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Coleção as Lygias: coleção de roupas e estampas inspiradas nas artistas Lygia Clark e Lygia Pape

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Academic year: 2021

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CAROLINA DE AMORIM GRITTEN DAFHENY GIOVANA PACHECO DO CARMO

COLEÇÃO AS LYGIAS: COLEÇÃO DE ROUPAS E ESTAMPAS

INSPIRADAS NAS ARTISTAS LYGIA CLARK E LYGIA PAPE

TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO

CURITIBA 2017

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COLEÇÃO AS LYGIAS: COLEÇÃO DE ROUPAS E ESTAMPAS

INSPIRADAS NAS ARTISTAS LYGIA CLARK E LYGIA PAPE

Trabalho de Conclusão de Curso de graduação, apresentado à disciplina de Trabalho de Conclusão de Curso 2, do curso superior de Tecnologia em Design Gráfico do Departamento Acadêmico de Desenho Industrial - DADIN, da Universidade Tecnológica Federal do Paraná – UTFPR, como requisito parcial para obtenção do título tecnológico.

Orientadora: Profª. MSc. Simone Landal

CURITIBA 2017

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TERMO DE APROVAÇÃO

TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO 032

COLEÇÃO AS LYGIAS: COLEÇÃO DE ROUPAS E ESTAMPAS INSPIRADAS NAS ARTISTAS LYGIA CLARK E LYGIA PAPE

por

Carolina de Amorim Gritten – 1213075

Dafheny Giovana Pacheco do Carmo – 1558170

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado no dia 27 de novembro de 2017 como requisito parcial para a obtenção do título de TECNÓLOGO EM DESIGN GRÁFICO, do Curso Superior de Tecnologia em Design Gráfico, do Departamento Acadêmico de Desenho Industrial, da Universidade Tecnológica Federal do Paraná. As alunas foram arguidas pela Banca Examinadora composta pelos professores abaixo, que após deliberação, consideraram o trabalho aprovado.

Banca Examinadora: Profa. Eunice Liu (Dra.) Avaliadora

DADIN – UTFPR

Profa. Luciana Martha Silveira (Dra.) Convidada

DADIN – UTFPR

Profa. Simone Landal (MSc.)

Orientadora

DADIN – UTFPR

Prof. André de Souza Lucca (Dr.) Professor Responsável pelo TCC DADIN – UTFPR

“A Folha de Aprovação assinada encontra-se na Coordenação do Curso”.

Diretoria de Graduação e Educação Profissional Departamento Acadêmico de Desenho Industrial

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AGRADECIMENTOS

Agradecemos primeiramente à nossa orientadora Simone Landal, que em meio a tantos compromissos acadêmicos, se comprometeu e acreditou em nosso projeto.

A nossos pais e familiares pelo apoio e incentivo ao longo de nossa formação e compreensão durante as fases que mais exigiram nossa ausência.

A nossos companheiros pelo carinho e participação no projeto nos momentos que mais precisamos.

E finalmente a nossas amigas e amigos que participaram da troca de ideias, se colocando à disposição nas horas de necessidade durante o projeto.

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RESUMO

CARMO, Dafheny G. Pacheco do; GRITTEN, Carolina de Amorim. Coleção As Lygias: Coleção de Roupas e Estampas Inspiradas nas Artistas Lygia Clark e Lygia Pape. Trabalho de Conclusão de Curso. Universidade Tecnológica Federal do Paraná. Curitiba, 2017.

O presente trabalho, desenvolvido para a conclusão do curso de Tecnologia em Design Gráfico da UTFPR, apresenta a união das áreas de Design Gráfico e Design de Moda, apoiando-se em conhecimentos adquiridos nas duas áreas. O projeto consiste na criação de roupas e estampas com inspiração em obras das artistas brasileiras Lygia Clark e Lygia Pape. Desta maneira pretende-se atrair mais atenção para o trabalho das duas artistas, muito reconhecido no cenário da arte, mas pouco lembrado pelo público em geral. As duas artistas tinham como objetivo aproximar a arte da vida das pessoas, e a criação de peças de roupa pode ser uma forma de realizar essa aproximação. A pesquisa se iniciou acerca do movimento artístico Neoconcretismo, do qual as duas artistas participaram, e um estudo da vida e obra das artistas, dando enfoque às duas obras selecionadas como inspiração para a coleção: Ttéias (2002) de Lygia Pape e Bichos (1960) de Lygia Clark. Em seguida são abordados conceitos acerca de Moda e Design de Superfície. O projeto de estamparia foi focado na criação de estampas localizadas, aplicadas às peças através da técnica de sublimação. As peças foram desenvolvidas com base em conceitos de moda mais sustentável e modelagem sem resíduo. Para completar o projeto, foi criada uma marca gráfica para a coleção, tags para acompanhar as peças e um catálogo de coleção. Palavras-chave: Design Gráfico, Design de Moda, Estamparia têxtil, Arte brasileira, Lygia Clark, Lygia Pape

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ABSTRACT

CARMO, Dafheny G. Pacheco do; GRITTEN, Carolina de Amorim. As Lygias Collection: Prints and fashion collection inspired by the artists Lygia Clark and Lygia Pape. Final year research project. Federal University of Technology - Paraná, Curitiba, 2017.

The following project, developed for the conclusion of the UTFPR Graphic Design Technology course, presents the union of Graphic Design and Fashion Design, drawing on the knowledge acquired in both areas. The project consists of creating clothes and prints inspired by works of Brazilian artists Lygia Clark and Lygia Pape. In this way it is intended to attract more attention to their work, well recognized in the art scene, but little remembered by the general public. Both artists aimed to bring art and people's lives closer together, and the creation of pieces of clothing could be a way of achieving this approach. The research begins on the Neoconcretism artistic movement, of which both artists participated, and a study of the life and work of the artists, focusing on the two selected works as inspiration for the collection: Ttéias (2002) by Lygia Pape and Bichos (1960) by Lygia Clark. Concepts about Fashion and Surface Design are discussed below. The stamping project is focused on the creation of localized prints, which will be applied to the clothes through the technique of sublimation. The pieces will be developed based on more sustainable fashion concepts and no waste pattern cutting. To complete the project, a graphic mark will be created for the collection, alongside hanging tags to accompany the pieces, and a collection catalog.

Key words: Graphic Design, Fashion Design, Textile printing, Brazilian art, Lygia Clark, Lygia Pape

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1: Livro da Criação ... 21

Figura 2: Ballets Neoconcretos ... 22

Figura 3: Tecelares ... 23

Figura 4: Caixa das baratas ... 25

Figura 5: O Ovo, O Divisor, Roda dos Prazeres ... 25

Figura 6: Relevos ... 27

Figura 7: Ttéia 1A ... 27

Figura 8: Ttéia 1C ... 28

Figura 9: Superfícies Moduladas e Espaços Modulados ... 30

Figura 10: Casulos, Bichos... 31

Figura 11: Trepantes, Obra mole ... 31

Figura 12: Máscaras Sensoriais, Máscaras Abismo ... 32

Figura 13: Objetos Relacionais ... 32

Figura 14: Caminhando ... 33

Figura 15: Bichos ... 35

Figura 16: Ação do Fashion Revolution week ... 45

Figura 17: Costureiras e costureiros respondendo à pergunta “Quem fez minhas roupas?” ... 46

Figura 18: Metodologia de modelagem sem resíduo ... 51

Figura 19: Brainstorming de conceitos ligados às obras ... 57

Figura 20: Painel semântico: Modelagem sem resíduo ... 58

Figura 21: Painel Semântico de Público alvo ... 60

Figura 22: Painel semântico: Ttéias ... 63

Figura 23: Painel semântico: Bichos ... 63

Figura 24: Painel semântico da tendência futuro sem pressa ... 64

Figura 25: Miniaturas de peças piloto em tecido ... 67

Figura 26: Prova das peças piloto em miniatura ... 67

Figura 27: Croquis das alternativas ... 68

Figura 28: Fotografia da instalação Ttéias ... 69

Figura 29: Fotografia da instalação Ttéias ... 70

Figura 30: Fotografia da Instalação Ttéias ... 70

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Figura 32: Fotografias da instalação Ttéias manipuladas digitalmente pelas autoras

... 71

Figura 33: Primeiras alternativas de estampas localizadas ... 72

Figura 34: Estampas em rapport – alternativas eliminadas ... 73

Figura 35: Croquis com aplicação das estampas ... 74

Figura 36: Novos módulos de estampas ... 75

Figura 37: Cartela de cores da Coleção ... 76

Figura 38: Cartela de cores definitiva da Coleção ... 77

Figura 39: Estampa 001 ... 77

Figura 40: Estampa 002A e 002B ... 78

Figura 41: Estampa 003 ... 78 Figura 42: Estampa 004 ... 79 Figura 43: Estampa 005 ... 79 Figura 44: Estampa 006 ... 80 Figura 45: Estampa 007 ... 80 Figura 46: Estampa 008 ... 81

Figura 47: Novos croquis com estampas ... 81

Figura 48: Croquis com novas estampas ... 82

Figura 49: Croquis com novas estampas ... 83

Figura 50: Molde das peças Vestido Longo (modelo 009) e Blusa Gola ampla (modelo 001) ... 84

Figura 51: Processo de medida e corte do tecido para confecção das peças... 85

Figura 52: Processo de costura das primeiras peças piloto ... 86

Figura 53: Primeiras peças piloto concluídas ... 87

Figura 54: Molde do Vestido Nipônica ... 88

Figura 55: Processo de impressão das amostras de cores das estampas ... 89

Figura 56: Amostras de cores sobre o tecido, após teste de lavagem. ... 89

Figura 57: Moldes e estampas preparados para impressão ... 90

Figura 58: Moldes e estampas preparados para impressão ... 91

Figura 59: Peças piloto definitivas costuradas ... 93

Figura 60: Primeiras alternativas para o logotipo ... 95

Figura 61: Segunda etapa da geração de alternativas para o logotipo da coleção ... 95

Figura 62: Versão final do logotipo da coleção... 96

(9)

Figura 64: Artes desenvolvidas para as Tags ... 98

Figura 65: Verso das tags contendo texto explicativo ... 99

Figura 66: Frente das tags com estampa em Vermelho-Minério e Azul-Nuvem ... 100

Figura 67: Verso das tags com estampa em Vermelho-Minério e Azul-Nuvem ... 100

Figura 68: Frente das tags com estampa em Verde-enxofre e Azul-nuvem ... 101

Figura 69: Verso das tags com estampa em Verde-enxofre e Azul-nuvem ... 101

Figura 70: Foto conceitual da coleção ... 102

Figura 71: Fotos do lookbook ... 103

Figura 72: Fotos do Lookbook ... 104

Figura 73: Fotos do Lookbook ... 105

Figura 74: Painel semântico de referências para o Catálogo ... 106

Figura 75: Geração de alternativas de fundos para páginas do catálogo. ... 107

Figura 76: Geração de alternativas de capa ... 108

Figura 77: Alternativa final de capa ... 109

Figura 78: Catálogo impresso - páginas sobre o conceito da coleção ... 110

Figura 79: Catálogo impresso - páginas sobre o conceito da coleção ... 110

Figura 80: Catálogo impresso - páginas sobre o conceito da coleção ... 111

Figura 81: Catálogo impresso – páginas sobre o conceito da coleção ... 111

Figura 82: Catálogo impresso – páginas do Lookbook ... 112

Figura 83: Catálogo impresso – páginas do Lookbook ... 112

Figura 84: Arte de chamada para o evento de pesquisa ... 113

Figura 85: Peças preparadas para o desfile da Coleção ... 119

Figura 86: Preparação colaborativa para o desfile ... 119

Figura 87: Apresentação do conceito da coleção ... 120

Figura 88: Público da apresentação ... 120

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LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1: Respostas à pergunta “Você já conhecia as artistas Lygia Pape e Lygia

Clark?” ... 114

Gráfico 2: Respostas à pergunta “Você compraria alguma das peças?” ... 115

Gráfico 3: Respostas à pergunta “Qual foi a peça que você mais gostou?” ... 115

Gráfico 4: Respostas à pergunta “Qual foi a peça que você menos gostou?” ... 116

Gráfico 5: Respostas à pergunta: “Quanto você acha justo pagar pelas peças que mais gostou?” ... 116

Gráfico 6: Resultado de avaliação de valor dos produtos pelo público masculino. . 117

Gráfico 7: Resultado de avaliação de valor dos produtos pelo público feminino ... 117

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1: Mix de Coleção ... 61 Tabela 2: Mix de Coleção atualizado ... 88

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LISTA DE SIGLAS

WGSN World Global Style Network

CMYK Sistema de cores composto por Ciano, Magenta, Amarelo e Preto PET “Polyethylene Terephthalate” ou Poli Tereftalato de Etila, tipo de

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 14

1.1 JUSTIFICATIVA ... 15

1.2 PLANO DE TRABALHO ... 16

2 APROXIMAÇÃO AO NEOCONCRETISMO E OBRA DAS ARTISTAS ... 18

2.1 NEOCONCRETISMO ... 18

2.2 LYGIA PAPE ... 20

2.2.1 Período Frente e Neoconcretismo ... 22

2.3 TTÉIAS (2002) ... 26

2.4 LYGIA CLARK ... 29

2.5 BICHOS (1960) ... 34

2.6 CONSIDERAÇÕES SOBRE AS ARTISTAS ... 37

3 MODA E DESIGN DE SUPERFÍCIE ... 39

3.1 CONCEITOS ACERCA DO TERMO MODA ... 39

3.2 TENDÊNCIAS ... 40

3.3 DESENVOLVIMENTO DE COLEÇÃO ... 42

3.4 SLOW FASHION E CONSUMO CONSCIENTE ... 43

3.4.1 Metodologia de Moda Sustentável ... 47

3.4.2 Tecido – Poliéster Reciclado ... 48

3.5 MODELAGEM ... 49

3.5.1 Modelagem Sem Resíduo ... 50

3.6 DESIGN DE SUPERFÍCIE ... 52

3.6.1 Processo Criativo do Design de Superfície na Moda ... 52

3.7 TÉCNICAS DE IMPRESSÃO EM TECIDO ... 53

4 DESENVOLVIMENTO DO PROJETO ... 56

4.1 CONCEITUAÇÃO DO PROJETO ... 56

4.2 PÚBLICO ALVO – COLEÇÃO AS LYGIAS ... 58

4.3 METODOLOGIA DE DESENVOLVIMENTO ... 60

4.4.1 Sub-temas: Ttéias e Bichos ... 62

4.5 TENDÊNCIA: FUTURO SEM PRESSA ... 64

4.6 GERAÇÃO DE ALTERNATIVAS ... 66

4.6.1 Alternativas de Modelos ... 66

4.6.2 Alternativas de Estampas ... 69

4.6.3 Cartela de Cores da Coleção ... 76

4.6.4 Geração de Alternativas de Estampas ... 77

4.6.5 Desenvolvimento das primeiras Peças Piloto ... 84

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4.6.7 Aplicação das Estampas e confecção das Peças Piloto ... 90

4.6.8 Desenvolvimento do Logotipo da Coleção ... 94

4.6.9 Desenvolvimento de Tags ... 96

4.6.10 Desenvolvimento do catálogo da coleção ... 102

4.7 PRÉ-LANÇAMENTO DA COLEÇÃO E PESQUISA PRESENCIAL ... 113

CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 122

REFERÊNCIAS ... 124

SITES CONSULTADOS ... 126

APÊNDICES ... 127

APÊNDICE A: Fichas Técnicas das Peças da Coleção... 127

APÊNDICE B: Ficha de pesquisa de opinião ... 136

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1 INTRODUÇÃO

Ao longo da história, a arte brasileira teve uma produção muito rica, entretanto, ela é pouco conhecida do público geral. Em se tratando de artistas mulheres, esse nível de reconhecimento é ainda menor. O foco deste projeto foi então inicialmente pesquisar artistas femininas e brasileiras com quem as autoras se identificassem para o desenvolvimento de uma coleção. Foram encontradas durante a pesquisa essas duas mulheres atuantes no período Concreto e Neoconcreto, Lygia Pape e Lygia Clark.

Lygia Pape foi uma artista ampla e inovadora cujas obras abrangeram desde a pintura e a escultura até o design e à criação de instalações. Seu trabalho passou pelo Concretismo e ela foi uma das signatárias do Manifesto Neoconcreto, movimento que será abordado posteriormente neste projeto. Sua arte é pautada pela liberdade com que experimenta e manipula diversas linguagens e formatos e por incorporar o espectador como agente, além de produzir objetos e instalações marcados pela ironia, humor negro e críticas à situação política. A artista não se prende aos mesmos suportes ou procedimentos, seu trabalho é sempre inovador e enfrenta inúmeras questões.

Lygia Clark é reconhecida amplamente no cenário da história da arte brasileira e mundial, sendo elogiada tanto em escritos quanto em exposições (JUSTINO, 2013). Foi uma pintora, escultora e também uma das fundadoras do Grupo Neoconcreto. Ao longo da trajetória de seu trabalho, passou a desenvolver objetos tridimensionais. A artista se preocupava com a relação do corpo com a obra de arte. Segundo a pesquisadora Maria Alice Milliet (apud JUSTINO, 2013), é Clark quem melhor compreende as relações espaciais do plano no Neoconcretismo. A obra de Lygia Clark caminha no sentido da não representação e da superação do suporte. Propõe a desmistificação da arte e do artista e a aproximação do espectador, que de certa forma compartilha a criação da obra. Na medida em que amplia as possibilidades de percepção sensorial em seus trabalhos, integra o corpo à arte, de forma individual ou coletiva.

Dentro do ramo da arte, é notória a importância que ambas artistas têm. Seus trabalhos traduziram uma nova forma de ler a realidade e representá-la. Ainda assim, a elas é dado o mesmo destino de grande parte das mulheres envolvidas com a arte,

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passando despercebidas ao grande público, ficando seu trabalho reconhecido somente no meio especializado e acadêmico.

Tendo em vista esse problema de tamanha invisibilidade da arte feminina brasileira e somando-se a isso as ricas ideologias de Lygia Pape e Lygia Clark foi pensado que o desenvolvimento de uma coleção de roupas e estampas inspiradas em suas obras seria uma possível solução a essa invisibilidade. A roupa faz parte do cotidiano, então uma linha de roupas e estampas pode aproximar a arte das pessoas, colocar em evidência as artistas e promover a visibilidade da arte feminina, além de provocar no público a curiosidade de pesquisar mais a fundo a produção artística feminina brasileira.

Este projeto tem como objetivo geral, criar uma linha de peças de vestuário com modelagens e estampas que serão inspiradas no trabalho das artistas Lygia Clark e Lygia Pape, e dessa forma trazer atenção ao trabalho de ambas. E como objetivos específicos, listamos os seguintes:

 Pesquisar sobre as artistas Lygia Clark e Lygia Pape e o movimento artístico do Neoconcretismo

 Pesquisar sobre o design de superfície, seus métodos e o papel do designer gráfico nesse processo

 Desenvolver modelagens e estampas que tenham como inspiração o trabalho das artistas Lygia Clark e Lygia Pape

 Agregar às peças informações sobre as artistas a partir de tags temáticas, visando ampliar o conhecimento do público acerca de suas produções

 Trabalhar com o conceito de “Modelagem sem resíduo”, de modo a melhorar o aproveitamento do tecido ao cortar as peças, reduzindo a quantidade de resíduos na produção

1.1 JUSTIFICATIVA

A Moda, assim como o Design Gráfico em si, é uma forma de comunicação visual. Como afirma Jones (2013, p.34) “Assim como tentamos ler as expressões faciais das pessoas ao nosso redor, também lemos os sinais emitidos por suas roupas e inferimos, às vezes erroneamente, o tipo de gente que são”. Através do que uma pessoa veste, ela é capaz de expressar sua personalidade, sua visão de mundo, suas

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referências culturais. O papel do designer passa por criar meios para que essa expressão possa existir.

Neste projeto foi optado unir o Design Gráfico ao Design de Moda por serem formas complementares de comunicação visual e pelo fato de uma das autoras ter formação na área, tendo trabalhado neste ramo desde 2009.

Com a popularização do consumo consciente, cresce a busca por produtos com mais significado, e não mais pelo consumo puro e simples. Ainda segundo Jones (2013, p.6) “Elegância, beleza e preço alto não são mais guias para o que é ‘cool’ ”. Existe um público interessado em saber o que e quem está por trás da criação dos produtos que adquire. Aproveitando esse nicho de mercado é possível criar uma coleção que irá colocar em destaque o trabalho das artistas Lygia Clark e Lygia Pape, reforçando a identidade cultural brasileira e a produção artística feminina.

Durante a pesquisa foram analisadas diversas obras de ambas as artistas e foram selecionadas duas principais para servirem como inspiração para a coleção. São essas a obra Bichos (1960) de Lygia Clark e Ttéias (2002) de Lygia Pape. As duas foram escolhidas por serem duas obras que abriram espaço para que o espectador se tornasse protagonista da participação na concretização da ideia das artistas. As duas obras apresentam fortes aspectos visuais, formais e conceituais que trazem uma grande amplitude de inspirações para modelagens, estampas e interação com o usuário.

Seguindo essa tendência de modificação de consumo, também existe uma preocupação com relação aos materiais e o destino dos resíduos provenientes da produção de peças de vestuário. A partir do trabalho criativo de modelagem pode-se reduzir esta produção de resíduos, fazendo um melhor aproveitamento do tecido.

Os materiais utilizados para composição da roupa também constituem um ponto digno de atenção. Existem no mercado vários tipos de tecidos feitos à base da reciclagem de PET. Por serem uma boa maneira de reutilizar resíduos, seria interessante criar uma forma de valorizar mais esse tipo de tecido a partir da aplicação do design de superfície.

1.2 PLANO DE TRABALHO

Para desenvolver o projeto de coleção de roupas e estampas inspirado nas obras de Lygia Clark e Lygia Pape, adotaremos a seguinte sequência de trabalho. No capítulo “Aproximação ao Neoconcretismo e Obra das Artistas”, será feita uma breve

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abordagem sobre o movimento Neoconcreto, a vida e obras mais relevantes das artistas com base nos autores Brito (1985), Borja-Villel e Velásquez (2012), Machado (2008), Cocchiarale e Geiger (2004), Brett (2001), Rolnik (1999), Rivera (1999). Em seguida o foco será voltado para as duas obras escolhidas como inspiração para o projeto: Bichos, de Lygia Clark e Ttéias, de Lygia Pape também segundo os autores citados anteriormente.

Como embasamento teórico e conceitual para o desenvolvimento da coleção, serão abordados no capítulo “Moda e Design de Superfície” os conceitos de Moda, Tendências e Desenvolvimento de coleção, de acordo com os autores Jones (2005), Matharu (2011) e Treptow (2013). Em seguida será estudada a metodologia de Moda Sustentável, de acordo com Salcedo (2014). Também serão esclarecidas questões acerca das técnicas de Modelagem com base nos autores Abling (2014) e Seivewright (2009), e em seguida será focado o conceito de design sem desperdício, de acordo com Rissanen e Mcquillan (2016). Ao final desse capítulo será abordado ao tema Design de Superfície segundo Rütchschilling (2008), Pacheco e Medeiros (2013) e Yamane (2008) e em seguida as Técnicas de impressão em tecido com base em conhecimento adquirido por uma das autoras em sua experiência profissional.

Após esse embasamento, será documentado o processo de criação do projeto, iniciando com sua Conceituação, a Metodologia de projeto com base em estudos de Jones (2005), Treptow (2013) e Salcedo (2014), a Geração de alternativas de Modelos, Estampas e Materiais Gráficos, a Coleção e seu registro fotográfico, e por fim, Documentação Técnica dos modelos desenvolvidos.

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2 APROXIMAÇÃO AO NEOCONCRETISMO E OBRA DAS ARTISTAS

Nessa seção será apresentada uma introdução sobre o movimento artístico do Neoconcretismo. Em seguida, uma análise das obras e trajetórias das artistas Lygia Clark e Lygia Pape, e por fim serão colocados em foco os dois trabalhos que irão inspirar a coleção: Bichos, de Lygia Clark e Ttéias, de Lygia Pape.

2.1 NEOCONCRETISMO

Surgido originalmente no ano de 1959 a partir de um manifesto, o Neoconcretismo foi resultado de uma insatisfação por parte de artistas concretistas do Rio de Janeiro com a forma racionalista e regrada com que a arte vinha sendo retratada pela vanguarda concreta e por outros artistas que também a ela pertenciam. Segundo Brito (1985), o concretismo era uma vanguarda de caráter racionalista que teve forte influência do desenvolvimento que a física e a mecânica estavam adquirindo naquele período. Esse incentivo afetava a vanguarda em todos os âmbitos, principalmente nos processos da pintura, tornando esses projetos consideravelmente científicos e de caráter fortemente racional.

As discordâncias que havia entre os artistas concretistas tornaram-se públicas e polêmicas na década de 50. Elas aconteceram entre grupos de duas cidades específicas: São Paulo e Rio de Janeiro. O grupo paulista, denominado Ruptura, era formado por Lothar Charoux, Hermelindo Fiaminghi, Geraldo de Barros, Judith Lauand, Luiz Sacilotto e Waldemar Cordeiro. Como afirmado por Cocchiarale (1994), esse grupo mantinha uma obediência aos princípios formais e cromáticos do concretismo formulados por Theo Van Doesburg em 1930 e depois por Max Bill em 1935, fazendo com que transitassem no que o autor chama de “órbita da razão”.

Em contrapartida, o grupo carioca denominado Frente contava com artistas como Lygia Clark, Amilcar de Castro, Ferreira Gullar, Lygia Pape, Hélio Oiticica, Ivan Serpa, Décio Vieira, Weissmann, entre outros. Ao contrário do Ruptura, o Grupo Frente prezava pelo caráter pessoal de suas obras e queriam suas experiências livres de princípios e conceitos pré-estabelecidos. Eles se reuniam de modo extremamente dispersivo, entretanto isso não caracterizava necessariamente algo negativo no grupo. Como afirmou Pedrosa (apud BRITO, 1985) “(...) Uma coisa os une, e com a qual não transigem, dispostos a defendê-la contra tudo e todos, colocando-a acima de tudo e

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todos - a liberdade de criação” (PEDROSA apud BRITO, 1985. p.12). Ainda sobre essa questão, Lygia Pape também afirma:

Nesse momento, então, já havia no Rio uma posição um pouquinho diferente. Os concretos do Rio começaram a introduzir elementos mais subjetivos. (...) Outra coisa que também separa bastante o grupo do Rio do de São Paulo é que aqui não havia um projeto de trabalho. Havia sim um grupo que se reunia, que discutia muito, mas não um projeto como o plano-piloto para a poesia em São Paulo (PAPE apud COCCHIARALE e GEIGER, 2004. p. 155)

Desse modo, os artistas do Rio de Janeiro faziam suas obras apresentarem um limiar entre a razão e a sensibilidade. Tais diferenças foram com o passar do tempo alimentando as discordâncias e fazendo com que a polêmica entre os dois grupos crescesse. Sobre isso Lygia Pape comentou:

Em 57 eles propuseram o plano-piloto para a poesia, e foi aí que as coisas se complicaram. Por uma coincidência, quase todos do Rio, ou mesmo todos, não concordavam em ter um plano para dez anos à frente. O pessoal do Rio achou que seria racionalista demais organizar um projeto de trabalho, de criação para dez anos à frente, com todas as normas, com tudo determinado. (...) O manifesto é de 1959, mas antes, em 1957, já estava muito clara uma diferença de postura, e com esse plano-piloto para a poesia a coisa exacerbou-se e rompeu-se ali (PAPE apud COCCHIARALE e GEIGER, 2004, p. 155)

Foi em 1956, na I Exposição Nacional de Arte Concreta (realizada em dezembro de 1956 em São Paulo e em fevereiro de 1957 no Rio de Janeiro) que as diferenças entre o grupo paulista e carioca vieram à tona para o público. Ali foi o marco para que ocorresse, em 1959, uma ruptura formal entre os grupos, denominado Manifesto Neoconcreto. Formalizado em texto por Ferreira Gullar, o manifesto deu origem então a uma nova esfera e vanguarda artística no Brasil: o Neoconcretismo. (COCCHIARALE, 1994)

Como afirmado por Borja-Villel e Velázquez (2012) o Manifesto Neoconcreto denunciava a poesia concreta como excessivamente mecanicista. Essa questão é reiterada por Brito (1985) quando ele coloca que o manifesto se tratava de uma tomada de posição em relação às fortes influências mecanicistas da arte concreta. Os neoconcretos buscavam a ruptura das categorias artísticas e a incorporação de novas formas verbais e expressivas à arte abstrata e lutaram para que suas pinturas saíssem das molduras e se abrissem para o “mundo real”. (BORJA-VILLEL e VELÁZQUEZ, 2012. p. 15)

Para os artistas neoconcretos essas influências roubavam a autonomia da obra e substituíam suas qualidades naturais por noções de “objetividade científica”,

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sendo que o que de fato interessava para eles era a arte como construção da sociedade. Essa postura entregava que o Neoconcretismo possuía origem construtiva, que sempre prezou por construir uma arte que servisse de modelo para uma construção social, integrando a arte na sociedade e “educando esteticamente as massas”. Temos como exemplo a Bauhaus, o construtivismo soviético, a revista De Stijl, entre outros. (BRITO, 1985)

No caso específico das artistas Lygia Pape e Lygia Clark, ambas trabalharam por pouco tempo dentro dos conceitos do neoconcretismo, pois seus trabalhos acabaram transcendendo o objeto, tornando-se obras que se realizam a partir da participação do espectador. Essa interação do público possui mais importância do que a obra por si só. Ainda assim, tanto o concretismo quanto o neoconcretismo foram períodos essenciais para o desenvolvimento das artistas e para suas obras-trajeto. 2.2 LYGIA PAPE

Lygia Pape nasceu em Nova Friburgo, no Rio de Janeiro, no ano de 1927. Segundo Machado (2008), no decorrer da sua vida e em sua longa trajetória artística, entre as atividades que desenvolveu estiveram a pintura, escultura, cinema, design, programação visual, eventos, instalações ambientais, entre outros. Sua produção foi sempre rica, extensa e com características inovadoras. O crítico inglês Guy Brett era um admirador da artista e comentou sobre essas experiências:

O seu ludismo e sua liberdade particulares podiam ser vistos pelo modo com que ela estava disposta, desde o início, a experimentar, com uma ampla gama de linguagens e formatos – desde o balé até o livro! Ela flutuava acima dos limites das disciplinas institucionalizadas, fazendo suas próprias recombinações. (BRETT, 1994)

O período posterior ao início dos anos 50 foi um marco na emancipação de artistas em relação aos velhos conceitos de arte. Toda uma geração abraçou uma nova forma de consumi-la, no qual priorizava-se o público e ultrapassava-se limites e conceitos tradicionais. Um dos maiores exemplos de êxito dessa nova fase foi Lygia Pape, que possuía uma origem concreta, que levou esses valores por toda a sua produção desde os anos 50 até 2002 (ANDRADE, 2015). Como ela mesma afirmava, sua arte era pública e não-comercial, algo que “qualquer pessoa poderia repetir em casa”. Borja-villel e Velásquez (2012) complementam essas características da artista ao afirmarem que a arte de Pape se recusa a ser excludente, além de possuir incontáveis idas e vindas.

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Toda a sua formação se deu em um período de complexas reestruturações urbanas, e teve como panorama a cidade do Rio de Janeiro. Pape possuía um olhar singular para as características de sua cidade, e cada percepção sua adquirida em passeios e passagens foi decisiva para a criação de suas obras. Como ela mesma afirmou:

(...) fui percebendo um tipo novo de relação com o espaço urbano, assim como se eu fosse uma espécie de aranha tecendo o espaço. [...] Subindo por um viaduto, descendo por outro, percebi que minhas idas e vindas pelas ruas eram como uma teia. (MATTAR, 2003, p. 75 apud MACHADO, Vanessa Rosa, 2008)

Talvez a maior característica de Lygia como artista fosse a desconstrução. Como afirmou Herkenhoff, na revolução neoconcreta (na qual Pape foi fundamental) não são admitidas fronteiras entre as artes, e ela é um exemplo disso quando desconstruiu a forma de se fazer livros e apresentar danças com suas obras Livro da

Criação (1959 – figura 1) e Ballets Neoconcretos (1959 – figura 2), levando-os a

perderem suas hierarquias com uma forma totalmente nova de serem apresentados ao público. (BORJA-VILLEL e VELÁZQUEZ, 2012)

Figura 1: Livro da Criação

Fonte: http://www.museoreinasofia.es/sites/default/files/obras/AD06985-002_11.jpg Acesso em: 19/09/2017

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Figura 2: Ballets Neoconcretos

Fonte: http://www.vidin.co/wp-content/uploads/2017/06/pape-ballet-neoconcreto.jpg Acesso em: 19/09/2017

2.2.1 Período Frente e Neoconcretismo

Um contexto essencial na obra e vida da artista foi a revolução neoconcreta. No final dos anos 40 já existiam em São Paulo e no Rio de Janeiro o que Fernando Cocchiarale (1994) se refere como “embriões” dos grupos de artistas concretistas Ruptura e Frente. Pape pertencia ao grupo Frente e nele permaneceu entre 1954 e 1956, juntamente com artistas como Ivan Serpa, Hélio Oiticica, Lygia Clark, Ferreira Gullar, entre outros.

Ambos os grupos, como já citado, apesar da origem comum no Concretismo, possuíam discordâncias entre si e lidavam com a arte de maneiras diferentes. Enquanto o grupo Ruptura (São Paulo) mantinha uma postura mais formal e obediente aos princípios concretistas priorizando a razão, o grupo Frente (Rio de Janeiro) pelo contrário valorizava um caráter pessoal e desprovido de princípios em suas obras, equilibrando a razão e a sensibilidade sem hierarquizar um ou outro. Logo, apesar da mesma origem e do mesmo uso da geometria, a relação entre os dois grupos permaneceu polêmica até sua ruptura. (COCCHIARALE, 1994)

O Manifesto Neoconcreto, ocorrido e formalizado em 1959 por Ferreira Gullar, foi o marco que deu origem a uma nova fase na arte brasileira denominada

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Neoconcretismo. Algo que todos os artistas neoconcretos possuíam em comum entre si era a integração da obra com o espaço no qual ela estava inserida. A partir daquele momento, o fundo passaria a fazer parte do projeto como um todo e, segundo Borja-Villel e Velásquez (2012), havia uma luta em fazer com que as pinturas saíssem das molduras e fossem para o mundo real.

As obras de Pape da década de 50 (período Frente) possuíam traços concretistas e ainda eram bastante influenciadas pela geometria. Dessa época datam pinturas e as únicas xilogravuras desse período, os emblemáticos Tecelares (1956 - figura 3). Foi com o advento do Neoconcretismo e com todo o contexto político-social da década de 60 que Lygia assumiu uma nova postura com suas obras e com a sua forma de fazer arte, integrando nela todo o contexto cultural no qual estava inserida.

Figura 3: Tecelares

Fonte: http://www.lygiapape.org.br/pt/obra50.php?i=5 Acesso em: 19/09/2017

Juntamente com Hélio Oiticica e Lygia Clark, artistas neoconcretos com quem ela manteve uma forte conexão e as maiores similaridades artísticas, Pape seguiu uma linha de desenvolvimento de forte caráter coletivo, levando o espectador a se tornar uma peça essencial para que a produção artística se tornasse completa. (MACHADO, 2008)

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Com este alinhamento de ideias, esse trio passou a vivenciar a criação de umas das vanguardas mais complexas surgidas no país. Sobre a artista e sobre todo esse novo contexto, o crítico Guy Brett afirma:

Foi esse espírito rebelde da vanguarda brasileira nos anos 50 e 60 que a possibilitou penetrar ao fundo as ideias de abstração européia sem qualquer cerimônia exageradamente respeitosa ou sentimento de inferioridade. Era possível, portanto, para estes artistas visar o universal, até o cósmico, estando ao mesmo tempo imersos no local e no particular. Eles conseguiram escapar da sorte típica dos artistas do "terceiro mundo": a de fornecer à metrópole imagens de escape exótico. Em vez disso, eles valiam-se da realidade brasileira para tentar resolver alguns dos dilemas contemporâneos mais profundos. (BRETT, 2000 apud COCCHIARALE, 1994)

Segundo a própria Lygia Pape, foi em 1963 que o Neoconcretismo se dissolveu (COCCHIARALE e GEIGER, 2004). A década de 60 foi um marco na história mundial. Como afirma Cauê Krüger: “falar dos acontecimentos de 1968 implica, sem exagero, recuperar um panorama de história mundial, pois eles aconteceram em Paris, Praga, nos Estados Unidos, Brasil, México, envolveram a União Soviética, Cuba, China, Vietnã, e estenderam-se por diversos países” (KRÜGER, 1968). No caso do Brasil, foram anos de intensa repressão política com a ditadura militar instaurada no país em 1964 (BARROS, 2011). Sobre esse aspecto histórico, Vanessa Rosa Machado situa que:

Em meio às medidas repressivas instauradas a partir do golpe militar de 1964, e exacerbadas com a publicação do Ato Institucional no 5, houve iniciativas que procuraram se dirigir a um público, por assim dizer, leigo, para transformá-lo em público de arte, ou que, em outra medida, propuseram expandir o museu para os lugares públicos. (ROSA, 2008. p. 97)

Toda essa atmosfera refletiu nas obras de Pape. O trabalho da artista voltou-se para a crítica às elites e instituições culturais, como por exemplo em trabalhos como a Caixa de baratas (1967 – figura 4). Essa obra remonta a uma crítica à arte “trancada e morta” dentro dos museus. Lygia afirmava que colocar essa caixa em um museu era um gesto de humor negro, visto que esta mesma caixa era uma negação absoluta dos museus (FARIA, 1999). Como foi afirmado pela própria artista em entrevista:

A Caixa das baratas, onde mostro uma coleção de baratas presas com alfinetes, como uma verdadeira coleção, queria uma referência (pela sensação de asco que essas baratas produziam no espectador) com a arte guardada nos museus, longe da vida. (PAPE apud COCCHIARALE e GEIGER, 2004. p. 163)

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Figura 4: Caixa das baratas

Fonte: http://www.lygiapape.org.br/pt/obra60.php?i=8 Acesso em: 19/09/2017

Entretanto, uma parte importante do potencial da artista ainda estava por vir com o trio de projetos mais emblemáticos surgidos no final da década de 60. O Ovo (1967), O Divisor (1968) e Roda dos Prazeres (1967 – figura 5) evidenciaram uma nova fase da artista. A obra de Pape mais do que nunca estava comprometida com o seu público. Sua sensibilidade foi desde expor críticas às ditaduras (que não se resumiam apenas ao Brasil na América Latina), quanto a também representar a realidade de povos indígenas e de pessoas de classes mais baixas (BORJA-VILLEL e VELÁZQUEZ, 2012). Toda essa conjuntura demonstra uma direção pós neoconcretismo da artista voltada para a antropologia cultural (HERKENHOFF, 2012).

Figura 5: O Ovo, O Divisor, Roda dos Prazeres Fonte: http://www.lygiapape.org.br

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Assim Lygia Pape se manteve até o fim da sua vida. Na década de 70, usando como influencia suas xilogravuras Tecelares (período Frente) e sua relação com a cidade do Rio de Janeiro (ANDRADE, 2015), Lygia criou a primeira instalação da obra

Ttéias, mas que somente no final dos anos 90 ganharia novas versões. Lygia

trabalhou incansavelmente até 2002, vindo a falecer no Rio de Janeiro em maio de 2004 (COCCHIARALE, 2015).

2.3 TTÉIAS (2002)

Ao longo da pesquisa acerca da obra de Lygia Pape, foi encontrada como inspiração a obra Ttéias (2002), que servirá como base para a criação da coleção de estampas. Tratam-se de instalações em escala arquitetônica criadas a partir da disposição de vários fios dourados dispostos de diferentes formas no espaço, presos por plataformas de madeira fixadas no chão e no teto que recebem alguns focos de iluminação para salientar as formas desses fios.

Como afirma Andrade (2015), Ttéias foi a última etapa do projeto de pesquisa de Pape sobre linguagem geométrica que teve início na série Relevos (1955-56 figura 6) e Tecelares (1956). Esse último, que foram as únicas xilogravuras do período Frente, foi uma das maiores inspirações para a artista criar as instalações na década de 70. Em 1977, ela se juntou com seus alunos da Escola de Artes Visuais do Parque Lage, no Rio de Janeiro, e criou as primeiras experiências da obra, esticando fios em meio à natureza. Sua primeira exposição realizada foi a instalação Ttéia 1A (figura 7), no ano de 1979. Foi só a partir da década de 90 que a artista daria continuidade a esse projeto.

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Figura 6: Relevos Fonte: http://www.lygiapape.org.br/pt/obra50.php?i=4 Acesso em: 19/09/2017 Figura 7: Ttéia 1A Fonte: http://www.lygiapape.org.br/pt/obra70.php?i=6 Acesso em: 19/09/2017

Outra grande influência para as instalações e para a obra Ttéias como um todo foi a cidade do Rio de Janeiro, palco da vida e obra de Lygia Pape e lugar com o qual ela possuía uma relação íntima. Com o passar do tempo, a artista foi percebendo

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que todos os lugares que ia estavam conectados pelo seu caminhar, como se deixasse linhas invisíveis atrás de si formando assim uma teia de vários fios por onde passava. Como afirmou Arlete Fonseca em sua publicação:

A artista cria possibilidades de unir lugares distintos relacionados com sua vida e obra, na sua cidade-teia. Assim como uma aranha que busca mapear seu território por escolhas individuais, deslocando-se para os pontos que mais a atraísse, Pape emprega sua sensibilidade neste emaranhado que se entrecruzam em espaços vitais em que todos podem tecer seus projetos de vida e morte. Ttéia 1C é a conclusão deste processo que une arte, escolhas, dores, amores, ideias, planos de um modo de sentir e de viver. (ANDRADE, 2015)

Esse projeto expôs o desenvolvimento artístico que Lygia adquiriu com o passar dos anos. Com as Ttéias ela mostrou seu apurado senso técnico ao ter explorado elementos como espacialidade, luz natural e artificial, além de diferentes tipos de fios utilizados na instalação, tais como cobre, nylon, prata, entre outros. O projeto conta ainda com a participação direta do espectador, concretizando a obra em um projeto tridimensional que provoca o deslocamento e interação do público para que ela se concretize. A exposição Ttéia 1C (figura 8), desenvolvida pela artista no ano de 2002, foi sua última obra e encontra-se atualmente exposta no Instituto Inhotim, localizado em Brumadinho, Minas Gerais.

Figura 8: Ttéia 1C

Fonte: http://www.lygiapape.org.br/pt/obra00.php?i=15 Acesso em: 19/09/2017

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2.4 LYGIA CLARK

Lygia Clark nasceu em Belo Horizonte em 1920. Declarava-se Pintora, Escultora e “Não-artista”. Foi aluna do arquiteto e paisagista Burle Marx em 1947 no Rio de Janeiro e entre 1950 e 52 estudou em Paris. Seu interesse inicialmente se deu pela investigação da “linha como moduladora da composição” (COCCHIARALE e GEIGER, 1987, p. 144) e sua relação com o espaço, o que ela chamou de Linha Orgânica. Em 1956 Lygia expõe suas obras na I Exposição Nacional de Arte Concreta no Rio de Janeiro e em São Paulo.

Segundo Justino (2013), apesar de pouco comentada, a influência de Burle Marx foi grande em sua formação. Ele trabalhava com materiais simples e naturais como rochas, plantas e areia, e dava grande importância para a possibilidade de o caminhante interagir com seus jardins e criar uma experiência própria.

Para analisar o trabalho de Lygia Clark, Brett (2001) propõe observar os três sujeitos principais para a existência do que conhecemos como arte: o artista, o objeto e o espectador. Serão usados nessa pesquisa os argumentos do autor para entender melhor a trajetória da artista. Ao longo do trabalho de Lygia, esses três personagens passam por transformações significativas. Carvalho (2011) também afirma o mesmo: No Brasil, o trabalho de Lygia Clark é de extrema relevância em decorrência das transformações que opera nos três elementos da comunicação artística: o artista, a obra e o espectador. A trajetória de Lygia Clark é a própria trajetória de vida e arte que se mesclam, se misturam, se desdobram, se tocam, se confundem para resgatar o significado primeiro de ‘ser e estar’ no mundo. (CARVALHO, 2011, p.131)

Em um primeiro plano, Brett (2001), fala sobre a imagem do artista que normalmente é visto como um ser criativo e quase divino capaz de criar coisas que satisfazem a necessidade de contemplação dos espectadores. Na obra de Lygia Clark, ela deixa de ocupar este “posto” e passa a, de certa forma, abrir mão da autoria da obra. Isso porque a obra deixa de existir em seu propósito sem que haja a participação e interação do observador.

Em segundo lugar, Brett (2001) analisa o objeto. E a partir dele traça a trajetória de evolução do trabalho da artista, em uma linha do tempo que vai da pintura bidimensional até as proposições em que a obra é a experiência do participante. Esta linha de transformações pode parecer fluida para quem observa na superfície, mas em cartas de Lygia Clark é possível perceber que cada uma dessas transformações

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era precedida de uma crise e uma busca profunda para que se materializasse uma nova ideia.

Podemos dizer que toda a sua produção está descrita, “explicada” e relacionada aos seus processos internos, suas “crises” como ela própria denomina, tornando compreensível as mudanças em cada fase do seu trabalho. (BARBIERI, 2008, p. 38)

Essa linha do tempo se inicia em Superfícies Moduladas e Espaços

Modulados (1950 – figura 9), quando as formas ainda geométricas invadem as

molduras, eliminando o espaço que separa a arte do mundo externo. Em 1958, com

Casulos essas formas assumem mais uma dimensão e passam a ter um espaço

interno, saindo do quadro. Segundo Brett (2001), como se fosse uma evolução, os

Casulos (figura 10) caem ao chão, ganham dobradiças e se tornam Bichos (1960

figura 10). Depois, em Trepantes (1964 – figura 11), a superfície continua sendo metal, mas frente e verso, dentro e fora são misturados na forma da fita de Moebius. Com uma flexibilidade ainda maior, vem em seguida Obra Mole (1964 – figura 11), esculturas espiraladas feitas em borracha.

Figura 9: Superfícies Moduladas e Espaços Modulados

Fonte: https://www.artbasel.com/catalog/artist/7105/Lygia-Clark Acesso em: 19/09/2017

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Figura 10: Casulos, Bichos

Fonte: https://www.artbasel.com/catalog/artist/7105/Lygia-Clark Acesso em: 19/09/2017

Figura 11: Trepantes, Obra mole

Fonte: https://overthekneeproject.files.wordpress.com/2014/04/lc231_mariogrisolli.jpg Acesso em: 19/09/2017

De objetos para o tato, a artista passa aos objetos para os sentidos com

Máscaras Sensoriais (1967 – figura 12) e depois objetos para o corpo como um todo

em peças como Máscaras Abismo (1967-68 – figura 12). A partir de então, os objetos não são apenas obras a se observar, são Objetos Relacionais, que foram usados amplamente em pesquisas e experimentações de Lygia na área da terapia corporal. Assim, o corpo e a ação se tornam o centro da atenção da artista, e não mais os objetos em si.

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Figura 12: Máscaras Sensoriais, Máscaras Abismo

Fonte: https://classconnection.s3.amazonaws.com/38/flashcards/1481038/png/sensorial_hoods Acesso em: 19/09/2017

Segundo o argumento de Guy Brett (2001), chega-se ao terceiro personagem, o observador. Que em lugar do imparcial e contemplativo observador dos museus e galerias de arte, chega tão perto da criação da artista a ponto de tornar-se tornar-seu paciente. Entre os anos 1970 e 80 Lygia tratou muitas pessoas com tornar-seus métodos experimentais de terapia utilizando os Objetos Relacionais (figura 13). Chegando a lecionar sobre esses métodos na universidade de Sorbonne em Paris.

Figura 13: Objetos Relacionais

Fonte: https://i.pinimg.com/originals/f1/b3/5a/f1b35a6d05a39f346a516de8fb0490b5.jpg Acesso em: 19/09/2017

O trabalho de Lygia vai pouco a pouco incluindo novos sentidos. Suas primeiras obras eram para os olhos. Bichos já passa a estimular o tato. As Máscaras

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Sensoriais estimulam principalmente visão, audição e olfato. As Máscaras Abismo

excluem a visão e incluem sensações que passam para o corpo como um todo. E a partir disso, seu trabalho vai se aprofundando ainda mais no interesse pelo que está escondido no ser de cada participante (ou paciente) e as sensações que ele pode descobrir ao se relacionar com os objetos, roupas e proposições. (BRETT, 2001)

Com os Objetos Relacionais, em experimentações, Lygia percebe que a interação com os objetos provoca fortes reações nas pessoas, como o retorno de memórias que não poderiam ser acessadas somente pela razão. Nesse momento há uma inversão do foco de seu trabalho, que deixa de ser o objeto em si e passa a ser o próprio observador, que se torna paciente. (COCHIARALLE, 1987)

Rolnik (1999), divide o conjunto obra de Lygia Clark em duas partes principais, tendo como divisor a obra Caminhando (figura 14), de 1963. A primeira parte, que vai de 1947 a 1963, começa com os estudos de Lygia junto a Burle Marx e também com a influência de Fernand Léger, que valorizava a linha e sua relação com o espaço.

Figura 14: Caminhando

Fonte: https://comunicacaoeartes20122.wordpress.com/2013/02/19/lygia-clark/ Acesso em: 19/09/2017

A autora afirma que a partir de 1954, seu trabalho ganha mais autonomia e encontra semelhança com outros artistas contemporâneos, o que a leva à união com

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o movimento Neoconcreto, sendo a sua uma das assinaturas no Manifesto Neoconcreto.

A obra de Lygia nessa primeira fase conserva algumas características Concretas, como o uso materiais e formas bastante simplificadas e objetivas. Mas o que a diferencia é o fato de que essas formas eram um meio para uma expressão mais abrangente. A combinação dessas formas resulta na criação de “objetos vivos”, que surgem no plano em suas primeiras obras com a ideia da “linha orgânica”, que interage com o espaço, e da “quebra da moldura”, que elimina a separação entre obra e ambiente. Em 1959 começa a explorar a tridimensionalidade em Casulos até chegar a realmente ocupar o espaço tridimensional em Bichos (1960-63).

À primeira vista pode parecer estranho falar em “organicidade” no Neoconcretismo, pois a forma de expressão ainda se apoia na geometria. Mas o que se buscava nesse movimento não era uma organicidade baseada em imitar as formas da natureza, e sim incorporar a vitalidade nas obras como impulso criador, tanto do artista quanto do observador. Isso é bastante perceptível nas obras e nas cartas escritas pela artista (ROLNIK, 2009).

Segundo Rivera (2008), o passo da criação de Lygia caminha cada vez mais a partir da obra em direção ao observador, até o ponto em que este se torna o principal objeto de estudo. A transição de Bichos, para Trepantes, chegando em Caminhando, vai abrindo cada vez mais a possibilidade de interferência do observador até o ponto em que não cabem mais as palavras “obra” ou “objeto”, e assim as “proposições” tomam seu lugar. Até o limite em que a proposição, na ausência de um sujeito participante, se torna apenas um manual de instruções. Assim, a própria artista afirma estar se “desagregando” de suas obras, que já não dependem dela para existir.

Lygia Clark faleceu em 1988, tendo criado e trabalhado com terapias até então. De acordo com Rolnik (1999), a questão central da arte moderna, na qual inclui a obra de Lygia Clark, é “religar arte e vida”, chegando a limites que não eram imaginados, e que por isso continuam apenas parcialmente compreendidos até hoje. 2.5 BICHOS (1960)

Para o desenvolvimento das modelagens da coleção que será desenvolvida nesse projeto, foi escolhida como inspiração a obra Bichos (1960), por suas variações

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de formas, ângulos de observação e interpretação de “dobras”, o que se aproxima muito do conceito de vestir.

Sobre esta obra, Lygia Clark afirma em entrevista a Cochiaralle (2004), que a criação dos Bichos foi consequência de uma adaptação necessária na obra

Contra-relevo (1959). Por serem feitas em madeira, ela percebeu que as peças sempre

voltavam das exposições com algum defeito, então procurou outro material e passou a trabalhar com o alumínio. Ao dobrar uma fina placa de alumínio, surgiu a ideia de criar uma peça com mais articulações (figura 15).

Figura 15: Bichos

Fonte: http://veja.abril.com.br/entretenimento/pelos-caminhos-de-lygia-clark/ Acesso em: 19/09/2017

Inicialmente trabalhou com chapas muito finas, que eram utilizadas para confecção de aviões em miniatura. Ela cortava formas geométricas nessas chapas e as unia com fita adesiva. Nos anos 60, em parceria com seu colega Bonino, se tornou possível a confecção dos bichos em maior escala e com as dobradiças, pois ele dominava as técnicas de manipulação do metal. Posteriormente a técnica de confecção foi aprimorada, tendo algumas etapas automatizadas. O que inicialmente era feito manualmente com serra, passou a ser cortado a partir de moldes com facas especiais, conforme a artista explicou em entrevista a Cochiaralle (2004).

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Os Bichos representaram o início do desapego à autoria da obra. O objeto se torna o centro da ação do observador, que pode modificá-lo conforme sua vontade, dentro das limitações de movimento que o próprio objeto apresenta. (COCHIARALLE, 2004)

Rivera (2008) afirma que em Bichos, Lygia convida o espectador a ser co-autor da obra, provocando movimento e de certa forma dando vida aos Bichos. O contato entre obra e observador é orgânico, um movimenta, o outro responde. As dobradiças seriam uma referência à espinha dorsal de um animal real. Quando questionada sobre quantos movimentos um Bicho seria capaz de fazer, Lygia afirma “Eu não sei, você não sabe, mas ele sabe...” (CLARK, 1999 apud RIVERA, 1999, p.227). Nossa imaginação pode pensar em diversos movimentos, mas o material rígido e suas dobradiças trazem algumas limitações.

A diversidade de possibilidades das peças não acontece somente no movimento, mas também no ângulo de observação. Lygia afirmava: "O Bicho não tem avesso" (CLARK, 1999 apud RIVERA, 1999, p.227).

Os Bichos, por serem feitos em placas de metal polido, com cortes secos e dobradiças, podem trazer uma ideia ligada ao tecnológico e industrial. Mas sua inconstância e a necessidade do contato com o observador para gerar nele um movimento, trazem um certo tipo de vida para o objeto. E nesse momento as fronteiras entre obra e observador passam a se dissolver. (ROLNIK, 1999)

Através dos Bichos, Lygia opera na dimensão espaço-temporal. Não se trata de um espaço contemplativo, mas de um espaço circundante. A artista resolve a dialética do dentro e fora, do avesso e direito, uma vez que os Bichos criam um espaço interior “vivo” e, ao mesmo tempo, deixam-se ser penetrados pelo espaço circundante. Convida o espectador a mover suas partes e ele (o bicho) lhe devolve uma multiplicidade de combinações improvisadas no aqui agora. ROLNIK, 1999, p.134

Segundo Rolnik (1999), a ideia de Bichos ia além da proposta de contato com o espectador, havia também uma vontade de que eles fossem multiplicados, se espalhando por diversos ambientes e lugares do mundo. Mas como sua forma ainda leva a uma possibilidade de contemplação, não foi isso que aconteceu, e as obras acabaram ficando restritas à exposição em museus.

Também havia uma característica em Clark de não se reter demais em um determinado projeto, e ir seguindo em frente nas evoluções de suas propostas. Em lugar de tentar desmistificar a característica de “obra de arte” dos Bichos, sua tendência foi seguir em frente rumo a uma desmaterialização cada vez maior de suas

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criações. De acordo com Rolnik (1999) esse seria o motivo da série Bichos ser a mais conhecida, comentada e documentada de suas obras, por ainda ocupar um lugar de destaque no ideal tradicional de “obra de arte”. Depois deles, suas obras foram se tornando cada vez mais ideias e conceitos do que objetos em si. O interesse de Lygia não era apenas fazer o espectador interagir com a obra, mas também despertar nele sensações próprias. Bichos foi apenas o início da materialização dessa vontade. 2.6 CONSIDERAÇÕES SOBRE AS ARTISTAS

Após o estudo aprofundado sobre cada uma das Lygias e sobre seus contextos de vida e artísticos, surgiu a possibilidade de compreender a essência de cada uma e a partir disso inserir essa mesma essência na criação da coleção de roupas e estampas.

Lygia Pape focava sua arte na inclusão do todo, na expansão, na utilização de materiais acessíveis para que todas as pessoas tivessem a possibilidade de recriar ou de se sentirem inseridos. Ela trabalhava no externo, em uma escala muitas vezes arquitetônica, como por exemplo a própria Ttéias, que cobria uma sala inteira com seus fios.

Em contrapartida Lygia Clark focava no “eu”, no pessoal, no autoconhecimento e no olhar para dentro. Sua arte mudou as relações entre obra, artista e observador. Ela começou sua trajetória na pintura e pouco a pouco sua arte foi se convertendo para o autodescobrimento e o aprofundamento no ser, até seus objetos tornarem-se meios para tratamento em terapia corporal.

Esse contraste entre as duas artistas serviu como fonte de inspiração para as peças. As Ttéias de Lygia Pape representam o externo, a amplitude e a observação do ambiente, e serviram como inspiração para as estampas da coleção. A estampa na roupa é aquilo que o outro vê, é o que está exposto para o público e esta é sua relação com as Ttéias. Do outro lado temos Bichos de Lygia Clark, peças de metal compostas de formas geométricas planas, que podem ser modificadas pelo observador. Desta obra tiramos a inspiração para as modelagens, que no mesmo princípio, também são formadas por triângulos, retângulos e trapézios, e ao serem colocadas sobre o corpo ganham uma nova forma. Essa forma será diferente para cada tipo de corpo que a vestir.

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As roupas da coleção As Lygias possuem formatos e caimentos que dependerão do seu usuário para funcionar, será a pessoa que a veste que definirá suas dobras e formatos. Além disso, a modelagem é feita através do tecido, e é o tecido que se mantém em contato direto com a pele, com o “eu”, fazendo essa conexão com a essência introspectiva de Clark.

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3 MODA E DESIGN DE SUPERFÍCIE

Neste capítulo será abordado o embasamento técnico e conceitual do projeto, iniciando com conceitos acerca do termo Moda, tendências, modelagem convencional, modelagem sem resíduo, slow fashion, moda sustentável, desenvolvimento de coleção e outros conceitos necessários para o desenvolvimento do projeto.

3.1 CONCEITOS ACERCA DO TERMO MODA

Vestir-se é uma necessidade inerente à vida social do ser humano. A simples rotina de vestir-se pela manhã implica em decisões, conscientes ou não, de qual será a imagem que iremos apresentar para o mundo. Nesse momento se leva em conta também o que pode ser confortável ou socialmente aceito para determinada atividade a ser desenvolvida ao longo do dia. Segundo Jones (2005, p. 24) “Moda é uma forma especializada de ornamentação do corpo”.

Para definir os conceitos acerca do termo moda, é válido fazer um contraponto com o termo vestuário. Vestuário está relacionado ao aspecto funcional das roupas, a necessidade que temos de nos proteger das intempéries, de cobrir o corpo para participar do convívio social. Já o conceito de Moda, abarca uma infinidade de subjetividades, estando constantemente sintonizado com a cultura e as mudanças sociais. Os designers buscam criar produtos que se conectem ao consumidor num nível estético e emocional, e para isso é necessária uma percepção abrangente das necessidades e anseios de seu público alvo. (MATHARU, 2011)

A Moda, de acordo com Treptow (2013) surge no momento em que as pessoas passam a se valorizar pela diferenciação dos demais a partir da aparência. Mas ao mesmo tempo, essa diferenciação de uns gera identificação com outros, e dessa tendência surgem grupos semelhantes, em que um determinado estilo pode ser admirado e copiado por outros. A partir desse fenômeno é que se tem a definição de Moda. Então o vestuário deixa de ter a característica meramente funcional e passa a ser uma forma de expressão visual, de diferenciação, inclusão ou exclusão, e que pode mudar de acordo com o contexto social e cultural de cada época e localidade.

Segundo Treptow (2013) a base da indústria têxtil e de confecção consiste na criação, produção e venda de produtos. “Ao processo de definição, criação e estudo de viabilidades e métodos para a produção de um produto, damos o nome de

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desenvolvimento de produto” (Treptow, 2013, p.16). Nesse processo de criação são levadas em conta características como público alvo, pesquisa de tendências, viabilidade de custo dos produtos, disponibilidade de materiais junto aos fornecedores e a capacidade produtiva da empresa. O designer de moda, além de criar os produtos, deve considerar todos esses aspectos.

Até o início do século, o calendário da moda tinha uma definição clara, com lançamentos de coleção ocorrendo duas ou quatro vezes por ano. Sendo coleções de Primavera/Verão e Outono/Inverno, normalmente com duas coleções intermediárias entre elas. Com o amplo acesso à informação, a velocidade da demanda por novidades se tornou muito maior, e hoje a maioria das marcas já não pode mais se prender ao calendário semestral. Pequenas empresas atuantes no mercado de pronta-entrega, chegam a planejar lançamentos semanais de novos produtos. Coleções que antes poderiam ser planejadas com um ano de antecedência, hoje são lançadas em cerca de oito semanas pelas marcas do mercado fast-fashion como Zara e H&M. (Treptow, 2013)

Ao mesmo tempo, crescem as pequenas marcas autorais, e a indústria slow

fashion passa a tomar forma, com um perfil de consumo consciente e sustentável.

Mas ainda assim, mesmo essa modalidade de criação já não se atém a calendários de coleção. Cada marca de moda cria seu próprio ciclo de acordo com suas demandas (Jones, 2005).

Nesse novo cenário, o conceito da palavra “Coleção” em moda se refere a um conjunto de produtos que compartilha entre si o mesmo conceito de criação, direcionamento de mercado, formas e aspectos estéticos. Normalmente sendo peças que combinam entre si, ou peças novas que podem ser combinadas a outras já existentes nas coleções de determinada marca (Treptow, 2013). Nessas coleções também não há uma quantidade mínima ou máxima de produtos, isso será definido de acordo com a capacidade e os objetivos de mercado de cada marca.

3.2 TENDÊNCIAS

Segundo Treptow (2013, p. 22) “A moda é um fenômeno sociológico”. Sendo assim, não há como separar a moda dos acontecimentos mundiais, dos aspectos culturais e sociais. É de grande importância que o designer esteja muito atento e desenvolva a capacidade de “ler” estilos e tendências. Para se tornar moda, um determinado estilo precisa ser adotado por uma quantidade maior de pessoas. Como

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um consenso silencioso, várias pessoas aceitam, concordam e consomem determinada ideia para que ela se torne moda.

“Tendência de moda, ou modismo, é o nome dado aos produtos que retratam o gosto dominante de um determinado tempo” (Treptow, 2013, p.27). A facilidade de acesso à informação faz com que imagens atravessem o mundo instantaneamente. Por isso fica cada vez mais difícil definir de onde surgem determinados estilos. Para a maior parte da população, a influência sobre seu estilo é exercida por veículos de comunicação de massa, como a televisão, os filmes, e em alguns casos, revistas de moda. Entre o público jovem é evidente a influência das imagens compartilhadas nas redes sociais. Em estudos de tendências, são observados dois movimentos principais de origem das influências. O primeiro é chamado efeito trickle down ou “desaguamento”, o segundo bubble-up ou “ebulição”. (Jones, 2005)

O efeito trickle down vem das passarelas ou celebridades em direção às ruas. Por exemplo, um designer lança determinado modelo em passarela, celebridades e clientes vanguardistas passam a adotar o estilo. Em seguida, marcas independentes associadas ao mercado de vanguarda começam a reproduzi-lo, aos poucos essa tendência vai sendo adotada pelo grande público, e quando atinge o auge, passa a ser reproduzida pelo comércio popular.

Já o efeito bubble-up acontece ao contrário. Um estilo começa a aparecer nas ruas, em grupos normalmente relacionados a contraculturas. A mídia de moda dá um nome a esse modo de se vestir e passa a divulgá-lo em seus meios. Formadores de opinião começam a aderir ao estilo e em seguida ele aparece em versões elitizadas nas passarelas. Um grande exemplo disso foi o que aconteceu com o estilo punk nos anos 70 ou o grunge nos anos 90.

Para ter um panorama da previsão de tendências, podem ser consultados os boletins de escritórios de pesquisa, como o Trend Union, liderado pela pesquisadora Li Edelkoort, o Promostyl e o Peclers, com sede em Paris, ou o WGSN (World Global Style Network), que foi criado em 1998 e é o maior banco de dados de pesquisa de tendências online. As equipes desses escritórios pesquisam o contexto social, econômico e monitoram as tendências de mercado, como reação dos consumidores a cores, formas e conceitos. (Treptow, 2013)

Como o acesso ao conteúdo desses escritórios tem um alto custo, é importante para o estilista independente ou que trabalha em pequenas empresas,

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estar muito atento aos acontecimentos ao seu redor, tendências de consumo, comportamento e estilo de rua.

3.3 DESENVOLVIMENTO DE COLEÇÃO

Entende-se por Coleção um conjunto de produtos, com harmonia estética e com entrega prevista para uma determinada época em comum. Uma coleção precisa considerar aspectos como perfil do consumidor, identidade da marca, pesquisas, tema de coleção, cartela de cores, materiais e silhuetas. (Treptow, 2013)

Segundo Rech (apud Treptow, 2013), é o método de criação de coleção que diferencia o estilista ou designer de moda do artesão. Independente da velocidade dos lançamentos de cada marca, trabalhar com moda é trabalhar com a sazonalidade. De acordo com as datas de lançamento pretendidas, há períodos definidos para realização de pesquisas, criação de peças piloto, pedidos de tecidos, confecção e vendas. (Jones, 2005)

Alguns eventos, como feiras de lançamento de tecidos, acabam ajudando a definir o calendário da moda, pois a maioria das marcas depende dos fornecedores de tecidos para criar suas coleções. Poucas são as marcas com produção suficiente para criar tecidos de acordo com suas próprias demandas. Uma das principais feiras de tecidos que acontece no Brasil é a Première Vision, em São Paulo, que concentra fornecedores nacionais e internacionais e também divulga as tendências de cada estação em palestras pagas. A feira acontece em julho com lançamentos de Verão e novembro com lançamentos de Inverno.

Como o calendário de lançamentos está cada vez mais diluído, muitas vezes um estilista precisa gerenciar várias etapas de diferentes coleções ao mesmo tempo, mas essencialmente, o processo de criação do produto segue a seguinte lógica. Primeiramente são observadas as tendências em pesquisas que podem ser feitas na internet, nas ruas, nas feiras de tecidos, assistindo a desfiles, ou contratando sites especializados, como o WGSN, que lança boletins de tendências com mais de 2 anos de antecedência, mas ainda tem um custo bastante alto para pequenas empresas. Durante visitas a feiras de tecidos, podem ser coletadas amostras que poderão ser a base para os modelos da coleção.

A partir dessa pesquisa, é definido um tema que irá nortear a coleção, definindo cartela de cores, formas, detalhes que irão predominar e trazer a unidade

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