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Kriterion vol.53 número126

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Academic year: 2018

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Exatos vinte anos se passaram desde a publicação, em 1992, do volume 86 da Revista Kriterion, que reuniu os textos da Semana Comemorativa dos 400 anos da Morte de Michel de Montaigne, realizada naquele mesmo ano, na UFMG. Nestas duas décadas, consolidou-se no Brasil a pesquisa em ilosoia sobre este que é um dos maiores escritores em língua francesa e que contribuiu fortemente para que se traçasse a moldura na qual se inscreve o pensamento da era moderna. Os artigos aqui reunidos originam-se, em sua maior parte, das conferências apresentadas durante o Colóquio Montaigne: novas leituras, realizado na UFMG em 2011, e percorrem, sob diferentes perspectivas, temas centrais entre os muitos de que tratam os Ensaios.

Os Ensaios, obra constantemente reescrita, são um convite inequívoco a novas leituras e isto porque, no que tange ao pensar e ao interpretar, “há sempre lugar para um seguinte, certamente até mesmo para nós, e caminhos alhures”. Iniciando estes caminhos, Philippe Desan propõe que a vida real, na forma da política, invade a torre na qual muitas vezes gostamos de imaginar nosso ilósofo. Assim se embaralham, na escrita dos Ensaios, vida privada e vida pública – e a obra ganha uma dimensão, digamos, instrumental. Também no artigo de Maia Neto o contexto da escrita mostra-se essencial, e os ceticismos de Montaigne – pois há o pirrônico e o acadêmico, a depender das circunstâncias – constituem-se sobre o fundo dos conlitos religiosos e sua repercussão na corte da princesa Marguerite de Valois. O ceticismo é também o tema dos artigos de Luiz Eva, Danilo Marcondes e Plínio Smith, em diferentes abordagens. Eva reúne e analisa os elementos de proximidade entre os céticos antigos e Montaigne, no tocante à moral, sem deixar de ver a distância entre eles. Já Smith, mesmo que atento à retomada dos tópicos céticos por Montaigne, apresenta a forma de duvidar do ensaísta em sua diferença em relação a eles. Marcondes relaciona o ceticismo de Montaigne à descoberta do “outro” – o Novo Mundo e seus canibais –, o que contribui para a concepção, pelo ensaísta, de uma antropologia original. A questão da alteridade também está presente no texto de Maria Célia Veiga França, agora na igura da mulher, que nosso autor, contra muitos de seu tempo, delineia, reduzindo a diferença entre os sexos. Sobre mulheres e homens – e sobre o lugar fundamental de Eros no autorretrato de Montaigne – trata o meu próprio texto. Eduíno Orione e Lúcio

kRITERION, Belo Horizonte, nº 126, Dez./2012, p. 329-330

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Vaz abordam temas vizinhos: a morte e o suicídio. O primeiro mostra o lugar essencial do costume e da imaginação na meditatio mortis montaigniana, que se afasta dos legados metafísico e religioso da tradição, mesmo aproximando-se de Aristóteles; o aproximando-segundo defende, cuidadosamente e em oposição à maior parte da tradição interpretativa, a condenação incondicional do suicídio pelo autor dos Ensaios. Concebendo-a como lugar da variação e da contingência, e sobretudo do possível, Montaigne concede à história destaque em seus escritos; as maneiras como esta se faz presente nos Ensaios é o tema de Maria Cristina Theobaldo. A política e suas injunções frente às demandas da ética e da vida privada aparecem nos artigos de Gilmar Henrique – que mostra que o realismo de Montaigne não implica eliminar as exigências éticas da política – e de André Scoralick. Este último, num texto que dialoga com o de Desan, acompanha Montaigne em seu propósito de mostrar que o cuidado de si, embora não pareça, é uma virtude política. Sobre um autor para o qual a forma (manière) é mais importante do que a matéria (matière), não poderia faltar uma análise do estilo dos Ensaios: nesta categoria estão os trabalhos de Celso Azar, Sérgio Xavier e Edson Querubini. Celso Azar inscreve o ensaio montaigniano no modo de pensar “materializado” do Renascimento, inimigo das dicotomias de várias ordens, e distingue uma dimensão metafísica em sua escrita. Sérgio Xavier fala dos Ensaios como lugar da reinvenção, a partir da tradição clássica e, sobretudo, do estilo epistolar de Petrarca, do discurso em primeira pessoa. Edson Querubini, fechando este volume, analisa principalmente o “Da arte de conversar”, fazendo ver que os Ensaios são, como queria seu autor, uma conversa conduzida com arte, onde a excelência da manière decorre da sábia ignorância da matière. As resenhas ao inal do volume tratam de publicações recentes de autores brasileiros e estrangeiros dedicadas a Montaigne ou à Filosoia Moderna.

Embora lamentemos ausências importantes, acreditamos ser este volume representativo do “estado da arte” dos estudos montaignianos no Brasil. Tenho a agradecer aos autores que contribuíram para que ele viesse a lume, e também: a Ydernéa de Souza Birchal pelo minucioso trabalho de revisão dos textos; a Lúcio Vaz e Afrânio Souza a preciosa ajuda na adequação dos manuscritos ao formato da revista; a Júlia Birchal Domingues a revisão dos

abstracts em língua inglesa e a Raniere Lima, diagramador da revista, por ter aceito de bom humor as intermináveis idas e vindas dos arquivos.

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