescrito para El monte Ebal es trasladado al monte Garizim y, así, esté es el lugar que Adonai eligió de antemano. De esta forma justifican los

samaritanos la existência de su centro de culto en el monte Garizim”. Disponível em:

http/revistadigital/index.php/revistainteracoes/article/viewFile/229/190. Acessado em 22 fevereiro 13, 14:25:30.

88

Diante da alegada manifestação de Deus em Garizim, segundo o Pentateuco Samaritano, a diferença entre Garizim e Jerusalém está no que Sicre identifica e diferencia como lugares de culto, a saber:

“Dentro do mundo bíblico, o espaço sagrado constitui um tema extenso, que foi evoluído durante séculos. Através das diversas tradições observa-se que: 1) certos lugares adquirem caráter sagrado porque a divindade se manifesta neles; 2) outros conseguem esta categoria porque um grande personagem religioso os funda; 3) há momentos capitais da relação com Deus que podem ocorrer no espaço „profano‟.” (LUÍS SICRE, José. Profetismo em Israel: o profeta, os profetas, a mensagem. Petrópolis-RJ: Vozes, 2008, p. 382). Assim, Garizim se enquadra dentro da prescrição 1, onde Deus se manifestou, segundo o Pentateuco Samaritano Dt 27,4. Já o templo de Jerusalém é construído por uma personalidade, no entanto, sua afirmação como lugar sagrado é, segundo Araújo, construída por imagens que o associam à manifestação de Deus, como exemplo, a nuvem da presença divina: “Na Sagrada Escritura, a nuvem como manifestação da glória do Senhor aparece sobre o monte Sinai, sobre o monte Moriá, acompanhando os israelitas durante a sua marcha pelo deserto, dentro da tenda do deserto e dentro

do Templo ou como sinal escatológico”. E ainda: “o Templo de Jerusalém surge por vontade de Davi e iniciativa e Salomão: “[...] meu Pai Davi teve a intenção de construir uma casa para o Nome do Senhor

[...] Mas o Senhor disse [...] não serás tu quem edificará esta casa, e sim, teu filho [...]” (1Rs 8.17-19). Tais moradias após respectivas edificações vêm empossadas pelo seu dono, ou seja, o Senhor, e a tomada de posse se faz através da manifestação da nuvem que preenche a tenda (Êx 40.34-35) e o Templo (1Rs 8.10-13). A presença divina do Senhor recebe o nome de shekinah”. (ARAUJO, Gilvan Leite de. A Arca

da Aliança. Disponível em:

(28)

que “entre a fundação do Garizim e sua destruição em 128 a. C., as relações entre judeus e samaritanos degradaram-se progressivamente”89

.

O fato de haver Templo em Jerusalém e em Samaria indica que ambos possuíam vida sacrificial. No tempo de Jesus, Garizim já estava destruído e não há informação clara sobre a vida cultual da Samaria. Já em relação aos judeus, entre as várias tendências, é possível afirmar que existia o judaísmo oficial mantenedor do Templo, o que lhe acarretava uma teologia sacrificial. O Templo era o lugar, por excelência, para se apresentar os holocaustos (cf. Dt 12,1-12).

A centralidade do sacrifício no Templo de Jerusalém não é um projeto somente religioso, mas também um projeto político90 que invalida a religião popular e a existência de outros templos. A política de centralização cultual91 acontece na Reforma de Josias (cf. 2Rs 23,4ss). Esta Reforma foi possível graças a uma lacuna entre a dominação Assíria e a dominação Babilônica, na qual Josias buscou a unificação do povo por meio da vivência religiosa, investindo contra divindades estrangeiras e focando a prática religiosa sacrificial de Judá em Jerusalém. De fato, a Reforma, alegada como religiosa, não buscava somente este cunho, mas pelo contrário, com a destruição do templo de Betel, o chamado templo de Jeroboão (cf. 2Rs 23,15), Josias tentava levar o reino do Norte a também prestar culto em Jerusalém, onde este seria centralizadopelasuaReforma político-religiosa.

O alegado início da Reforma se encontra na descoberta do livro da Lei (cf. 2Rs 22,3ss), que alguns consideram se tratar de uma parte do livro do Deuteronômio92, porém, uma reforma em Israel já havia sido iniciada por Ezequias (cf. 2Rs 18,4), que não a pôde concluir devido ao contexto político-externo93. Deste modo, a Reforma de Josias parece ser uma continuidade, que terá seu ápice na Festa da Páscoa (cf. 2Rs 23,21: “O rei deu esta ordem a todo o povo: celebrai a Páscoa em honra do Senhor vosso

Deus, como está escrito neste Livro da Aliança.”), obrigando os fiéis a subirem em

89 SCHMIDT, Francis. O pensamento do Templo de Jerusalém a Qumran, p. 108. 90

Cf. RÖMER, Thomas. A chamada história deuteronomista: introdução sociológica, histórica e literária. Petrópolis: Vozes, 2008, p 11: Segundo a literatura deuteronomista existe apenas um único

santuário legítimo em „Israel‟, o qual, como leitor irá compreender mais tarde, correspondente ao templo

de Jerusalém, embora o nome da cidade nunca seja mencionado nem no Deuteronômio nem no Pentateuco. A centralização do culto implica também a centralização da economia e da política, como mostram as leis coligidas em Dt 13-18.

91 Cf. NAKANOSE, Shigeyuki. Uma história para contar: a páscoa de Josias. São Paulo: Paulinas, 2000, p. 197.

92 Cf. BERGANT, Dianne; KARRIS, Robert J. (Orgs). Comentário Bíblico. V. I, São Paulo: Loyola, 2010, p. 291.

(29)

peregrinação a Jerusalém, pois o combate à religião popular propunha um substituto para o culto: O Templo de Jerusalém. A Páscoa, que antes era tribal e familiar, agora é no Templo, com peregrinações anuais a Jerusalém94. Todavia, emrazãodasresistências enfrentadas, a Reforma só encontra sua maior expressão no judaísmo pós-exílico, com os grupos que, ao voltarem do exílio, requerem a centralidade do culto e a Lei da Pureza.

A Samaria, ao longo da história, continuará sendo uma resistência à Reforma de Josias e à pretensão pós-exílica, que queria um só Templo. Aliás,

o argumento principal era que a existência de muitos templos para a mesma comunidade de Israel era incompatível com a lei do Deuteronômio, que exigia a destruição de todos os lugares de culto e a centralização desse em um só templo.95

A realidade de um só templo não foi consenso entre o Povo da Aliança, assim, “O templo de Garizim estava longe de ser uma exceção”96, havendo, pois, outros dois templos fora de Jerusalém: Elefantina97 e Leontópolis98.

O Templo, em Jerusalém, Samaria, Elefantina ou Leontópolis,99 devia ter uma vida litúrgica pautada pelo sacrifício. No que diz respeito aos samaritanos, há a cópia de um calendário deste povo, exposto por Mauch100. Neste material, na edição de Powels, vê-se que a vida litúrgica samaritana prevê-servava a Festa da Páscoa101, contendo,inclusive,a reserva do dia para a imolação do cordeiro102.

94 Cf. NAKANOSE, Shigeyuki. Uma história para contar, p. 115.

95 SCHMIDT, Francis. O pensamento do Templo de Jerusalém a Qumran, 106. 96 Idem ibidem, p. 106.

97 Cf. MAIER, Johann. Entre os dois testamentos, p. 46: “existiu uma colônia militar israelita-judaica em Elefantina. Foi fundada, parece, no fim do século VI a. C., não necessariamente por israelitas do norte [... ] essa colônia militar possuía um templo, e estava evidentemente convencida de praticar um culto israelita. Uma missiva oficial sobre a festa da Passah atesta que também para a autoridade persa a colônia

era judaica, ou israelita.”

98 Cf. SCHMIDT, Francis. O pensamento do Templo de Jerusalém a Qumran, p. 107: “quase dois séculos e meio depois do problema com o Templo de Elefantina, outro santuário devia ser edificado no Egito. Por volta de 165 a. C. Onias IV, filho do sumo sacerdote Onias III, que circunstâncias políticas haviam afastado do pontificado em Jerusalém, recebeu de Ptolomeu VI Filometor um território em Leontópolis com o nome de Heliópolis, no baixo Egito. Ele fundou um templo em forma de torre, cujo altar foi concebido, diz-nos Flávio Josefo, à imitação do de Jerusalém. Em Leontópolis, os sacrifícios só

foram interrompidos em 73 d.C., quando o templo foi destruído por ordem de Vespasiano.”

99Idem ibidem, p 108: “ao lado dos judeus que sacrificavam em Jerusalém, havia lugar no seio do povo de Israel para os que levavam suas oferendas ao Garizim, assim como para os que haviam sacrificado na casa de Yahô, o deus que está em Elefantina-a-Fortaleza, ou para os que até 73 sacrificavam no Templo

de Leontópolis.”

100 Cf. BAILLET, Maurice. Le calendrier Samaritain. RB, Paris, n. 04, 1978, p. 481.

101 Cf. Idem ibidem, p. 484: “fundamentalment, les Samaritains ont le même système luni-solaire que les Juifs. A certains traits on reconnaît cependant le caractere plus archaïque de leur calendrier. Ainsi les mois ne portent pas de noms, mais sont designes pás des numéros. Le premier mois de l´année religieuse

est bien celui que le Pentateuque appella le mois d´Abib, au cours duquel on célèbre la Pâque.” [tradução

Referências

Documentos relacionados

Conclui-se que a Ds c IHO não necessariamente restringe o crescimento radicular ou rendimento de culturas sob plantio direto; a carga de 1600 kPa no teste de compressão uniaxial é

A cultura material e o consumo são contextualizados com o design, e são demonstradas estratégias de sustentabilidade no ciclo de vida nos produtos de moda.. Por fim, são

O estado do Rio Grande do Sul, que concentra produtores de calçados de couro, majoritariamente voltados à exportação de produtos com preços médios mais elevados, foi responsável

Avraham (Abraão), que na época ainda se chamava Avram (Abrão), sobe à guerra contra os reis estrangeiros, livrando não apenas seu sobrinho Lot, mas também os reis

Pressione a manete de embraiagem ou coloque a transmissão em neutro e pressione este interruptor para ligar o motor.. Botão

Nesse caso, a proposta do presente estudo foi avaliar e comparar a função autonômica cardíaca em mulheres jovens (GJ: 21 a 30 anos) e de meia idade pós- menopausa (GMI: 45 a 60

A démarche gerada na sociologia pragmática permite recolocar o questionamento sobre a participação numa abordagem renovada da política, reconsiderada a partir

Não é admissível que qualquer material elétrico não tenha este tipo de verificação, ainda mais se tratando de um produto para uso residencial... DI SJ UN TO RE S RE SI DE NC IA