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IMPONTUALIDADE DO PODER PÚBLICO NOS CONTRATOS ADMINISTRATIVOS COMO RELEVANTE RAZÃO DE DIREITO PARAA ELISÃO DO PEDIDO DE FALÊNCIA EM FACE DE TERCEIROS

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SANDORKRISZTANBORCSIK

AIMPONTUALIDADEDOPODERPÚBLICONOSCONTRATOS

ADMINISTRATIVOSCOMORELEVANTERAZÃODEDIREITOPARAAELISÃO DOPEDIDODEFALÊNCIAEMFACEDETERCEIROS

PUC/SP SOROCABA

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SANDOR KRISZTAN BORCSIK

AIMPONTUALIDADEDOPODERPÚBLICONOSCONTRATOS

ADMINISTRATIVOSCOMORELEVANTERAZÃODEDIREITOPARAAELISÃO DOPEDIDODEFALÊNCIAEMFACEDETERCEIROS

Monografia apresentada como exigência parcial para a obtenção do grau de especialista em direito processual civil no Curso de Especialização em Direito Processual Civil da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, sob a orientação do Prof. Dr. Luiz Sérgio de Souza Rizzi

PUC/SP SOROCABA

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SANDORKRISZTANBORCSIK

AIMPONTUALIDADEDOPODERPÚBLICONOSCONTRATOS

ADMINISTRATIVOSCOMORELEVANTERAZÃODEDIREITOPARAAELISÃO DOPEDIDODEFALÊNCIAEMFACEDETERCEIROS

Esta monografia foi julgada adequada à obtenção do grau de Especialista em

Direito Processual Civil e aprovada em sua forma final pelo Curso de Especialização

em Direito Processual Civil da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.

São Paulo, ______ / ______ / ______

Banca examinadora:

______________________________________________________

______________________________________________________

(4)

IV

RESUMO

O presente ensaio tem foco na incidência do disposto no art. 94, I, da Lei de

Falências e de Recuperação de Empresas – Lei n. 11.101, de 9 de fevereiro de 2005

– (LFRE), abrangendo como relevante razão de direito, hábil a elidir a decretação da

quebra, o inadimplemento injustificado de contrato administrativo pelo Poder Público.

Para tanto, reputa-se que a mora da Administração Pública acaba por

repercutir em relações jurídicas estranhas ao contrato – entabuladas entre a licitante

vencedora e terceiros – em face da condição de insolvência jurídica provocada pelo

Estado, de tal maneira a dar ensejo ao ajuizamento de pedido de falência por

estranhos à relação contratual primitiva.

O raciocínio desenvolvido parte da interpretação da lei falimentar à luz das

disposições contidas nos artigos 1º, IV, 170, II, IV, V, VII e VIII e 174, todos da

Constituição Federal, em cujo contexto a empresa desempenha papel fundamental

na sociedade contemporânea, como um dos elementos da estrutura do sistema

econômico, o que impede o Estado de ser o agente causador, direto ou indireto, de

sua quebra.

Sob esse viés constitucional, o ensaio busca equacionar possíveis soluções

para as questões processuais visando sua aplicação prática e a salvaguarda dos

(5)

V

especialmente de não ver a injusta decretação de sua falência, bem como dos

terceiros que com ela entabulam negócios jurídicos, assegurando-lhes o acesso a

uma via jurisdicional apta ao recebimento dos respectivos créditos.

Para a consecução desses objetivos voltaram-se os olhos aos direitos e

garantias constitucionais processuais, especialmente ao princípio do devido

processo legal, pedra fundamental sobre a qual se buscou erigir a presente tese,

conferindo-lhe sustentabilidade jurídica e imprimindo-lhe a necessária eficácia.

PALAVRAS-CHAVE: Lei de falências e de recuperação de empresas.

Inadimplemento do contrato administrativo. Relevante razão de direito. Elisão do

(6)

VI

ABSTRACT

The present essay examines the incidence of the disposed in the Article 94,

item one, of the Bankruptcies Law and of Recovery of Companies (New Bankruptcy

Law), enclosing as relevant reason of right, able to eliminate the bankruptcy decree,

the unjustified lack of payment of the administrative contract by the State.

Therefore, it is considered that the delay of payment of the Public

Administration echoes in strange juridical relationships to the contract – established

among the winning bidder and others – in view of the condition of juridical insolvency

caused by the State, in such way to give opportunity to the provoking the judicial

request of bankruptcy by strangers to the primitive contractual relationship.

The developed reasoning starts from the interpretation of the Bankruptcy Law

considering the Articles 1º, item four, 170, items two, four, five, seven and eight and

174, all of the Federal Constitution, in that the company performs fundamental

function in the contemporaneous society, as one of the structure elements of the

economic system, that impedes the State to be the causative agent, direct or indirect,

of its bankruptcy.

From this constitutional view, the essay seeks to equation for possible

solutions on the procedural subjects seeking the practical application and the

(7)

VII

specially to the unjust decree of its bankruptcy keep unseen, as well as the others

that with it establish juridical business, ensuring the access to a judicial way able to

the receiving of their respective credits.

To achieve these objectives the attention was given to the constitutional

procedural rights and their warranties, especially the principle of due process of law,

foundation stone about which had been searched to lift this theory, giving juridical

support and applying the necessary efficacy.

KEYWORDS: Bankruptcies law and of recovery of companies. Payment lack of

the administrative contract. Relevant reason of right. Elimination of the bankruptcy

(8)

VIII

SUMÁRIO

RESUMO... IV ABSTRACT... VI

INTRODUÇÃO...09

1 INTERPRETAÇÃO CONSTITUCIONAL DO DIREITO FALIMENTAR...15

1.1 CREDOR FISCAL...19

2 PRINCÍPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL -DUE PROCESS OF LAW ...27

3 ASPECTOS GERAIS DA LEI DE FALÊNCIAS E DE RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS...35

4 IMPONTUALIDADE E RELEVANTE RAZÃO DE DIREITO...41

4.1 RELEVANTE RAZÃO DE DIREITO EM FACE DE TERCEIROS...44

4.2 RISCO DA ATIVIDADE EMPRESARIAL...49

5 QUESTÕES PROCESSUAIS...56

5.1 A MATÉRIA DE DEFESA COMO QUESTÃO PREJUDICIAL...59

5.2 DA DEFESA DE MÉRITO...62

5.3 DA PRETENSÃO DE DIREITO MATERIAL - EXECUÇÃO DO CRÉDITO...67

5.4 DA SENTENÇA DENEGATÓRIA DA FALÊNCIA...72

5.4.1 DA ANTECIPAÇÃO DE TUTELA...75

5.5 ENCARGOS DA SUCUMBÊNCIA NA FASE DE CONHECIMENTO...78

6 DO PROSSEGUIMENTO NA FASE DE CUMPRIMENTO DA SENTENÇA...82

6.1 DA GARANTIA DO JUÍZO...85

6.2 ENCARGOS FINANCEIROS NA FASE DE CUMPRIMENTO DA SENTENÇA...90

6.3 DA EXECUÇÃO FRUSTRADA...95

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS...101

(9)

9

INTRODUÇÃO

A existência de uma legislação falimentar eficiente e eficaz é fundamental não

só para a segurança jurídica, mas também para a economia, especialmente quando

essa legislação privilegia a criação de mecanismos ordenados de resolução de

conflitos e coordenação de interesses para empresas/sociedades empresárias com

problemas financeiros ou em estado de falência, gerando resultados satisfatórios e

eficientes tanto para os credores quanto para a devedora, especialmente quando a

crise não encontrar solução de mercado.

Assim, o papel desempenhado pela legislação falimentar, sob o ponto de vista

econômico, apresenta-se como pedra angular na sinalização aos seus principais

agentes1 sobre os possíveis resultados a serem obtidos em suas estratégias de

negócios, permitindo antever o modo como serão resolvidos alguns conflitos quando

as empresas/sociedades empresárias com as quais mantêm relações jurídicas forem

levadas a uma situação de insolvência.

1

(10)

10

Em outras palavras, o regime de insolvência adotado pela lei sinaliza a esses

agentes econômicos2 a forma como serão afetados os resultados (pay-offs) das

empresas/sociedades empresárias com quem mantêm negócios, em caso de

insucesso, o que vai definir seu comportamento na articulação da produção,

consumo, distribuição e investimento.

Essa perspectiva prévia é especialmente importante se considerarmos que as

empresas/sociedades empresárias tomam suas decisões de investimento e

produção em função da expectativa de lucros futuros, e que tais estratégias de

atuação se desenvolvem em um ambiente de incerteza ante a impossibilidade de se

elaborar contratos que contemplem, com segurança, as ações e contingências

possíveis.

A nova legislação falimentar criou condições para minimizar o impacto da

incerteza sobre o curso normal dos negócios das empresas. A chamada “segunda lei

falimentar” avançou ao conferir ao sistema econômico um conjunto de regras de

coordenação, alinhando incentivos, preservando os direitos de propriedade,

regulando e privilegiando o cumprimento dos contratos. E, em caso de insolvência

efetiva, avançou ao permitir minimizar ao máximo as perdas, proporcionando maior

segurança para a atividade econômica, para as relações comerciais e para o

mercado de crédito em particular, de forma a maximizar o resultado da atividade

empresarial.

Com efeito, o regime de insolvência adotado procurou equacionar as variantes

para apresentar um sistema equilibrado, capaz de influir no comportamento dos

agentes e no funcionamento da economia diante dos resultados que se podem

esperar em caso de insucesso.

2

(11)

11

Contudo, embora haja harmonia da mens legis constitucional e

infraconstitucional, para que a lei possa realmente cumprir seus objetivos é

imprescindível que sua aplicação ao caso concreto seja pautada pela interpretação

constitucional do direito falimentar.

A leitura de seus dispositivos deve considerar, antes, o corpo normativo e

principiológico da Constituição Federal, especialmente os princípios do devido

processo legal, da segurança jurídica e da unicidade do direito, visando sua efetiva

aplicação no mundo fenomênico.

Nesse contexto, estabelecemos duas frentes de trabalho.

A primeira consiste em mostrar como o Poder Público3 pode provocar o

estado de insolvência jurídica de empresas ou sociedades empresárias mediante o

injustificado inadimplemento quanto às suas obrigações financeiras derivadas do

contrato administrativo, dando causa ao ajuizamento de pedido de falência por

terceiros.

Na segunda frente de trabalho procuramos indicar uma via jurídico-processual

efetiva às empresas ou sociedades empresárias que, diante da situação

anteriormente apresentada, estejam submetidas a uma das seguintes sujeições:

a) estando na iminência de ver decretada sua quebra, possam

apresentar como causa excludente o inadimplemento da

Administração Pública como relevante razão de direito para a mora no

cumprimento das obrigações assumidas com empregados,

fornecedores e toda sorte de credores, a ensejar a improcedência do

pedido de falência;

3

(12)

12

b) havido entabulado negócios com colaboradores da Administração

Pública e não tendo recebido seus créditos possam, mediante a

conversão do pedido de falência elidido em processo executivo,

processado sem solução de continuidade por meio do instituto do

cumprimento da sentença (CPC, arts. 475-I a 475-R), ter a penhora

dos direitos sobre o crédito decorrente do contrato administrativo,

objeto de discussão na matéria de defesa, assegurando-lhes o acesso

a uma via jurisdicional apta ao recebimento do quantum debeatur,

situação que se tornaria irreversível em face do advento da

decretação da quebra da devedora.

O primeiro campo de trabalho é delimitado pela identificação e subsunção do

inadimplemento do contrato administrativo, por parte do Poder Público, a um só

tempo como causa e relevante razão de direito para a mora justificada da

contratada, considerando o disposto no art. 94, I, da Lei n. 11.101/05, capaz, por si

só, de afastar a caracterização da insolvência jurídica e, portanto, elidir a decretação

da falência.

As causas excludentes da falência requerida com base na impontualidade

injustificada, previstas no art. 4º do revogado Decreto-lei n. 7.661/45 e, em sua maior

parte repetidas no art. 96 da Lei n. 11.101/05, têm valor meramente enumerativo, o

que permite construir, no campo doutrinário e jurisprudencial, esta vinculação, de

modo a ampliar o direito de defesa da empresa/sociedade empresária devedora de

terceiros e credora da Administração Pública.

Ainda, com vistas à interpretação sistemática da ordem econômica e

financeira – CF, art. 170 e ss –, o ensaio perfilha a corrente doutrinária e

(13)

13

Público para o ajuizamento de pedido de falência do devedor, cujo quantum

debeatur está inscrito como dívida ativa.

Como corolário desse entendimento, procura-se demonstrar que o

ordenamento jurídico contempla a proteção adequada a fim de não permitir ao Poder

Público provocar, indiretamente, a quebra de empresas em virtude do

inadimplemento dos contratos administrativos com elas celebrados.

O segundo campo de trabalho encontra sua delimitação no equacionamento

das questões processuais da defesa de mérito calcada na prova da ocorrência de

"relevante razão de direito", justificadora da impontualidade como questão prejudicial

que envolve a relação jurídica estranha às partes do processo falimentar.

Com efeito, a regulação satisfatória das situações jurídicas multilaterais, capaz

de atender às diretrizes constitucionais e preservar o conteúdo normativo da

legislação aplicável ao caso, demanda a solução de determinadas questões próprias

da relação jurídico-processual como (1) a adequação da solução de mérito aos

princípios da instrumentalidade das formas, boa-fé, economia, celeridade e eficiência

processuais, (2) o caráter prejudicial da matéria de defesa e a

necessidade/possibilidade de reunião ou suspensão de processos conexos, (3) a

condenação aos ônus da sucumbência em face da improcedência do pedido de

falência, (4) a possibilidade de prosseguimento na fase do cumprimento da sentença

e seus consectários.

Acresce em importância o tema quando se leva em consideração não apenas

o impacto nas empresas/sociedades empresárias que venham a se tornar

impontuais no cumprimento de suas obrigações financeiras, especialmente na

hipótese em estudo, mas, também, a repercussão que poderá advir no

(14)

14

intervenção do Poder Judiciário é que passará a definir os resultados da empresa e

a sorte dos que com ela negociaram.

Assim, o ensaio propõe meios de intervenção do Poder Judiciário que visam

fomentar a segurança jurídica, a proteção da atividade econômica e a sobrevivência

do instituto do crédito a fim de que o custo dos riscos associados à empresa e à sua

reorganização não seja repassado à sociedade pelos principais agentes

(15)

15

1INTERPRETAÇÃOCONSTITUCIONALDODIREITOFALIMENTAR

Hoje o Estado brasileiro se define juridicamente como sendo um Estado Social

e Democrático de Direito4, ou seja, ao lado das limitações postas ao Estado pela

ordem jurídica, a Constituição Federal fixa-lhe, também, obrigações positivas para o

desenvolvimento da sociedade e a realização da justiça social.

Agrega-se ao Estado de Direito a imposição do dever de atingir objetivos

sociais e a atribuição aos indivíduos do correlato direito de exigi-lo.

Destarte, em sua evolução, o Estado Social não só incorporou o Estado de

Direito como dele é dependente para atingir seus objetivos, na medida em que lhe

agrega elementos sócio-ideológicos, traduzidos como um conjunto de normas que

revela o caráter de compromisso constitucional entre o Estado liberal e o Estado

social intervencionista.

Partiu-se, portanto, da concepção de Estado liberal, entendida como “Estado

mínimo”, com reduzidas funções e sem interferência na vida econômica – na qual se

firmou a restrição dos fins estatais com a consagração de uma declaração de

4

(16)

16

direitos do homem para proteção contra abusos do poder, entendida como “estatuto

negativo” – para o Estado social intervencionista, com o plus de suavizar as

injustiças e opressões econômicas e sociais que se desenvolveram à sombra do

liberalismo, assumindo, o Estado, a postura de agente do desenvolvimento e da

justiça social.

Contudo, essa evolução para o modelo de Estado intervencionista não

significa que a constitucionalização da disciplina jurídica da ordem econômica – CF,

art. 170 e ss – traz em si a socialização da economia.

Nas palavras do Prof. Dr. José Afonso da Silva:

Isso não quer dizer que, nessa disciplina, se acolhe necessariamente um "sopro de socialização". Não, aqui, como no mundo ocidental em geral, a ordem econômica consubstanciada na Constituição não é senão uma forma econômica capitalista, porque ela se apóia inteiramente na apropriação privada dos meios de produção e na iniciativa privada (art. 170). Isso caracteriza o modo de produção capitalista, que não deixa de ser tal por eventual

ingerência do Estado na economia nem por circunstancial exploração direta da atividade econômica pelo Estado e possível monopolização de alguma área econômica, porque essa atuação estatal ainda se insere no princípio básico do capitalismo [...].

A atuação do Estado, assim, não é nada mais nada menos do que uma tentativa de por ordem na vida econômica e social, de arrumar a desordem que provinha do liberalismo. Isso tem efeitos especiais, porque importa em por condicionamentos à atividade econômica, do que derivam os direitos econômicos que

consubstanciam o conteúdo da constituição econômica5.

E prossegue o elevado jurista, com a propriedade que lhe é particular,

discorrendo sobre o fundamento e natureza da ordem econômica instituída:

A Constituição declara que a ordem econômica é fundada na

valorização do trabalho humano e na iniciativa privada. Que significa

isso? Em primeiro lugar quer dizer precisamente que a Constituição consagra uma economia de mercado, de natureza capitalista, pois a

iniciativa privada é um princípio básico da ordem capitalista. Em

segundo lugar significa que, embora capitalista, a ordem econômica dá prioridade aos valores do trabalho humano sobre todos os demais valores da economia de mercado. Conquanto se trate de declaração

5 SILVA, José Afonso.

(17)

17

de princípio, essa prioridade tem o sentido de orientar a intervenção do Estado na economia, a fim de fazer valer os valores sociais do trabalho que, ao lado da iniciativa privada, constituem o fundamento não só da ordem econômica, mas da própria República Federativa do Brasil (art. 1º, IV)6.

Nesse contexto, a empresa desempenha papel fundamental na sociedade

contemporânea como um dos elementos da estrutura do sistema econômico que a

Constituição Federal instaurou com fundamento na valorização do trabalho humano

e na livre iniciativa (art. 1º, IV), tendo por fim assegurar a todos existência digna,

conforme os ditames da justiça social (art. 3º), observados, dentre outros, os

princípios da propriedade privada e de sua função social, da livre concorrência, da

defesa do consumidor, da redução das desigualdades regionais e sociais e da busca

do pleno emprego (art. 170, II, III, IV, V, VII e VIII).

Sob essa premissa pode-se inferir que o princípio da preservação da

empresa, adotado pela Lei n. 11.101/05, é corolário de princípios constitucionais de

grande envergadura, e tem por escopo preservar, tanto quanto possível, o exercício

da atividade empresarial – definida como atividade econômica organizada para a

produção ou circulação de bens ou de serviços7 –, ainda quando decretada a

quebra, mediante a ordem de preferência para a realização do ativo, permitindo que

continue a exercer a sua função social como fonte produtora e geradora de

empregos e renda.

Com efeito, os modos de atuação do Estado na economia ficam vinculados às

balizas constitucionais, quer se trate de exploração estatal da atividade econômica,

de intervenção como agente normativo e regulador ou, ainda, de atuação com fins

de planejamento.

6

SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo. 10. ed. São Paulo: Malheiros, 1995, p. 720. 7

(18)

18

Essa possibilidade de intervenção do Estado deve ser exercida com a

consciência de que a atividade econômica, no regime capitalista como é o nosso,

desenvolve-se com observância ao princípio da livre iniciativa e sob a orientação de

administradores da empresa privada. Exceção a essa assertiva reside na prestação

de serviços públicos, em que a liberdade de desenvolvimento da empresa deve estar

contida no quadro estabelecido pelo Poder Público.

Não é por outro motivo que, “como agente normativo e regulador da atividade

econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo

e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o

setor privado” (CF, art. 174)8.

8

(19)

19

1.1 CREDOR FISCAL

Com relação à vinculação dos modos de atuação do Estado na economia às

balizas constitucionais, exsurge a questão da legitimidade do credor fiscal para

requerer a falência do devedor tributário.

Sobre o tema persistem duas discussões doutrinárias e jurisprudenciais que

se formaram ainda na vigência do revogado Decreto-lei n. 7.661/45.

Judiciosas opiniões levantam-se em ambos os sentidos. De um lado se

posicionam os que entendem possível o pedido falimentar tendo por sujeito ativo o

credor tributário, alegando, em síntese, que não há qualquer óbice legal expresso de

tal maneira que o silêncio da lei deve ser interpretado no sentido de ampliar as

possibilidades de cobrança do crédito fiscal e não de reduzi-las.

Sustentam, ainda, que o processo falimentar não se restringe apenas à

satisfação da pretensão individual da Fazenda Pública, como na execução fiscal,

mas agrega a esse resultado outro de interesse social: o impedimento do exercício

da atividade empresarial por pessoas que, sentindo-se protegidas pelo véu da

personalidade jurídica, reiteradamente constituem e extinguem sociedades

empresárias com o intuito deliberado de fraudar seus credores.

O pedido de falência, sob essa óptica, proporciona à Fazenda Pública a

possibilidade de contribuir para a depuração do sistema econômico ao mesmo

tempo em que lhe franqueia uma via coercitiva bastante eficaz para a persecução de

seus créditos.

Quanto à opção deixada ao servidor administrativo para decidir ou não pelo

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20

é vinculada ao interesse público e a verificação de eventual tratamento

discriminatório haverá de ser reprimido na forma da lei.

Em outra vertente, sustenta-se a ausência de legítimo interesse da Fazenda

Pública em requerer a falência de seus devedores, mormente segundo a livre

determinação e escolha de seus agentes administrativos.

Os opositores à admissibilidade afirmam com o Prof. Dr. Rubens Requião:

De nossa parte, estranhamos o interesse que possa ter a Fazenda Pública no requerimento de falência do devedor por tributos. Segundo o CTN os créditos fiscais não estão sujeitos ao processo concursal, e a declaração da falência não obsta o ajuizamento do executivo fiscal, hoje de processamento comum. À Fazenda Pública falece, no nosso entender, legítimo interesse econômico e moral para postular a declaração de falência de seu devedor.

A ação pretendida pela Fazenda Pública tem, isso sim, nítido sentido de coação moral, dadas as repercussões que um pedido de falência tem em relação às empresas solventes (Curso de Direito Falimentar, 1/95)9.

Enfrentando o tema, o Prof. Dr. Ricardo Negrão10 assevera que permitir ao

agente administrativo do Estado a faculdade de decidir em que casos se requererá

ou não a falência, de forma discricionária, viola o princípio da impessoalidade,

previsto no art. 37 da CF, haja vista que não há definição de critérios objetivos

fixados em lei.

Destarte, atento às razões apresentadas pelas correntes antagônicas, ao

nosso sentir, a vertente que nega a existência de legitimidade e interesse à Fazenda

Pública para o requerimento da falência do devedor cujo quantum debeatur está

inscrito como dívida ativa se mostra mais consentânea com a disciplina

9

REQUIÃO, Rubens apud BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp 164389/MG, rel. Min. Castro Filho, rel. p/ acórdão Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, Segunda Seção, j. 13.08.2003, DJ 16.08.2004 p. 130. Disponível em: <https://ww2.stj.gov.br/revistaeletronica/ita.asp?registro=199800107266&dt_publicacao=16/08/2004>. Acesso em: 14 out. 2007.

10

(21)

21

constitucional da ordem econômica e financeira e com o ordenamento jurídico

disciplinador da falência e da recuperação de empresas.

Nesse contexto, não parece adequado admitir que, dispondo de procedimento

próprio, privilegiado e vinculado, o Estado venha a postular a cobrança da dívida

pública por forma diversa da estabelecida em lei, sobretudo tratando-se de título

líquido, certo e exigível por ele mesmo elaborado, mediante o lançamento (CTN, art.

142) e a inscrição na dívida ativa (CTN, art. 201).

Com efeito, o tributo é cobrado mediante atividade administrativa plenamente

vinculada, de acordo com a definição contida no art. 3º do Código Tributário

Nacional. Portanto, quando o tributo não é pago no vencimento, a Administração não

tem alternativa senão inscrever o crédito correspondente na dívida ativa (CTN, art.

201 c/c Lei n. 6.830/80, art. 2º) e encaminhar a respectiva certidão de inscrição para

satisfação por meio de execução fiscal, porque é no juízo competente que a questão

deve ser discutida e não no juízo falimentar.

Assim também ocorre em relação aos chamados créditos parafiscais –

contribuições para o custeio da seguridade social (INSS), contribuição para Seguro

de Acidente de Trabalho (SAT), COFINS, PIS-Pasep, contribuições ao “Sistema S”11

11

(22)

22

e outros – que têm natureza tributária e, como tal, submetem-se ao mesmo regime

dispensado ao crédito tributário12.

Quanto aos créditos não-tributários13, o Poder Público pode optar por

inscrevê-los ou não na dívida ativa14, hipótese em que, estando inscritos, terão o

mesmo tratamento e classificação do crédito tributário.

Todavia, definir a melhor forma de cobrar o devedor, no caso de preferir

ajuizar a execução fiscal ou habilitar os créditos inscritos na dívida ativa, tributários

ou não, na falência já decretada15, é ato que se reveste de discricionariedade e

legitimidade.

12

Conforme dispõe o art. 39, § 2º, da Lei n. 4.320/64, a Dívida Ativa da Fazenda Pública é composta por créditos de natureza tributária e não-tributária, regularmente inscritas. Assim, constituem Dívida Ativa: 1) Tributárias, as provenientes de obrigação legal relativa a tributos e respectivos adicionais e multas como: impostos (CF, art. 145, I); taxas (CF, art. 145, II); contribuições de melhoria (CF, art. 145, III); empréstimos compulsórios (CF, art. 148) – inseridos no Capítulo I, do Título IV, sob a rubrica “Do Sistema Tributário Nacional”, foram os empréstimos compulsórios classificados como tributos pela Constituição Federal, revogando sua previsão como crédito não-tributário na Lei n. 4.320/64; contribuições especiais (CF, art. 149) e a contribuição sindical (CF, art. 8º, IV c/c CLT, arts. 578 a 610); 2) Não-tributárias, os demais créditos da Fazenda Pública como: multa de qualquer origem ou natureza, exceto as tributárias, foros, laudêmios, aluguéis ou taxas de ocupação, custas processuais, preços de serviços prestados por estabelecimentos públicos, indenizações, reposições, restituições, alcances dos responsáveis definitivamente julgados, bem assim os créditos decorrentes de obrigações em moeda estrangeira, de sub-rogação de hipoteca, fiança, aval ou outra garantia, de contratos em geral ou de outras obrigações legais. Ipsis litteris:

“Art. 39. Os créditos da Fazenda Pública, de natureza tributária ou não tributária, serão escriturados como receita do exercício em que forem arrecadados, nas respectivas rubricas orçamentárias. (Redação dada pelo Decreto Lei nº 1.735, de 20.12.1979)”

...

“§ 2º - Dívida Ativa Tributária é o crédito da Fazenda Pública dessa natureza, proveniente de obrigação legal relativa a tributos e respectivos adicionais e multas, e Dívida Ativa não Tributária são os demais créditos da Fazenda Pública, tais como os provenientes de empréstimos compulsórios, contribuições estabelecidas em lei, multa de qualquer origem ou natureza, exceto as tributárias, foros, laudêmios, alugueis ou taxas de ocupação, custas processuais, preços de serviços prestados por estabelecimentos públicos, indenizações, reposições, restituições, alcances dos responsáveis definitivamente julgados, bem assim os créditos decorrentes de obrigações em moeda estrangeira, de subrogação de hipoteca, fiança, aval ou outra garantia, de contratos em geral ou de outras obrigações legais. (Parágrafo incluído pelo Decreto Lei nº 1.735, de 20.12.1979)”. BRASIL, Lei n. 4.320, de 17 de março de 1964. Estatui Normas Gerais de Direito Financeiro para elaboração e controle dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L4320.htm.>. Acesso em 06 jun. 2008.

13

“Os exemplos mais comuns de dívidas ativas não-tributárias, no âmbito estadual, são as multas criminais, as multas por infrações ambientais (normalmente verificadas pela Cetesb ou pela Polícia Florestal), as multas decorrentes de infrações previstas no Código do Consumidor (em regra apuradas pelo Procon) e a reposição de vencimentos pagos indevidamente. Na esfera federal, as multas impostas pela Sunab, pelo Inmetro, pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), pelos Conselhos profissionais e pela fiscalização do trabalho (CLT)”. ÁLVARES, Manoel et al.Lei de execução fiscal comentada e anotada. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997, p. 40.

14 Consoante dispõe a Lei de Execução Fiscal (LEF), constitui Dívida Ativa da Fazenda Pública aquela definida

como tributária ou não tributária na Lei n. 4.320, de 17 de março de 1964 – art. 2º – abrangendo atualização monetária, juros e multa de mora e demais encargos previstos em lei ou contrato – art. 2º, § 1º – mediante a inscrição do crédito, que se constitui no ato de controle administrativo da legalidade, feita pelo órgão competente para apurar a liquidez e certeza do crédito – art. 2º, § 3º.

15

(23)

23

Nesse aspecto, é assaz relevante a reflexão do Exmo. Sr. Min. Dr. Ruy

Rosado de Aguiar, expressada logo no início de seu voto por ocasião do julgamento

do REsp n. 164.389-MG, pela 2ª Turma do E. STJ16:

[...] Se ao Estado é dado requerer falência, isso não é uma possibilidade, é um dever. Se o Estado requerer a falência de todos os seus devedores, será o caos; se tiver o direito de escolher uns devedores e não outros, será um caos pior.

A idéia de transformar a falência em uma via de saneamento do mercado não é um objetivo da Lei de Falência, mesmo porque o Estado tem outros meios para sanear o mercado. Se quiser punir o crime de falência, essa é uma conseqüência, e não um objetivo da falência. Nenhum juiz decreta a falência para punir o autor dos crimes de falência; ele a decreta para resolver o problema da quebra e para que os credores sejam pagos. Punir o crime de falência não pode ser o fator determinante desta ação estatal. O Estado, se quiser, tem a possibilidade de punir pela sonegação fiscal. E, se a Lei de Falência permite ação revocatória, essa mesma ação é concedida a todos os credores iludidos pelos seus devedores, independentemente da falência. Por fim, a desconsideração da pessoa jurídica existe tanto para esse caso como para qualquer outro.

Assim, os fundamentos que sustentam o pedido de falência, pelo Estado, não são suficientes para que se ingresse em uma via de grave dano para a atividade empresarial no País.

Com efeito, a par dos amplos privilégios concedidos à Fazenda Pública,

especialmente pelo procedimento executivo fiscal17, o ordenamento jurídico

preferem aos demais (LFRE, art. 83, III), salvo os créditos derivados da legislação do trabalho, limitados a 150 (cento e cinqüenta) salários-mínimos por credor, e os decorrentes de acidentes do trabalho (LFRE, art. 83, I), bem como os créditos com garantia real até o limite do valor do bem gravado (LFRE, art. 83, I).

16 “PROCESSO CIVIL. PEDIDO DE FALÊNCIA FORMULADO PELA FAZENDA PÚBLICA COM BASE EM

CRÉDITO FISCAL. ILEGITIMIDADE. FALTA DE INTERESSE. DOUTRINA. RECURSO DESACOLHIDO. I - Sem embargo dos respeitáveis fundamentos em sentido contrário, a Segunda Seção decidiu adotar o entendimento de que a Fazenda Pública não tem legitimidade, e nem interesse de agir, para requerer a falência do devedor fiscal. II - Na linha da legislação tributária e da doutrina especializada, a cobrança do tributo é atividade vinculada, devendo o fisco utilizar-se do instrumento afetado pela lei à satisfação do crédito tributário, a execução fiscal, que goza de especificidades e privilégios, não lhe sendo facultado pleitear a falência do devedor com base em tais créditos. (REsp 164389/MG, rel. Min. Castro Filho, rel. p/ acórdão Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, Segunda Seção, j. 13.08.2003, DJ 16.08.2004, p. 130)”. BRASIL. Superior Tribunal de Justiça.

Disponível em:

<https://ww2.stj.gov.br/revistaeletronica/ita.asp?registro=199800107266&dt_publicacao=16/08/2004>. Acesso em: 14 out. 2007.

17

(24)

24

contempla medidas outras que podem ser-lhes acrescidas como, v.g., a averbação

premonitória18 e a medida cautelar fiscal19.

Bem por isso, tanto a revogada Lei de Falências e Concordatas (Decreto-lei n.

7.661/45, art. 9º) quanto a atual Lei de Falências e de Recuperação de Empresas

(Lei n. 11.101/05, art. 97) não incluem a Fazenda Pública entre os legitimados ativos

ao requerimento da quebra do devedor.

Nem se diga que a Fazenda Pública está abrangida pela hipótese do art. 97,

IV da nova lei, que utiliza a expressão “qualquer credor”, porquanto os princípios que

norteiam o direito privado destoam em muito dos que norteiam o direito público,

especialmente no que diz respeito ao princípio da legalidade.

Para o Prof. Dr. Celso Antônio Bandeira de Mello o princípio da legalidade é

capital para a configuração do regime jurídico-administrativo, vindo a propósito as

forma que é lícito promover a execução fiscal depois da decretação da quebra e, se ajuizada antes, o curso da execução não se suspende. A Fazenda Pública não está sujeita ao pagamento de custas e emolumentos e a prática de atos judiciais de seu interesse independe de preparo ou prévio depósito (art. 39). Em seu artigo 8º, autoriza a citação pelo correio, com aviso de recepção, mesmo se tratando de processo de execução, se a Fazenda Pública não a requerer por outra forma. Ainda, a citação pelo correio considera-se feita na data da entrega da carta no endereço do executado, ou, se a data for omitida no aviso de recepção, 10 (dez) dias após a entrega da carta à agência postal. O prazo para oferecimento de embargos (30 dias) conta-se da data da intimação e não da juntada do aviso de recepção, do mandado ou da carta precatória aos autos (art. 16), quando a intimação da penhora não ocorrer por publicação no órgão oficial (art. 12). E em seu art. 38, a Lei de Execução Fiscal determina que a discussão judicial da dívida ativa só é admissível em execução, na forma por ela regulada, salvo as hipóteses de mandado de segurança, ação de repetição de indébito ou ação anulatória do ato declarativo da dívida.

18 A chamada averbação premonitória vem disciplinada no art. 615-A, do Código de Processo Civil (CPC),

acrescentado pela Lei n. 11.382/06, e visa obstar a prática de atos em consilium fraudis, tornando pública a existência da execução e de que o patrimônio do devedor está afeto a responder para o cumprimento de suas obrigações, mesmo antes de haver arresto, citação ou penhora, presumindo-se fraudulenta a alienação ou o gravame de bens, inclusive em relação a terceiros, após a averbação do ajuizamento da execução nos registros de imóveis, veículos e bens sujeitos à penhora ou arresto. O dispositivo pode ser aplicado com fundamento no art. 1º da Lei n. 6.830/80, que determina a aplicação subsidiária das normas do CPC à execução fiscal.

Assim, dispõe o mencionado estatuto de rito:

“Art. 615-A. O exeqüente poderá, no ato da distribuição, obter certidão comprobatória do ajuizamento da execução, com identificação das partes e valor da causa, para fins de averbação no registro de imóveis, registro de veículos ou registro de outros bens sujeitos à penhora ou arresto.

§ 1.º O exeqüente deverá comunicar ao juízo as averbações efetivadas, no prazo de 10 (dez) dias de sua concretização.

§ 2.º Formalizada penhora sobre bens suficientes para cobrir o valor da dívida, será determinado o cancelamento das averbações de que trata este artigo relativas àqueles que não tenham sido penhorados.

§ 3.º Presume-se em fraude à execução a alienação ou oneração de bens efetuada após a averbação (art. 593). § 4.º O exeqüente que promover averbação manifestamente indevida indenizará a parte contrária, nos termos do § 2º do art. 18 desta Lei, processando-se o incidente em autos apartados.

§ 5.º Os tribunais poderão expedir instruções sobre o cumprimento deste artigo”. BRASIL. Código de processo civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L5869.htm>. Acesso em: 27 maio 2008.

19

(25)

25

lições do grande mestre:

Para avaliar corretamente o princípio da legalidade e captar-lhe o sentido profundo cumpre atentar para o fato de que ele é a

tradução jurídica de um propósito jurídico: o de submeter os

exercentes do poder em concreto – o administrativo – a um quadro normativo que embargue favoritismos, perseguições ou desmandos. Pretende-se através da norma geral, abstrata e por isso mesmo impessoal, a lei, editada pois pelo Poder Legislativo – que é o colégio representativo de todas as tendências (inclusive minoritárias) do corpo social – garantir que a atuação do Executivo nada mais seja senão a concretização dessa vontade geral20.

...

O princípio da legalidade, no Brasil, significa que a Administração nada pode fazer senão o que a lei determina.

Ao contrário dos particulares, os quais podem fazer tudo o que a lei não proíbe, a Administração só pode fazer o que a lei antecipadamente autorize. Donde, administrar é prover aos interesses públicos, assim caracterizados em lei, fazendo-o na conformidade dos meios e formas nela estabelecidos ou

particularizados segundo suas disposições. Segue-se que a atividade administrativa consiste na produção de decisões e comportamentos que, na formação escalonada do direito, agregam níveis maiores de concreção ao que já se contém abstratamente nas leis21.

Nessa perspectiva é que se deve compreender a interpretação constitucional

do direito falimentar e os modos de atuação do Estado na economia, a fim de que o

ordenamento jurídico possa oferecer proteção adequada aos jurisdicionados,

especialmente no âmbito do processo, de modo a propiciar não apenas o acesso à

jurisdição, mas a uma ordem justa a serviço do direito material, como instrumento

eficaz de tutela.

Trata-se do chamado “instrumentalismo processual substancial” – da

aderência do processo à realidade sócio-jurídica com vistas a cumprir efetivamente

sua finalidade – em contraposição ao instrumentalismo meramente nominal ou

20

BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 7. ed. São Paulo: Malheiros, 1995, p. 57.

(26)

26

formal22.

Destarte, as noções até aqui expostas jazem subjacentes ao cerne da questão

sob exame, consistindo em pressuposto para a superação do campo das afirmações

gerais e, como tal, foram consideradas como pano de fundo quando de seu

detalhamento nos tópicos que se seguem.

22

(27)

27

2 PRINCÍPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL – DUE PROCESS OF LAW

Mais do que mera racionalização ou singelo juízo de equidade, o ensaio se

propõe a apresentar meios de intervenção do Poder Judiciário visando fomentar a

segurança jurídica, a proteção da atividade econômica e a sobrevivência do instituto

do crédito, o que não se mostra possível sem a observância das garantias

constitucionais processuais, especialmente o princípio do devido processo legal,

pedra fundamental do sistema jurídico e requisito imprescindível para conferir

sustentabilidade e imprimir a necessária eficácia a qualquer proposição.

Fixada essa premissa, é significativo entender em que consiste o devido

processo legal e seu alcance, máxime se considerarmos que o meio,

necessariamente, deve ser idôneo para a consecução do fim.

O princípio do due process of law remonta, historicamente, aos antecedentes

das declarações de direitos da Idade Média, tendo na Magna Carta inglesa

(1215/1297) — Magna Carta Libertatum seu Concordiam inter regem Johannen at

Barones pro concessione libertatum Ecclesiae et regni angliae23 — o mais famoso

desses documentos, cuja finalidade era limitar o poder do rei, de tal maneira que

nenhum de seus súditos teria seus direitos e liberdades alcançados24, senão per

23 Grande Carta das Liberdades ou Concórdia entre o Rei João e os Barões para a outorga das liberdades da

Igreja e do reino inglês. 24 SILVA, José Afonso.

(28)

28

legale iudicium parium suorum, vel per legem terrae, ou seja, senão pelo julgamento

legal de seus pares, e pela lei da terra25.

Cuida-se de mecanismo cuja primeira função é condicionar a privação de

direitos à observância das regras e formas preestabelecidas — aplicação de regras

procedimentais prévias, segundo a lei vigente — com vistas a impedir ações

arbitrárias do rei. Significa que o rei deve julgar os homens livres conforme a lei, em

conformidade com o devido processo legal, e não segundo a sua vontade, até então

absoluta.

Modernamente, o due process of law, concomitantemente com uma série de

outros princípios formadores da base do que se possa reconhecer como “dignidade

da pessoa humana”, integra as declarações de direitos fundamentais

contemporâneas, cujo conteúdo essencial passou a ser objeto de reconhecimento

supra-estatal em documentos de feição universal26.

Historicamente, para que se agregassem às declarações de direitos a força e

os mecanismos jurídicos capazes de lhes imprimir eficácia, houve a necessidade de

que os direitos nelas reconhecidos passassem a constar dos textos constitucionais,

o que lhes conferia o caráter de normas jurídicas positivas válidas aos indivíduos

25

Magna Carta Libertatum – (Cláusula 39) Nenhum homem livre será detido nem preso, nem despojado de seus direitos nem de seus bens, nem declarado fora da lei, nem exilado, nem prejudicada a sua posição de qualquer outra forma; tampouco procederemos com força contra ele, nem mandaremos que outrem o faça, a não ser por um julgamento legal de seus pares e pela lei do país. (Cláusula 40) A ninguém venderemos, a ninguém recusaremos ou atrasaremos direito ou justiça (tradução aproximada do inglês) – Disponível em: <http://www.bl.uk/treasures/magnacarta/translation/mc_trans.html> Acesso em: 14 jan. 2008.

A Magna Carta foi repristinada, pela regência, em nome do filho e sucessor do Rei John Lackland, Henrique III, em novembro de 1216, suprimindo-se algumas cláusulas, inclusive a 61ª, conhecida como “cláusula de segurança”, a mais extensa do documento e que estabelecia um comitê de 25 barões com poderes para reformar qualquer decisão real, até mesmo pela força se necessário. Em 1225, ao completar a maioridade, o Rei Henrique III republicou o documento em uma versão ainda mais curta, com apenas 37 cláusulas. O Parlamento de Eduardo I, filho e sucessor de Henrique III, republicou o documento uma última vez, em 12.10.1297, como parte de um estatuto conhecido como Confirmatio Cartarum e que confirmava a versão reduzida da Magna Carta de 1225. A Magna Carta de 1297 foi revisada diversas vezes e ainda integra o direito inglês, embora apenas algumas de suas cláusulas estejam em vigor. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Magna_Carta>. Acesso em: 14 jan. 2008.

26

(29)

29

vinculados ao respectivo Estado27.

A Constituição Política do Império do Brasil, de 25.03.1824, foi pioneira na

subjetivação e positivação dos direitos e garantias individuais do homem, que os

enuncia em seu art. 179, caput e incisos I a XXXV, sob a rubrica “Das Disposições

Geraes, e Garantias dos Direitos Civis, e Políticos dos Cidadãos Brasileiros”28.

Nela vislumbramos, salvo melhor entendimento, alocado na parte final do

inciso XI, do art. 179, dentre os princípios da legalidade, da igualdade e do juiz

natural, o influxo do princípio do devido processo legal. Embora não se referisse

expressamente a ele, o texto constitucional prescrevia que “ninguém será

sentenciado, senão pela autoridade competente, por virtude de lei anterior, e na

forma por ela prescrita”29.

Diante desse quadro, e considerando que a Constituição brasileira de 1988

fez uso da expressão “devido processo legal” — tomada de empréstimo do direito

anglo-americano —, ao se reportar à garantia da liberdade e da propriedade,

particular interesse surge em voltar os olhos por um instante à Constituição

norte-americana, especialmente à sua declaração de direitos.

De fato, o due process of law integra a declaração de direitos fundamentais da

Constituição dos EUA30, inserida posteriormente na forma de enunciados elaborados

27

SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo. 10. ed. São Paulo: Malheiros, 1995, p. 165-167. 28 Ibidem, p. 168-169.

29

“Das Disposições Geraes, e Garantias dos Direitos Civis, e Políticos dos Cidadãos Brazileiros. ...

Art. 179. A inviolabilidade dos Direitos Civis, e Politicos dos Cidadãos Brazileiros, que tem por base a liberdade, a segurança individual, e a propriedade, é garantida pela Constituição do Imperio, pela maneira seguinte. I. Nenhum Cidadão póde ser obrigado a fazer, ou deixar de fazer alguma cousa, senão em virtude da Lei. ...

XI. Ninguem será sentenciado, senão pela Autoridade competente, por virtude de Lei anterior, e na fórma por ella prescripta.

...

XIII. A Lei será igual para todos, quer proteja, quer castigue, o recompensará em proporção dos merecimentos de cada um”. (sic) BRASIL. Constituição do Império (1824). Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituiçao24.htm>. Acesso em: 17 jan. 2008.

30

Convenção de Filadélfia, aprovada em 17/09/1787 - (Bill of Rights – 5ª e 14ª Emendas), sem destaque no original:

(30)

30

por Thomas Jefferson e James Madison para garantia dos direitos fundamentais do

homem, como conditio sine qua non para a ratificação do pacto federativo, dando

origem às dez primeiras Emendas à Constituição de Filadélfia, aprovadas em

179131, às quais se acrescentaram outras, totalizando, atualmente, vinte e sete

emendas.

Atendo-se à matéria desse tópico, a declaração de direitos fundamentais da

Constituição dos EUA (Bill of Rights), dispõe que nenhuma pessoa será [...] privada

da vida, liberdade, ou propriedade, sem due process of law –– 5ª Emenda — [...]

nem irá qualquer Estado privar qualquer pessoa da vida, liberdade, ou propriedade,

sem due process of law; nem negar a qualquer pessoa na sua jurisdição a igual

proteção das leis –– 14ª Emenda, 1ª Seção.

A Constituição da República Federativa do Brasil, por sua vez, quando adotou

Congress of the United States begun and held at the City of New-York, on Wednesday the fourth of March, one thousand seven hundred and eighty nine.

THE Conventions of a number of the States, having at the time of their adopting the Constitution, expressed a desire, in order to prevent misconstruction or abuse of its powers, that further declaratory and restrictive clauses should be added: And as extending the ground of public confidence in the Government, will best ensure the beneficent ends of its institution.

RESOLVED by the Senate and House of Representatives of the United States of America, in Congress assembled, two thirds of both Houses concurring, that the following Articles be proposed to the Legislatures of the several States, as amendments to the Constitution of the United States, all, or any of which Articles, when ratified by three fourths of the said Legislatures, to be valid to all intents and purposes, as part of the said Constitution; viz.

ARTICLES in addition to, and Amendment of the Constitution of the United States of America, proposed by Congress, and ratified by the Legislatures of the several States, pursuant to the fifth Article of the original Constitution.

... AMENDMENT V

No person shall be held to answer for a capital, or otherwise infamous crime, unless on a presentment or indictment of a Grand Jury, except in cases arising in the land or naval forces, or in the Militia, when in actual service in time of War or public danger; nor shall any person be subject for the same offence to be twice put in jeopardy of life or limb; nor shall be compelled in any criminal case to be a witness against himself, nor be deprived of life, liberty, or property, without due process of law; nor shall private property be taken for public use, without just compensation.

... AMENDMENT XIV

Passed by Congress June 13, 1866. Ratified July 9, 1868.

Note: Article I, section 2, of the Constitution was modified by section 2 of the 14th amendment. Section 1.

All persons born or naturalized in the United States, and subject to the jurisdiction thereof, are citizens of the United States and of the State wherein they reside. No State shall make or enforce any law which shall abridge the privileges or immunities of citizens of the United States; nor shall any State deprive any person of life, liberty, or property, without due process of law; nor deny to any person within its jurisdiction the equal protection of the laws”. EUA. Convenção de Filadélfia (1787). Disponível em: <http://www.archives.gov/national-archives-experience/charters/bill_of_rights_transcript.html> Acesso em: 14 jan. 2007.

31 SILVA, José Afonso.

(31)

31

o princípio do devido processo legal (art. 5º, LIV), o fez com referência à cláusula do

due process of law, originada do direito anglo-americano32, a qual carreou consigo

todo um conceito secular pré-existente, cujo conteúdo essencial do princípio

abrange a igualdade das partes, a legalidade, o direito de ação, o contraditório, a

ampla defesa e a razoável duração do processo, imanentes ao procedural due

process of law, ou seja, ao devido processo legal procedimental.

De fato, prescreve a Constituição Federal brasileira, de 05.10.1988, sem

destaques no original:

Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes

no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

...

II – ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;

...

XXXV – a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito;

...

LIV – ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;

LV – aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados ocontraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;

...

LXXVIII – a todos, no âmbito judicial e administrativo, são

assegurados a razoável duração do processo e os meios que

garantam a celeridade de sua tramitação.33

Com efeito, nossa Carta Política, em mais de uma oportunidade, reafirma

expressamente o ideal de observância da forma regular de procedimento para

aplicação do direito, que é uma das idéias centrais do due process of law, e o faz,

v.g., quando adota os princípios do Estado de Direito (art. 1.º) e da legalidade (arts.

5.º, II e 37).

32

KEMMERICH, Clóvis Juarez. Estudos de direito processual. Porto Alegre: Edição do Autor, 2007. Disponível em: <http://www.tex.pro.br/wwwroot/smart_file_download.php?f=livro_kemmerich.pdf> Acesso em: 05 dez. 2007. 33

(32)

32

Assim, para que um procedimento seja due process of law, ou procedural due

process of law, ele deve:

1º) corresponder às regras previstas para o caso;

2º) consistir em um procedimento justo, enquanto capaz de proteger o

jurisdicionado do arbítrio do julgador e de qualquer meio processual que o facilite.

Os critérios acima apontados, em verdade, têm incidência ainda na

reconstituição das versões dos fatos alegados pelas partes, mediante a correta

avaliação das provas e dos elementos de convicção, como antecedente lógico para

o adequado enquadramento dos fatos à norma a fim de possibilitar a formulação da

regra concreta para o caso sob apreciação judicial.

Kazuo Watanabe alude à “cognição adequada” como pressuposto de um

julgamento justo.

Não seria, certamente, um exagero afirmar-se que o direito à

cognição adequada faz mesmo parte do conceito menos abstrato do

princípio do juiz natural. Quando no sistema anglo-saxão, nos

primórdios do constitucionalismo, se insistiu no direito ao julgamento “pelos seus pares”, pelos “homens honestos da vizinhança”, já se intuía o direito à cognição e julgamento pelos juízes que, inseridos na mesma realidade social, tivessem a sensibilidade necessária para avaliar em toda a dimensão a conduta do acusado34.

Tem-se, como resultado, que o princípio, em seu aspecto procedimental, deve

ser capaz de exercer função integrativa no caso de o ordenamento jurídico não

atender aos seus requisitos e, em seu aspecto substancial, exercer função

bloqueadora, através do controle de constitucionalidade, no caso de serem

contrariados35.

34

WATANABE, Kazuo. Da cognição no processo civil. 2. ed. Campinas: Bookseller, 2000, p. 64-65. 35

Destarte, não tem sido outro o entendimento esposado pelo E. STF acerca do tema, como se vê dos v. arestos que seguem colacionados, todos sem destaque no original:

(33)

33

Destarte, sob o viés constitucional, o devido processo legal consiste em limite

à intervenção estatal e fator que legitima o exercício da jurisdição para proporcionar

o acesso e preservar os direitos fundamentais à vida, à liberdade, à igualdade, à

segurança e à propriedade, elementos indefectíveis do conceito de “dignidade da

pessoa humana”36.

procedimentos, mas sim que o procedimento incidente, segundo as regras processuais, atenda às referidas garantias constitucionais. 2. Além de manifesta a maior gravidade dos delitos previstos na Lei de Tóxicos pelos quais condenado o paciente (arts. 12, 13 e 14), que cominam penas de reclusão bem superiores às do art. 10, caput e § 2º, da L. 9.437/97, L. 8.072/90 acentuou o rigor ao delito de tráfico que - por determinação constitucional (CF/88, art. 5º, XLIII) -, é inafiançável e insuscetível de graça e anistia. 4. Não se questiona, no caso, a aplicação da L. 10.409/02, em vigor quando do oferecimento da denúncia. 5. De qualquer sorte, a adoção do procedimento antigo (L. 6.368/76) convertido em ordinário depois de inquiridas as testemunhas, dado que mais amplo, não causou ao paciente nenhum prejuízo, cuja demonstração, sempre que possível, é indispensável: precedentes. (HC 86022-SP, rel. Min. Sepúlveda Pertence, Primeira Turma, j. 23.08.2005, DJ 28.10.2005, p. 50)”. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Disponível em: <http://www.stf.gov.br/portal/jurisprudencia/visualizarEmenta.asp?s1=000318544&base=baseAcordaos>. Acesso em: 23 jan. 2008.

“Despacho: 1. Trata-se de recurso extraordinário interposto contra acórdão do Primeiro Juizado Especial Cível de Porto Velho - RO. Sustentam os recorrentes, em síntese, que não foram intimados para a audiência de instrução e julgamento, o que lhes restringiu a oportunidade de produzir provas e causou-lhes irreparável prejuízo, manifestado pela sua sucumbência no presente feito. 2. Entendeu a instância de origem que não ficou demonstrado o prejuízo decorrente da inexistência de intimação dos recorrentes para a audiência em questão. 3. O recurso merece provimento. Conforme decidido pela Segunda Turma desta Corte, no julgamento do AI 335.076-AgR, rel. Min. Gilmar Mendes, unânime, DJ de 07.02.2003, o fato de os juizados especiais cíveis e criminais atenderem aos princípios da celeridade e da economia processual não pode provocar o desrespeito aos postulados da ampla defesa e do devido processo legal. No presente processo, os recorrentes ficaram impedidos de produzir prova em audiência e de inquirir a testemunha arrolada, porque não foram intimados para esse ato processual de essencial para a apuração da verdade. O dano sofrido é inquestionável, pois o pedido deduzido pela recorrida foi julgado procedente. 4. Diante do exposto e com base no parecer do Ministério Público Federal, dou provimento ao recurso extraordinário, para anular o processo desde a audiência de instrução e julgamento, nos termos do art. 557, § 1º-A, do CPC. Publique-se. Brasília, 29 de agosto de 2005. Ministra Ellen Gracie Relatora. (RE 260776-RO, rel. Min. Ellen Gracie, j. 29.08.2005, DJ 16.09.2005, p. 120)”. BRASIL.

Supremo Tribunal Federal. Disponível em:

<http://www.stf.gov.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=(260776.NUME.%20OU%20260776.DM S.)%20NAO%20S.PRES.&base=baseMonocraticas>.Acesso em: 23 jan. 2008.

“Ementa: DIREITO INSTRUMENTAL - ORGANICIDADE. As balizas normativas instrumentais implicam segurança jurídica, liberdade em sentido maior. Previstas em textos imperativos, hão de ser respeitadas pelas partes, escapando ao critério da disposição. INTIMAÇÃO PESSOAL - CONFIGURAÇÃO. Contrapõe-se à intimação pessoal a intimação ficta, via publicação do ato no jornal oficial, não sendo o mandado judicial a única forma de implementá-la. PROCESSO - TRATAMENTO IGUALITÁRIO DAS PARTES. O tratamento igualitário das partes é a medula do devido processo legal, descabendo, na via interpretativa, afastá-lo, elastecendo prerrogativa constitucionalmente aceitável. RECURSO - PRAZO - NATUREZA. Os prazos recursais são peremptórios. RECURSO - PRAZO - TERMO INICIAL - MINISTÉRIO PÚBLICO. A entrega de processo em setor administrativo do Ministério Público, formalizada a carga pelo servidor, configura intimação direta, pessoal, cabendo tomar a data em que ocorrida como a da ciência da decisão judicial. Imprópria é a prática da colocação do processo em prateleira e a retirada à livre discrição do membro do Ministério Público, oportunidade na qual, de forma juridicamente irrelevante, apõe o "ciente", com a finalidade de, somente então, considerar-se intimado e em curso o prazo recursal. Nova leitura do arcabouço normativo, revisando-se a jurisprudência predominante e observando-se princípios consagradores da paridade de armas. (HC 83255-SP, rel. Min. Marco Aurélio, j. 05.11.2003, Tribunal Pleno, DJ 12.03.2004, p. 38)”. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Disponível em: <http://www.stf.gov.br/portal/jurisprudencia/visualizarEmenta.asp?s1=000296679&base=baseAcordaos>. Acesso em: 23 jan. 2008.

36 “A garantia de que ninguém será privado da vida sem o devido processo legal, que consta da Constituição

(34)

34

Por essa razão, o devido processo legal tem função autônoma em relação às

normas de direito material e processual, de tal forma que sua observância pode ser

exigida mesmo sem a ocorrência da violação de qualquer delas.

Por conseguinte, é possível a interposição de recurso extraordinário com

fundamento na violação ao devido processo legal, sem que a ofensa à Constituição

Federal seja considerada reflexa.

(35)

35

3 ASPECTOS GERAIS DA LEI DE FALÊNCIAS E DE RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS

Essencialmente podemos destacar que a Lei n. 11.101, de 09.2.2005 tem por

objetivo central propiciar a continuidade dos negócios da empresa em dificuldades

financeiras e com viabilidade econômica, enquanto unidade produtiva, com vistas a

manter sua capacidade de produção e de geração de empregos mediante o

oferecimento de condições para que encontre os meios necessários para a sua

recuperação, a partir de negociações com seus credores, quando não houver

solução de mercado.

Seguindo essa orientação a nova lei se afastou da tendência fortemente

patrimonialista que norteava o Decreto-lei n. 7.661/45, já incompatível com a

dinâmica da economia atual.

Até então, não eram contemplados importantes ativos, especialmente os

intangíveis, que hodiernamente podem alcançar valores superiores aos fixos – ativos

exclusivamente patrimoniais –, assim também como eram ignorados conceitos agora

fundamentais na avaliação da solvência de empresas e negócios, como a

perspectiva de geração de fluxo de caixa futuro37.

37

LISBOA, Marcos de Barros et al. A racionalidade econômica da nova lei de falências e de recuperação de

empresas. 2005. Disponível em:

(36)

36

Com efeito, à época inexistiam empresas como as que desenvolvem software

ou prestam serviços na rede mundial de computadores, por vezes desprovidas de

ativo patrimonial, cujo valor no mercado de ações, não raro, é aferido com

supedâneo em elementos como a marca, o modo de gestão ou a perspectiva de

geração de fluxo de caixa futuro. Esses fatores, incomuns à época da legislação de

1945, quando presentes, possuíam baixa representatividade nas análises

econômico-financeiras de outrora, acarretando a perda de importantes ativos38.

Ainda, com o intuito de viabilizar mecanismos mais eficazes de reorganização

às empresas em crise, o instituto da concordata foi substituído pelo regime da

recuperação, decomposto nas modalidades judicial, que contempla um plano

ordinário e um especial para as microempresas e empresas de pequeno porte, e

extrajudicial.

A recuperação extrajudicial permite a solução de mercado para as empresas

em estado crítico, com o crivo do Poder Judiciário mediante a homologação do

acordo, o que não era possível na vigência do Decreto-lei n. 7.661/45, que

sancionava como ato de falência qualquer iniciativa do devedor de reunir-se com um

grupo de credores para renegociação das dívidas, conduta suficiente para ter sua

quebra requerida e decretada.

O que consistia num direito acessível a toda empresa/sociedade empresária

que atendesse aos requisitos da lei, sem que se cogitasse de sua capacidade de

recuperação, passou a ser um direito condicionado ao atendimento concomitante

dos requisitos legais e da demonstração de viabilidade econômica, averiguada em

função do seu tempo de funcionamento, importância social, mão-de-obra e

38

LISBOA, Marcos de Barros et al. A racionalidade econômica da nova lei de Falências e de recuperação de

empresas. 2005. Disponível em:

Referências

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