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MUSEU, INFORMAÇÃO E PODER NO BRASIL: MUDANÇAS E CONHECIMENTO

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XIV Encontro Nacional de Pesquisa em Ciência da Informação (ENANCIB 2013) GT 9 – Museu, Patrimônio e Informação

Comunicação Oral

MUSEU, INFORMAÇÃO E PODER NO BRASIL: MUDANÇAS E CONHECIMENTO

Nilson Alves de Moraes - UNIRIO

Resumo

O texto resulta de reflexões impostas ao fim de uma pesquisa. Analisamos o museu e o contexto histórico. Ele se renova como produção e compartilhamento de conhecimento. O museu e a Ciência da Informação são protagonistas nas sociedades em mudança organizando e difundindo o saber, transformando a informação em conhecimento organizado, e interferem na relação entre informação e conhecimento, estimulando novos entrecruzamentos e experiências que introduzem novos atores, temas, saberes e modos de fazer e compreender.

O objetivo do texto é apresentar uma análise teórica e conceitual dos processos de constituição e desenvolvimento de políticas públicas relativas a museus no Brasil no período 2003 a 2013. Reunimos, sistematizamos e refletimos sobre a bibliografia e a documentação que tratam de políticas públicas relacionadas a museus na última década.

Palavras Chave: Museu. Políticas Públicas. Conhecimento. Informação.

MUSEUM, INFORMATION AND POWER INBRAZIL: CHANGES ANDKNOWLEDGE

Abstract

The article results from reflections imposed at the end of a research. We analyze the museum and the historical context. Museum is renewed as production and sharing of knowledge. The museum and the Information Science are protagonists of societies in a process of change, organizing and disseminating knowledge, transforming information into organized knowledge, and also interfering in the relationship between information and knowledge, stimulating new intercrossings and experiences that introduce new

actors, themes, knowledges and ways of doing and understanding.

The aim of this article is to present a theoretical and conceptual analysis of the constitution and development processes of public policies relating to museums in Brazil during the period from 2003to 2013. We have gathered, systemized and reflected on the bibliography and documentation that deals with public policies related to museums in the last decade.

Keywords: Museum. Public Policies. Knowledge. Information.

1 APRESENTANDO O TEMA

A construção de políticas públicas, especialmente na área de museu, representou um desafio para o Brasil na primeira década do século XXI1. Isto porque as políticas públicas destinadas a museus apresentam uma trajetória singular, obedecendo a

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interesses sociais, alianças conjunturais e prioridades. O histórico processo de concentração de poderes e exclusão social no país sempre comprometeu a adoção de estratégias contínuas, amplas e coerentes, que levem em conta direitos humanos fundamentais como o do exercício da cidadania.

Analisando-se o percurso de políticas públicas e do Direito Social no Brasil, é possível afirmar que a simples existência de tais políticas e de normas legais não remete à garantia de sua execução (DAIN, 2001). Aimplementação de políticas públicas e a prática do Direito têm sido alvos de um complexo mecanismo de disputas entre segmentos da sociedade, vistoconfigurarem realidades que vão de encontro a interesses privados.

Estudar políticas públicas no Brasil de hoje é defrontar-se com a perpetuação de benefícios que fomentam a marginalização de populações, fato que atinge o seu ápice no decorrer do século XX. Este cenário, ainda que paradoxal ― considerando-se o grande volume de riqueza produzida no país ―, vem sendo imposto por um modelo capitalista que tem por base a ação de agências e instituições internacionais, as quais não só desconsideram as necessidades e os anseios da maior parte da população, como acarretam danos ao meio ambiente. Diferentes setores da sociedade brasileira já buscaram, e ainda buscam, deter esse processo ― sobretudo, os intelectuais, artistas, políticos, cientistas e militantes ―, por meio de atitudes e discursos que destacam a importância das políticas públicas para o reordenamento das condições de vida existentes (MORAES, 2008).

O presente trabalho, resultado de reflexões surgidas ao final de uma pesquisa, aborda todas estas questões em relação ao papel do museu, que se renova como estratégia de articulação às novas condições de produção e circulação de conhecimento e de informações. No contexto atual, enquanto meio efetivo de produção e compartilhamento de conhecimento, o museu suscita, cada vez mais, a interdisciplinaridade da Museologia com outras ciências, em particular a Ciência da Informação e as Ciências Sociais.

2 INTRODUZINDO O CENÁRIO

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tecnológica e sociocultural. A consequência mais imediata desse fato foram pressões e movimentos sociais em busca de respostas às suas demandas, ao mesmo tempo em que o pensamento científico empenhava-se em organizar e difundir o arsenal disponível de conhecimento ― matéria-prima impalpável, mas fundamental para o surgimento de novos horizontes. Desde então, a relação entre informação e conhecimento se estreitou, criou vínculos e produziu intensas trocas, estimulando o surgimento de outros atores, saberes e modos de compreender os fenômenos à nossa volta (Castells, 1999).

Em nossa pesquisa, tivemos a oportunidade de estudara criação e o desenvolvimento de políticas públicas de cultura ― particularmente no que diz respeito aos museus brasileiros no período de 2003 a 2013 ―,com base em teorias do campo das Ciências Sociais. Foram reunidas e sistematizadas as documentações sobre políticas públicas na última década.

No pós-1970, a orientação “neoliberal” buscou apagar todas as formas de existência social que divergiam daquela reconhecida pela ideologia dominante, agudizando, assim, a crise social e preocupando as camadas médias e os grupos identificados com os movimentos sociais. No entanto, ao lado da capacidade do sistema de se reproduzir e impor seu projeto hegemônico, mudanças culturais e relacionais começam a atingir as agendas oficiais e os projetos sociais, suscitando um novocenário para a cultura em geral e também para o museu.

3 A ACELERAÇÃO DO TEMPO E OS NOVOS ENFRENTAMENTOS NA SOCIEDADE E NO MUSEU

O tempo presente revela que a aparência ou sensação de permanência e estabilidade na sociedade está superada e não suporta mais qualquer perplexidade ou dúvida (Harvey, 2011). Nesse contexto, apenas a mudança se estabelece como algo permanente, alterando e alternando papéis, atores, setores, projetos, estratégias e interesses (Moraes, 2010).

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No Brasil, a despeito dos avanços que a globalização promove no ambiente sociocultural, a cidadania ainda está por ser construída. Há uma intensa mobilização de grupos empenhados em mudanças concretas, que encontra resistência de outros grupos favorecidos ao longo do tempo. Superar privilégios que orientam a estruturação da sociedade é ação que implica competência e decisões políticas, culturais e técnicas. Daí, por conta do papel estratégico da cultura e de suas instituições, todo e qualquer estudo deve ter o compromisso de repensar teorias, princípios e efeitos das políticas públicas para colaborar, assim, com a constituição e preservaçãode uma verdadeira cidadania.

As reflexões estão orientadas, com frequência, por corpos teórico-metodológicas que fazem parte de uma tradição intelectual herdada do pensamento europeu dos séculos XVIII e XIX. Porém, o cientista social é levado arever suas análises considerando as mudanças conjunturais e a desenvolverteorias e metodologias capazes de dar conta de um cenário em que a cultura, as políticas públicas e o próprio museu precisam considerar diferentes percepções e racionalidades. Neste sentido, areunião e a revisão da bibliografia e documentação sobre o Estado e as políticas públicas de museu no Brasil no período 2003-2013 permitem uma reflexão inovadora, constituindo um ponto de partida para a compreensão do atual momento histórico do museu no país.

A existência de um sistema internacional que regula as estruturas econômicas e sociais no mundo todo demonstra que não estamos mais sob o comando de uma só dimensão e de um só poder, o local. Tal descentralização, ainda que operando de maneira orquestrada, permitiu às sociedades novas formas de organização e, no caso do Brasil, uma crescente participação dos segmentos sociais nos processos decisórios e na definição de políticas públicas, implicando maior controle sobre os processos políticos, sociais e culturais. O museu, então, estigmatizado como lugar de tradições, transforma-se em local deacelerada produção e difusão de saber, passando a transforma-ser pensado como instituição inter campo (Gonzales de Gomez, 2003).

4 FALANDO DO MUNDO, QUANDO TUDO PARECE EM CHAMAS E REVELA DESESPERANÇA

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Uma conjuntura de intensas e simultâneas mudanças em nível internacional não pode mais ser abordadae compreendida com foco em paradigmas superados. Entretanto, o conservadorismo no mundo acadêmico e o compromisso das empresas midiáticas como modelo de desenvolvimento capitalista, para só citar dois fatores, reforçaram durante muito tempo a crença na submissão inexorável da política e da sociedade aos interesses de determinados grupos e organizações, em detrimento do bem-estar coletivo, do exercício democrático e da cultura cidadã, banalizando a exclusão social.

Ao acatar, porém, as premissas neoliberais e dos grupos privados, a cultura se transforma num mero espetáculo, apêndice da economia e do setor produtivo. As antigas identidades, sistemas de crenças, instituições, saberes e práticas que criaram as condições de um sistema de estabilização do mundo social se deterioraram e entraram em declínio, permitindo a emergência de outras ou novas identidades que fragmentaram o homem moderno e o seu modo de ser, pensar e estar no mundo. Portanto, e contraditoriamente, apenas a continuidade modernizadora foi permitida (Moraes, 2012).

No entanto, à medida que o capitalismo, sem oposição, triunfa e assume a dimensão global, sua própria expansão acelera sua deterioração, expressa por meio de crises que se espalham pelo planeta. A chamada crise de 2007-2008 anuncia e consolida um momento que aponta para o crepúsculo do sistema, mas esta é apenas um início e um indício de um longo processo de tensões.

A multiplicidade e a simultaneidade de crises que explodiram em seguida (financeira, produtiva, sanitária, alimentar, energética, relacionais e de subjetividades), com efeitos diferentes em todos os países que fazem parte desse complexo sistema ― que Wallerstein (2011) denomina de “sistema mundo” ― produzem uma consciência e convergem para outras, relacionadas, por exemplo, ao meio ambiente, relações e contratos societários, dependência tecnológica e informacional, complexo industrial da saúde, circulação e consumo de diferentes drogas legais e ilegais, corrupção sistêmica, massas urbanas e rurais marginalizadas e dependência da cultura.

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O mundo que se organiza e se impõe como única possibilidade no Ocidente,

fundamentado no capitalismo e calcado numa determinada lógica de cunho ideológico e

simbólico, encontra, enfim, os seus limites. Ele não é o todo, como queria aparentar, mas

apenas parte do cenário. A desejada modernidade anseia por um projeto que não tenha

por destino a acumulação de bens, mas um sentido para a vida e o futuro.

A resistência da sociedade civil passa a se fazer presente em fóruns

internacionais e a se articular em rede, denunciando fatos e exigindo mudanças de rumo

e inclusão da sociedade nos processos decisórios e de controle social (BORON, 2003).

Desta vez, ao contrário do “Império” e seus representantesde agências transnacionais, a sociedade demonstra uma maturidade, pluralidade e complexidade capazes de produzir

soluções que atendem ao conjunto dos indivíduos.

Harvey, em seu estudo “Os Limites do Capital” (2011), aponta a existência de um limite no contexto da atual crise, o qual se encontra na capacidade de acumulação do

próprio capital. Para Harvey, “o capital nunca resolve seus problemas, apenas os

transfere para outro lugar” (p. 12). Portanto, numa conjuntura de diferentes crises do capital, há também uma intensa e veloz transferência de seus reflexos para novos setores

esegmentos sociais, considerando que o movimento do capital é determinado pelo jogo

de poder político, dominado por umaelite financeira.

Therborn (2012), por sua vez, tambémreconhece que “o capitalismo é um sistema

autodestrutivo”, mas relata diferenças a serem observadas. Para o autor, “o neoliberalismo é uma variante da modernidade de direita, enquanto a globalização é

mais o voo da modernidade em si”. O autor destaca os movimentos de direitos humanos, feministas, homossexuais, urbanos e em prol da sustentabilidade, entre eles,

comomanifestações que provocam a reflexão e revigoram a crítica social, e promovendo

a deslegitimação das esferas sociais tradicionais.

Castells (1999) chama a atenção para a emergência de uma sociedade em que,

além do processo produtivo e de circulação de mercadorias, o imaterial afirma-se como

parte da produção e distribuição de riquezas e do controle social. Ou seja, uma sociedade

centrada em informação e conhecimento.

A insurreição contra o capitalismo possui uma face planetária, trazendo novos

modos de pensar e encaminhar soluções. A dimensão do coletivo se impõe sobre os

interesses, estratégias e projetos particulares, embora os privilégios seculares tentem

resistir. O controle do crescimento econômico implica mais um ciclo de esgotamento do

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Os meios de comunicação e os ideólogos dominantes, identificados com as teses

neoliberais, se empenham em caracterizar toda resistência e discurso alternativo como

selvagem e comprometida com ideias populistas e contrárias à modernização, chegando

a lhe atribuir até a prática de barbaridades eatitudes primitivas. Para tais grupos, o

capitalismo teria competência para superar qualquer crise, mostrando uma nova

disposição e outros modelos de reprodução social. (Castells, 1999, p. 8)

A primeira década do século XXI, desafiando os cenários tecidos por políticos,

empresários e acadêmicos comprometidos com as teses neoliberais, já configura a

existência de um novo contexto para a sociedade, no qual convivem as estratégias de

manutenção das condições históricas e sociais impostas no século XX e as dificuldades

para impor uma nova ordem. A condenação ao desassossego, à insegurança e ao fracasso

do novo, sempre endossada pelos que estão no controle social, ajudou a produzir o clima

dos anos 1990, mas não chegouàs portas de alguns grupos de reflexão, instituições e

projetos sociais.

Para os agentes culturais identificados com o coletivo e, particularmente, com os

museus, o modo de dominação social do sistema capitalista é passado. Apesar das

diferentes naturezas de violência a que foi submetido, o museu, por ação destes

profissionais, conseguese renovar e se comprometer com novas ações e possibilidades.

Isto fica claro quando ele assume uma agenda compromissada com questões que

implicam novos enfoques e enfrentamentos. A adesão à mobilização dos cidadãos

urbanos e das periferias revela a travessia do museu por mares bravios em busca da

construção de sua sobrevivência.

5 DESASSOSSEGOS, INQUIETAÇÕES E PARADIGMAS QUE A HISTÓRIA INCITA

Os cenáriosmais recentes e as possibilidades de mudança constituídas nas últimas

três décadas demonstram as prioridades e urgências políticas, institucionais e científicas

do museu. Este conquista, a cada dia, uma complexidade mais robusta, garantida pela

sociedade e pelo conhecimento da História2. Fruto de recortes temáticos e factuais, a

construção do percurso do museu se dará por meio de referências a fatos históricos

2

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relevantes na afirmação da comunidade museológica como agente político presente na

estrutura burocrática governamental.

No período de mandato do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, uma gestão

com viés neoliberal que pouco investiu nas demandas sociais, o museu mostrou-se

suscetível às exigências de agências internacionais e conformou suas políticas à lógica

de mercado. Moraes (2009) destaca o comprometimento daquele governo com o setor

privado e relembra o sentido atribuído à aplicação dos recursos públicos enquanto

investimento, numa lógica empresarial de retorno financeiro que confundia direitos

sociais com benefícios.

Nessa perspectiva, o setor cultural recebeu pouca atenção política, sendo

sustentado por leis de incentivos e projetos de pequeno alcance. A gestão de Francisco

Weffort à frente do Ministério da Cultura tratou a área por uma perspectiva instrumental

e utilitária, como parte da indústria de entretenimento (MORAES, 2009). Um

documento publicado pela pasta em 1995, intitulado “Cultura é um bom negócio”, traduz a atuação governamental à época e expressa o empenho em substituir o Estado

pelo mercado. As políticas culturais concentraram-se na Lei Rouanet3 e na Lei do

Audiovisual4, seguindo um esquema de rentabilidade no qual os recursos eram

destinados aos projetos que garantiam algum tipo de retorno, seja financeiro ou em

marketing. Assim, enquanto instituições sem fins lucrativos, os museus sofreram com a

ausência do Estado por não se mostrarem atraentes do ponto de vista dos investidores e

acabaram padecendo de recursos materiais, financeiros e humanos.

O desenvolvimento de políticas públicas para o museu entre 2003 e 2013 abarcou

a criação do Departamento de Museus e Centros Culturais (DEMU) e seus

desdobramentos, culminando na formalização do Instituto Brasileiro de Museus

(IBRAM) durante o governo Lula. Entretanto, as descontinuidades observadas e a

reversão de algumas tendências nos dois primeiros anos dogoverno Dilma demonstram

as disputas e a existência de uma crise de hegemonia no setor. Isto é, os grupos aliados

da privatização não foram de todo eliminados do centro da gestão.

Ao abordar as conquistas do setor museológico (seus marcos institucionais e

legais) advindas de um processo político e ideológico vivenciado no Brasil a partir de

meados do século XX, Márcio Rangel (2010) considera que os caminhos percorridos

representam resistências, embates e acordos. Múltiplos atores sociais e institucionais

3

Lei nº 8.313 de 23 de dezembro de 1991.

4

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compuseram e ampliaram esse itinerário, que resultou em políticas públicas para o setor

museológico. Para o autor, tratou-se de uma conjuntura complexa, especialmente pela

pluralidade de elementos envolvidos:

(...) a política pública compreende um conjunto de atores ou grupos de interesse que se mobilizam em torno de um objetivo. Também há acordo que nesta análise faz-se necessário examinar as agências formadoras de políticas, as regras para tomada de decisão, as inter-relações entre as agências e os formuladores, bem como os agentes externos que influenciam o seguimento das decisões (p.129).

Aqui, cabe enfatizar os objetivos traçados e alcançados por esses atores ao longo

de dez anos, destacando o papel do MinC e de suas instituições na elaboração e

execução de projetos que conferiram novos rumos à história das políticas culturais no

Brasil. O período refere-se à gestão de Gilberto Gil, Juca Ferreira, Anna Hollanda e

Marta Suplicy à frente do Ministério da Cultura (MinC) e se caracteriza, nas duas

primeiras gestões, por uma reestruturação deste órgão e pelo fortalecimento da pasta no

que diz respeito à sua dotação orçamentária e ampliação de sua atuação junto à

sociedade.

A História é uma ciência, que, nos anos pós-1960, revelou sua especial

importância para a compreensão das velozes mudanças ocorridas no Brasil no campo

sociopolítico e cultural. Mas não falamos apenas da dita História oficial, que ora

glorifica, ora condena os acontecimentos, e sim daconcepção de História consagrada na

pós-modernidade, a qual observa os fatos como sendo parte de uma sociedade fluida,

fractal, em que passado, presente e futuro não são delimitados com o rigor de costume.

A História constrói veredas inquietantes, mas, através de narrativas que convocam

a razão, ressignifica os eventos, os tempos e os processos, oferecendo-nos a

possibilidade de novos sentidos. Daí, no curso de transformações sociais, em plenos

anos 1970, o museu se reinventa, se reinterpreta, deslocando-se da visão institucional e

ilustrativa para se envolver com novas questões, exigir outros saberes e práticas e

dialogar com mais ciências. O museu então se revela como construção social e, mais do

queum setor da área cultural, configura-se um agente da sociedade, um ator.

A História e o Museu deram origem a um conjunto de estudos, exposições e

reflexões absolutamente invulgar, inesgotável, com vigorosas narrativas revelando as

tensões, as singularidades e o inusitado das sociedades contemporâneas (Bourdieu,

1986). Esse acervo contribui paraaumentar o leque de olhares sobre a questão social na

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cada vez com maior intensidade, que ele está fadado a ser presente, estar no presente e

explicar o presente, em que pese abrigar séculos de História. .

Um aprofundamento dessa visão de museu, que tanto privilegia passado, quanto

presente e futuro, ouque recorre a enfoques teórico-metodológicose tambémàs pesquisas

empíricas, o situa como espaço de informação, conhecimento, interlocução, análise e

crítica. Portanto, ao longo dos séculos e especialmente nas últimas décadas, conforme

lembra Hobsbawn (2011), o museu nunca deixou de ser um problema de natureza

político-social, constituindo, assim, um eterno objeto de disputas pelo seu controle.

Em torno do museu como instituição social, quer num formato real ou ideal,

circulam riquezas temáticas e discussões inesgotáveis que nem o mais opressor poder de

Estado consegue esmagar. O museu é sempre uma entidade viva e vibrante, mesmo

quando tudo ao seu redor se mostra hostil ou a racionalidade se vê obrigada a lutar para

impor o seu reino. A cultura contida no museu está além do que se pode ver, ouvir, tocar

e sentir, pois ali mora a vida da Históriae de todas as ciências, da mesma forma que lá

também habitam os sonhos, as dúvidas, os ideais e os projetos de cada nação, grupo e

indivíduo.

Para o museu manter sua desejável isenção e integridade ética como um fórum de

informação e saber, fugindo das trilhas e armadilhas da conjuntura política, desde suas

metodologias e organização até o diálogo com outras instituições e áreas do pensamento

precisam ser discutidos de forma rigorosa, impedindo soluções simplistas, mistificações

e quadro de pessoal sem a devida qualificação e competência.

Vale lembrar que, nos anos 1920, a preocupação de vários intelectuais estava

mais direcionada à existência de um maior número de museus e com diferentes

especificidades, como, por exemplo, um museu tipicamente brasileiro, um museu

latino-americano etc. Contudo, tal reivindicação implicava um falso dilema, na medida em que

a diversidade é uma das principais marcas da cultura brasileira e latina. No caso

específico do Brasil, este é um país de complexidades e dimensões continentais, aberto a

imigrantes. Portanto, deve ser sempre pensado e escrito no plural.

6 MUSEU E ESTADO NO BRASIL: UMA RELAÇÃO A SER REINVENTADA

A construção de políticas públicas abrangentes, descentralizadas e inclusivas, em

especial para o campo da cultura, se mantém um desafio no Brasil. Deve-se salientar

que, em geral, a política pública entre nós já nasce sob a égide de interesses privados,

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de vigilância das alianças que conduzem os destinos das políticas públicas no país,

evitando-se o eterno recomeço de jogos de poder para o controle das instituições.

À semelhança do Brasil, vários países latino-americanos enfrentam as sequelas

de um modelo de desenvolvimento que transformou o continente num cenário de

tragédias, desigualdades econômicas e sociais e berço de privilégios. Não é à toa que

cientistas e intelectuais das mais diferentes áreas e militantes sociais se surpreendem

crescentemente com a importância que o tema das políticas públicas assume nos países

da América Latina (MORAES, 2008).

Fiori (2012) entende que, nos anos iniciais do século XXI, a situação política se

alterou. Segundo o autor, os partidos e coalizões de base nacional fundamentados em

bases desenvolvimentistas e inspirações sociais vagamente socialistas imprimiram outra

orientação política e ideológica ao continente. O autor considera que, num primeiro

momento, os governos recém-chegados não realizaram mudanças profundas na

economia, mantendo a essência da política macroeconômica ortodoxa imposta pelos

neoliberais. Porém, garantidas as premissas econômicas de gestões anteriores, algumas

mudanças começaram a se concretizar. Ocorre que elasainda não tinhamestatura e força

para promover a reordenação da estrutura econômica e, portanto, não impactaram o

status quo social.

Num segundo momento, consolidada a estrutura econômica, domesticadas as

finanças e garantida a expansão do emprego e do crédito, o desafio social ganha

prioridade. A cidadania no Brasil começa, então, a ser lentamente construída, se bem

que de forma instável ao longo da primeira década. Enfrentar aconcentração de renda e

os privilégios impregnados no cenário social se mostra uma opção desafiadora para os

novos governos, uma vez que exige coragem e competênciapara a tomada de decisões

que mudarão o curso da História. Até a presente data, pelo que percebemos sobre

mudanças sociais efetivas, nenhum grupo no poder chegou a tanto. Contudo, no que diz

respeito à definição e implementação de políticas públicas, é preciso reconhecer o

quanto ainda esperamos das ações do Estado.

Na verdade, a incerteza e a descontinuidade deprojetos sociais de maior

envergadura não são novidades para ninguém, muito menos para os excluídos sociais, já

que elas se introduzem em todas as iniciativas que se propõem a mexer com a estrutura

de poder. Tais problemas fazem parte de um arsenal de controle da população, para

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apatia. A cada troca de governo, o que se pretende é apagar a memória coletiva que

passou de geração a geração e dar início a um novo ciclo de promessas.

Outro grave problema com que convivemos é a exacerbação da cultura da

precificação e do individualismo. A cultura não escapa dessas armadilhas, Assim, toda

“mercadoria” cultural deve ter um preço, enquanto patrimônios materiais e imateriais

são condenados a uso privado e mesmo à destruição. A transformação de cultura em

mercado, ainda que possa ser pensada de maneira razoável e organizada, tem dado frutos

amargos no Brasil. Grande parte da população não consegue acesso a obras artísticas,

científicas e culturais de notório valor, muitas vezes sob a justificativa de falta de

entendimento. No entanto, nos domínios da cultura, apremissa poderia (e deveria) ser

abrir as portas do conhecimento, da arte e da beleza para todos aqueles que quiserem

vê-las e conhecê-vê-las melhor.

A chegada recente ao poder de novas lideranças políticas, fruto do fracasso de

decisões e estratégias aceleradas nos anos 1990, era preparada e foi caracterizada como

uma “virada à esquerda” nos rumos do país. De fato, a ascensão dos novos grupos expressou alguma mudança nastendências políticas e na abordagem das questões

públicas, mas sem mexer com as principais estruturas de sustentação do sistema

produtivo, do governo ou contrariar radicalmente os domínios instalados.

7 NÃO FOI SÓ DECISÃO POLÍTICA, INSTITUCIONAL OU DO MUSEU

Para se compreender o processo político, jurídico e institucional que o museu no

Brasil conhece desde 2003, deve ser eliminada qualquer ilusão sobre a capacidade de

transformaçãodas decisões ou dos méritos individuais de Gilberto Gil, Juca Ferreira,

José Nascimento e Mário Chagas embora todos eles sejam intelectuais e militantes da

cultura comprometidos com mudanças. As mudanças são operações complexas e

decisões políticas e institucionais. O fato é que a conjuntura e os próprios processos

sociais em curso estimularam as ações e projetos na área de museu, facilitando a adoção

de propostas com vistas a democratizar e otimizar o desempenho dessa instituição.

Buscando se reinventar, o museu no Brasil, tanto públicoquanto privado, deu

início a um período em que a gestão do conhecimento começou a ser encarada e

praticada com mais rigor, o que permitiaà instituição frear as subjetividades e enfrentar

as ameaças representadas por determinados grupos com interesses particulares. Ainda

assim, somos forçados a reconhecer que é pouco provávelapreender a totalidade dos

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analisar, selecionar ou organizar um objeto de conhecimento mantém estreita relação

comum certo tempo-espaço e com expectativas da conjuntura.

Nos anos mais recentes, mesmo sem concretizar uma ruptura com a tradição

museológica, o museu no Brasil passa a interagir mais estreitamente com as teorias e

práticas da Ciência da Informação e também se torna mais receptivo a

gruposidentificados com o mercado. Tal convivência cria tensões, mas, por outro lado,

demonstra ser desnecessário pensar num modelo único de museu, uma vez que o próprio

perfil da sociedade agora incentiva a multiplicidade de discursos e projetos, desde que

respaldados por um trabalho sério e gestores preparados a lidar com a questão cultural.

Hoje, é praticamente inviável pensar o museu apenas como espaço de guarda da

experiência e da temporalidade, um lugar de acúmulo da História. Isto porque o museu

reescreve seu papel junto à sociedade brasileira por meio de debates e ações,

evidenciando que não pode mais restringir seus projetos e atividades a quatro paredes.

Os muros precisam ser rompidos, num movimento que se aproxima de outros

movimentos e que considera a participação de outros atores.

Na condição delocal de encontro e criação coletiva, o museujá não se limita a um

espaço de exposições. Orienta ações e concepções, revela sentidos, fornece

interpretações, trabalha com o simbólico. É preciso tomá-lo e encará-lo em sua tensão

paraperceber possibilidades, recusando respostas simplistas (Moraes, 2011).

A propósito desses novos ares, o MinC e suas instituições se dedicaram à

elaboração e execução de projetos que conferiram rumos às políticas culturais. Rangel

(2010) demonstra que os princípios norteadores e os eixos programáticos do Plano

Nacional de Museus (PNM), constituídos em 2003, foram executados em todo o

território nacional e tiveram a adesão da comunidade museológica. A partir da PNM, as

instituições e políticas museais foram consideradas e inseridas na agenda governamental,

passando a ser compreendidas “como instrumentos sociais, como espaço de crítica e

reflexão de nossa realidade” (RANGEL, 2010, p.132). A adesão do campo foi

constituída por meio de oficinas, seminários, fóruns nacionais, editais de financiamento

e prêmios.

O desdobramento mais visível do PNM foi a constituição do Sistema Brasileiro

de Museus (SBM), por meio do decreto n° 5.264, de 5 de novembro de 2004(publicado

no Diário Oficial em 08/11/2004), vinculado ao MinC. O SBM foi criado com o objetivo

de possibilitar o diálogo entre museus e instituições museológicas no Brasil, e também

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fortalecimento de sistemas regionais de museus. O decreto instituiu um Comitê Gestor

responsável por propor diretrizes e ações para o desenvolvimento do setor.

O SBM passou a ser integrado por museus públicos e privado, instituições

museológicas, sistemas de museus, universidades e entidades ligadas ao setor, todos

vinculados por meio de um termo de adesão firmado entre a instituição e o Ministério da

Cultura. Tornou-se uma importante ferramenta para o debate e a proposição de políticas

públicas para museus, capaz de articular projetos entre ministérios, universidades e

outras entidades além da esfera federal, tanto no setor público quanto privado

(MORAES, 2009). O desenvolvimento do SBM se deu concomitantemente à gestão de

um Sistema Nacional de Cultura (SNC), planejado para garantir as continuidades de

ações, projetos e programas culturais em médio e longo prazo que estivessem sujeitos às

intempéries conjunturais (RUBIM, 2008).

O SBM virou um subsistema do SNC, funcionando como expressão de um projeto

maior e consistente para toda a pasta do Ministério da Cultura, cujas articulações

tentavam garantir que as políticas públicas da área se transformassem efetivamente em

políticas de Estado (CALABRI, 2011). Os subsistemas temáticos começaram a integrar

uma importante rede de políticas setoriais em âmbito local, regional e nacional,

necessárias à garantia dos direitos culturais previstos, no Artigo 6, da Constituição

Federal de 1988. Observava-se, portanto, que a gestão do Ministério da Cultura

preocupava-se, desde o início, com a abrangência e a continuidade das políticas

executadas.

As políticas públicas para o museu no Brasil se igualaram a outras experiências

similares no mundo e se assemelham, hoje, a processos cuja experiência de gestão é

bem-sucedida (MORAES, 2009). A criação do IBRAM teve como referência as

experiências francesas, espanholas e portuguesas, mas conformou-se às especificidades

brasileiras. A autarquia foi instituída para atender à demanda primordial dos museus por

uma agência dedicada às suas questões. Portanto, a expectativa da comunidade

museológica era de que o IBRAM ampliasse a arrecadação dos museus públicos, gerasse

emprego e renda e fomentasse o turismo cultural (Relatório de Gestão 2003 – 2010, Ministério da Cultura, 2011). Sua atuação seria dedicada a aprimorar a organização, a

gestão e o desenvolvimento dos museus, articulando-se às demais políticas culturais e

ferramentas institucionais criadas desde 2003.

Estas informações demonstram o papel da cultura como fio condutor das

(15)

fato modifica o papel das vanguardas técnicas na gestão das políticas públicas; dos

profissionais, estudantes e militantes dos museus neste período; e omite, principalmente,

a importância da participação e do apoio da sociedade (organizadamente ou não) a este

processo. Havia, entre os intelectuais, gestores e movimentos sociais, a expectativa de

continuidade destas políticas durante a Gestão Dilma.

A Gestão Anna de Hollanda, ao mudar as prioridades, as estratégias e o modo de

encaminhamento de resoluções. Ficou explicitado que a política adotada dependia de

conduções e orientações identificadas com o tema, portanto de base individual, e de

outro lado a fragilidade dos processos representativos e de mobilização da sociedade

daqueles identificados com o SBM e com o cotidiano do museu.

8 CONSIDERAÇÕES EM BUSCA DE UMA ORIENTAÇÃO OU CONCLUSÃO: É HORA DE AVANÇAR?

O novo itinerário proposto para os museus e seus gestores remete a um processo

coletivo, exigindo uma visão ou concepção do outro e das condições em que a luta se

desenvolve. Portanto, obriga identificar as suas forças e as dos outros atores e projetos,

suas alianças e as alianças dos outros projetos, suas estratégias e as estratégias dos outros

projetos, e também produzir um discurso e conhecer o discurso do outro. Trata-se,

assim, de umaopção estratégica diante de condições objetivas e simbólicas.

A cultura produz e se reproduz como parte de uma relação social; ela é garantia

de encontro entre o museu e seu tempo. Nas atuais condições de desenvolvimento do

museu, seu itinerário simbólico e institucional gera disputas culturais, enfatiza seu traço

de lutas e produção de alternativas.

O profissional de museu é agora desafiado a ser um ator social que modifica sua

atuaçãoem função de uma instituição sob nova condição. O museu de hoje constitui

informação, comunicação e promoção de novos suportes e tecnologias a serviço da

sociedade, modificando as exigências e expectativas relativas ao seu pessoal.

Nos museus, predominava um modelo funcional de comunicação, informação e

interação com os visitantes e entre os visitantes e os saberes e práticas exposta no

ambiente, facilitada por um modelo de intervenção, herdado da tradição educacional

constituída nos anos 1950. Havia nestes museus e na compreensão destes museus uma

estrutura vertical, inflexível, inquestionável e lenta, ou aparentemente imutável, em que

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profissionais de museu consideravam que as relações entre corações, mentes e discursos

estavam sujeitas a controles tênues, passivos e incapazes de produzir alternativas.

A informação no museu revela-se prioridade e insere-se na lógica do seu campo,

submetendo-se ao contexto histórico e social (Moraes, 2010). Desta forma, a informação

não é demanda ou prática neutra e desinteressada, ganha corpo na luta pela convivência

dos projetos e enfoques.

A informação é gerada e transferida principalmente pela exposição e

disponibilizada também no acervo documental. Mas o museu não produz apenas

exposição e não se esgota nela. Museu representa afeto e sentidos; representações do real

e do imaginário.

O museu se inscreve na lógica constitutiva do simbólico como capacidade e

responsabilidade em fazer ver e fazer crer, como capacidade de falar e se fazer ouvir, de

se constituir como agente social e participar ativamente da construção de seu tempo. O

poder simbólico aparece intimamente ligado às formas de controle social, mas não se

restringe a elas. Ele é exercido nas relações sociais, na capilaridade social, e se constitui

na dinâmica social. No museu, existem modos de perceber e classificar as coisas do

mundo e intervir nesta realidade como instituição mediadora que caracteriza a existência

de um constructor permanente. Portanto, de mudanças, lutas e incertezas.

O museu assume um protagonismo nos estudos sobre o contexto cultural no

pós-2003. Atualmente ele é um consenso, é parte do processo de modernização no Ocidente

por sua capacidade de informar, envolver-se na viabilização de uma agenda pública,

organizar e expor esses processos e configurar a cultura e o processo democrático.

O anúncio da exoneração de José Nascimento Júnior do cargo de presidente do

IBRAM, em 7 de maio de 2013, encerraria a trajetória de uma liderança iniciada em

2003. Em dez anos, Nascimento Jr. trabalhou com quatro ministros da Cultura e em sua

gestão foi formulado um Sistema Nacional de Museus. Porém, a conjuntura que permitiu

a presença de Nascimento Júnior no mais importante cargo público de gestão em museus

não representou o esgotamento de uma instituição ou de uma política pública para um

setor estratégico do Estado Nacional, dos interesses de grupos privados, articulados

principalmente aos setores financeiros, e dos movimentos sociais.

Para o museu compreender e agir no novo contexto social, cultural e tecnológico,

fora tomadas atitudes e construídas relações que ajudam os museus e os interessados no

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afirmar que o museu passa a constituir um qualificado agente que se submete à lógica de

produção e controle social. Observamos que o “novo” pode ser apenas um “outro”.

Analisar as políticas públicas executadas ao longo de uma década permite

observar que o governo Lula se dedicou às questões culturais e transformou a realidade

do MinC, impulso que sofreu descontinuidade na primeira metade da gestão Dilma.

Foram suprimidas, a partir de 2011, verbas, lideranças do campo foram afastadas da

gestão. No período Lula, O DEMU/IBRAM assumiu funções primordiais e recebeu

recursos que fortaleceram a pasta e consolidaram bases para políticas continuadas em

setores distintos.

Para Gilberto Gil (2005, p. 103), o desafio ao longo daqueles anos foi o de superar

a condição do ministério como mero gestor de leis de incentivo, com mais servidores

aposentados que na ativa, com o menor orçamento da Esplanada, tendo suas instituições

e instrumentos desarticulados. Gil reverteu esse quadro e ressignificou o papel da

cultura na agenda política governamental. Juca Ferreira, por sua vez, deu continuidade à

linha de gestão, consolidando as bases para as políticas de médio e longo prazo. Já no

governo Dilma, o impasse foi retomado por algumas medidas e ações que afastaram o

MINC da orientação inicial e constata-se a voltada tradição de favorecimento de

interesses privados. Isso se dá inclusive nas políticas de museu que ameaçam seu papel

de agente de mudanças.

Assumindo o caráter estratégico da cultura para o desenvolvimento social, medidas

foram tomadas a partir de constantes diálogos com a sociedade civil. Retomou-se o

papel central do Estado na formulação, gestão e financiamento das políticas culturais, e

nessa perspectiva as instituições museológicas receberam expressiva atenção

governamental. O enfoque do setor pautou-se na garantia constitucional do direito à

cultura e ao acesso às suas fontes, reconhecendo a dinamicidade do museu e sua

importância para a sociedade. Entre as medidas adotadas, o Plano Nacional de Museus, o

Sistema Brasileiro de Museus, o Cadastro Nacional de Museus e o Estatuto de Museus

consolidaram as bases políticas e jurídicas para ações continuadas – que superem alternâncias administrativas. Os museus tornaram-se objeto de políticas de Estado, e

tecem uma complexa teia de relações, demandas e desafios que pretendia oferecer

impulsos à futura trajetória setorial e que as gestões Anna Hollanda e Marta Suplicy

colocam em questão estabelecendo novas ou outras possibilidades, incluindo o retorno

do museu para o seu interior, e fazendo aqueles identificados com o museu repensar suas

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A História não se esgota e não parte do nada. A História do museu e da ciência da

informação, que a partir dos anos 1970, em especial, ajuda e permite ao museu uma

reflexão renovadora na compreensão no processo de produção e difusão do

conhecimento em que o museu ganha importância, não sofreu interrupção,

descontinuidade. Em tempos velozes, as mudanças observadas não são estruturais, elas

exigem outras percepções e capacidade de produzir sentidos e necessidades para novos

grupos, identidades, classes sociais e expectativas da sociedade que não vê a sua

hegemonia ameaçada.

REFERÊNCIAS

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