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Reflexões acerca do conceito de castração no contemporâneo

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Academic year: 2021

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UNIJUI – UNIVERSIDADE REGIONALDO NOROESTE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

DHE – Departamento De Humanidades e Educação Curso De Psicologia

EMILY FREITAS DOS SANTOS

Reflexões acerca do conceito de castração no contemporâneo

Ijuí 2018

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EMILY FREITAS DOS SANTOS

Reflexões acerca do conceito de castração no contemporâneo

Monografia apresentada ao Curso de Psicologia da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul – UNIJUI, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Psicologia.

Orientadora: Profª. Ms. Carolina Gross

Ijuí 2018

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UNIJUI – Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul DHE – Departamento de Humanidades e Educação

A Comissão Examinadora, abaixo assinada, aprova a monografia

Reflexões acerca do conceito de castração no contemporâneo

Elaborada por

EMILY FREITAS DOS SANTOS

Como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Psicologia

Comissão examinadora

Profª. Mestre Carolina Gross DHE/UNIJUI

Profª Mestre Sonia Aparecida da Costa Fengler DHE/UNIJUI

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AGRADECIMENTOS

Gostaria de agradecer primeiramente a Deus, por todas as oportunidades que pude alcançar e por sempre ter me dado força e saúde para enfrentar as dificuldades que surgiram nesta caminhada.

Aos meus pais, que sem eles nada disso seria possível, todo o amor, apoio e incentivo que sempre me deram, fazendo de tudo para que eu pudesse realizar meus sonhos.

Ao meu namorado, que me acompanhou desde o início desta caminhada, sempre com muita paciência, me ajuda em tudo, me apoia e me entende nos momentos mais difíceis.

E por fim, a minha orientadora, que sempre acreditou em mim, me dando todo o suporte e ajuda necessária, me orientando a seguir minha ideia inicial, sobre a qual foi um trabalho que adorei realizar e consegui alcançar minhas expectativas.

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“Não me lembro de nenhuma necessidade da infância tão grande quanto a necessidade da proteção de um pai”.

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RESUMO

O presente trabalho tem como objetivo refletir sobre o conceito de castração apresentado por Freud, sendo esse de suma importância para a constituição psíquica do sujeito e a sua relação com a sociedade contemporânea. Muitas modificações ocorreram na transição da sociedade moderna para a sociedade contemporânea. A maneira como as sociedades se organizam sofreram modificações, sendo a sociedade contemporânea organizada pelo consumismo, fator de grande importância que influenciou mudanças nas relações, dentre elas as relações afetivas, em relação a estas, destacamos a relação de autoridade do pai e a questão do amor entre os pais e os filhos. O trabalho irá apresentar as transformações sobre a transição da modernidade para a contemporaneidade, seguindo por apresentar o conceito de castração e o complexo de Édipo, destacando a função paterna, no processo de constituição psíquica. Para finalizar, o trabalho irá abordar o filme que está relacionado com a temática do trabalho, denominado de O Clube da Luta, sendo também relacionado com a violência, uma forma de descarga de energia quando não se tem simbolização e nem mediação da palavra.

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Sumário

INTRODUÇÃO ... 8

CAPÍTULO I – A TRANSIÇÃO DO MUNDO MODERNO PARA O MUNDO CONTEMPORÂNEO ... 9

O mundo moderno ... 10

O mundo contemporâneo ... 17

CAPÍTULO II – CARACTERIZANDO O CONCEITO DE CASTRAÇÃO ... 24

Complexo de castração ... 24

Figura Paterna apresentada na Castração e o Complexo de Édipo ... 26

CAPÍTULO III – A CASTRAÇÃO NO CONTEMPORÂNEO... 31

Clube da Luta: um filme para contextualizar a castração na contemporaneidade . 36 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 42

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INTRODUÇÃO

Freud apresenta em sua teoria o conceito de castração, elemento inicial para a reflexão proposta no presente trabalho, e como podemos articular o conceito de castração na sociedade atual? O interesse por essa temática se deu por uma experiência de estágio na Ênfase em Educacional na qual foi realizado estágio com turmas do início do ensino fundamental. As queixas das professoras eram constantes em relação a falta de limites e a agressividade das crianças. Outro fator que influenciou na escolha, foi a experiência de emprego no meu local de serviço em uma escola de Educação Infantil, na qual também se tem muitas queixas de crianças que não conhecem os limites e nem regras, e muitas falas sobre a diferença de como era nos tempos “antigos” e na atualidade. O interesse se deu em buscar saber o que mudou na sociedade e também na relação dos pais e os filhos.

Sabemos o quanto esse conceito é fundamental na constituição psíquica da criança e a importância da função paterna para exercer esta função. Num primeiro momento a criança vive uma relação dual com a função materna, sendo necessário a entrada de um terceiro para barrar essa relação, mostrando para a criança que a mãe deseja outra pessoa para além ela. Esta terceira pessoa é o que chamamos de função paterna, e é essa entrada que irá permitir a castração e também a entrada do sujeito no simbólico.

Para podermos caracterizar a sociedade contemporânea é preciso retomar a sociedade moderna e as suas diferenças em relação a nossa sociedade atual. Em um primeiro momento o trabalho apresenta a maneira como a sociedade se civilizou, sendo por meio da renúncia dos instintos sexuais e agressivos. A sociedade precisou abrir mão de seus impulsos para poder viver em harmonia. Foi a partir disso, que a civilização se inicia.

A sociedade moderna era caracterizada pela luta do sonho da pureza. Onde os considerados impuros eram a sujeira da modernidade, o texto apresentará mais detalhado sobre quais foram os considerados impuros da sociedade moderna, e também os que estão sendo considerados os impuros da sociedade contemporânea. Outras mudanças ocorreram entre a era moderna e a pós-moderna bem como as relações afetivas são estabelecidas, as mudanças no âmbito do trabalho e questão do termo desemprego e principalmente a relação entre pais e filhos passam por modificações.

O texto apresentara sucintamente o Complexo de Édipo e o complexo de Castração e por fim, será realizado uma ligação entre a sociedade contemporânea e o conceito de castração. Neste último tópico, é possível notar que também ocorrem mudanças, pois a relação de poder e de autoridade que o pai possuía se modifica, não se encontrando mais o

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saber no pai, mas sim do lado de fora, como por exemplos manuais de como lidar com os filhos e a televisão. Em meio a tudo isso, podemos pensar em como articular o conceito de castração na sociedade atual.

Para finalizar, será trazido um filme, denominado de O Clube da Luta, onde irá ser relatado um personagem que tinha ausência da função paterna em sua vida. Essa ausência será caracterizada no filme por meio da violência, quando o personagem funda o Clube da Luta, onde é possível notar a impossibilidade de simbolização e da mediação da palavra.

CAPÍTULO I – A TRANSIÇÃO DO MUNDO MODERNO PARA O MUNDO CONTEMPORÂNEO

A cultura está muito ligada a civilização, na qual foi constituída para reduzir ou acabar com uma barbárie primitiva, impossibilitando e barrando de que todos possam realizar e agir como pretendem, sem que ninguém possa interferir. Se toda a sociedade, continuasse a seguir seus impulsos originais sem que fossem interrompidos, situações horripilantes aconteceriam. A partir da ação civilizatória que foi possível “preparar” a sociedade para as normas e padrões culturais.

Quando pensamos em civilização, podemos pensar que não foi um processo da noite para o dia, na qual a humanidade passa da selvageria para a vida civilizada, mas sim um processo que foi construído ao longo do tempo. Podemos caracterizar este início de civilização, a partir do Totem e Tabu, na qual os irmãos que haviam sido expulsos de casa, voltam e matam o pai, também devorando-o, terminando assim com a horda patriarcal. A partir do ato de devorar o pai, esse mesmo é introjetado nos filhos, que realizam uma identificação com o mesmo e consideram ficar com um pouco de sua força. Os filhos que haviam matado o pai pois este mesmo desejava e possuía todas as mulheres para si, acabaram por também desejarem ter todas as mulheres para si, foi a partir daí que os filhos tiveram de abrir mão do que desejavam e de seus impulsos, para manter a ordem, pois caso contrário, iriam acabar um lutando contra o outro.

Quando pensamos em cultura, podemos pensá-la no plural, pois existem vários tipos de culturas. O que elas têm em comum, é que são estabelecedoras de ordem e que emitem normas, principalmente aquelas que se referem aos dois tabus da civilização: a primeira de não se relacionar sexualmente com a mãe e a segunda de não matar o pai. Todo sistema cultural possui uma estrutura com objetivos da sua organização, sendo estes direcionados para

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os valores centrais para aquela cultura. Esses valores estão no topo do sistema cultural. Portanto, a cultura até hoje, possui um esforço de manter e estabelecer a ordem.

Segundo Freud (1930), a civilização é construída a partir da renúncia dos instintos. É preciso que se abandone os desejos e impulsos originais, sendo esses de ordens sexuais e agressivos. Podemos pensar esses impulsos como no complexo de Édipo, na qual primeiramente a criança deseja inconscientemente manter relações incestuosas em relação a mãe, e o desejo de eliminar o pai, ocupando assim o seu lugar. Para a criança se caracteriza uma ambivalência em relação aos pais neste conflito, no mesmo momento que se coloca desejos amorosos, também se coloca desejos hostis. É a partir destes desejos sexuais e agressivos que é necessário impor uma ordem a uma sociedade que estava desordenada, impondo assim grandes a sexualidade e agressividade do homem, resultando em uma renúncia forçada.

O mundo moderno

Pensando a sociedade na época da modernidade, observa-se que a civilização opta por perder algo em troca de outra. Se troca a possibilidade de felicidade e seus desejos por segurança.

O princípio de prazer está aí reduzido à medida do princípio de realidade e as normas compreendem essa realidade que é a medida do realista. “O homem civilizado trocou um quinhão das suas possibilidades de felicidade por um quinhão de segurança” (BAUMAN, 1998, p.08, grifo do autor).

Esta ordem imposta na qual era o orgulho da modernidade, passou a se tornar excessiva diminuindo assim a possibilidade de liberdade da civilização.

Dentro da estrutura de uma civilização concentrada na segurança, mais liberdade significa menos mal-estar. Dentro da estrutura de uma civilização que escolheu limitar a liberdade em nome da segurança, mais ordem significa mais mal-estar (BAUMAN, 1998, p. 09).

Para Bauman (1998), a modernidade está encaixada em três pilares que caracterizaram esta etapa e organizam a sociedade. Sendo estas o conceito de beleza, limpeza e ordem.

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Na idade moderna a questão social era em relação a “poluição” de que a presença de determinadas pessoas que eram consideradas desajustadas ou “fora do lugar” causavam na estética e moral harmonia da sociedade. A pureza é um ideal característico da modernidade, sendo uma visão da ordem. Sendo a ordem, uma maneira de organização dos nossos atos, distribuídos por uma hierarquia.

“Ordem” significa um meio regular e estável para os nossos atos; um mundo em que as probabilidades dos acontecimentos não estejam distribuídas ao acaso, mas arrumadas numa hierarquia estrita – de modo que certos acontecimentos sejam altamente prováveis, outros menos prováveis, alguns virtualmente impossíveis (BAUMAN, 1998, p. 15, grifo do autor).

Cada época e cultura possuem um modelo de pureza, os padrões ideais mudam de uma época para outra, mas continua a existir um modelo de pureza e ideal de padrão.

O interesse pela pureza e a obsessão com a luta contra a sujeira emergem como características universais dos seres humanos: os modelos de pureza, os padrões a serem conservados mudam de uma época para a outra, de uma cultura para a outra – mas cada época e cada cultura tem um certo modelo de pureza e um certo padrão ideal a serem mantidos intactos e incólumes às disparidades. (BAUMAN, 1998, p. 16).

Aquele que é considerado um obstáculo para a higiene e organização do ambiente não deixa de ser outros humanos, que foram classificados ou categorizados por outras pessoas que consideram e tratam como sujeira. Um grupo de seres humanos classificando e caracterizando outro grupo de seres humanos como sujeira, por não se adequarem aos padrões impostos por uma parte da sociedade.

No mundo moderno, os considerados impuros foram os revolucionários, pois eles eram uma ameaça aos princípios de uma ordem tradicional, pois tentavam substituí-las por outra ordem. Essas pessoas como sendo a “sujeira” da modernidade, causam uma fragilidade da ordem, por isso a necessidade de realização de limpeza.

Não havia reflexão diante destas pessoas, pois a ordem imposta a sociedade não possibilitava mudanças, fazia parte da ordem considerar o que não era ideal de modelo, ser classificado como sujeira. Então era realizado uma constante varredura da sujeira, se tornando rotina e um hábito essa limpeza. Isso era realizado sem pensar nos atos cometidos. Era preciso se manter a limpeza e a pureza para que se mantenha a ordem.

Cada ordem tem suas próprias desordens; cada modelo de pureza tem sua própria sujeira que precisa ser varrida. Mas, numa ordem durável e resistente, que se reserve o futuro e envolva ainda, entre outros pré-requisitos, a proibição da mudança, até a

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ocupação de limpeza e varredura são partes da ordem. Pertencem à rotina diária e, como a rotina de tudo, tendem a repetir-se monotonamente, duma forma completamente transformada em hábito e que torna a reflexão redundante. O que alcança o nível da consciência e desperta a atenção não é tanto a rotina de eliminar a sujeira quanto prevenir uma não-habitual e fortuita interrupção da rotina (BAUMAN, 1998, p. 20, grifo do autor).

Na idade moderna se pensava em uma ordem que levasse a segurança, principalmente em relação ao futuro, por isso esta nova ordem estabelecida na modernidade de que o mundo seria bom e perfeito, e da qual não se poderia existir estranhos e ninguém que não estivesse nos padrões estabelecidos por um determinado grupo, parecia tão sedutora e irresistível.

No mundo moderno, notoriamente instável e constante apenas em sua hostilidade a qualquer coisa constante, a tentação de interromper o movimento, de conduzir a perpétua mudança a uma pausa, de instalar uma ordem segura contra todos os desafios do futuro, torna-se esmagadora e irresistível (BAUMAN, 1998, p. 21).

Se existia uma grande relação entre o extremo radical de uma ordem nova e final na qual era tão sonhada.

O que era “totalitário” nos programas políticos totalitários, eles próprios fenômenos totalmente modernos, era, mais do que algo além da abrangência da ordem que eles prometiam, a determinação de não deixar nada ao acaso, a simplicidade das prescrições com a limpeza, e a meticulosidade com que eles atacaram a tarefa de remover qualquer coisa que colidisse com o postulado da pureza (BAUMAN, 1998, p. 21, grifo do autor).

Em relação ao trabalho na modernidade, o termo desemprego ganhava um outro significado. Os desempregados eram aqueles que não podiam ganhar o seu próprio sustento, os que estavam temporariamente afastados por motivos de saúde sendo vistos como uma mão de obra de reserva, na qual os mesmos eram preparados para assumir o trabalho novamente quando fosse apto.

Os “desempregados” eram o “exército de reserva da mão-de-obra”. Temporariamente sem emprego por motivo de saúde, enfermidade ou dificuldades econômicas correntes, eles deviam ser preparados para reassumir o emprego quando aptos(...) (BAUMAN,1998, p. 50, grifo do autor).

A previdência era um direito de todos os membros da sociedade, como uma forma de garantia de segurança. “Os dispositivos da previdência eram então considerados uma rede de

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segurança, estendida pela comunidade como um todo, sob cada um dos seus membros(...)”(BAUMAN, 1998, p. 51).

Mesmo com a previdência sendo mantida para todos, a sociedade era encorajada a enfrentar os obstáculos da vida, de modo que não precisasse utilizá-la. A comunidade se responsabilizava para a promoção da saúde dos desempregados para que pudessem voltar ao trabalho. O estado de bem-estar garantia uma segurança para o sujeito, sendo seu de direito como cidadão, sendo fornecido de uma maneira de seguro coletivo. O seguro era coletivo, por isso a comunidade se via na responsabilidade de manter a saúde dos desempregados para voltar ao mercado de trabalho e aos empregados para que continuassem a se empenhar cada vez mais. Sendo assim, menos pessoas precisariam da utilização da previdência, mas que era mantida como forma de segurança.

Pensando sobra e ética e a moral, Levinas citado por Bauman (1998) retrata o mundo moral como sendo entre eu e o Outro.

“O Outro” ou “O Rosto “são nomes genéricos, mas em todo encontro moral esses nomes significam apenas um, somente um ser – um Outro, um Rosto. Nenhum dos nomes pode aparecer no plural sem perder o seu status ético, seu significado moral (BAUMAN, 1998, p. 62, grifo do autor).

Nesta relação, tanto o eu como Outro chegam despidos de qualquer moralidade, distinção social, de classe ou papéis, sendo reduzidos ao que é da essência da humanidade.

Na reunião moral de dois, eu e o Outro chegamos despidos de nossos adornos sociais, despojados de status, distinções sociais, desvantagens, posições ou papéis, não sendo ricos nem pobres, arrogantes ou humildes, poderosos os destituídos – reduzidos à simples essencialidade da nossa humanidade comum (BAUMAN, 1998, p. 62 – 63, grifo do autor).

Essa reunião moral é interrompida pela entrada de um Terceiro. Essa relação com a moralidade apresentada por Levinas citado por Bauman (1998) pode ser comparada a Psicanálise e o Complexo de Édipo. Na qual se tem essa relação de duas pessoas, se tornando somente um, ou seja, da mãe e o filho, na qual mantêm essa relação fusional e que é mortífera. E é a partir da intromissão de um terceiro, que vai (re)apresentar a falta/castração da mãe e vai inscrever o filho esta falta/castração, possibilitando a subjetivação do filho o tornando um sujeito desejante.

A partir da entrada deste terceiro, o impulso moral excede seus limites sendo necessário a inscrição da justiça. A justiça se funda a partir do momento que a experiência da

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singularidade e a experiência da multiplicidade dos outros e a maneira como se dá se no meio social se encontram.

A justiça torna-se necessária quando se verifica que o impulso moral, inteiramente auto-suficiente dentro da reunião moral de dois, é um guia insatisfatório ao se aventurar além dos limites daquela reunião(...)Mas é esse impulso moral que torna a justiça necessária: ele recorre a justiça em nome da autopreservação, embora, enquanto o faça, se arrisque a ser abatido, podado, mutilado ou diluído(BAUMAN, 1998, p. 68).

A ética não é um valor derivado do Estado e dos seus poderes de legislar e manter o cumprimento das ordens. A ética e a justiça são instrumentos do Estado, mas da qual tem origem na nossa constituição, no momento que somos inscritos na castração.

O que se observa é que na sociedade moderna se utiliza de valores como igualdade como sendo o valor supremo e a essência da justiça e seu significado se mantém em controvérsias. Bauman (1998) nos coloca que a parte da sociedade não filosófica não tem uma ideia ou noção ou se tem é muito vaga, sobre a questão da justiça. O conhecimento que possuem é em relação a injustiça, sendo essa mesma, a primeira noção da ética popular, e não mais a justiça. “(...)as massas(...)não fazem idéia, ou na melhor das hipóteses fazem uma idéia vaga, da noção abstrata de ‘justiça como tal’, elas tendem a reconhecer infalivelmente um caso de injustiça” (BAUMAN, 1998, p. 75, grifo do autor).

Com o passar das décadas, não se teve avanços na percepção do que é “justo”, pelo contrário, o bem-estar e qualidade de vida foram responsáveis pela desigualdade, onde muitos enriqueceram rápido e no outro pólo, uma população que empobreceu rápido. A sociedade não se dá conta do que seria justo, e a desigualdade passa a ser uma situação considerada “normal”.

Na era moderna não se pensa em prolongar o contentamento, mas se “investe” na impossibilidade de ficar contente. É impossível se manter fixo, ser moderno significa estar sempre em movimento.

Então os párias, aqueles que foram excluídos do convívio social e considerados as vítimas, a partir da modernidade puderam retomar sua esperança. Pois quem mais intocável que uma pessoa que não pertence a lugar nenhum?

A modernidade proclamou que nenhuma ordem era intocável, visto que todas as ordens intocáveis deviam ser substituídas por uma nova ordem artificial, em que são construídos caminhos que levam da parte mais baixa ao topo e, portanto, ninguém faz parte de nenhum lugar eternamente. A modernidade foi, assim, a esperança do

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pária. Mas o pária podia deixar de ser pária somente ao se tornar - ao se esforçar para se tomar - um arrivista (BAUMAN, 1998, p. 99, grifo do autor).

O arrivista foi o considerado herói da era moderna, aquele que pretende triunfar a qualquer preço, mesmo que ocasione prejuízo a outros. O arrivista está sempre em movimento, sua permanência é temporária, ele pode estar no lugar, mas não ser do lugar. Perseguia identidades pois a sua própria havia sido negada.

Mas para tudo tem suas desvantagens, estar em movimento também vai significar não fazer parte de lugar nenhum, não podendo contar com a proteção de ninguém. Foi a esperança que levou o pária a sua viagem de se transformar em arrivista. Mas essa incansável jornada, lhe remetiam lembranças passadas de buscas por lares e a frustração de sua nova sobriedade.

A era moderna foi um período na qual se tratou de padrões, esperança e culpa. Toda realização é uma cópia dos padrões apresentados pela sociedade moderna, que remetem o que virá amanhã, e junto com estes padrões se cria esperanças de que o dia de amanhã será melhor que o de hoje, o que muitas vezes não acontece, sendo necessário a culpa para evitar a esperança da frustração.

A primeira revolução educacional acompanhou a sociedade moderna. Neste período, as crianças eram vistas como adultos em miniatura, o que diferenciavam seus rostos eram os músculos e por ter o juízo mais fraco. Também não se tinha a ideia de acomodações e quartos separados das dos pais e crianças, e nem mesmo as roupas demarcavam algo sendo da infância, as crianças usavam as roupas grandes e abandonadas de irmãos e dos pais.

Foi a partir do século XVII que estas ideias foram ganhando modificações.

Partes das casas familiares foram separadas e reservadas para as atividades dos adultos e declaradas “áreas proibidas” às crianças abaixo de certa idade; um regime separado e atividades especiais foram concebidas para as crianças; e, para marcar isso simbolicamente, seus trajes foram desenhados para acentuar-lhes o status inferior ou “incompleto(...)”. (BAUMAN, 1998, p. 178, grifo do autor).

Essa descoberta estava ligada a nova percepção da realidade social, na qual apresentava indivíduos mais maduros, sendo assim foi percebido atributos peculiares nas crianças e observado que elas são criaturas por si mesmas, não sendo a miniatura de ninguém. Mas que precisam da orientação e controle de um adulto, pois são considerados indivíduo frágeis e inocentes.

Foi a partir do discurso médico e educacional da época, que se começa a ter noção sobre a sexualidade infantil. Segundo Bauman “a sexualidade manifesta ou latente, despertada

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ou adormecida da criança também costumava ser um poderoso instrumento na articulação das modernas relações de família” (BAUMAN,1998, p. 186).

Neste período, o sexo era considerado da moda e muito discutido por médicos que se aprofundavam neste assunto e suas patologias. Mas as questões de sexualidade e sua proibição ou liberdades eram classificadas de acordo com as diferenças de classe. A classe média deveria seguir a moral rígida que era posta. O sexo era pensado somente para reprodução e necessidade, colocando a família no centro da questão. A religião pregava que o sexo era obrigatório dentro dos casamentos e que a mulher deveria se submeter e suportar isso, e não como um prazer para ambos. A mulher era utilizada como meio reprodutor. Para manter esta condição, se originou mitos que diziam que o homem enfraqueceria sua capacidade intelectual se praticasse muito sexo e as mulheres teriam seu tempo de vida abreviado. Ocasionando assim, medo e culpa destas pessoas. Os homens de classe alta eram os que desfrutavam do amor livre, pois eram os que podiam usufruir do sexo com “liberdade”, eles iam ao encontro das prostitutas pra conseguir se satisfazer.

Com a origem da Psicanálise, Freud começa a estudar sobre a sexualidade das mulheres e das crianças.

A função apenas reprodutiva da sexualidade, agrega-se a busca do prazer. O corpo biológico abre espaço para o corpo erógeno. A psicanálise passa a dar voz e, portanto, escuta aquelas mulheres que sofriam e que não eram acolhidas pela medicina da época, buscando a origem do seu padecimento (HAUSEN, 2013, p. 33).

Em sua obra, trabalha a questão de que a mulher pode ter o mesmo desejo sexual que o homem, que a masturbação não ocasiona insanidade e que as crianças também são seres sexuais. A partir disto, Sigmund Freud faz nascer a modernidade sexual. “Sexualidade que transcende a ideia de genitalidade, que dá voz à pulsão, que marca, que é modelo de relação com o mundo, que reconhece o direito às crianças de serem sexualizadas e, às mulheres, de serem sexuadas” (HAUSEN, 2013, p. 31).

A família foi o único lugar de aprendizagem para as crianças e mulheres, dentro de uma fiscalização e cuidados médicos. A primeira revolução sexual contribuiu para construir um pilar na construção da ordem. “O sexo foi desenvolvido na construção de numerosos segmentos da estrutura social moderna “(BAUMAN, 1998, p. 182).

Na modernidade os homens e mulheres viviam um tempo-espaço estruturado e sólido. A pessoa podia se perder e se achar, chegando aonde pretendia estar. Tudo dependia de conhecimento e determinação, a liberdade era como agir com esse conhecimento. O

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psiquismo da modernidade foi a identidade, ela informa quem a pessoa é. Identidade é constituída, atraindo-se pelo que ainda não é mas que pode vir a ser. Não necessariamente se teve fim a modernidade, alguns traços da mesma permanecem conosco, como a esperança de dias melhores.

O mundo contemporâneo

No contemporâneo a ideia de se perder alguma coisa para ganhar outra se mantém, mas se modificam os lugares, pois agora se perde segurança e ganha felicidade. “O princípio de realidade hoje, tem de se defender no tribunal de justiça, onde o princípio do prazer é o juiz que a está presidindo” (BAUMAN, 1998, p. 09).

Ideias de beleza, pureza e ordem não foram abandonados na pós-modernidade, mas agora são realizados através da espontaneidade, do desejo e do esforço individual.

Os homens e as mulheres pós-modernos trocaram um quinhão de suas possibilidades de segurança por um quinhão de felicidade. Os mal-estares da

modernidade provinham de uma espécie de segurança que tolerava uma liberdade pequena demais na busca da felicidade individual. Os mal-estares da pós-modernidade provêm de uma espécie de liberdade de procura do prazer que tolera uma segurança individual pequena demais. (BAUMAN, 1998, p. 10, grifo do autor).

A modernidade estava muito ligada a pureza e higiene, sendo esta realizada pela eliminação da sujeira que ocasionava a fragilidade da ordem. Se pensarmos por este caminho, quais seriam as pessoas que fogem desta ordem, ou seja, qual seria a sujeira do contemporâneo? Os modelos de pureza mudam constantemente, e coisas que antes eram comuns e familiares podem acabar a se tornar a sujeira. A incerteza e a desconfiança acabam por governar a pós-modernidade.

Estranhos não se encaixam no mapa cognitivo, moral ou estético do mundo. Cada sociedade produz sua espécie de estranhos de acordo com a sua maneira, mas toda sociedade produz estranhos, esses mesmos ocasionam incertezas. Vizinhos de porta, família, que antes eram redes de segurança, podem de a noite para o dia virarem estranhos, dependendo do tipo de ordem que está ativa. Houve mudanças nas relações interpessoais, não se tem mais laços duradouros e seguros, tudo está muito conectado ao consumismo. As relações são

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estabelecidas e mantidas pelo que essa pessoa possuí. As habilidades individuais estão ligadas a tecnologia que são compradas no mercado.

Os homens e mulheres pós-modernos são seduzidos pelas experiências de aventuras não possuindo medo de se perderem, não fixando nenhum tipo de compromisso. São levados ao mercado consumidor que consegue organizar para que o homem mantenha sua procura permanente e sempre insatisfeita. Sempre estamos procurando por satisfação, mas essa é somente parcial, pois nosso objeto de causa de desejo é para sempre perdido. No entanto, isso é capturado pelo mercado consumidor.

Nessa mudança de disposição, são ajudados e favorecidos por um mercado inteiramente organizado em torno da procura do consumidor e vigorosamente interessado em manter essa procura permanentemente insatisfeita, prevenindo, assim, a ossificação de quaisquer hábitos adquiridos, e excitando o apetite dos consumidores para sensações cada vez mais intensas e sempre novas experiências. (BAUMAN, 1998, p. 23).

No mundo contemporâneo se vive em constante competição, em relação a beleza e a estilos. Por isso o teste de pureza da pós-modernidade é conseguir ser capaz de se deixar seduzir pelas possibilidades que o mercado consumidor oferece e de conseguir manter este mesmo, podendo assim conseguir vestir e “comprar” identidades, passando a vida inteira nesta interminável busca por novas experiências, sensações e identidades.

Existem pessoas que não tem os recursos suficientes para responder a demanda deste mercado consumidor e de seus atrativos, são os chamados consumidores falhos. Esses mesmos, são a “sujeira”, os novos “impuros” da contemporaneidade, pois não se ajustam ao novo ideal de pureza da época. Sendo a liberdade, uma relação de poder, na qual os mais “ricos” tem maior poder e liberdade em relação aos “pobres”.

Uma vez que o critério da pureza é a aptidão de participar do jogo consumista, os deixados fora como um “problema”, como a “sujeira” que precisa ser removida, são

consumidores falhos – pessoas incapazes de responder aos atrativos do mercado

consumidor porque lhes faltam recursos requeridos, pessoas incapazes de ser “indivíduos livres” conforme o senso de “liberdade” definido em função do poder de escolha do consumidor. (BAUMAN, 1998, p. 24, grifo do autor).

A limpeza de separar e eliminar estas pessoas consideradas como impuros, fica desregulamentado e privatizado. Os centros comerciais impedem a entrada destes consumidores falhos e realizam vigilâncias por meio de câmeras, alarmes e seguranças armados. Possibilitando que os consumidores afortunados possam viver livremente e felizes, nas suas casas cercados de muralhas.

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Os mais odiados impuros da contemporaneidade não possuem condições de se manter ativo no meio consumista, sendo assim, acabam por desrespeitar ou realizar com as próprias mãos a lei. Esses mesmos são os assaltantes, ladrões e furtadores. A busca pela pureza se expressa pelos meios punitivos contra as classes consideradas perigosas para a sociedade. Essas mesmas, são os moradores de ruas pobres e das áreas urbanas mais perigosas e proibidas. Por isso a população encarcerada tem aumentado, e todos os outros que cercam este meio, como advogados, policiais e fornecedores de equipamento carcerários também.

Na contemporaneidade os laços são fragilizados. Se perde a confiança e a segurança que tínhamos na modernidade. Os empregos, as posições, e as carreiras não apresentam mais garantias e seguranças. Carreiras que no momento pareciam sedutoras, acabam se tornando suicidas a partir do momento que a prática e a experiência se convertem em reponsabilidades e haveres a serem cumpridos.

Em nossos tempos pós-modernos os sujeitos sofrem permanentemente do que podemos considerar problema de identidade mal resolvido. Isso ocorre pois lhe faltam recursos para se construir uma identidade sólida e duradoura.

Pensando o mercado de trabalho, os sem empregos deixaram de ser mão-de-obra reserva e passaram a ser desempregados. Atualmente não se pensa em oportunizar qualificações e empregos a essas pessoas, só se pensa em racionalizar, cortar e reduzir funcionários, para melhorias econômicas da empresa. As pessoas sempre que possível, são substituídas por máquinas e meios tecnológicos. Empregos duradouros já não existem, o que dificulta que as pessoas possam realizar projetos e planos de vida futuramente.

Os dispositivos da previdência que antes era um direito do cidadão e realizada de forma coletiva, passa a ser concentrada somente nos que necessitarem dele, sendo sujeitados a verificação de sua necessidade por meios cada vez mais humilhantes, na qual são comparados ou difamados pelo meio público sendo pessoas que “roubam” dinheiro dos contribuintes ou até mesmo usuários de drogas. O seguro contra os ricos deixa de ser coletivo e passa a ser privatizado. “A responsabilidade pela situação humana foi privatizada e os instrumentos e métodos de responsabilidade foram desregulamentados” (BAUMAN, 1998, p. 54)

O processo produtivo que era coletivo, buscava avanços por meio de esforços coletivos, mas esses produtores, foram substituídos pelos consumidores, se tornando individuais, pois “ao contrário do processo produtivo, o consumo é uma atividade inteiramente individual. Ele também coloca os indivíduos em campos opostos, em que frequentemente se atacam” (BAUMAN, 1998, p. 54).

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Quando controlava a conduta disciplinada de seus membros por meio de seus papéis produtivos, a sociedade incitava formas combinadas e a busca de avanço mediante esforços coletivos. A sociedade que obtém padrões de comportamento para uma ordem mais estável daqueles seus integrantes que se viram expulsos, ou estão prestes a ser expulsos, de suas posições de produtores e definidos em vez disso, primordialmente, como consumidores, desencoraja a fundamentação da esperança em ações coletivas. (BAUMAN, 1998, p. 54).

O consumo se caracteriza assim, como sendo o novo estabelecimento da ordem da contemporaneidade. O mercado consumidor tem um poder de sedução, porque realça os sonhos e desejos das pessoas. Pode ser comparado a um jogo, na qual os jogares incapazes devem ser mantidos fora deste jogo.

Dada a natureza do jogo agora disputado, as agruras e tormentos dos que dele são excluídos, outrora encarados como um malogro coletivamente causado e que precisava ser tratado com meios coletivos, só podem ser redefinidos como um crime

individual. As "classes perigosas" são assim redefinidas como classes de criminosos.

E, desse modo, as prisões agora, completa e verdadeiramente, fazem as vezes das definhantes instituições do bem-estar. (BAUMAN, 1998, p. 57, grifo do autor).

Os excluídos do jogo são os consumidores falhos ou insatisfeitos, cujo não conseguem a partir dos seus meios alcançar seus desejos, ou seja, aqueles que não possuem dinheiro, pensando que o dinheiro é o possibilitador da felicidade. Pensando assim, ser pobre na pós-modernidade é encarado como crime.

Podemos pensar essa era, como sendo a que teve uma expansão mundial em todos os sentidos, tanto da comunicação, tecnologia e da indústria. A pobreza que antes era um problema e uma dificuldade local sendo “tratada” em coletivo, passa a ser no contemporâneo, algo relativamente privado.

A pós- modernidade apresenta questões de desigualdade a partir do momento que se brutaliza os pobres, a sociedade que é seduzida pelo consumo e que mantém essa condição de um lado, e por outro lado a classe baixa na qual não se tem lugar ou perspectiva de lugar na sociedade. Esses últimos, são privados por meio legais, de manter esse ciclo vicioso do consumo considerado como um valor supremo de uma qualidade de vida agradável. Sendo assim, passam a remeter a meios ilegais para obtenção de satisfação, ou seja, são remetidos as drogas, sendo a droga um instrumento do pobre e o consumismo um êxtase do rico.

Podemos relacionar a droga e o consumo com a castração. Pois ambos são objetos que possuem uma função frente a falta constituinte do sujeito, ambas as duas “saídas” são

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ilusórias, se apresentam como objetos que satisfazem o desejo. Ambas também são temporárias, pois nada aplaca o desejo por completo, sendo novamente remetido ao uso das drogas ou a uma nova compra.

Os ricos supostamente satisfeitos são os que desfrutam de sua liberdade pessoal pois reagem alegremente com o mercado consumidor, são facilmente seduzidos pelas ofertas do mercado e possuem recursos para conseguir manter estas ofertas. Aqueles que não possuem condições de seguir o mercado consumidor, se transformam em um consumidor falho, sem possuir liberdade de escolha, pois não estão no padrão de ideal imposto pela sociedade, ou seja, os pobres acabam sendo inúteis para o mercado que são direcionados para os consumidores ativos e também para o estado pois não movimentam a economia.

Os pobres não são mais os exploradores que produziam o produto para ser transformado em capital na modernidade, ou o exército de mão-de-obra reserva que era preparado para ser reintegrado no trabalho quando apto. O pobre, no momento atual, passa a ser excluídos, do que é considerado “normal”. Para a economia não serve de nada, é completamente inútil, sendo a sua existência só sendo explicada pelo fato de sua presença “servir” para ser excluída da sociedade considerada normal, “... a sociedade que se reproduz por meio do jogo da oferta ao consumidor e escolha do consumidor, mediado pela atração e sedução” (BAUMAN, 1925, p. 77).

Não se investe mais na preparação desses sujeitos para que possam voltar ao processo produtivo, ao mercado de trabalho, é um investimento da qual a economia não pode se dar o luxo e nem se justifica o porquê de se investir. O que antes era investido nas pessoas que estavam temporariamente desempregadas, agora é investido nas prisões e meios de vigilância eficazes.

A partir deste mundo fragmentado, se constrói uma política fragmentada que

corresponde exatamente à rápida e fugaz atenção da era do espaço reduzido e tempo achatado -o tipo de atenção conhecida por sua incapacidade para se concentrar, se fixar, se prender a um objeto por mais tempo do que a atração da novidade dure; uma atenção que se esgota antes de consumir o seu objeto se desloca perpetuamente na busca de novas atrações, adquirindo ao processo notáveis habilidades de patinação e deslizamento, mas se esquivando a todo mergulho e escavação profundos (BAUMAN, 1998, p. 87).

Como na modernidade, se tinha os párias e os arrivistas, na pós-modernidade, se tem os turistas e os vagabundos, considerados as metáforas da vida contemporânea. Como o eixo desta época é evitar se fixar em uma identidade apenas, os turistas são exemplo dessa evitação. Os turistas se tornam viajantes, colocando seus sonhos e desejos acima das

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realidades de sua casa, abandonando o local que está quando novas experiências e oportunidades surgem. Para eles, isso é considerado liberdade e autonomia. Os turistas são os heróis da época, já os vagabundos, considerados as vítimas da era pós-moderna. Os vagabundos, não permanecem em lugar nenhum, por mais que seu desejo seja ficar, ele não é bem-vindo em lugar algum, não havendo outra escolha a não ser viajar novamente a procura de outro lugar. Pode-se dizer que os vagabundos são turistas involuntários.

O mundo que era constituído de objetos duráveis foi substituído pelo mundo de produtos disponíveis projetados para imediata obsolescência. As identidades são trocadas e descartadas, vivendo um dia de cada vez, sem compromissos a longo prazo. No contemporâneo se evita a fixação, não se fixa a lugar nenhum, a nenhuma vocação, relacionamentos e nem trabalho. Tempo futuro não está estruturado no espaço do pós-moderno. Não há mais para frente e para atrás, mas sim não ficar parado, sempre estar em movimento. Saber adequar-se as condições e situações do cotidiano.

Desde a era moderna se tem a questão de como construir identidade, e como torná-la universal e reconhecida. O que muda, da era moderna para a pós-modernidade é que atualmente a identidade enfrenta dificuldades em se manter fixa, se tem uma necessidade em não se manter e nem firmar excessivamente uma identidade, a fim de que possa ser trocada por outra quando preciso.

Podemos pensar no contemporâneo também sobre a segunda revolução sexual. Na qual considera apagar tudo sobre a primeira revolução e que vai remeter a um enfraquecimento do ninho familiar e uma dissociação do envolvimento romântico do amor erótico. Se na primeira revolução o sexo serviu para a construção de estruturas sociais duráveis e que essas faziam parte da construção de ordem e que a sexualidade estava relacionada a preservação das obrigações, a segunda revolução nos remete a uma coleção de experiências, sendo utilizados os critérios aptidão corporal e adequação individual.

As crianças são mantidas a distância da intimidade e amor dos pais. O sexo é um dos temas que mais assombra as famílias. O medo provem dos pais e de seu desejo sexual. Não é sobre o que a criança deseja ou pode realizar com seu impulso, mas no que os pais mandam fazer ou que o podem fazer. A criança não aparece mais como sujeito do desejo sexual, mas como objeto sexual.

As crianças agora são consideradas principalmente objetos sexuais e vítimas potenciais de seus pais como sujeitos sexuais e, visto que os pais são por natureza mais forte do que os filhos e colocados na posição do poder, a sexualidade dos pais

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pode facilmente levar ao abuso desse poder, a serviço dos instintos sexuais dos pais. (BAUMAN, 1998, p. 187, grifo do autor).

Podemos pensar que a liberdade individual no contemporâneo veio para substituir e fazer repensar todos os outros valores existentes. Estamos numa permanente fuga de nossas relações, empregos e identidades. Vivemos em um mundo de fragilidades e insegurança. A pós-modernidade nos faz remeter a um espelho totalmente necessário para que possamos nos reconhecer e nos encontrarmos.

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CAPÍTULO II – CARACTERIZANDO O CONCEITO DE CASTRAÇÃO

Sabemos a grande importância que o conceito de castração possuí na constituição psíquica da criança. É a sua inscrição que permite a criança reconhecer limites e a possibilidade da entrada no registro do simbólico. Mas como este processo acontece? É o que o capítulo a seguir busca apresentar, sobre a maneira como se inscreve a castração na criança juntamente com o complexo de Édipo.

Complexo de castração

A palavra castração vem do latim castratio, e nos destina a pensar sobre a perda da capacidade reprodutora, e posteriormente pensar sobre a remoção dos testículos. A castração geralmente é definida em um primeiro momento de uma maneira orgânica, sendo pensada como a mutilação dos órgãos genitais. Mas não podemos levar este termo sobre seu significado literal, pois a castração que Freud (1900/1976) nos apresenta por meio da Psicanálise é pensada simbolicamente, se distanciando da ideia de castração do real. Este termo juntamente com o complexo de Édipo e o recalcamento, forma a tríade da sexualidade. Sendo este conceito, sexualidade, muito mais ampla do que apenas os órgãos genitais, sendo este termo como um todo, termo que Freud nos apresenta para além do sexo, sendo sexualidade como pulsão sexual sublimada, função egóica e como sendo a base de tudo, ao contrário do sexo que se refere ao órgão genital e seu prazer.

A castração não deixa de ser um corte, uma perda simbólica, possibilitando a saída da criança do narcisismo ingressando-o em um novo tempo, sendo esse do reconhecimento do outro. Para Freud a castração tem referência nos tempos da horda primitiva, na qual os filhos eram castrados pelo pai, para este, poder possuir todas as mulheres para si.

Vivências de desmame e a separação da criança da mãe ao nascer irão se produzir em uma relação dual entre este filho e a mãe. As vivências de castração acontecem quando um terceiro entra nesta relação, proibindo a ligação dual da mãe com o filho. Este terceiro, é a figura paterna, na qual irá dar a ordem e impor limites a criança, que posteriormente será internalizado na lei e na cultura. Segundo Freud, existe um desenvolvimento diferente entre os meninos e as meninas.

Na menina, no primeiro momento, o clitóris tem a mesma proporção que o órgão sexual masculino, se apresentando como um pênis. No decorrer ela se dá conta de uma diferenciação a partir do momento que efetua uma comparação com uma pessoa do sexo

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oposto, embora ainda não consiga reconhecer essa pessoa sendo do outro sexo. A menina nota que é desfavorecida, se sentindo injustiçada na qual a descobre que não possuí o pênis e passa a invejá-lo. Por um determinado tempo a menina tem a esperança de que quando ficar mais velha irá adquirir um. Com o passar do tempo, percebe que isto não irá acontecer e chega a conclusão de que o mesmo esteve lá, mas lhe foi tirado. Ela se vê desprovida de algo que considerava sendo universal e que todos possuíam. Essa conclusão é muito significativa emocionalmente, na qual se ingressa a menina na conflitiva edípica. O resultado de sua castração se apresenta pela falta do pênis, sendo necessário que a criança se posicione a um acordo com a castração em relação a si mesma. Na menina, não se coloca a ameaça da castração:

(...) o Édipo não é destruído, mas criado pela influência da castração, uma vez que responsabiliza a mãe por não ter merecido dela a proteção necessária que teria impedido a castração. Inaugura-se, assim, a possibilidade da desvinculação da menina de sua mãe. (HAUSEN, 2013, p. 58).

A menina não abandona com facilidade o desejo de se ter o pênis, ela espera muito tempo que este se desenvolva, o que não ocorre, deixando marcas que só serão suportadas pela descarga de energia psíquica.

Em relação a castração do menino, a situação acontece diferente. O mesmo possuí em um primeiro momento uma atração erótica pela sua mãe, que é barrado pela figura paterna, que irá deixar claro que o desejo da mãe não é pelo filho. Então o menino transforma esse desejo em seu próprio órgão genital, que seria o pênis. Ocasionando o início de atos masturbatórios, na qual a mãe presencia e o proíbe de realizar a masturbação, ameaçando a castração se o mesmo continuar. Isto para o menino se coloca como uma verdade, pois ele se compara a anatomia feminina, na qual vê que não se tem o pênis, e considera que isto aconteceu porque a menina foi castrada. O menino acredita que a castração virá da figura paterna que ele tem internalizado, sendo este considerado como um trauma necessário para a constituição.

A reação a esse trauma afeta todas as relações do menino com as figuras parentais que ele tiver. Acaba se criando um espaço de submissão diante do pai, que representa uma figura de autoridade. Embora o menino se identifique com o pai pois os dois possuem o mesmo desejo pela mãe, este mesmo também se identifica com a mãe, que exerce uma postura de submissão perante a esse pai autoritário, o mesmo papel que o menino também

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exerce. A partir disto, os atos masturbatórios cessam, sendo necessário a criação da fantasia para descarga de energia.

Já na menina, essa mesma deixa de se identificar com a mãe quando se dá conta de que é castrada, e a culpada pela sua castração passa a ser a mãe, e o pai passa a ser seu objeto de desejo. Primeiramente a menina se relaciona com o pai com o objetivo de se ter um pênis, quando se dá conta de que isto não irá acontecer, passa a ter o desejo de se ter um filho com este pai.

A suposição de uma genitália idêntica entre os sexos é um pressuposto de verdade entre as crianças, afirma, é uma das teorias sexuais infantis usadas para dar conta do enigma do nascimento, da questão oferecida pela esfinge: afinal de contas, quem sou eu? Ao perceberem a diferença anatômica, nesse tempo ainda tomando equivalência clitóris/pênis, pressupõem-na devida à castração: aos meninos é oferecida a possibilidade de preservarem seu órgão obedecendo à ordem paterna; às meninas fica o lamento e a certeza de haverem perdido aquele que era o único órgão conhecido. (HAUSEN, 2013, p. 47)

São as teorias infantis descritas por Freud (1900), e como se dá seu destino que dará conta do temor que é pra criança ser castigada por desejos que ela desconhece conscientemente e que são proibidos. Essas teorias se fundam como fantasias inconscientes no psiquismo. Embora possa parecer assustador, é a marca da castração, que irá possibilitar ao sujeito reconhecer o limite, o respeito e o lugar que o outro ocupa.

É por meio da mesma que o sujeito estabelece sua relação com o mundo, deixa para trás seu modelo narcísico e passa a ter a noção de que seu corpo possui um limite que vai para além de seu desejo. “O processo civilizatório, proposto pelo complexo edípico, evidencia ao sujeito a necessidade de abandonar o pressuposto do tudo posso” (HAUSEN, 2013, p. 60).

Esse processo civilizatório, como já foi mencionado, impõe que as pulsões sejam recalcadas, constituindo um sujeito na qual Lacan denomina sujeito do inconsciente ou sujeito barrado. “A concepção do conceito de castração se refere, portanto, à norma, constituindo-se como a marca do ingresso do sujeito humano na cultura” (HAUSEN, 2013, p. 61).

Figura Paterna apresentada na Castração e o Complexo de Édipo

Essa figura paterna, apresentada a criança e que realiza a castração, não é o pai da paternidade comum. Não se trata aqui, de pensarmos esse pai no biológico, mas sim esse

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mesmo, como uma função, ou seja, a função paterna, que irá ser o operador do simbólico. O pai simbólico é a referência da lei e também da proibição do incesto.

Em primeiro lugar, convém distinguir ir a soberania da função paterna que habitualmente decorre da apelação genérica de Pai simbólico, da sua existência concreta e histórica de ser encarnado enquanto Pai real. Em segundo lugar, é comum levar em consideração o Pai imaginário, entidade fantasística, se é que existe, sem a qual nenhum Pai real poderia receber investidura de Pai simbólico (DOR, 1991, p. 16, grifo do autor).

Pensando assim, este pai simbólico é remetido em um contexto de um significante, que Lacan chamou de significante Nome-do-Pai.

Com efeito, o que autoriza o texto da lei se basta por estar, ele mesmo, no nível do significante. Trata-se do que chamo de Nome-do-Pai, isto é, o pai simbólico. Esse é um termo que subsiste no nível do significante, que, no Outro como sede da lei, representa o Outro. E o significante que dá esteio à lei, que promulga a lei. Esse é o Outro no Outro (LACAN,1957/1958, p. 152).

Para que a lei seja fundada no pai, é preciso que este mesmo seja “assassinado”. Este pai depois de morto, irá promulgar a lei a partir do símbolo do pai. Sendo este mesmo então, o Nome-do-pai, que irá vir como um significante substituindo o significante do desejo da criança pela mãe. Dessa forma, o pai simbólico se coloca como uma metáfora, sendo esta, quando um significante irá se colocar no lugar de outro significante. Essa metáfora, se constitui perante a simbolização inicial e primordial que se constrói na relação da criança com a mãe. Nesta relação o pai é colocado como substituto no lugar da mãe. “A função do pai no complexo de Édipo é ser um significante que substitui o primeiro significante introduzido na simbolização, o significante materno” (LACAN, 1957/1958, p. 180). A construção do pai simbólico a partir do pai real irá permitir a elaboração da dialética edipiana.

No Complexo de Édipo, para além dos elementos principais que seriam o pai, a mãe e o filho, Lacan introduz o falo.

Objeto entendido pela criança como aquele capaz de satisfazer o desejo materno, cujo trânsito no complexo edipiano organizará a subjetividade. No desenvolvimento libidinal, segundo a teoria infantil, todos os seres são portadores deum pênis, essa é a premissa universal: crença no genital masculino. E como articulador do Édipo, o falo é vivenciado em três tempos lógicos propostos por Lacan (Silva, 2007, p. 61).

A criança em um primeiro momento, está numa relação fusional com a mãe, na qual o pai neste momento se apresenta como pai real, mas não está incluído nesta relação da

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criança com a mãe. Neste período, o filho é “como o único objeto que pode satisfazer o

desejo da mãe” (DOR, 1991, p. 46, grifo do autor). Sua primeira relação com a realidade será

a partir dessa mãe e as vivências e experiências que essa mesma vai desenhando e apresentando a criança.

O pai, ainda neste momento, não pode se colocar como pai simbólico pois ainda a criança está na identificação de seu próprio falo que é imaginário, se colocando em uma posição diferente do da castração, pois aqui, a criança se coloca como objeto fálico, sendo esse mesmo, na castração o objeto imaginário. Para o pai operar pela via do simbólico é preciso “que o pai se achasse investido da atribuição fálica” (DOR, 1991, p. 47).

A primeira relação com o Outro que a criança experiência é a sua mãe, na medida em que esta já está simbolizada, sendo esta primeira simbolização na qual a criança consegue ser capaz de articular que a mãe pode estar presente ou pode estar ausente. É o que conhecemos por Fort-da. É a partir dessa primeira simbolização da afirmação do desejo da criança diante do desejo da mãe que se começa a iniciar as complicações das outras simbolizações.

(...) a relação da criança com a mãe, na medida em que a criança revela depender do desejo da mãe, da primeira simbolização da mãe como tal, e de nada mais. Através dessa simbolização a criança desvincula sua dependência efetiva do desejo materno da pura e simples vivência dessa dependência e alguma coisa se institui, sendo subjetivada num nível primário ou primitivo. Essa subjetivação consiste, simplesmente, em instaurar a mãe como aquele ser primordial que pode estar ou não presente. No desejo da criança, em seu desejo próprio, esse ser é essencial. O que deseja o sujeito? Não se trata da simples apetência das atenções, do contato ou da presença da mãe, mas da apetência de seu desejo (LACAN, 1957/1958, p. 188).

A criança começa a se dar conta que não é somente ela que a mãe deseja, e a se perguntar qual seria o motivo das idas e vindas dessa mesma, e a partir daí, vai acabar descobrindo que o significado dessas saídas é o falo. Então, para agradar a mãe, é necessário ser o falo.

No primeiro tempo do Édipo, a criança vai procurar satisfazer o desejo da mãe, aonde está mesma está em busca de seu próprio desejo. O sujeito passa a se identificar com o objeto do desejo da mãe, ou seja, passa a ser o desejo do desejo da mãe, se considerando capaz de se colocar no lugar da falta do outro, ou seja, no lugar do falo. “Essa é a etapa fálica primitiva, aquela em que a metáfora paterna age por si, uma vez que a primazia do falo já está instaurada no mundo pela existência do símbolo do discurso e da lei” (LACAN, 1957/1958, p. 198). A figura paterna neste momento, aparece de uma maneira velada.

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No segundo tempo, “o pai entra em função como privador da mãe, isto é, perfila-se por trás da relação da mãe com o objeto de seu desejo como aquele que castra, coisa que digo apenas entre aspas, pois o que é castrado, no caso, não é o sujeito, e sim a mãe” (LACAN, 1957/1958, p. 191, grifo do autor). O pai priva, através da mãe, a criança de algo que ela não tem, e que só existe como símbolo. Ao mesmo tempo que o pai priva a criança de ser o objeto de desejo da mãe, essa mesma é privada de ser o objeto fálico.

Está bastante claro que o pai não castra a mãe de uma coisa que ela não tem. Para que fique postulado que ela não o tem, é preciso que isso de que se trata já esteja projetado no plano simbólico como símbolo. Mas há de fato uma privação, uma vez que toda privação real exige a simbolização (LACAN, 1957/1958, p. 191).

Ou seja, a demanda que for endereça ao Outro, terá que passar pelo tribunal superior, ou seja o pai. Então “o pai se afirma em sua presença privadora, como aquele que é o suporte da lei, e isso já não é feito de maneira velada, porém de um modo mediado pela mãe, que é quem o instaura como aquele que lhe faz a lei. (LACAN, p. 200).

Começa a se colocar incertezas perante a criança e o pai começa a aparecer como um rival, ou melhor, objeto de rivalidade diante do desejo da mãe. Essas incertezas, no plano imaginário se colocam como a questão de ser ou não ser o falo da mãe.

Neste momento, é necessário a intervenção efetiva do pai. Que anteriormente era considerado como um terceiro.

A partir de agora, quando se trata do ter ou não ter, somos forçados a fazê-lo entrar em consideração. Para começar, convém assinalar que ele é, fora do sujeito, constituído como símbolo. Isso porque, se assim não for, ninguém poderá intervir realmente como revestido desse símbolo. É como personagem real, revestido desse símbolo, que ele passa então a intervir efetivamente na etapa seguinte. (LACAN, 1957/1958, p. 193).

A terceira etapa será decisiva para a saída do Complexo de Édipo. Nesta etapa, o pai se coloca como aquele que tem o falo, sendo colocado no lugar de pai simbólico.

No terceiro tempo, portanto, o pai intervém como real e potente. Esse tempo se sucede a privação ou à castração que incide sobre a mãe, a mãe imaginada, no nível do sujeito, em sua própria posição imaginária, a dela, de dependência. É por intervir como aquele que tem o falo que o pai é internalizado no sujeito como Ideal do eu, e que, a partir daí, não nos esqueçamos, o complexo de Édipo declina (LACAN, 1957/1958, p. 201).

A criança associa a presença do pai como a causa da ausência da mãe, então a criança nomeia este pai, como sendo aquele que movimenta o desejo da mãe. Relacionando

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um significante novo, o Nome-do-Pai ao significante do falo. Nesta etapa, o menino se identifica com o pai, sendo este o possuidor do pênis, e a menina reconhece o homem como aquele que possui esse mesmo.

Neste momento, a criança abandona uma atitude passiva em relação de objeto do desejo do outro e passa a tomar uma atitude psiquicamente ativa, renunciando “à sua identificação primordial ao objeto que satisfaz o desejo do outro”(DOR, 1991, p. 51).A criança obterá acesso ao simbólico e se constituir como sujeito a partir como já mencionado, da metáfora paterna, e seu mecanismo, o recalque originário. Como já explicado, se realiza “uma construção metafórica pela substituição de um símbolo de linguagem por um outro símbolo de linguagem” (DOR, 1991, p. 51).O significante Nome-do-pai pela via metafórica, irá vir para substituir o significante originário, o falo, sendo esse o desejo da mãe, que se torna inconsciente.

Só esse recalque originário é propenso de comprovar que a criança renunciou ao objeto inaugural de seu desejo. “Em outras, palavras, ela só pode renunciar a ele na medida em que aquilo que o significa tornou-se inconsciente para ela” (DOR, 1991, p. 51).

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CAPÍTULO III – A CASTRAÇÃO NO CONTEMPORÂNEO

A partir das diversas mudanças ocorridas entre a era moderna e a pós modernidade apresentadas no primeiro capítulo, podemos constatar que a sociedade atual não é a mesma da sociedade moderna. Estamos vivenciando uma sociedade organizada a partir do consumismo. Onde se predomina o gozar1 a todo custo, sendo impulsionados a um mundo consumista desenfreado, que nos apresentam produtos não como uma escolha, mas sim como uma necessidade.

A nova sociedade, com sua excessiva capacidade de produção, é o lugar dos novos objetos, dos novos perigos, das novas formas de relacionamentos, que eliminam a singularidade. Os antigos ideais foram substituídos por um mais-de-gozar comum. A generalização de mercadorias promove um exagerado consumo que independe da necessidade. A oferta, agora, do discurso capitalista, é a de muitos ideais, com muitas multiplicações, muitas escolhas reversíveis, que fazem com que o sujeito não se fixe em lugar nenhum e se sinta solitário e desamparado. O ideal passou a valer menos que os objetos de consumo (Albuquerque, 2006, p. 63).

As leis sofrem mudanças a todo tempo e já não são as mesmas, e essas mudanças ocorrem dependendo das circunstâncias da situação. Os valores éticos e morais não são mais iguais para todos, o que pode ser ético e/ou moral para um, pode não ser para outro sujeito, e o que prevalece no momento é o individualismo.

As relações e os laços afetivos também apresentam modificações, pois esses mesmos estão se tornando cada vez mais frágeis, e o que se coloca em primeiro lugar é o interesse em algo que o outro possa me oferecer. Diante das inúmeras opções que o mundo oferece é difícil se manter fixo em algo, pois o mundo fluí e anda muito rápido, não permitindo o sujeito se manter em um lugar por muito tempo.

O capitalismo e o mercado consumidor têm ganhado uma grande proporção e com tamanha rapidez, o sujeito não consegue assimilar todas as coisas que estão a sua volta e que lhe estão sendo ofertadas, mas mesmo assim a sociedade impõe que é necessário saber de todos os acontecimentos e que esteja por dentro de todos os lançamentos. “Os efeitos dessa tecnologização e globalização são a impossibilidade de projetos em longo prazo, uma superexposição às mudanças e riscos, e o sujeito tem de dar conta de tudo isso” (GOMES, 2011, p. 50)

1 Segundo Albuquerque (2006), gozo, para a Psicanálise, é diferente de prazer. O sujeito vai em busca

do prazer, mas que este mesmo é impossibilitado pois o simbólico não consegue alcançá-lo, sendo o gozo, uma manifestação de dor e de sofrimento da ordem do real. Pode-se pensar, que o gozo é a satisfação pulsional que se volta contra o sujeito.

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O sujeito torna-se, por excelência, um consumidor dedicado a calcular a relação entre o custo e o benefício da aplicação do seu tempo, do seu conhecimento e do lazer. Por conseguinte, nasce uma nova moral. A moral burguesa do trabalho, da produção, convoca ao recalque do gozo em proveito das realizações culturais. Qual é a nova moral? Hoje, a produção de excedentes inverteu a relação entre oferta e procura: primeiro se inventa o produto só depois se cria a demanda, o consumidor ideal (SANTOS, 2001, p. 308 apud GOMES, 2011, p. 50).

Diante de todas essas mudanças, podemos notar que o termo castração apresentada por Freud, sofre modificações no mundo contemporâneo. O contemporâneo coloca em questão a castração.

Da mesma forma, podemos observar que as relações entre pais e filhos também sofrem alterações. A entrada da indústria do consumo está cada vez mais presente nesta relação, e os pais cada vez mais permissíveis com isto, possibilitando as crianças possuírem tudo o que desejam, não havendo o tempo de o processo da criança desejar determinado objeto e esperar para conquista-lo se possível.

As pulsões que antes não se completavam e que eram barrados pois tinham que passar pelo Outro, sendo este a função paterna, e por consequência orientadas pelo Superego, era o que mantinham os laços sociais estáveis e em harmonia. A civilização se constrói a partir dessas pulsões barradas, na qual os impulsos de ordem sexual e agressivas necessitam serem renunciadas. É por meio da função paterna e da castração que o desejo da criança em relação a sua mãe é barrado, possibilitando está criança entrar no registro simbólico.

A função paterna na atualidade, não oferece mais referência para o sujeito em constituição, que está inserido em um mundo em transformação. O nome-do-pai que oferecia os valores, os limites, as rotinas e tradições está se universalizando, de uma maneira como um saber outro, fora do pai, não é o pai quem sabe, mas agora que sabe são os manuais de como educar os filhos e as dicas apresentadas nos programas de televisão. Com efeito disso, a subjetividade e a singularidade destes sujeitos vão se perdendo. E sem referência como é possível o sujeito se constituir psiquicamente? Neste mundo onde todos desejam ter tudo, a palavra “não” fica difícil de se colocar no discurso da sociedade e principalmente no discurso dos pais.

O Outro como aquele que dita e regulamenta como gozar e do que gozar, está permitindo cada vez mais que se possa gozar de tudo que a sociedade, e principalmente o mercado consumidor oferece, não se permitindo dizer não para si mesmo, por consequência disso não consegue dizer não para um outro sujeito, que está vivenciando uma era de gozar a toda hora e sobre qualquer preço, pois a grande questão da pós modernidade é ser feliz a

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