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Painel: GIIs - Cooperação Internacional para o Desenvolvimento: contradições e potencialidades

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12 e 13 de julho de 2012 Brasília/ DF

Painel: GIIs - Cooperação Internacional para o Desenvolvimento: contradições e potencialidades

Área Temática: GOIs - Governança e Instituições Internacionais

AS ORGANIZAÇÕES INTERNACIONAIS E SEU ALCANCE EMANCIPATÓRIO

Autora: Laura Lyrio Gonçalves

Instituto de Relações Internacionais – Universidade de Brasília (UnB)

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Resumo

O presente estudo propõe-se a investigar as instituições internacionais e seu papel na contemporaneidade, avaliando seu potencial transformador no sistema internacional. Toma-se como objeto de estudo as políticas agrárias do Banco Mundial no Brasil e seus conflitos com os projetos societários dos movimentos sociais campesinos nacionais, articulados na plataforma transnacional da Via Campesina. A aceleração das relações sociais em âmbito global trata-se de processo composto pela reformulação do papel do Estado-nação, pela construção de organizações internacionais multilaterais e pela emergência de novos atores transnacionais e novos temas - como os movimentos sociais e suas culturas políticas particulares. Decorre uma intensa complexificação do cenário internacional, acompanhada de uma possível abertura à transformação de suas estruturas assimétricas de poder por meio da ação política dos movimentos sociais.

Palavras-chave: Organizações Internacionais; Movimentos sociais; Estado;

Emancipação humana.

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Introdução

O estudo das Organizações Internacionais (OIs) assume papel relevante na área das Relações Internacionais em tempos de aceleração das relações sociais em âmbito global, uma vez que novas indagações e dinâmicas estimulam o desbravamento de novas fronteiras investigativas. Objetiva-se ensejar algumas reflexões acerca de seu papel na contemporaneidade, partindo da interpretação dos desdobramentos das políticas de desenvolvimento agrário do Banco Mundial no Brasil e sua relação com a ação política da Via Campesina.

Este trabalho contextualiza-se no processo inicial de desenvolvimento da pesquisa de mestrado “O agrário na contemporaneidade: as políticas fundiárias do Banco Mundial no Brasil de 1975 a 2010 e a atuação da Via Campesina” e, portanto, não se propõe a traçar conclusões definitivas sobre o tema, mas incitar o debate acadêmico acerca do mesmo, a partir do levantamento de problematizações que permeiam o processo investigativo da pesquisa.

A aceleração das relações sociais em âmbito global constitui um processo contraditório e multicausal de delineamento de novas características para as dinâmicas de construção de políticas públicas. Parecem compor este movimento:

uma reformulação do papel do Estado-nação, a construção e legitimação de organizações internacionais multilaterais e a emergência de novos temas e atores transnacionais (HAESBAERT & PORTO-GONÇALVES, 2006). Decorre uma intensa complexificação do cenário internacional, acompanhada de uma possível abertura à transformação de suas estruturas de poder assimétricas. A globalização emerge como um processo contraditório de benefícios e exclusão, de modo que os países periféricos empreendem estratégias multilaterais e regionais como caminho para solução de problemas comuns. Para estes países e suas sociedades nacionais, a temática do desenvolvimento social assume relevância estratégica como fundamento de sua política externa – vista como instrumento importante da política nacional de crescimento econômico e proteção dos direitos sociais de sua população (CERVO, 2008).

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O Estado emerge como mediador de demandas públicas e interesses privados - cada vez mais influenciados pelas dinâmicas da dimensão internacional (OKEREKE, 2009). Neste contexto, observa-se a pertinência de uma avaliação das políticas oriundas de organizações internacionais como o Banco Mundial, investigando um possível enfraquecimento dos mecanismos constitucionais (nacionais) de reforma agrária - devido a não complementariedade entre propostas da Função Social da Terra da Constituição Federal de 1988 e os projetos do Banco Mundial para o meio rural brasileiro.

Os caminhos assumidos para o desenvolvimento do tema partem de duas concepções consideradas importantes para pensar a questão, e que se fazem presentes ao longo do texto. Primeiramente, observa-se que a investigação na área dos projetos de desenvolvimento social empreendidos pelas organizações internacionais corresponde a um processo de abertura ontológica na disciplina, compondo o processo de edificação de novos campos de estudo e valorização de diferentes objetos de pesquisa. Esta abertura dialética fundamenta uma nova concepção de Relações Internacionais, mais aberta e dialógica ao incorporar

“novos”i questionamentos da sociedade civil e outras formas de organização social e participação politica internacional. Em segundo lugar, decorre a leitura de que os processos sociais inerentes à construção de uma governança global dialógica e democrática possuem também uma dimensão cultural intersubjetiva (MARTINS, 2007), mediada por conflitos, mudanças e processos de co-constituição das ações políticas dos atores que interagem no cenário internacional (ROCHA, 2001). Deste modo, soa necessário pensar as políticas destas organizações dentro do contexto das lutas sociais das comunidades às quais as mesmas se destinam, investigando o alcance de sua contribuição para as mesmas.

Organizações Internacionais e movimentos sociais

A segunda metade do século XX caracteriza-se pela aceleração das relações sociais em âmbito global, sobretudo ao fim do período de bipolaridade. Este processo recebe o nome de globalização e identifica-se pelo aumento da circulação de mercadorias, pessoas, informações, idéias e capital. Acompanha este decurso

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histórico a consolidação de instâncias multilaterais e regionais, novos locus de governança global (ROSENAU, 2000) que, preocupadas com a questão da desigualdade social, passam a implementar projetos de desenvolvimento social nos países periféricos do globo, sobretudo no início da década de 1990.

A proliferação de OI´s no cenário internacional remonta ao período pós- Segunda Guerra Mundial, com a criação da Organização das Nações Unidas (ONU) em 1945, após a criação do Banco Mundial (BM), do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Acordo Geral de Tarifas e Comércio (GATT) no Acordo de Bretton Woods, em 1944. Elencando-se, para fins analíticos, o histórico do BM, se inicialmente esta instituição atuava como agência de promoção da infra-estrutura nos países atingidos pelas Primeira e Segunda Guerra Mundial, posteriormente, a partir da década de 1990, sobretudo, esta entidade amplia sua agenda de atuação, preocupando-se com questões econômicas, sociais e culturais. O Banco Mundial passa a criar políticas de desenvolvimento social para os países periféricos, firmando-se como grande financiador de projetos sociais também no setor de desenvolvimento agrícola e combate à pobreza no meio rural. Cabe pontuar que, é por meio do crescimento da financeirização do capital (processo impulsionado pelas dinâmicas globalizantes) que as políticas de crédito para desenvolvimento social do BM se tornam praticáveis, tendo este organismo multilateral firmado-se também, ao lado do FMI, após o Consenso de Washington em 1989, como promotor das medidas de ajuste estrutural nas economias dos países periféricos por meio de suas cláusulas de condicionalidade.

A criação de organizações internacionais e a prática da ação multilateral pelos Estados propõem-se historicamente a unir forças em um processo cooperativo de conquista de um objetivo comum. Observa-se que no campo do discurso político internacional a implementação de políticas de desenvolvimento social advindas de instâncias multilaterais nos países periféricos legitima-se como resposta às assimetrias de poder internacionais e domésticas. Porém, ao refletir sobre a dinâmica de incorporação destas propostas, ocorre o questionamento acerca dos constrangimentos causados à autonomia política dos países periféricos aos quais os projetos implementados com cláusulas de condicionalidade se destinam, o que

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parece estrategicamente problemático numa perspectiva de alinhamento pragmático frente às estruturas de poder do sistema internacional. Ademais, os estudiosos da temática no Brasil tendem a interpretar as políticas de desenvolvimento rural do BM como mais um mecanismo de transferência de valor da periferia para o centro, promovendo a reprodução das assimetrias de poder e não a aplicação de medidas redistributivas que fomentem a horizontalidade e a emancipação (MARTINS ET AL, 2004; FERNANDES; SAUER, 2008).

Neste sentido, Robert Cox interpreta as OIs como espaços internacionais de articulação das classes hegemônicas, posto que os Estados não atuam no âmbito das mesmas em busca da conquista de um interesse nacional-síntese e universal, mas tendem a perpetuar os privilégios de classe dos grupos hegemônicos. Em seu interior doméstico a correlação de forças entre os grupos sociais com diferentes propostas de políticas de desenvolvimento social tende a ser favorável aos grupos que já estão no poder - uma vez que possuem maiores recursos políticos e econômicos para pressionar o Estado pela aprovação de seus projetos societários (HALLIDAY, 2007). Assim, o Estado não é interpretado como promotor imparcial do bem comum, mas como instituição sujeita às dinâmicas sociais de poder de suas sociedades.

Ocorreria, portanto, um processo de complexificação dos processos de luta política em âmbitos doméstico e internacional, cabendo a questão: no interior das organizações internacionais existe uma abertura não estadocêntrica para outras formas de representatividade da sociedade civil, como os movimentos sociais? A existência de Cúpulas Paralelas às conferencias oficiais promovidas por estas OIs podem constituir uma indicação da demanda por representatividade política nestes encontros.

Formalmente, os cidadãos empreendem luta social no interior de seu Estado para conquista de determinados projetos de desenvolvimento social que consideram adequados. Porém, quando a correlação de forças está desfavorável à conquista e/ou preservação dos direitos sociais constitucionais e, quando a estrutura sócio- econômica e histórica atravanca avanços democráticos como a reforma agrária e a

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preservação ambiental e cultural das comunidades campesinas, (re)surgemii formas transnacionais de articulação dos sujeitos em luta.

Cox afirma que a emancipação humana e social não poderá ser construída

“de cima para baixo”, por organizações internacionais que representam hegemonicamente os interesses dos países centrais, em uma promoção que parte do plano externo global para as comunidades locais, mas que as lutas políticas devem ser promovidas de dentro dos Estados para fora. Decorrem então algumas reflexões: esta assertiva não exclui a possibilidade de articulações transnacionais dos grupos contra-hegemônicos para fortalecimento de sua capacidade de poder nas relações domésticas, daí a relevância de plataformas como a Via Campesina.

Cabe o questionamento também acerca da relevância da luta por representação política no interior das OIs hegemônicas – este aspecto da luta política transnacional pela emancipação humana e social representaria um esforço de controle democrático e popular do alcance da influência das OIs sobre a autonomia dos Estados, o que poderia ser particularmente interessante para os países periféricos que orientam sua política externa por meio do objetivo normativo de promoção do desenvolvimento social e da redistribuição de renda. Faz-se necessário avaliar o potencial e o alcance emancipatório e democrático das instituições internacionais no contexto das lutas sociais domésticas e transnacionais, uma vez que as mesmas influenciam a correlação de forças no interior dos Estados.

Faltam estudos que indiquem algum alcance transformador emancipatório de organizações internacionais hegemônicas tais como o BM, o FMI e a ONUiii. Carecem, na área, estudos que avaliem as consequências de políticas e diretrizes advindas das mesmas para o âmbito doméstico no processo de criação de políticas públicas. A literatura crítica e marxista das RI as interpreta como instrumentos de manutenção da ordem vigente e da perpetuação das relações sociais de exploração entre os seres humanos, o que constitui as raízes das assimetrias de poder em âmbitos doméstico e internacional. Deste modo, o exame das políticas de desenvolvimento social rural do BM no Brasil, contextualizadas no cenário da luta política da Via Campesina, objetiva empreender um estudo de caso e um recorte temático que objetiva trazer luz às indagações acima apresentadas.

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O estudo histórico e bibliográfico que fundamenta a presente pesquisa, permitiu a identificação de dois elementos: a não complementariedade de propostas de políticas públicas de desenvolvimento social rural advindas do Banco Mundial e da Constituição Federal de 1988; e a manutenção de uma estrutura restrita de controle democrático destas mesmas políticas em um perfil “reativo” e não

“participativo”. Ambas as identificações propostas partem da leitura de documentos oficiais do Banco Mundial, disponibilizados online pelo sítio da organização, e também da leitura de documentos oficiais da Via Campesina, publicados em cartilhas e também em seu sítio oficial na internet. A busca de uma bibliografia interdisciplinar que dialoga com a temática também constitui aspecto fundamental do mosaico investigativo.

A principal política do BM no setor de desenvolvimento rural no Brasil é a chamada Reforma Agrária de Mercado, cujo princípio primordial é o willing buyer/

willing seller, que consiste na venda e compra voluntárias de terras, sem necessidade de desapropriações realizadas pela União segundo a Função Social da Terra da Constituição Federal de 1988iv. Este projeto do BM busca incubar relações de parceriav no campo, por meio da formatação de pequenos produtores rurais familiares em trabalhadores terceirizados fornecedores de matéria-prima para as agroindústrias multinacionais. A implementação de assentamentos rurais dá-se por meio de políticas de crédito rural oferecidas aos pequenos agricultores (willing buyers). Inicialmente implementado no Brasil e em outros países periféricos como projeto-piloto no início da década de 1990 para “alívio da pobreza” no meio rural, continua compondo as dinâmicas agrárias dos mesmos até os dias hodiernos, transformando-se em política fundiária consolidada, principalmente nos países exportadores de bens primários e de bens de baixo valor agregado. Em relatórios parciais, ao longo dos anos, o decorrer do projeto no Brasil foi considerado pelo BM como satisfatório e paradigmático para os outros países periféricos em que foi implementado - como Guatemala, Colômbia, México, Zimbábue, África do Sul, Tailândia, entre muitos outros (MARTINS, 2004).

Como as políticas do BM para o meio rural brasileiro possuem antagonismos com a Função Social da Terra da CF/88, sua implementação enfraquece os

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mecanismos constitucionais de reforma agrária – tendem a promover seu desuso porque não há complementariedade das propostas. Deixam-se de se territorializar assentamentos rurais por meio da Função Social da Terra e promove-se uma reforma agrária nos moldes propostos pelos projetos de ajuste estrutural do Banco Mundial, ou seja, os mecanismos constitucionais perdem espaço para diretrizes que advém de instâncias multilaterais supranacionais.

Nesse ínterim, desdobra-se a luta dos movimentos sociais campesinos por poder político no interior de seus Estados, e sua integração transnacional para fortalecimento de sua posição contrária ao neoliberalismo e à globalização excludente. A unidade dos múltiplos movimentos sociais locais e regionais na Via Campesina objetiva fortalecer uma série de demandas sociais comuns, como a crítica ao tratamento da reforma agrária como pequena política, historicamente negligenciada e “realizada” de modo fragmentado e não em massa, o que seria o modo verdadeiramente democrático. São a favor da soberania alimentar, da desconcentração fundiária e de medidas redistributivas que promovam o fim da desigualdade social. Demandam a garantia de demarcação das terras indígenas e quilombolas, o acesso aos direitos sociais básicos e, posicionam-se contra as relações de trabalho que promovem a morte no campo por excesso de trabalho (em que os cortadores-de-cana constituem exemplo paradigmático, principalmente no Brasil).

A divergência da Via Campesina com as propostas do BM reporta-se ao fato de que a visão de desenvolvimento social deste movimento está mediada pela idéia da emancipação humana, o que não condiz com a articulação em parceria da agricultura familiar com as corporações internacionais e nem com o encolhimento dos dispositivos constitucionais federais de reforma agrária, processo entendido como enfraquecimento reacionário dos direitos sociais conquistados. A proposta do BM de integração do sujeito campesino ao mercado, pelo vínculo às empresas multinacionais, desconsidera e deslegitima a especificidade cultural da produção econômica camponesa voltada para a subsistência ou pequena escala, para trocas comerciais locais centradas no desenvolvimento social de suas próprias comunidades regionais.

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A respeito do segundo aspecto pontuado, sobre a manutenção de mecanismos restritos e reativos de controle popular, cabe o caso estudado na pesquisa, acerca do “The inspection panel: report and recommendation on request for inspection: Brazil: Land Reform and Poverty Alleviation Pilot Project”. Em 10 de dezembro de 1998, a partir dos questionamentos promovidos pelos movimentos sociais campesinos no Fórum Nacional Pela Reforma Agrária e Pela Justiça no Campo, realizado no Brasil pelos movimentos populares campesinos, o Banco Internacional para a Reconstrução e o Desenvolvimento (BIRD) – instituição componente do World Bank Group - iniciou, em 1999, um painel de inspeção acerca do Land Reform and Porverty Alleviation Pilot Project do Banco Mundial, a partir do qual poucas diretrizes foram reformuladas: como a diminuição das taxas de juros e prorrogação dos prazos de pagamento para as políticas de crédito rural.

Um dos grandes questionamentos dos movimentos sociais a respeito destas políticas consistia no fato de que os rumos políticos, econômicos e culturais de sua sociedade estavam sendo decididos em instâncias multilaterais nas quais não possuíam abertura democrática participativa para a formulação de seus parâmetros.

A despeito da não-complementariedade das políticas advindas do BM com a CF/88, os movimentos sociais campesinos organizados não tiveram espaço participativo na problematização das mesmas, mas promoveram a organização e o debate popular no Fórum Nacional, de onde partiu uma pauta de reivindicações no tocante às politicas do BM. O Banco Mundial, por sua vez, encaminhou uma avaliação do projeto-piloto - o que futuramente não resultou em modificações consistentes que contemplassem as reivindicações feitas. Em âmbito doméstico, na mesma época, houve intensa luta política em torno da pauta formulada no Fórum Nacional e também forte cobrança das comunidades junto ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), o que não resultou na abolição da reforma agrária via políticas crediárias.

Deste modo, observa-se que a possível relação de co-constituição das ações politicas entre Via Campesina e BM se dá de modo reativo e não participativo, de modo que os espaços formais permanecem herméticos à participação popular - fechados ainda, em uma perspectiva estadocêntrica dos processos de formulação de políticas publicas, ou seja, não dialogam com as comunidades às quais seus

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projetos se destinam, mas relacionam-se de modo reativo e burocratizado com as mesmas. É também a partir desta interpretação que a presente pesquisa permite trabalhar com as leituras de que o papel do Estado-nação estaria em um processo de reformulação em meio às dinâmicas globalizantes. Assim, ele desponta como mediador em relações transnacionais e não apenas como promotor (no cenário internacional) de um interesse nacional abstrato e universalizante que não contempla as demandas sociais de suas comunidades particularesvi.

Considerações Finais

Não se sabe ainda se existe algum potencial emancipatório nas políticas das organizações internacionais hegemônicas. No caso das políticas de desenvolvimento rural do BM no Brasil, observa-se a contraditoriedade de suas propostas com o processo histórico de lutas sociais empreendidas pelas comunidades campesinas articuladas transnacionalmente no movimento social Via Campesina. Decorre da presente investigação a possibilidade de trabalhar com a hipótese de um efeito assistencialista a curto prazo destas organizações, mas não como fomento de políticas redistributivas de renda e recursos que promovam a construção de uma horizontalidade nas relações de poder entres os grupos domésticos e as nações, em plano internacional.

Faltam estudos na área que não se atenham somente ao campo teórico e especulativo da revisão bibliográfica e que se fundamentem em pesquisas de documentos históricos. E ainda, faltam investigações de documentos oficiais alternativos que permitam voz também aos atores contra-hegemônicos envolvidos na dinâmica estudada, isto é, faz-se imprescindível estudar não apenas as interpretações oficiais do Estado e das OIs (no caso da pesquisa empreendida: do Estado brasileiro e do Banco Mundial), mas também considerar a leitura de mundo dos demais atores sociais e internacionais, como os movimentos sociais. A partir da confrontação das versões da história, busca-se identificar a medida do alcance das potencialidades e contradições das OIs e suas dinâmicas.

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A relevância acadêmica do tema encontra-se no compromisso da ciência em responder aos questionamentos da humanidade sobre o real e na sua demanda de entendimento das estruturas históricas de causalidade existentes, que constituem variáveis a serem consideradas seriamente no processo de edificação de projetos de futuro. Aqui elenca-se também a importância normativa e social de orientar os projetos de futuro das comunidades para uma relação social emancipatória que supere as relações econômicas de exploração “do homem pelo homem”vii, que seja alicerce para o exercício cotidiano da ação política democrática e participativa, e para a tolerância ao culturalmente diferente.

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Notas

iNeste ponto menciona-se “novos”, entre aspas, partindo do entendimento que certas pautas políticas demandadas pelos movimentos sociais campesinos (estudados no âmbito da Via Campesina) constituem lutas políticas de longa duração histórica, como a luta pela reforma agrária e pela demarcação de terras indígenas e quilombolas na América Latina. O caráter de novidade da questão reportar-se-ia à atualização do debate no contexto contemporâneo e sua interpretação a partir da área das Relações Internacionais, isto é, da contribuição dos pesquisadores da disciplina ao tema.

iiLembrando que a articulação transnacional de classes e grupos contra- hegemônicos para empreendimento de luta sócio-política internacional não é

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processo novo da contemporaneidade e possui suas raízes nos movimentos sociais sindicais internacionais do século XIX.

iiiAssume-se que estas OIs podem ser trabalhadas aqui conjuntamente, em um mesmo bloco, partindo-se das reflexões de Robert Cox.

ivArtigo 5º, XXIII da CF/88; Artigo 186 da CF/88. Detalhes em: Pinto Júnior e Farias (2004).

vRelação de cooperação de perfil exploratório dos trabalhadores e trabalhadoras campesinas, com perda de seus direitos trabalhistas. Processo de terceirização de parte do processo produtivo, com fornecimento de matéria-prima a baixo custo para as corporações multinacionais, uma vez que estas últimas são autorizadas a relacionar-se com os pequenos produtores como se os mesmos fossem “sócios” da empresa, ainda que não possuam ações ou propriedade sobre a corporação.

Detalhes em: Martins (2004).

viCabe pontuar que, numa perspectiva critica e marxista das RI, não é recente a leitura do Estado como mediador dos interesses dos múltiplos grupos sociais em âmbito doméstico e internacional, tendendo à preservação do status quo e dos interesses e estruturas de poder das classes hegemônicas (HALLIDAY, 2007). O que pode ser identificado como recente é uma abertura na disciplina das Relações Internacionais a trabalhar com aspectos comportamentais das instituições, incluindo o Estado e suas dinâmicas contraditórias entre o público e o privado em seu escopo analítico - buscando contemplar níveis mais complexos de variáveis imbricadas no estudo do internacional.

viiPara fim de esclarecimento, trabalha-se com a conceitualização da idéia de emancipação humana e social empreendida no interior do aporte da teoria crítica, marxiana e marxista. Deste modo a denominação “exploração do homem pelo homem” aqui reproduzida busca fazer referencia a expressão utilizada por Karl Marx nas obras do autor indicadas nas referencias. Entende-se entretanto que a exploração seja “do ser humano pelo ser humano”, observando que também as mulheres estão inseridas nesta dinâmica do ser social.

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