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Caracterização Sinóptica dos Gradientes nos Canais da Ria de Aveiro. Parte II: Oxigénio, Clorofila e Zonação Ecológica

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Actas das Jornadas da Ria de Aveiro 2011 151 Universidade de Aveiro 2011

Caracterização Sinóptica dos Gradientes nos Canais da Ria de Aveiro.

Parte II: Oxigénio, Clorofila e Zonação Ecológica

M. Rodrigues

a

, J.M. Dias

b

, S. Leandro

c

, F. Morgado

d

, A. Cunha

d

, A. Almeida

d

, A.

Oliveira

e

e H. Queiroga

d

a Núcleo de Estuários e Zonas Costeiras

Laboratório Nacional de Engenharia Civil, Lisboa 1700-066, Portugal

mfrodrigues@lnec.pt

b CESAM & Departamento de Física

Universidade de Aveiro, Aveiro 3810-193, Portugal

joao.dias@ua.pt

c Escola Superior de Turismo e Tecnologia do Mar, Grupo de Investigação em Recursos Marinhos

Instituto Politécnico de Leiria, Peniche 2520–641, Portugal

sleandro@ipleiria.pt

d CESAM & Departamento de Biologia

Universidade de Aveiro, Aveiro 3810-193, Portugal

{henrique.queiroga,fmorgado,aalmeida,acunha}@ua.pt

e Núcleo de Tecnologias da Informação

Laboratório Nacional de Engenharia Civil, Lisboa 1700-066, Portugal

aoliveira@lnec.pt

SUMÁRIO

Os gradientes ecológicos nos estuários estão associados a gradientes de salinidade, temperatura e outras variáveis abióticas, apresentando, por isso, uma variabilidade espacial e temporal importante. Neste estudo de caracterização sinóptica da Ria de Aveiro pretendeu-se caracterizar a variabilidade espacial e sazonal dos gradientes físicos (salinidade e temperatura, Parte I) e dos gradientes ecológicos (Parte II) com base em dados medidos quasi-sinopticamente nos canais principais da Ria, durante quatro campanhas. A caracterização dos gradientes ecológicos é realizada em duas fases. Inicialmente, a partir da interpolação dos valores amostrados, estabeleceram-se mapas horizontais de oxigénio dissolvido, amónia, nitritos, fosfatos, silicatos e clorofila a em todo o domínio da Ria de Aveiro, para cada estação do ano. Com excepção do oxigénio dissolvido, os resultados evidenciam a sazonalidade dos parâmetros biológicos e químicos. As concentrações de oxigénio dissolvido são globalmente inferiores a 10 mg/L e não apresentam variabilidades sazonais e longitudinais relevantes. Para a clorofila a as concentrações mais elevadas são observadas na Primavera e no Verão, estando associadas à maior biomassa fitoplanctónica. Este padrão é inverso ao observado nos nutrientes, em particular, na amónia, fosfatos e silicatos, para os quais as concentrações mais elevadas ocorrem no Outono. Estes parâmetros apresentam gradientes longitudinais, com concentrações mais elevadas a montante dos canais. A influência da salinidade na distribuição do zooplâncton e da macrofauna bentónica poderá traduzir-se numa variabilidade sazonal e longitudinal destas grandezas, com maior extensão para jusante das áreas ocupadas por populações de afinidade estuarina em períodos chuvosos, e maior extensão para montante das áreas ocupadas por populações de afinidade marinha em períodos secos.

PALAVRAS CHAVE: Sazonalidade, Clorofila a, Nutrientes, Oxigénio Dissolvido, Zonação Longitudinal

INTRODUÇÃO

Os estuários, devido à sua natureza de ambientes de transição entre a terra e o mar, suportam inúmeros biota de características únicas. A dinâmica das comunidades destes biota é afectada por diversos factores ambientais e pelas interacções entre os processos hidrodinâmicos, químicos e bióticos. Da interacção entre a maré e os caudais fluviais, em particular, resultam gradientes espaciais de salinidade, que afectam a distribuição das diferentes comunidades biológicas. A intervenção antrópica nos sistemas estuarinos (e.g. construção de barragens) constitui também um factor de alteração dos regimes hidrológicos e, consequentemente, da dinâmica do ecossistema.

A alteração desta dinâmica pode ter consequências gravosas, quer em termos de qualidade da água, quer em termos de perda de abundância e riqueza das espécies. A ocorrência de fenómenos de eutrofização, devidos ao aumento das cargas de nutrientes (e.g. CUGIER et al., 2005), ou as dragagens necessárias para

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Actas das Jornadas da Ria de Aveiro 2011 152 Rodrigues et al.

De modo a garantir a sustentabilidade destes ecossistemas a longo prazo e o seu bom estado ecológico (preconizado no âmbito da Directiva Quadro da Água) é importante perceber a sua variabilidade natural e a resposta à variação dos parâmetros hidrológicos.

A zonação e a classificação ecológica de estuários têm sido objecto de vários estudos. Em particular, a correlação entre a distribuição biótica em sistemas estuarinos e a variação dos parâmetros físicos, nomeadamente, da salinidade, foi abordada por vários autores (e.g. MCLUSKY e ELLIOT, 2004; PAAVOLA et al., 2005; WOLF et al., 2009). A zonação dos sistemas estuarinos com

base na salinidade é geralmente estabelecida com base no sistema de Veneza de 1958, o qual foi expandido por CARRIKER (1967):

zonas limnética, oligohalina, mesohalina, polihalina e euhalina (Tabela 1). Vários autores propõem também uma classificação biótica dos organismos estuarinos com base na sua tolerância à salinidade (Tabela 2). Nesta tabela, de forma global, é possível identificar três grupos principais de espécies: espécies límnicas (origem fluvial), espécies estuarinas e espécies marinhas. ATTRILL

e RUNDLE (2003) propõem, no entanto, um novo modelo de

estuário. Segundo estes autores, os estuários enquadram-se num modelo de dupla ecoclina: uma ecoclina da zona marinha até ao estuário médio que se sobrepõe a uma segunda ecoclina desde o estuário médio até à zona dulçaquícola. Estes autores propõem assim que na zona média do estuário não existem espécies estuarinas endémicas, mas sim espécies marinhas derivadas e espécies límnicas derivadas. A zonação biótica de estuários trata-se, assim, de uma matéria complexa e controversa que depende da interacção de vários factores.

A variação sazonal e espacial das condições ambientais é também um factor a ter em consideração, dado que irá afectar a dinâmica das comunidades dos ecossistemas estuarinos. Desta forma poderão ocorrer deslocações longitudinais dos grupos de organismos, associadas às variações das condições sazonais (ATTRILL e RUNDLE,2003).

A Ria de Aveiro é um ecossistema estuarino localizado na costa NW de Portugal, caracterizado pela sua diversidade faunística e florística. Ao longo dos anos, vários estudos têm sido realizados visando a caracterização das comunidades bióticas e das características biológicas e químicas deste ecossistema (e.g. MORGADO et al., 2003; LEANDRO et al., 2007; LOPES et al., 2007;

NUNES et al., 2008). A influência dos gradientes longitudinais na

distribuição dos organismos na Ria de Aveiro é também abordada. MOREIRA et al. (1993) analisaram a distribuição da macrofauna

bentónica e LEANDRO (2008) a distribuição do zooplâncton, ao

longo de um gradiente salino (canal de Mira). Estes estudos são, no entanto, de abrangência espacial e/ou temporal limitada (e.g. medições num único canal da Ria).

No presente estudo pretendeu-se adquirir um conjunto de dados de parâmetros físicos (salinidade e temperatura) e biológicos e químicos em toda a extensão da Ria de Aveiro, os quais permitem caracterizar sazonalmente os gradientes físicos e ecológicos. O presente artigo constitui a Parte II deste estudo, onde são analisadas a variação sazonal e longitudinal dos gradientes ecológicos. Adicionalmente é ainda discutida uma zonação longitudinal ecológica da Ria baseada nos gradientes salinos medidos e na caracterização do zooplâncton de LEANDRO (2008) e

da macrofauna bentónica de MOREIRA et al. (1993).

MATERIAL E MÉTODOS

A zona de estudo, Ria de Aveiro, é descrita detalhadamente na Parte I. As campanhas de campo para a caracterização biológica e química da Ria de Aveiro decorreram em simultâneo com as campanhas de caracterização física, as quais são também descritas detalhadamente na Parte I. A estratégia básica de amostragem consistiu na realização de campanhas sazonais para obtenção de perfis longitudinais e transversais das propriedades hidrológicas dos quatro canais principais da Ria de Aveiro (Canal de Mira, Canal de Ílhavo, Canal de Ovar e Rio Vouga), em condições Tabela 1: Sistema de Veneza (expandido por CARRIKER,1967).

Zona Valor

Limnética: rio <0.5

Oligohalina: topo do estuário 0.5-5 Mesohalina: secção superior do

estuário 5-18

Polihalina: abrangendo as secções média e inferior do

estuário

Secção média: 18-25 Secção inferior: 25-30

Euhalina: barra 30-35

Tabela 2: Classificações bióticas baseadas em tolerâncias à salinidade (baseado em WOLF et al., 2009; salinidade entre parênteses).

Salinidade REMANES , 1969; REMANE e

CHLIEPER, 1971

GIERE e PFANNKUCHE,

1982 MCLUSKY e ELLIOT, 2004 WOLF et al., 2009 Estenohalinos limnobiônticos

(0-≤0.5) Límnicos (0-≈5) Migrantes Límnicos (0)

Organismos oligohalinos

(0-≤5) Límnicos, toleram sal (0-≤0.5) Eurihalinos limnobiônticos

(0-≤8)

Espécies eurihalinas

límnicas (0-≤18) Eurihalinos límnicos (0-≤10)

Espécies endémicas de águas

salobras (0.5-≤35; 3-≤18) oportunistas (≈3-≤21) Espécies eurihalinas Organismos estuarinos endémicos (5-18) Espécies endémicas de

águas salobras (≈3-≈21) Espécies de águas salobras 0.5-≤30) Espécies marinhas eurihalinas

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Actas das Jornadas da Ria de Aveiro 2011 153 Rodrigues et al.

aproximadamente de meia-enchente em cada ponto de amostragem, durante marés de amplitude média. As campanhas decorreram nos seguintes períodos: Outono (Outubro/2000), Inverno (Novembro e Dezembro/2000), Primavera (Março e Abril/2001) e Verão (Junho/20001). A amostragem foi executada de jusante para montante, nas estações indicadas na Figura 1.

No que se refere à caracterização dos gradientes ecológicos foram realizadas medições in situ de oxigénio dissolvido (sondas WTW calibradas antes do início de cada dia de amostragem), material em suspensão (D&A OBS3) e intensidade luminosa (quantómetro Licor LI-189) ao longo da coluna de água, a intervalos de 1 m de profundidade. Foram ainda colhidas amostras de água a meio da coluna de água para medições de nutrientes inorgânicos, carbono orgânico dissolvido (COD), carbono orgânico particulado (COP) e clorofila.

As amostras de água para a medição de nutrientes inorgânicos (amónia, nitrito, fosfato e silicato) foram imediatamente filtradas usando filtros MSI Acetate Plus de 450 µm. A água filtrada foi armazenada em garrafas de PVC a -20º C até à análise, exceptuando a água para análise de fosfato que foi mantida em garrafas de vidro a 4º C. As análises de nutrientes foram feitas com um auto-analisador Alliance Evolution II de acordo com os métodos recomendados no manual do equipamento.

A clorofila foi estimada fluorimetricamente após filtração de três sub-amostras de 0.5 L através de filtros Whatman GF/C e extracção em acetona fria a 90% (v/v) durante cerca de 18 h.

Interpolação de Campos Horizontais

Os campos horizontais de oxigénio dissolvido foram interpolados a três profundidades distintas (superfície, meia-água e fundo), para cada uma das estações do ano. Foram ainda interpolados os campos horizontais de clorofila a para cada uma das estações do ano, e de nutrientes para o Outono de 2000 e o Verão de 2001. Dado que para estes últimos parâmetros não se observou variabilidade vertical significativa, na interpolação consideraram-se os valores médios verticais A metodologia seguida foi idêntica à adoptada na caracterização física e consistiu numa análise inicial e preparação dos perfis verticais previamente medidos, organizando-os por latitude, longitude e valor da grandeza. Posteriormente efectuou-se uma interpolação espacial de valores para a totalidade da Ria de Aveiro, utilizando o Método Ordinário de Kriging (CRESSIE, 1993) e considerando um modelo

isotrópico de variograma linear com um erro na variância igual a zero.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Gradientes Espaciais e Variabilidade Sazonal

Nas Figuras 2 a 7 apresentam-se mapas horizontais de concentrações sazonais de oxigénio dissolvido, clorofila a, amónia, nitritos, fosfatos e silicatos estabelecidos a partir da interpolação dos valores amostrados. Para a variação da concentração de oxigénio dissolvido apresentam-se resultados a três profundidades: superfície, meia-água e fundo.

Oxigénio dissolvido: O padrão de variação sazonal do oxigénio dissolvido (Figuras 2-4) é caracterizado por valores globalmente inferiores ou iguais a 10 mg/l em todos os períodos. O valor máximo observado é de 10,61 mg/l no Outono (canal de S. Jacinto, Out2000), sendo o valor mínimo de 5,90 mg/l no Verão (canal de Ílhavo, Jun2001). O perfil de variação espacial é, em geral, idêntico ao longo dos canais. Uma das excepções observa-se no canal de Ílhavo, no período de Verão, com um decréscimo da concentração para montante. A variação vertical é caracterizada

por concentrações ligeiramente mais elevadas à superfície, possivelmente relacionadas com as trocas entre a coluna de água e a atmosfera. Esta situação é mais evidente no período de Verão, no canal de Ílhavo.

Clorofila a: A concentração de clorofila a (Figura 5) varia segundo um padrão sazonal evidente, com concentrações mais elevadas nos períodos de Primavera (Mar/Abr2001) e Verão (Jun2001). Nestes períodos as condições ambientais são mais favoráveis para a produção fitoplanctónica, o que conduz às concentrações mais elevadas observadas. Os valores médios (mínimos e máximos, entre parênteses) nestes períodos são, respectivamente, de 6.68 µg/l (1,03-31,20 µg/l) e 8.77 µg/l (4,65-14,40 µg/l). Na Primavera, as concentrações mais elevadas ocorrem a montante do canal de S. Jacinto e no Verão a montante do canal de Mira. No período de Inverno (Nov/Dez2001) as concentrações de clorofila a atingem o valor mínimo de 0,22 µg/l. O padrão de variação espacial caracteriza-se pelo aumento tendencial das concentrações para montante ao longo dos canais da Ria. Globalmente as concentrações mais baixas ocorrem próximo da embocadura, devido à maior influência marinha. Nutrientes: A estrutura horizontal da concentração de nutrientes é apresentada nas Figuras 6 e 7. As concentrações de amónia são mais elevadas no Outono (Out2000) relativamente ao Verão (Jun2001) e evidenciam uma correlação negativa entre a concentração deste nutriente e a menor produtividade fitoplanctónica. Desta forma, observam-se menores concentrações deste nutriente quando as concentrações de clorofila a são mais elevadas, o que indica o seu consumo pelo fitoplâncton. A concentração máxima, de 40 µM NH4+, é observada a montante do

canal de Mira, onde existe um gradiente longitudinal acentuado no Outono, com um aumento das concentrações de jusante para montante. No canal de Ílhavo são também observadas concentrações elevadas da ordem de 25 a 35 µM NH4+. Durante o

Outono, o padrão longitudinal é observado em todos em todos os canais, existindo uma maior uniformidade no período de Verão (concentrações geralmente inferiores a 100 µM NH4+).

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Actas das Jornadas da Ria de Aveiro 2011 154 Rodrigues et al.

Os nitritos apresentam, à semelhança da amónia, uma variabilidade espacial relevante, com concentrações mais elevadas a montante. Embora as concentrações tendam a ser ligeiramente mais elevadas no Outono (Out2000), o valor máximo (114,6 µM NO2-) é observado no Verão a montante do canal de Ílhavo. Este

facto poderá estar associado ao menor caudal fluvial deste

período, o qual poderá traduzir-se num aumento da concentração. As concentrações mais elevadas de fosfatos são também observadas no Outono (Out2000). Durante este período, as concentrações variam entre 2,0 a 9,9 µM PO43-, sendo o valor

máximo observado a montante do canal de Mira. No Verão as concentrações são geralmente inferiores a 3,0 µM PO43-, sendo o

a) b) c) d)

Figura 2: Estrutura horizontal do oxigénio dissolvido (mg/l) interpolada para a camada superficial da Ria de Aveiro para cada estação do ano: a) Outono de 2000; b) Inverno de 2000; c) Primavera de 2001; d) Verão de 2001.

a) b) c) d)

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Actas das Jornadas da Ria de Aveiro 2011 155 Rodrigues et al.

As concentrações de silicatos variam entre valores de cerca de 20 a 200 µM SiO2 O valor máximo é observado no canal de Mira a

montante no Outono (Out2000). Tal como para a amónia e para os fosfatos, a variação sazonal de silicatos evidencia um consumo

deste nutriente nos períodos de maior produtividade fitoplanctónica. O padrão de variação espacial é semelhante ao dos outros nutrientes analisados, com um gradiente longitudinal de jusante para montante mais acentuado no Outono.

a) b) c) d)

Figura 4: Estrutura horizontal do oxigénio dissolvido (mg/l) interpolada para a camada de fundo da Ria de Aveiro para cada estação do ano: a) Outono de 2000; b) Inverno de 2000; c) Primavera de 2001; d) Verão de 2001.

a) b) c) d)

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Actas das Jornadas da Ria de Aveiro 2011 156 Rodrigues et al.

Zonação Longitudinal Ecológica

O estudo da distribuição espacial de diversas propriedades físicas, químicas e biológicas da coluna da água da Ria de Aveiro apresentado em DIAS et al. (este volume) e no presente trabalho evidencia, como seria de esperar, a complexidade dos padrões espaciais, fruto da complexidade geomorfológica da Ria, bem

como a sua forte variabilidade sazonal. Nesta secção apresenta-se uma análise explorativa das variações da distribuição do zooplâncton e da macrofauna bentónica na Ria de Aveiro, baseada na descrição dos gradientes ambientais da coluna de água. A discussão é realizada tendo como referencial os padrões de distribuição espacio-temporal do zooplâncton e da fauna bentónica no Canal de Mira, descritos por LEANDRO et al. (2007), LEANDRO

a) b) c) d)

Figura 6: Estrutura horizontal dos nutrientes na Ria de Aveiro no Outono de 2000 (µM): a) amónia, b) nitritos, c) fosfatos e d) silicatos.

a) b) c) d)

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Actas das Jornadas da Ria de Aveiro 2011 157 Rodrigues et al.

(2008) e MOREIRA et al. (1993). Note-se que a variação da

salinidade depende da interacção entre os caudais fluviais e a maré, variando por isso a escalas temporais curtas (ciclo de maré) e a escalas temporais mais alargadas (variação sazonal dos caudais afluentes). Os fluxos de maré ocasionam nos estuários variações da distribuição longitudinal das comunidades planctónicas mas não das comunidades bentónicas, enquanto que sazonalmente se verificam variações no padrão de distribuição espacial dos dois tipos de comunidade. A análise apresentada baseia-se, assim, nas condições de salinidade medidas durante as campanhas e tem um carácter explorativo. Para os períodos das campanhas, os mapas de salinidade de acordo com as classes do Sistema de Veneza são apresentados na Figura 9 da Parte I (DIAS et al., este volume).

Dada a variabilidade associada aos gradientes salinos e a ocorrência natural das populações, é também de referir que no presente estudo não se pretendem estabelecer limites físicos para a ocorrência de espécies ou comunidades, mas sim discutir a variação sazonal da extensão da ocupação das espécies de afinidade marinha, estuarina e limnética na Ria de Aveiro.

Zooplâncton: LEANDRO et al. (2007) estudou as variações

sazonais de abundância, biomassa e produtividade zooplanctónica na Ria de Aveiro e identificou os copépodes como o grupo de zooplâncton mais abundante na Ria. Neste estudo, realizado entre 2000 e 2001, as maiores abundâncias de copépodes foram observadas no mês de Setembro. As produtividades mais elevadas foram obtidas em Junho e Setembro, estando os períodos de menor produtividade associados às épocas de precipitação mais elevada (e, consequentemente, salinidade inferior). LEANDRO

(2008) estudou os padrões sazonais e longitudinais de Acartia spp. no canal de Mira entre Agosto de 2000 e Junho de 2002, tendo identificado três zonas: Zona 1 (Z1), que corresponde a estações de jusante e onde as abundâncias de Acartia clausi (espécie de afinidade marinha) são mais elevadas; Zona 2 (Z2), estuário médio, onde dominam as populações de Acartia tonsa (espécie de afinidade estuarina); e Zona 3 (Z3), com baixa abundância de copépodes.

A análise dos dados obtidos por LEANDRO (2008) permite

verificar que, genericamente, nas três zonas identificadas e durante o período analisado a salinidade variou da seguinte forma:

Z1: 25-35 – zonas euhalina e polihalina inferior; Z2: 25-5 – zonas polihalina média e mesohalina; Z3: 5-0 – zonas oligohalina e limnética.

A correlação da abundância zooplanctónica com os factores ambientais realizada por LEANDRO (2008) evidenciou uma correlação negativa com a salinidade na Z1, a qual reflecte a advecção do zooplâncton de montante para jusante, sendo as respostas do zooplâncton a estas variações rápidas. Nas Z2 e Z3 o zooplâncton correlacionou-se positivamente com a temperatura. Nas Z1 e Z2 LEANDRO (2008) identificou uma forte variabilidade

sazonal, enquanto na Z3 este padrão não foi evidente.

Os padrões de variabilidade identificados por LEANDRO (2008)

sugerem, assim, uma resposta rápida do zooplâncton à variação das condições ambientais, nomeadamente das condições de circulação e termo-halinas. Deste modo, é expectável uma variação sazonal da distribuição das populações de zooplâncton ao longo da Ria em resposta às alterações das condições ambientais. Em particular, no que se refere, à salinidade estas alterações irão traduzir-se na advecção para montante e para jusante das populações. A extensão da advecção das populações dependerá temporalmente das condições de caudal fluvial e de maré, as quais irão influenciar a distribuição da salinidade na Ria.

Os dados obtidos nas presentes campanhas permitem identificar duas épocas contrastantes no que se refere à variação sazonal da salinidade na Ria. Nos períodos de Outono (Out2000) e Verão

(Jun2001) observam-se salinidades mais elevadas ao longo de toda a extensão da Ria, as quais se devem aos caudais fluviais mais baixos – período seco. Inversamente, na Primavera (Mar/Abr2001) e no Inverno (Nov/Dez2001) os caudais fluviais mais elevados contribuem para salinidades inferiores ao longo da Ria – período chuvoso.

No período seco (Out2000 e Jun2001) as medições de salinidade realizadas evidenciaram uma extensão significativa das secções euhalinas e polihalinas inferiores, as quais abrangem a quase totalidade da área da Ria. Nas cabeceiras dos canais do Espinheiro, de Ílhavo e Mira observam-se salinidades inferiores a 25. A excepção é o canal de S. Jacinto, onde se observam salinidades superiores a 30 em toda a sua extensão durante o período de Outono (Out2000). Nestes períodos, devido aos menores caudais fluviais, existe, assim, uma tendência para a extensão para montante das populações de zooplâncton de afinidade marinha, ocupando a quase totalidade da área da Ria.

Nos períodos de Inverno (Nov/Dez2000) e Primavera (Mar/Abr2001) as salinidades apresentam valores significativamente inferiores. Nestes períodos uma maior extensão para jusante (entre as cabeceiras e cerca de metade da extensão dos vários canais) das zonas com salinidade inferior a 5 (secções limnéticas e oligohalinas). Deste modo, durante estes períodos poderá ocorrer tendencialmente uma situação de extensão para jusante das populações de afinidade estuarina, transportadas pelos caudais fluviais.

Macrofauna bentónica: MOREIRA et al. (1993) estudaram a evolução da macrofauna bentónica ao longo de um gradiente longitudinal no canal Mira. Os resultados deste estudo evidenciaram a ocorrência de três grupos principais de espécies: Grupo I (GI), dominado por espécies marinhas eurihalinas e polihalinas e que apresenta uma larga abundância no canal; Grupo II, limitado às zonas de jusante do canal e caracterizado por espécies polihalinas marinhas; e Grupo III, localizado nas secções de montante e constituído por espécies estuarinas e límnicas eurihalinas. Refira-se que a análise realizada por MOREIRA et al. (1993) se refere à distribuição média da macrofauna bentónica, não distinguindo variações sazonais. A análise destes dados permite identificar as seguintes classes de salinidade nas zonas onde ocorrem cada um dos grupos:

GII: 25-35 – zonas euhalina e polihalina inferior; GI: 25-5 – zonas polihalina média e mesohalina; GIII: 5-0 – zonas oligohalina e limnética.

De um modo geral, a distribuição da macrofauna bentónica é mais estável do que a das comunidades planctónicas. No entanto, a variação das condições sazonais poderá também induzir variações na distribuição destas comunidades, sobretudo associadas à variação dos limites montante ou jusante da distribuição das espécies. Assim, é comum nos estuários assistir-se a uma extensão para montante do limite superior da distribuição das espécies de afinidade marinha na estação seca, e uma extensão para jusante do limite inferior das espécies de afinidade dulçaquícola na estação pluviosa (ATTRILL e RUNDLE 2002).

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Actas das Jornadas da Ria de Aveiro 2011 158 Rodrigues et al.

Mira: populações bentónicas de maior afinidade marinha a jusante e uma transição para populações bentónicas de afinidade estuarina a montante. Nos períodos com precipitação mais elevada (Mar/Abr2001 e Nov/Dez2000) a tendência será para a maior ocupação a jusante de espécies de maior afinidade estuarina.

CONCLUSÕES

Na Ria de Aveiro observam-se variações sazonais e longitudinais dos parâmetros biológicos e químicos. As concentrações de clorofila a apresentam uma variabilidade sazonal significativa, sendo mais elevadas na Primavera e no Verão. Neste período as condições ambientais, nomeadamente a radiação solar, são mais favoráveis à produção fitoplanctónica. Esta tendência é inversa às dos nutrientes, nomeadamente a amónia, fosfatos e silicatos, evidenciando este facto o consumo dos mesmos pelas comunidades de fitoplâncton. Em termos longitudinais ocorrem gradientes ao longo dos vários canais, normalmente com concentrações mais elevadas a montante, o que mostra uma tendência para origem fluvial de cargas mais elevadas, em particular, de nutrientes.

No que se refere à zonação longitudinal do zooplâncton e da macrofauna bentónica, existirá também uma tendência para a variação sazonal da extensão ocupada pelas populações para montante e para jusante. Estes gradientes serão marcados por uma maior extensão para montante das áreas ocupadas por populações de afinidade marinha durante os períodos de salinidade mais elevada (Verão e Outono). Nos períodos de maior caudal fluvial (Inverno e Primavera) é previsível uma maior extensão para jusante das áreas ocupadas por populações de afinidade estuarina e dulçaquícola. Estes padrões devem ser considerados como tendências e não como limites físicos para a ocorrência das populações. A zonação ecológica detalhada de estuários baseada na salinidade deverá considerar a variabilidade temporal da salinidade ao longo do ciclo de maré e sazonalmente, devido à variação dos caudais fluviais.

De um modo geral, a ocorrência de fortes gradientes biológicos, físicos e químicos sazonais e longitudinais na Ria de Aveiro constitui um factor de extrema importância e complexidade no estudo da dinâmica ecológica do sistema. Os ecossistemas estuarinos podem ser considerados uma ecoclina, apresentando uma variação gradual das comunidades ao longo do gradiente de salinidade caracterizada por uma gama heterogénea de estados transicionais (ATTRILL e RUNDLE 2002). Este padrão deve ser

considerado no estabelecimento de programas de investigação, monitorização e gestão deste ecossistema, e os dados recolhidos pelo projecto de Caracterização Sinóptica da Ria de Aveiro (ver também DIAS et al. neste volume) permitem estabelecer uma base

referencial para estes programas.

AGRADECIMENTOS

A primeira autora foi co-financiada pela bolsa SFRH/BD/41033/2007 da FCT. A realização das campanhas contou com o apoio de um conjunto de pessoas às quais os autores agradecem: Ana Lúcia Tavares, Fábio Pereira, Luísa Pontes, Maria João Almeida, Rui Marques, Sizenando Abreu e Sónia Meireles.

LITERATURA CITADA

ATTRILL, M.J. e RUNDLE, S.D., 2002. Ecotone or Ecocline:

Ecological Boundaries in Estuaries, Estuarine, Coastal and

Shelf Science, 55, 929–936

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CUGIER, P.; BILLEN, G.; GUILLAUD, J.F.; GARNIER, J. e

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