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Remição de Pena Pelo Estudo. Analogia In Bonam Partem

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ANO 9 - Nº 110 - Janeiro/2002 ANO 9 - Nº 110 - Janeiro/2002ANO 9 - Nº 110 - Janeiro/2002 ANO 9 - Nº 110 - Janeiro/2002 ANO 9 - Nº 110 - Janeiro/2002

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BoletimBoletim Publicação Oficial do INSTITUTO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS CRIMINAIS

O DIREITO POR QUEM O FAZ

Remição de Pena Pelo Estudo.

Analogia In Bonam Partem

Ag. em Execução nº 1.258.707-2

10ª Câmara do Tribunal de Alçada Criminal Ementa Oficial

"Execução penal. Art. 126. Possibili- dade de remição da pena pelo estudo. Na interpretação do art. 126 da Lei nº 7.210/

84, nada impede o reconhecimento do direito do condenado à remição da pena também pela sua efetiva freqüência e comprovada conclusão de cursos ofi- ciais supletivos, profissionalizantes, de instrução de segundo grau e superior, patrocinados pelo sistema penitenciá- rio, invocando-se a função integrativa do princípio da analogia in bonam par- tem, para preencher a lacuna legal.

Os cursos supletivos, profissionali- zantes, de instrução de segundo grau ou superior têm previsão no art. 35, § 2º, do CP, como regra do regime semi-aberto, mas também devem ser implementados nos presídios fechados, porque durante a fase de execução da pena prepondera o interesse social na concreta recupera- ção do sentenciado e na sua volta à sociedade, sem que torne a delinqüir, o que poderá ser tentado pela via da edu- cação, e ao Estado 'cumpre proporcio- nar condições para a harmônica integra- ção social do condenado', segundo a Lei de Execução Penal."

Relatório

1. O promotor de Justiça em exercício na Vara de Execuções Criminais de Cam- pinas agravou contra sentença proferida no Processo nº 302.224, referente ao con- denado L.D.S., que deferiu a remição de 25 dias da pena reclusiva que lhe foi aplicada, em razão de sua freqüência a aulas. Argumentou o recorrente que essa decisão não se ajusta ao texto legal do art. 126 da Lei de Execução Penal, que prevê somente o trabalho como fator de diminuição do tempo de duração da san- ção imposta (conf. razões de fls. 16/20).

O recurso foi processado regularmente.

Manifestou-se a Procuradoria Geral de Justiça pelo seu provimento (fls. 32/34).

2. O agravado freqüentou atividade escolar na Penitenciária I de Hortolân- dia, correspondente a 153 dias, somando 459 horas/aulas, obtendo aprovação em curso equivalente às quatro primeiras séries do ensino fundamental (Lei nº 9.394/96), e requereu que esse período de aulas fosse considerado como remi- ção de parte da sanção reclusiva que lhe foi aplicada. Juntou atestado escolar subscrito pelo diretor do Núcleo de Edu- cação do Estado (fls. 6).

3. O juiz da Vara das Execuções Cri- minais de Campinas, após ouvir o repre- sentante do Ministério Público, deferiu o pedido e declarou remidos 25 dias da pena. Fundamentou a sua decisão no relevante princípio que deve nortear a execução penal: a busca da ressocializa- ção, uma vez que, tendo o condenado procurado aprimorar os seus conheci- mentos, ao participar de atividade esco- lar, com a finalidade de reinserir-se so- cialmente de forma mais apropriada — uma das finalidades da pena — era mes- mo caso de se reconhecer o benefício, aplicando-se a regra do art. 126 da LEP, asseverando: "Bem por isso, conquanto a Lei de Execução Penal não exclui expressamente a possibilidade de remi- ção pelo estudo e, considerando a fina- lidade maior do legislador pátrio no sentido de recuperar o preso, justifica- se no caso em tela a analogia in bonam partem para reconhecer o direito do condenado de remir parte da pena pelo estudo" (fls. 13).

4. Várias medidas penais são aplica- das na fase executória da pena com o objetivo de reduzir o tempo de duração da privação da liberdade e com o intuito de buscar a melhor forma de reinserir o condenado na sociedade, com algum prognóstico favorável de readaptação, como, por exemplo, o livramento condi- cional, o indulto, a comutação e a unifi- cação de penas.

além desses benefícios já tradicionais, a remição (conf. arts. 126 a 130 da Lei nº 7.210/84), pela qual o condenado, re- colhido em presídio fechado ou semi- aberto, é incentivado a trabalhar, sob promessa de que terá abreviada a dura- ção da sanção que lhe foi imposta, à razão de um dia de pena por três traba- lhados.

6. A remição provém do Direito Penal espanhol, e tinha por objetivo desobstruir os presídios do excesso de presos durante o período da guerra civil, como assinalou Alberto Silva Franco ao pesquisar a doutrina penal espanhola, afirmando: "A remição teve origem, com a denomina- ção de 'redenção de penas pelo traba- lho', no Direito Penal espanhol e foi, de início, reservada ao atendimento de pre- sos políticos provenientes da Guerra Civil. Posteriormente, o instituto alar- gou seu raio de abrangência para atingir também os condenados por crimes co- muns (art. 100 do CP espanhol) e, em época mais recente, ou seja, com a Re- forma Penal de 1983, tornou-se aplicá- vel 'para efeitos de liqüidação de sua condenação aos recursos que tenham sido privados provisoriamente da liber- dade'. A filosofia que deu sustento ao instituto, segundo Quintero Olivares e Muñoz Conde ('La Reforma Penal de 1983, 1983, p. 114), é a da 'manutenção de uma disciplina penitenciária nos cár- ceres por meio de uma obrigação enco- berta do trabalho sem condições onero- sas', e tal filosofia não está conforme 'as modernas diretrizes do penitenciarismo orientado ao tratamento recuperador dos reclusos'. Trata-se, portanto, de um instituto considerado, na atual fase do Direito Penal espanhol, como 'obsoleto' (Bustos Ramirez, 'Manual de Derecho Penal Espanhol', 1984, p. 457; Quintero Olivares e Muñoz Conde, ob. cit., p.

114)" ("Código Penal e sua Interpreta- ção Jurisprudencial", 7ª ed., Editora Revista dos Tribunais, 2001, p. 820).

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Lei nº 7.210/84, nada impede o re- conhecimento do direito do conde- nado à remição da pena também pela sua efetiva freqüência e comprovada conclu- são de cursos oficiais supletivos, profis- sionalizantes, de instrução de segundo grau e superior, patrocinados pelo sistema penitenciário, invocando-se a função inte- grativa do princípio da analogia in bonam partem, para preencher a lacuna legal.

8. A finalidade da aplicação da sanção privativa de liberdade é a punição pelo mal que o crime causou e a sua preven- ção futura, dividida em geral e especial, traduzindo-se esta última na ação exerci- da diretamente sobre o autor do fato penal, com o objetivo de promover uma correção pessoal, para que ele se ajuste ao modelo social vigente e evite cometer novos crimes quando retornar à liberda- de. Busca-se, segundo as palavras de Anibal Bruno, "a restauração da ido- neidade social do sentenciado" — a sua ressocialização — "o meio tido agora como o mais importante, pelo qual a pena pode realizar o seu fim de preven- ção. É em volta desse problema da recu- peração social do delinqüente que hoje se concentram os objetivos concretos da profilaxia do crime" ("Direito Penal, Parte Geral", tomo III, 1967, p. 48).

9. Para a consecução desse objetivo é necessário que, na fase de execução da pena, o Estado-administração e o Esta- do-juiz cumpram decididamente o dis- posto no art. 1º da Lei nº 7.210/84, "pro- porcionando condições para a harmôni- ca integração social do condenado", ta- refa extremamente complexa, porque, no fundo, tenta-se modificar a personalida- de do agente, preparando-o para o retor- no à vida comunitária, quando terá de respeitar os padrões sociais e legais vi- gentes, sendo que essa missão é atribuída ao cárcere, o que pode representar a própria negação da modificação preten- dida, pelos reconhecidos inconvenientes da prisão: verdadeiras masmorras que servem como determinante fator crimi- nógeno, ante os elevados índices de rein- cidência real que se têm verificado.

10. É difícil assegurar que a prisão fechada pode se prestar a esse trabalho restaurador quando se lembra da lição de Manoel Pedro Pimentel, sobre o que ela representa: "uma instituição totali- tária, que alcança o indivíduo a ela submetido em toda a extensão de sua personalidade. Exige a sua submissão plena e o sujeita a regras regulamenta- res de maneira coativa. Qualquer que seja a ideologia da administração de uma penitenciária, o preso será sempre incitado a absorvê-la, aceitando-a e a

ela se submetendo", in "O Drama da Pena de Prisão", Reforma Penal, Edito- ra Saraiva, pp. 50/51.

11. Se isso já não bastasse para colocar em dúvida a prisão fechada como refor- madora, constata-se que, ao ingressar no sistema penitenciário, e para nele sobre- viver, o condenado é compelido a absor- ver os denominados "males da prisoniza- ção", pois tem de se conduzir de acordo com os costumes e valores comuns da vida prisional, diferentes do modelo vi- gente no mundo livre, e, na maioria das vezes, degradantes, fato objeto de análi- se por parte de Heleno Fragoso, que leciona: "Como instituição total, a pri- são necessariamente deforma a persona- lidade, ajustando-se à subcultura prisio- nal (prisonização). A reunião coercitiva de pessoas do mesmo sexo num ambiente fechado, autoritário, opressivo e violen- to, corrompe e avilta. Os internos são submetidos às leis da massa, ou seja, ao código dos presos, onde impera a violên- cia e a dominação de uns sobre outros...

A delação é punida com a morte. Con- clui-se, assim, que o problema da prisão é a própria prisão, que apresenta um custo social demasiadamente elevado.

Aos efeitos comuns a todas as prisões, somam-se os que são comuns nas nossas:

superpopulação, ociosidade e promis- cuidade" ("Lições de Direito Penal, Par- te Geral", Forense, 1991, p. 287/289).

12. Muito bem. Quando um condena- do tenta se afastar da forma comum do comportamento carcerário, consistente na absorção da prisonização, na ociosi- dade perniciosa, na marginalização etc., e busca o único caminho realmente refor- mador, da educação curricular patroci- nada pelo Estado-administração como uma possibilidade de otimizar a sua futu- ra reinserção social, essa atitude deve ser valorizada, como o fez a respeitável de- cisão, porque o sentenciado aderiu e par- ticipou do único meio capaz de influen- ciar beneficamente o seu retorno à socie- dade, com alguma chance de mudança, em razão dos nítidos efeitos superiores da educação sobre os meros trabalhos manuais tradicionais das prisões, que são normalmente admitidos para abater par- te da pena.

13. Os cursos supletivos, profissiona- lizantes, de instrução de segundo grau ou superior têm previsão no art. 35, § 2º, do CP, como regra do regime semi-aberto, mas também devem ser implementados nos presídios fechados, porque durante a fase de execução da pena prepondera o interesse social na concreta recuperação do condenado e na sua volta à sociedade sem que torne a delinqüir, o que poderá

ser tentado pela via da educação formal, e ao Estado "cumpre proporcionar con- dições para a harmônica integração so- cial do condenado", segundo a Lei de Execução Penal.

14. A equiparação entre o exercício do trabalho e a freqüência a cursos educa- tivos supletivos etc., para fins de remi- ção da pena deve ser reconhecida, em razão do sentido que se deve emprestar ao significado da palavra trabalho, con- ceituada, nos dicionários, como "a apli- cação das forças e faculdades humanas para alcançar um determinado fim. Ta- refa a ser cumprida; serviço. Tarefa, obrigação, responsabilidade. Atividade que se destina ao aprimoramento ou ao treinamento físico, artístico, intelec- tual", definição que engloba o equiva- lente ao estudo formal, para fins de remi- ção de pena. Considere-se, ainda, os fun- damentos lançados pela r. sentença, ao afirmar que: "De plano, força é convir que o estudo, como atividade de caráter intelectual que se destina ao aprimora- mento artístico e intelectual guarda níti- da semelhança com o trabalho propria- mente dito, mormente estando ambas as atividades visando atingir os objetivos da Lei de Execução Penal, qual seja, o sentido imanente da reinserção social, o qual deve compreender a assistência e a ajuda — efetivas — na obtenção dos meios capazes de permitir o retorno do condenado ao meio social em condições favoráveis para a mais plena integração.

É insuficiente o atual sistema de 'trata- mento'. Imperioso garantir uma maior efetividade dos direitos da personalida- de do condenado, notadamente para in- centivar o desenvolvimento da atividade útil... Também é certo que nalgum ponto estar-se-á reconhecendo a justa equiva- lência entre as atividades de 'montar prendedores de roupa' ou qualquer outra artesanal e meramente braçal — todas tradicionalmente computadas para fins de remição — com a realização da for- madora educação. Afinal, parece que constituiria rematado contra-senso o juiz da execução reconhecer a remição pelo trabalho do 'faxina' e simplesmente igno- rar o esforço do educando" (fls. 13 e 14).

15. Viável, a aplicação da analogia in bonam partem na interpretação do dis- posto no art. 126 da LEP, para o preen- chimento da lacuna, porque são equiva- lentes o estudo oficial e o trabalho exer- cidos na prisão, suprindo-se a lacuna existente na redação legal, que só cuidou da última atividade como forma de remir a sanção. O emprego na analogia é veda- do somente para criar crimes e funda- mentar penas, mas, quando aplica- da em in bonam partem, ela tem

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função integrativa, conclusão que se retira da lição de Nilo Batista:

"Vedado o acesso da analogia naquilo que Aníbal Bruno chamava de 'Direito Penal estrito', ou seja, o Direito Penal criador de crimes e cominador de penas, tem ela as portas abertas para cumprir suas funções integrativas em todo o res- tante ordenamento jurídico-penal" ("In- trodução Crítica ao Direito Penal Brasi- leiro", Editora Revan, 1996, p. 76).

16. Registre-se, por fim, que em ou- tros Estados, a Justiça tem reconhecido, pelo mesmo fundamento, a remição da pena pelo estudo, o que se vê, por exem- plo, do julgamento proferido pela 1ª Câmara do Tribunal de Alçada Criminal do Paraná, assim sumulado: "Recurso de Agravo. Remição da pena pelo estudo.

Curso oficial com aproveitamento. Por- taria do Juízo que define pressupostos e diretrizes ao seu deferimento divorciada da legislação existente. Lacuna da lei que deve ser preenchida pela analogia.

Recurso provido. Diante da lacuna da lei, cabe ao juiz recorrer à analogia, aplicando à remição da pena pelo estu- do as mesmas normas previstas na Lei de

Execução Penal para a remição da pena pelo trabalho, eis que as duas apresen- tam o mesmo desiderato — proporcio- nar condições para a harmônica inte- gração social do condenado, a teor do art. 1º da LEP" (Recurso de Agravo nº 119.434-7, julgado em 04.06.1998, re- lator juiz Wilde Pugliese). Igualmente, Ac. nº 6.025, 2ª Câmara, rel. juiz Eli de Souza, DJ de 21.05.99, p. 107; e Recur- so de Agravo nº 0132364-8, 1ª Câmara, Ac. 6373, rel. juiz Bonejos Demchuk, DJ de 11.06.99, p. 129).

17. O Tribunal de Justiça de Minas Gerais, por sua 2ª Câmara, em 18.05.2000, no julgamento do Agravo nº 174.3123-9/

00, sendo relator o des. Herculano Ro- drigues, decidiu: "Deve-se conceder a remição da pena do sentenciado que comprove freqüência a curso de suplên- cia, oferecido pelo estabelecimento pri- sional, desde que aferido o aproveita- mento do condenado-estudante e de acordo com a carga horária do curso, seguindo-se os mesmos critérios da remi- ção por dia trabalhado, pois, além de a tanto não se opor o sistema de execução penal pátrio, o art. 126 da LEP (Lei nº

7.210/84) não distingue a natureza do trabalho, para fins de se remir o tempo de execução da pena" (Revista dos Tribu- nais, vol. 783/695).

18. Em suma: é possível o reconheci- mento da remição da pena executada em estabelecimento de regime fechado, pela efetiva freqüência e comprovada conclu- são, por parte do condenado, de atividade educativa oficial, como cursos supleti- vos, profissionalizantes e de instrução de segundo grau ou superior. Para suprir a lacuna do art. 126 da LEP, que só previu o exercício do trabalho como causa de diminuição da sanção, adota-se o princí- pio da analogia in bonam partem.

19. Por esses motivos merece prestí- gio a r. sentença proferida pelo mm. juiz de Direito da Vara das Execuções Crimi- nais da Comarca de Campinas.

20. Negaram provimento ao agravo em execução.

Márcio Bártoli presidente e relator

O DIREITO POR QUEM O FAZ

A Justiça é Cega... Mas o Juiz Não é!

Marco Antônio D.A., com 29 anos, brasileiro, solteiro, operário, foi indicia- do pelo inquérito policial pela contra- venção de vadiagem, prevista no artigo 59 da Lei das Contravenções Penais.

Requer o Ministério Público a expedi- ção de portaria contravencional. O que é vadiagem? A resposta é dada pelo artigo supramencionado: "entregar-se habi- tualmente à ociosidade, sendo válido para o trabalho..."

Trata-se de uma norma legal draco- niana, injusta e parcial. Destina-se ape- nas ao pobre, ao miserável, ao farrapo humano, curtido vencido pela vida. O pau- de-arara do Nordeste, o bóia-fria do Sul. O filho do pobre que pobre é, sujeito está à penalização. O filho do rico, que rico é, não precisa trabalhar, porque tem renda paterna para lhe assegurar os meios de subsistência.

Depois se diz que a lei é igual para todos! Máxima sonora na boca de um orador, frase mística para apaixonados e sonhadores acadêmicos de Direito.

Realidade dura e crua para quem en- frenta, diariamente, filas e mais filas na busca de um emprego. Constatação cruel para quem, diplomado, incursiona pelos caminhos da Justiça e sente que os pratos da balança não têm o mesmo peso.

Marco Antônio mora na Ilha das Flo- res (?) no estuário do Guaíba. Carrega sacos. Trabalha "em nome" de um irmão.

Seu mal foi estar em um bar na Voluntá- rios da Pátria, às 22 horas. Mas se haveria de querer que estivesse numa uisqueria ou choperia do centro, ou num restauran- te de Petrópolis, ou ainda numa boate de Ipanema?

Na escala de valores utilizada para valorar as pessoas, quem toma um trago de cana, num bolicho da Volunta, às 22 horas e não tem documento, nem um cartão de crédito, é vadio. Quem se en- charca de uísque escocês numa boate da Zona Sul e ao sair, na madrugada, dirige (?) um belo carro, com a carteira rechea- da de "cheques especiais", é um burguês.

Este, se é pego ao cometer uma infra- ção de trânsito, constatada a embriaguez, paga a fiança e se livra solto. Aquele, se não tem emprego é preso por vadiagem.

Não tem fiança (e mesmo que houvesse, não teria dinheiro para pagá-la) e fica preso.

De outro lado, na luta para encontrar um lugar ao sol, ficará sempre de fora o mais fraco. É sabido que existe desem- prego flagrante. O Zé-Ninguém (já está dito), não tem amigos influentes. Não há apresentação, não há padrinho. Não tem

referências, não tem nome, nem tradi- ção. É sempre preterido. É o Nico Bonda- de, já imortalizado no humorismo (mais tragédia que humor) de Chico Anísio.

As mãos que produzem força, que carregam sacos, que produzem argamas- sa, que se agarram na picareta, nos andai- mes, que trazem calos, unhas arrancadas, não podem se dar bem com a caneta (veja-se a assinatura do indiciado às fls.

5v.) nem com a vida. E hoje, para qual- quer emprego, exige-se no mínimo o 1º grau. Aliás, grau acena para graúdo. E deles é o reino da Terra.

Marco Antônio, apesar da importân- cia do nome, é miúdo. E sempre será. Sua esperança? Talvez o Reino do Céu.

A lei é injusta. Claro que é. Mas a Justiça não é cega? Sim, mas o juiz não é.

Por isso: determino o arquivamento do processo deste inquérito.

Porto Alegre, 27 de setembro de 1979 Moacir Danilo Rodrigues Juiz de Direito da 5ª Vara Criminal

Nota: Essa sentença, proferida há mais de 20 anos, revela a importância e a coragem do julgador na aplicação da lei, por vezes injusta.

Cremos que, além de sua relevância histórica, ela é de grande interesse aos nossos leitores.

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SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

Prisão preventiva só se justifica em casos excepcionais.

Não serve como medida para punição antecipada.

O clamor público não justifica a prisão cautelar

“A privação cautelar da liberdade individual reveste-se de caráter excep- cional, somente devendo ser decretada em situações de absoluta necessidade

— A prisão preventiva, para legitimar-se em face do nosso sistema jurídico, impõe

— além da satisfação dos pressupostos a que se refere o art. 312 do CPP (prova da existência material do crime e indício suficiente de autoria) — que se eviden- ciem, com fundamento em base empírica idônea, razões justificadoras da impres- cindibilidade dessa extraordinária medi- da cautelar de privação da liberdade ou do réu.

A prisão preventiva — enquanto me- dida de natureza cautelar — não tem por objetivo infligir punição antecipada ao indiciado ou ao réu — A prisão pre- ventiva não pode — e não deve — ser utilizada pelo Poder Público como instru- mento de punição antecipada daquele a quem se imputou a prática do delito, pois, no sistema jurídico brasileiro, fundado em bases democráticas, prevalece o princípio da liberdade, incompatível com punições sem processo e inconciliável com conde- nações sem defesa prévia.

A prisão preventiva — que não deve ser confundida com a prisão penal — não objetiva infligir punição àquele que sofre a sua decretação, mas destina-se, conside- rada a função cautelar que lhe é inerente, a atuar em benefício da atividade estatal desenvolvida no processo penal.

O clamor público, ainda que se tra- te de crime hediondo, não constitui fator de legitimação da privação da cautelar da liberdade — O estado de comoção social e de eventual indigna- ção popular, motivado pela repercussão da prática da infração penal, não pode justificar, por si só, a decretação da pri- são cautelar do suposto autor do com- portamento delituoso, sob pena de com- pleta e grave aniquilação do postulado fundamental da liberdade.

O clamor público — precisamente por não constituir causa legal de justificação da prisão processual (CPP, art. 312) — não se qualifica como fator de legitima- ção da privação cautelar da liberdade do indiciado ou do réu, não sendo lícito pre- tender-se, nessa matéria, por incabível, a aplicação analógica do que se contém no art. 323, V, do CPP, que concerne, exclu- sivamente, ao tema da fiança criminal.

Precedentes.

A acusação penal por crime hediondo

não justifica, por si só, a privação cautelar da liberdade do indiciado ou do réu.

A preservação da credibilidade das instituições e da ordem pública não con- substancia, só por si, circunstância au- torizadora da prisão cautelar — Não se reveste de idoneidade jurídica, para efeito de justificação do ato excepcional de pri- vação cautelar da liberdade individual, a alegação de que o réu, por dispor de privi- legiada condição econômico-financeira, deveria ser mantido na prisão, em nome da credibilidade das instituições e da preser- vação da ordem pública.

Abandono do distrito da culpa para evitar situação de flagrância. Descabi- mento da prisão preventiva — Não cabe prisão preventiva pelo só fato de o agente — movido pelo impulso natural da liberdade

— ausentar-se do distrito da culpa, em ordem a evitar, com esse gesto, a caracteri- zação da situação de flagrância.

Ausência de demonstração, no caso, da necessidade concreta de decretar-se a prisão preventiva do paciente — Sem que se caracterize situação de real neces- sidade, não se legitima a privação cautelar da liberdade individual do indiciado ou do réu. Ausentes razões de necessidade, reve- la-se incabível, ante a sua excepcionalida- de, a decretação ou a subsistência da pri- são preventiva.

Discursos de caráter autoritário não podem jamais subjulgar o princípio da liberdade — A prerrogativa jurídica da liberdade — que possui extração constitu- cional (CF, art. 5º, LXI e LXV) — não pode ser ofendida por interpretações dou- trinárias ou jurisprudenciais, que, funda- das em preocupante discurso de conteúdo autoritário, culminam por consagrar, pa- radoxalmente, em detrimento de direitos , garantias fundamentais proclamados pela Constituição da República, a ideologia da lei e da ordem.

Mesmo que se trate de pessoa acusada da suposta prática de crime hediondo, e até que sobrevenha sentença penal condena- tória irrecorrível, não se revela possível — por efeito de insuperável vedação consti- tucional (CF, art. 5º, LVII) — presumir- lhe a culpabilidade.

Ninguém pode ser tratado como cul- pado, qualquer que seja a natureza do ilícito penal cuja prática lhe tenha sido atribuída, sem que exista, a esse respei- to, decisão judicial condenatória transi- tada em julgado.

O princípio constitucional da não cul- pabilidade, em nosso sistema jurídico, consagra uma regra de tratamento que impede o Poder Público de agir e de se comportar, em relação ao suspeito, ao indiciado, ao denunciado ou ao réu, como se estes já houvessem sido condenados definitivamente por sentença do Poder Judiciário.”

(HC nº 80.719-4/SP, 2ª Turma, rel.

min. Celso de Mello, j. 26.06.01, v.u., DJU 28.09.01, pp. 37/38).

Prisão preventiva.

Análise dos critérios de idoneidade de sua motivação à luz da jurisprudência do STF

"A fundamentação idônea é requisito de validade do decreto de prisão preven- tiva: no julgamento do habeas corpus que o impugna não cabe às sucessivas instâncias, para denegar a ordem, suprir a sua deficiência originária, mediante achegas de novos motivos por ele não aventados.

Não pode o decreto de prisão preventi- va carente de fundamentação idônea, va- lidar-se com a fuga posterior do acusado, que não tem o ônus de submeter-se à prisão processual cuja validade pretenda contestar em juízo.

Constitui abuso da prisão preventiva

— não tolerado pela Constituição — a sua utilização para fins não cautelares, mediante apelo à repercussão do fato e à necessidade de satisfazer a ânsias popu- lares de repressão imediata do crime, em nome da credibilidade do Poder Ju- diciário."

(HC nº 81.148-5/MS, 1ª Turma, rel.

min. Sepúlveda Pertence, j. 11.09.01, v.u. , DJU 19/10/01, p. 32).

Concurso material.

Reunião de processos subordinados à conexão

"A reunião, como objeto do mesmo pro- cesso, das acusações relativas a delitos dis- tintos só é lícita nas hipóteses legais de conexão ou continência, essa de logo afas- tada, quando se cuida de concurso material.

A conexão instrumental ou probatória

— única modalidade cogitável na espécie

— exige, porém, vínculo objetivo entre as diversas infrações, de tal modo que a prova de uma ou de qualquer de suas circunstâncias elementares influa na pro- va da outra (precedentes do STF): não basta, assim, para sua caracterização, a identidade do agente e da vítima de delitos independentes.

Juizados Especiais: suas peculiarida- des não bastam a legitimar a reunião no mesmo processo de acusações diversas, ausentes a conexão e a continência, se daí podem resultar dificuldades à defesa."

(HC nº 81.042-0/DF, 1ª Turma, rel.

min. Sepúlveda Pertence, j. 11.09.01, v.u. , DJU 19/10/01, p. 32).

Jurisprudência compilada por Helena Regina Lobo da Costa e Mariângela Lopes Neistein.

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SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Crime de imprensa.

Crítica e ofensa.

Liberdade de imprensa.

Ausência de justa causa

"Observações críticas, ainda que irri- tantes, nos limites da divulgação da si- tuação fática, não configuram, de per si, crime de imprensa (art. 27, inciso VIII da Lei de Imprensa).

Não se pode alçar à condição de ilícito penal aquilo que somente é desejado pela especial susceptibilidade da pessoa atin- gida e nem se deve confundir ofensa à honra, que exige dolo e propósito de ofender, com crítica jornalística objeti- va, limitada ao animus criticandi ou ao animus narrandi, tudo isto, sob pena de cercear-se a indispensável atividade da imprensa.

'A relação entre lei e liberdade é, obviamente, muito estreita, uma vez que a lei pode ou não ser usada como instru- mento de tirania, como ocorreu com fre- qüência em muitas épocas e sociedades, ou ser empregada como um meio de pôr em vigor aquelas liberdades básicas que, numa sociedade democrática, são consi- deradas parte essencial de uma vida ade- quada' (Dennis Lloyd).

Writ concedido, trancando-se a ação penal."

(HC nº 16.982/RJ, 5ª Turma, rel. min.

Felix Fisher, j. 20.09.01, v.u., DJU 29.10.01, p. 229).

Crime de denunciação caluniosa.

Trancamento da ação penal.

Ausência de justa causa.

Atipicidade da conduta

"O trancamento da ação penal, medi- da de exceção, somente é cabível, con- soante entendimento sufragrado no âm- bito desta Corte Superior de Justiça, nas hipóteses em que se demonstrar na luz da evidência, primus ictus oculi, a exclusão da autoria, a atipicidade da conduta ou a extinção da punibilidade.

Na denunciação caluniosa, o fato de o crime imputado falsamente não ter ocor- rido não exclui a tipicidade da conduta, por isso que a imputação falsa pode ser objetiva ou subjetiva, enquanto é deli- tuosa atribuição de fato que se sabe não ter ocorrido ou a atribuição de fato ocor- rido a quem se sabe não ser o seu autor.

Para a configuração do crime de de- nunciação caluniosa, é irrelevante tenha o denunciador indicado a identidade da pessoa denunciada, bastando, tão-so- mente, a imputação indireta, por meio da qual possa ela ser identificada.

Recurso improvido."

Jurisprudência compilada por Carlos Alberto Pires Mendes e Daniela Carvalho Almeida da Costa.

(RHC nº 10.690/SP, 6ª Turma, rel.

min. Hamilton Carvalhido, j. 05.06.01, v.u., DJU 24.09.01, p. 342).

Crime continuado. Extinção da punibilidade pela prescrição.

CP, art. 115 e art. 119.

"Segundo o cânon inscrito no art. 119, no concurso de crime, a extinção da punibilidade incidirá sobre a pena de cada um isoladamente, não dispondo o preceito sobre a prescrição na hipótese do crime continuado.

Sendo o crime continuado um delito único, ao qual se impôs uma só sanção, o benefício legal que reduz o prazo prescri- cional tem aplicação mesmo na hipótese em que o réu atinge a maioridade no curso da continuidade delitiva.

Recurso ordinário provido. Habeas corpus concedido."

(RHC nº 10.182/SP, 6ª Turma, rel.

min. Vicente Leal, j. 04.09.01, v.u., DJU 01.10.01, p. 246).

Crime de roubo qualificado.

Fixação da pena-base acima do mínimo legal.

Ausência de fundamentação.

Nulidade

"Afora casos excepcionais, fazem-se estranhos ao cabimento do habeas cor- pus os pedidos de modificação de pena ou de regime prisional, por indispensável à individualização da pena, na sua quan- tidade e na definição do regime inicial do cumprimento da prisional, o exame apro- fundado dos autos no referente ao fato criminoso, às suas circunstâncias, seus antecedentes e suas conseqüências, e aos sujeitos do crime, o que em nada se identifica com a só consideração da sen- tença ou do acórdão.

A fundamentação das decisões do Po- der Judiciário, tal como resulta da letra o inciso IX do artigo 93 da Constituição da República, é condição absoluta de sua validade e, portanto, pressuposto da sua eficácia, substanciando-se na definição suficiente dos fatos e do direito que a sustentam, de modo a certificar a realiza- ção da hipótese de incidência da norma e os efeitos dela resultantes.

Tal fundamentação, para mais, deve ser deduzida em relação necessária com as questões de direito e de fato postas na pretensão e na sua resistência, dentro dos limites do pedido, não se confundindo, de modo algum, com a simples reprodu- ção de expressões ou termos legais, pos- tos em relação, não raramente, com fatos

e juízos abstratos, inidôneos à incidência da norma invocada.

À par da simples transcrição de tre- chos legais, em se resumindo a funda- mentação da sentença na presunção de que da natureza abstrata do crime de roubo deve deduzir-se a perigosidade do agente, banida, de forma peremptória, do Direito Penal vigente, a cassação, nessa parte, do decreto condenatório, é medida que se impõe.

Em se tratando o acórdão, em sede de aferição de vício da dosimetria da pena, tão-somente da questão relativa à pena- base, permanecendo-lhe estranha a das causas de aumento, que, postas sob vistas na sentença, conduzem à dupla conside- ração do mesmo fato concreto da gravi- dade das lesões sofridas pela vítima, tem- se, por induvidosa, a caracterização de sua nulidade, no específico das penas infligidas, a reclamar novo estabeleci- mento harmonizado à lei, preservada a condenação decretada.

Ordem parcialmente concedida."

(HC nº 10.823/RJ, 6ª Turma, rel. min.

Hamilton Carvalhido, j. 29.06.00, v.u., DJU 01.10.01, p. 247).

Homicídio qualificado. Negativa de autoria. Exame minucioso de prova. Impropriedade do writ.

Qualificadoras. Fundamentação

"É vedado o exame do material cogni- tivo e o minucioso cotejo da prova na via estreita do habeas corpus.

Os dados que compõem o tipo básico ou fundamental (inserido no caput) são elementares (essentialia delicti); aque- les que integram o acréscimo, estrutu- rando o tipo derivado (qualificado ou privilegiado), são circunstâncias (acci- dentalia delicti).

No homicídio, a qualificadora de ter sido o delito praticado mediante paga ou promessa de recompensa é circunstância de caráter pessoal e, portanto, ex vi do art 30 do CP, incomunicável.

É nula a decisão de pronúncia que acolhe a comunicabilidade de circuns- tância pessoal e deixa de motivar concre- tamente a admissibilidade das qualifica- doras.

Habeas corpus parcialmente concedi- do."

(HC nº 15.184/PI, 5ª Turma, rel. min.

Felix Fisher, j. 16.08.01, v.u., DJU 24.09.01, p. 232).

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TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL

Descaminho. Dúvida quanto à propriedade das mercadorias.

Abolvição decretada

"Alegando o apelante não ser o proprie- tário das mercadorias apreendidas, que es- tavam expostas à venda, há de ser conside- rada a afirmação, dada a existência nos autos de depoimentos testemunhais confir- matórios, enquanto não cuidou o órgão de acusação de infirmar o fato.

Declarado que a banca do camelódro- mo era de um primo e estava apenas prestando o favor de vigiá-la, enquanto aquele viajava, deve ser acolhida a alega- ção, porquanto existem protocolos de re- querimento de alvará, em nome do indica- do parente, cuja autenticidade não foi ques- tionada, proporcionando, no mínimo, a dúvida de existência de dolo e de prática de descaminho.

A própria sentença, expressamente, consignou deixar de aplicar a pena de perdimento, em homenagem ao princípio da pessoalidade da pena, por haver dúvida de quem seria o proprietário das mercado- rias, 'em vista da tese sustentada pela defesa', determinando a restituição ao pri- mo do apelante.

Não provado tenha o réu concorrido para a prática delituosa, impõe-se a sua absolvição (CPP, art. 386, IV)."

(TRF 1ª Reg., Ac. nº 01080830, 2ª Turma, rel. juiz fed. Lindomar Marques de Brito, j. 19.06.01, v.u., DJU 16.07.01, p. 567).

Não-recolhimento de contribuições previdenciárias.

Dificuldades financeiras.

Cooperativa

"A partir dos dados trazidos pela defe- sa, entre os quais as ações de execução e os títulos protestados, conclui-se que a situa- ção financeira da cooperativa era extre- mamente crítica, motivo pelo qual deve ser reconhecida a dificuldade financeira alegada e ser absolvido o seu administra- dor, com fundamento na inexigibilidade de conduta diversa, causa supralegal de exclusão da culpabilidade.

A crise financeira enfrentada pela coo- perativa atinge diretamente seus associa- dos, diminuindo-lhes seu patrimônio pes- soal, o que praticamente impossibilita que se lhes exija reposição de capital para saldar os compromissos da entidade. Ade- mais, não há como pretender, na esfera penal, impor ao administrador da coopera- tiva a obrigação de exigir dos cooperados que cumpram pessoalmente com as obri- gações previdenciárias, sob pena de que, não o fazendo o administrador ou não comparecendo os cooperados, seja o ad- ministrador penalmente responsabilizado pela omissão."

Jurisprudência compilada por Celeste Leite dos S. P.

Gomes, Cesar Matta Ide e Luis Fernando Beraldo.

(TRF 4ª Reg., EI na Ac. nº 37, 1ª Turma, rel. juiz fed. Vilson Darós, j. 08.06.01, m.v., DJU 04.07.01, p. 576).

Conta corrente. Bloqueio necessário à investigação criminal

"O bloqueio da conta corrente face à necessidade de investigação da possível participação do apelante em organização criminosa equipara-se à apreensão, con- forme precedente do STJ.

Decisão mantida por não haver elemen- tos nos autos que afastem a possibilidade dos bens apreendidos interessarem ao pro- cesso ou estarem sujeitos ao confisco pre- visto no art. 91, II, do CP."

(TRF 4ª Reg., Ap. nº 00.71.00.039982-0/

RS, 8ª Turma, rel. des. Amir Serti, j.

03.09.01, v.u., DJU 26.09.01, p. 1.650).

Art. 183 da Lei de Telecomunicações.

Potencialidade lesiva.

Tipicidade. Art. 336, CP. Dolo.

Ônus da prova. Consumação.

Dano. Prescindibilidade

"O delito tipificado no art. 183 da Lei nº 9.472/97 consiste em desenvolver ativida- des de telecomunicações sem a devida autorização do órgão competente, tendo quedado incontroverso nos autos o fato de que o réu não a possuía.

Descabida a alegação de que o aparelho apreendido não possui potencialidade lesi- va, na medida em que o laudo pericial é claro ao afirmar que sua utilização acarreta problemas ao sistema de comunicação, cau- sando interferências em outros serviços.

Tipicidade configurada.

O crime previsto pelo art. 183 da Lei nº 9.472/97 é de perigo de dano, consuman- do-se com o mero risco potencial de lesão ao bem jurídico tutelado, qual seja, o regular funcionamento do sistema de tele- comunicações, sendo prescindível qual- quer resultado efetivo.

O elemento subjetivo necessário ao cri- me do artigo 336 do Código Penal é o dolo do tipo, consubstanciado na vontade de violar ou inutilizar selo ou sinal, tendo consciência da sua natureza.

Incumbe à defesa a prova de causas que excluam a culpabilidade (art. 156), o que não ocorreu na espécie.

A infração ao artigo 336 do Código Penal consuma-se com a prática de qual- quer das ações incriminadas, independen- temente de qualquer outro resultado.

Embora o aparelho tenha sido arrecada- do, posteriormente, pela Polícia Federal, o fato é que a infração já havia se consumado com o simples rompimento do lacre.

Apelação improvida."

(TRF 4ª Reg., Ap. nº 01.04.01.041394-

0/RS, 7ª Turma, rel. juiz Fabio Ruiz, j.

11.09.01, v.u., DJU 26.09.01, p. 1.646).

Crimes contra a flora.

Mata Atlântica.

Patrimônio Nacional.

Interesse da União.

Competência federal

"O fato de ser competência comum da União, dos Estados e do Distrito Federal e dos Municípios, proteger o meio ambien- te, bem como combater a poluição em qualquer de suas formas e preservar as florestas, a fauna e a flora, de acordo com o que dispõe o art. 23, VI e VII, da Cons- tituição Federal, demonstra o interesse federal em tais casos, o que é suficiente para afastar a competência da Justiça Es- tadual, por ser esta residual.

À Mata Atlântica a CF/88 atribuiu a condição de Patrimônio Nacional, revelan- do-se com isso o prevalente interesse nacio- nal, o qual transcende o âmbito estadual.

Não há falar que necessária a compro- vação da origem da madeira extraída para a verificação da competência, tendo em vista que esta se dá em razão do interesse da União nos casos dos crimes cometidos contra a flora, a qual se caracteriza como Patrimônio Nacional.

Recurso em sentido estrito provido."

(TRF 4ª Reg., RSE nº 01.04.01.0244991-1/

SC, 7ª Turma, rel. juiz José Luiz B. Ger- mano da Silva, j. 21.08.01, v.u., DJU 12.09.01, p. 457).

Crimes contra a fauna silvestre.

Leis nºs 5.197/67 e 9.605/98.

Súmula 91/STJ.

Cancelamento.

Interesse federal.

Competência da Justiça Federal

"O sistema da Lei nº 9.605/98 não conflita com o da Lei nº 5.197/67.

Havendo interesse federal envolvido na proteção do meio ambiente, no combate à poluição e na preservação da fauna (CF, art.

23, inciso VII), ainda que concorrentemen- te, é da Justiça Federal a competência para o processo e julgamento dos crimes contra a fauna, a teor do inc. IV do art. 109 da CF.

Confirma a conclusão o fato de compe- tir ao Ibama, autarquia federal, a normati- zação e fiscalização do uso e acesso aos recursos faunísticos.

Recurso em sentido estrito improvido."

(TRF 4ª Reg., RSE nº 00.72.05.005011- 0/SC, 8ª Turma, rel. juiz Volkmer de Castilho, j. 16.08.01, m.v., DJU 26.09.01, p. 1.648).

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TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Nova classificação do delito na sentença de 1º grau.

Aplicação da Lei nº 9.099/95.

Direito do acusado

"A sentença de primeiro grau desclassi- ficou o delito para violação do art. 16 da Lei nº 6.368/76 e, em seguida, suspendeu o processo nos termos do art. 89 da Lei nº 9.099/95 e determinou a designação da audiência após o trânsito em julgado. (...) O julgador, após o advento da Lei nº 9.099/95, ao findar o primeiro momento da sentença e verificar que o delito deve ser desclassificado e que essa desclassifi- cação irá permitir que o agente possa ser beneficiado com o disposto no art. 89 dessa lei, terá que reconhecer a nova clas- sificação e, antes de passar para o segundo momento, o da verificação de autoria, deverá converter o julgamento em dili- gência para que a proposta de suspensão do processo possa ser feita. A conversão do julgamento ocorre porque o primeiro momento somente se exaure quando, nos casos cabíveis, for cumprido o disposto no art. 89 da Lei nº 9.099/95.

É um dever do julgador e não mera faculdade, a conversão do julgamento em diligência, desde que a nova classificação dos requisitos exigidos para a aplicação do art. 89 da Lei nº 9.099/95 esteja satisfeita.

Constitui um dever do julgador porque ele não pode deixar de outorgar ao acusado todo o direito que a ele é assegurado por lei."

(TJ/SP, Ap. nº 298.374-3/7-00, 2ª CCrim., rel. des. Almeida Braga, j.

04.06.01, m.v.).

Crime hediondo. Prisão cautelar.

Necessidade de motivar a decretação da carcer ad custodiam

"Muito embora os fatos pelo qual o paciente foi condenado sejam graves, o certo é que tal circunstância não pode, por si só, autorizar a prisão cautelar, pois há muito banida de nossa legislação a prisão preventiva compulsória.

Há de se ponderar que a hediondez do crime praticado não impediu que o pacien- te aguardasse o julgamento popular em liberdade.

Tendo o paciente respondido todo o processo em liberdade, comparecendo a todos os atos processuais, a ordem merece ser concedida.

(...)

O juiz que condenou o réu em primeira instância poderá mantê-lo preso ou orde- nar sua prisão, desde que motive adequa- damente a decretação da carcer ad custo- diam. A condenação pode determinar a existência do fumus boni juris, mas não é

suficiente para dar origem ao periculum in mora. E só aglutinando-se esses dois pres- supostos da medida coercitiva e cautelar que ela pode ser imposta."

(TJ/SP, HC nº 354.348-3/6-00, 3ª CCrim., rel. des. Segurado Braz, j.

24.07.01, v.u.).

Falso testemunho.

Retratação após a sentença de pronúncia. Possibilidade.

"(...) o apelante faltou com a verdade, o que ele próprio confessou, quando nesta ação penal foi interrogado.

De qualquer forma, sua retratação ocor- reu antes da sentença proferida pelo Tri- bunal do Júri.

(...)

Pouco importa, igualmente, que a retra- tação se tenha dado no próprio processo em que fora praticado o falso testemunho ou, como na espécie, em interrogatório em juízo, nos autos da ação penal movida em face do réu: afinal, de um modo ou de outro, houve retratação oficial, perante o Estado-juiz, assim bem cientificado do ocorrido e de como os fatos verdadeira- mente se passaram.

Aliás, precipitada a instauração da pre- sente ação penal, muito antes do trânsito em julgado da sentença proferida na ação em que fora praticado o crime de falso testemunho."

(TJ/SP, Ap. nº 270.137-3/1, 5ª CCrim., rel. des. Celso Limongi, j. 03.05.01, voto vencido em parte).

Tráfico de entorpecente.

Laudo definitivo. Ausência.

Comprovação que a lei considera integrante da tipificação do delito

"(...) para o reconhecimento da existên- cia de crime de entorpecente é indispensá- vel o exame pericial definitivo, não po- dendo, inclusive, ser suprido por confis- são, eis que ausente a prova de materiali- dade.

O laudo de constatação acostado às folhas (...) observa o caráter provisório do resultado e não confirma necessariamente o resultado da identificação que será en- viado em laudo definitivo."

(TJ/SP, Ap. nº 333.454-3/6-00, 3ª CCrim., rel. des. Segurado Braz, j. 26.06.01, v.u.).

Porte de arma.

Sentença reclassificatória da conduta na forma típica

qualificada. Mutatio libelli

"Réu denunciado no art. 10, caput, da Lei nº 9.437/97. Certidão relativa à conde-

nação anterior por crime contra o patrimô- nio juntada no curso do processo. Senten- ça reclassificatória da conduta na forma típica qualificada (art. 10, § 3º, IV). Não observância do prescrito no art. 384, pará- grafo único, do CPP. Inadmissibilidade.

Configurada mutatio libelli, com afronta ao princípio da correlação temática, posto não se cuidar de mera agravante genérica, mas de qualificadora do tipo de injusto, a depender de específica imputação."

(TJ/SP, Ap. nº 288.733-3/0, 3ª CCrim., rel. des. Gonçalves Nogueira, j. 27.01.00, v.u.).

Entorpecentes. Tráfico.

Inadmissibilidade de presunção do dolo.

Prova insuficiente

"Não se pode reconhecer o crime do art.

12 da Lei nº 6.368/76, se a prova não é certa e precisa sobre a destinação ao tráfi- co da substância entorpecente apreendida com o acusado, inadmissível a presunção do dolo.

Os depoimentos dos policiais autores da prisão devem ser analisados em face de toda a instrução probatória, não se poden- do considerá-los como prova hierarquica- mente superior, pois o princípio da verda- de real repele as fontes de prova prefixa- das, com suas certezas predeterminadas.

A deficiência da ação policial, deixan- do de colher outros elementos fundamen- tais para o esclarecimento do fato, enfra- quece e torna duvidosa a acusação.

Recurso provido em parte."

(TJ/SP, Ap. nº 2.832/98, 5ª CCrim., rel.

des. Sergio Verani, j. 24.06.99, v.u.).

Réu condenado em regime semi-aberto. Falta de vaga.

Cumprimento da pena em regime aberto.

Possibilidade

"(...) não pode o paciente cumprir pena em regime carcerário mais severo do que estabeleceu a sentença condenatória.

Aliás, esse é o entendimento da juris- prudência: 'Estando o paciente sujeito ao cumprimento da pena em regime semi- aberto, de conformidade com o título exe- cutório, não pode e não deve permanecer em regime prisional fechado, mais rigoro- so do que o imposto, o que configura o constrangimento ilegal' (RT 679/332)."

(TJ/SP, HC nº 350.921-3/2, 5ª CCrim., rel. des. Celso Limongi, j. 21.06.01, m.v.).

Jurisprudência compilada por Eder Clai Ghizzi, Maria Fernanda Baptista Cepellos Daruiz, Rogério Marcolini e Vinícius de Toledo Piza Peluso.

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